Fanfic: Desde sempre. | Tema: Fátima Bernardes e William Bonner

Oito e meia da noite. Em frente o espelho, Fátima finaliza sua maquiagem. Usando um vestido tomara-que-caia, todo bordado em paetês dourados, ela estava deslumbrante. O cabelo solto e liso, cascateava pelas costas dela, até alcançar a cintura. Nos pés, um scarpin metálico altíssimo, evidenciava as belas coxas que ela possuía. O vestido, por ser justo, demarcava as curvas do corpo dela. Na boca, um batom vermelho matte, no qual ela passava levemente a ponta dos dedos, tentando limpar as bordas que extrapolavam o limite de seus lábios. Se olhou de vários ângulos e concluiu que estava adequada para comemorar seu aniversário ao lado de colegas e amigos. Em uma pequena clutch, jogou o batom, o celular, uma pequena carteirinha com documentos, cartões e dinheiro e as chaves do carro e de casa. Ganhou um beijo da mãe e do pai no rosto e saiu. Dirigiu até seu restaurante favorito, onde havia marcado com os colegas de trabalho mais próximos dela e alguns poucos amigos que possuía. Ligou o rádio e, quando se deu conta de qual música tocava na rádio, arregalou os olhos e aumentou o som. Just feel better, do Steve Tyler. (Link: http://www.youtube.com/watch?v=enbTb8PizTI). Era a mesma música que tocou em um clipe que passou no telão, em seu aniversário de 15 anos. Fazia muitos anos, mas ela teve a sensação de que se passaram apenas poucas semanas. Pensou em si mesma. Vinte e sete anos. “Como os anos voaram!”. O dia de seu aniversário era sempre era um dia extremamente nostálgico. Ela não pôde evitar a lembrança da valsa. Dançou com o pai, com o avô, com o padrinho e com William. Daquele dia em diante, ela teve que lidar com as recorrentes e irritantes perguntas de toda a família: - “Vocês não acham que você e o William deveriam namorar com o outro?”. Ela sacudiu a cabeça e riu com a lembrança. “Bobagem!”, pensou.    Estacionou na porta do restaurante, entregou a chave para o manobrista. Entrou pelo saguão e caminhou até a mesa que ela havia reservado para aquela noite. Já haviam alguns colegas da revista sentados na mesa, ela foi abraçada por todos e se sentou. Aos poucos, mais convidados chegavam, o que fazia com que Fátima se sentisse lisonjeada de tantas pessoas terem se deslocado até lá para prestigiá-la. A mesa para 20 pessoas já estava praticamente lotada. Todos gargalhavam e conversavam assuntos aleatórios. Estava sendo uma noite deliciosa. Fátima olhou em linha reta e viu William se aproximando. Estava de mãos dadas com a namorada, Heloísa. Ele veio de cabeça baixa, aparentemente tentando esconder uma chateação. Fátima conhecia-o só de olhar, pela expressão do rosto dele. “Essa filha da mãe brigou com ele por algum motivo...” Fátima bufou e revirou os olhos, sem que ninguém percebesse. Detestava Heloísa com todas as suas forças. Já viu por várias e várias vezes as atrocidades que ela era capaz de falar pra William, em público, na frente de qualquer pessoa, quando estava tomada pela ira. Ele não a merecia. Por várias vezes, as duas se estranharam. Heloísa não concordava com a amizade dos dois, achava que Fátima tentava se aproveitar da proximidade que tinha com ele para dar em cima de William. Em milésimos de segundos, Fátima lembrou-se da discussão com ela, há anos atrás. Em uma festa de Natal na casa da família de William, ela se aproveitou da ida dele ao banheiro para se aproximar de Fátima e disparar uma série de desaforos contra ela, totalmente inesperadamente.

                - Fátima. Eu queria ter uma conversa rápida com você... – disse Heloísa, com os olhos flamejando.

                - Oi. Pois não? – Fátima respondeu, calmamente, meio confusa com aquela situação.

                - Na verdade não é nem uma conversa. É só um recado. – ela olhou para os lados, para se certificar de que ninguém estava ouvindo. Olhou novamente pra Fátima. – Se afaste do William. Isso não é um pedido.

Fátima franziu o cenho, tentando se certificar se tinha entendido bem o que acabara de ouvir.

                - Como... ?

                - É isso mesmo que você ouviu. Ele é MEU namorado, ele não quer nada com você. Se quisesse, já teria tentado algo quando vocês ainda eram adolescentes e estaria, agora, com VOCÊ. Mas não, ele está COMIGO. Pare de cercá-lo, pare de ligar pra ele, mandar mensagens, para de se insinuar pra ele como você faz, se pendurando no pescoço dele ao cumprimentá-lo, tentando me provocar com essas demonstrações de afeto na minha frente e na frente de quem quer que seja. Você não vai conseguir roubá-lo de mim, isso eu garanto a você. – Heloísa fuzilava-a.

Fátima soltou uma gargalhada sarcástica, abismada com TAMANHO absurdo. Sentiu seu sangue subir-lhe à cabeça. Se controlou desesperadamente para não berrar com ela. Respirou fundo, olhou no fundo dos olhos de Heloísa e respondeu, com classe.

                - Heloísa... eu estou preferindo nem acreditar no que estou ouvindo. Fico em dúvida se sinto mais pena de você, por ser TÃO insegura e neurótica, ou se sinto pena do William por estar ao lado de uma pessoa tão perturbada. Olha... Não existe coerência em NENHUMA letra de todas essas palavras que você me disse. Eu não vou nem perder meu tempo justificando a você sobre a minha amizade com o William, porque eu sei que você está cansada de saber disso, se insiste nessa babaquice de achar que eu tento roubá-lo de você, ou é porque gosta de se martirizar com essa idéia maluca, ou então é porquê é burra mesmo e não consegue enxergar as coisas como elas realmente são. Desculpa, mas eu não vou me afastar do William, a não ser que ele me peça pra fazer isso. Mas se você precisou esperar que ele se afastasse pra vir me falar isso, provavelmente é porque ele não concorda com a sua atitude.  Não vou parar de mandar mensagens, não vou parar de abraçá-lo quando o vejo, seja lá onde for. Você chegou DEPOIS de mim, você já conheceu o William sabendo da minha relação com ele, inclusive eu estava presente no dia que vocês se conheceram, ele nunca escondeu de você a nossa amizade, então você não tem o DIREITO de tentar mudar algo que já existia MUITO antes de você brotar na vida dele. Espero que tenha ficado claro.

Heloísa se levantou da mesa, empurrando a cadeira com força. Virou as costas e saiu de perto. William nunca tomou conhecimento dessa discussão. Não através de Fátima. Mas desde esse dia, a relação das duas se tornou completamente complicada e cheia de cerimônia. Fátima abafou seus pensamentos em Heloísa e lembranças desse diálogo desprezível. Voltou a se concentrar em seu aniversário. Olhou pra William, que se aproximou da mesa e deu a volta em direção a Fátima, a fim de cumprimentá-la. Ela se levantou. Abraçou-o com força.

                - Parabéns, amor! – ele cochichou no ouvido dela, sem que ninguém ouvisse.

Fátima sorriu.

                - Obrigada! Ai, que bom que você veio!

Ele se desvencilhou dela e deu um passo para o lado. Heloísa olhou seriamente pra Fátima, que retribuiu o olhar.

                - Oi, Heloísa... Obrigada por ter vindo.

Ela assentiu com a cabeça, sem dizer uma palavra e esboçar um único sorriso. Os dois caminharam até a cadeira mais próxima. Heloísa se sentou e William cumprimentou o resto dos convidados, todos os colegas de trabalho de Fátima e conhecidos por ele. Ele retornou para a cadeira, ao lado da namorada e segurou a mão dela. Ambos estavam sérios, levemente desconfortáveis. Fátima observava discretamente. Notou que ela fiscalizava o olhar de William o tempo todo. Quando notava que alguma mulher da mesa olhava pra ele, ela se remexia na cadeira e repousava a mão no ombro dele, como se quisesse demarcar território. “Mas é muito psicopata essa garota!”, Fátima pensou consigo mesma. Ela sufocava William, ao lado dela, ele não era a mesma pessoa, engraçado, brincalhão e articulado como ele sempre foi. Mas ela preferiu nem pensar muito nisso naquela hora, para não estragar seu dia tão especial. Afinal de contas, nem faria diferença mesmo. Apenas William poderia tomar as rédeas de sua vida e contornar essa situação. Como melhor amiga, restava a ela apoiá-lo em toda e qualquer circunstância. E era isso que ela SEMPRE faria.

***

                A noite transcorria tranquilamente. Fátima ganhou uma garrafa de champagne com uma velinha presa no gargalo. Recebeu um coro de “parabéns pra você” de toda a mesa. Estava se divertindo muito. Já passavam das duas da manhã. Sentada ao lado de Fátima, estava uma colega de redação. Ela segurou a mão de Fátima para reparar melhor no anel.

                - Amiga, que anel lindo! Onde você comprou? – ela questionou.

                - Ah! Eu ganhei! – ela sorriu.

Heloísa imediatamente encarou as duas, prestando atenção no que elas falavam.

                - Mesmo? Ganhou de quem?

                - Do William!

                - Puxa, que incrível! É o símbolo do infinito?

                - Sim! Lindo, né? – Fátima sorriu, simpaticamente.

O clima descontraído foi interrompido por Heloísa, se levantando da cadeira em um rompante. Ela encarou Fátima, com os olhos em chamas. Pegou a própria bolsa, virou as costas e caminhou em direção a saída do restaurante. William olhou pra ela, sem entender nada. Levantou-se rapidamente e foi atrás dela. Fátima apoiou a testa com as pontas dos dedos e fechou os olhos. Constatou que acabara de fazer uma besteira. Muito provavelmente, Heloísa não sabia do presente e ela havia acabado de entregar. Mesmo que tenha sido inocentemente, se arrependeu imediatamente. Sentiu vontade de ir atrás deles pra tentar consertar a besteira, mas nem tentaria. Ficaria muito pior, causaria ainda mais confusão. Torceu de verdade para que William conseguisse contornar e ficasse tudo bem. Todos da mesa questionaram: - “O que aconteceu?”, - “Porque ela levantou de repente?”, mas Fátima tentou entrar em outro assunto para tirar o foco do chilique de Heloísa. Levemente angustiada, tentou pensar em outras coisas e se concentrar nas tantas pessoas queridas que estavam ao seu redor.

***

                - Helô, espera! – William descia as escadas do restaurante, em direção ao estacionamento, às pressas. Ela parou, de costas pra ele. – O que foi isso? Você enlouqueceu? – ele questionou.

Ela se virou de frente pra ele. O rosto encharcado de lágrimas.

                - Enlouqueci, William. Eu enlouqueci no dia em que decidi tentar novamente dar continuidade a nossa história, que acabou faz tempo. Aliás, eu acho que ela nunca nem começou de verdade.

                - O quê? O que foi dessa vez?

                - O QUE FOI, WILLIAM? – ela berrava. – QUANDO VOCÊ PRETENDIA ME CONTAR SOBRE ESSA PORCARIA DESSE ANEL QUE VOCÊ DEU PRA ESSA GAROTA?

William fechou os olhos e colocou a mão na cabeça.

                - Heloísa...

                - CALA A BOCA, NÃO QUERO OUVIR! Você não ia me contar né? Eu ia ficar igual a uma TROUXA, sendo a última a saber de tudo!

                - Heloísa, não é nada disso. Eu não escondo de você as coisas que você verdadeiramente precisa saber, que dizem respeito ao nosso relacionamento...

                - Ah, isso não diz respeito a nós? Tem certeza, William? Você dá uma jóia pra ela e esconde de mim, você provavelmente se encontrou com ela ou foi até a casa dela entregar esse presente e NÃO ME CONTOU! Você acha que eu não mereço saber disso?

                - E COMO VOCÊ QUER QUE EU SEJA SINCERO COM VOCÊ? Olha como você reage! Você está histérica, berrando comigo no meio da rua!

                - PORQUE EU SOUBE DA BOCA DOS OUTROS E NÃO DA SUA, WILLIAM!

Ele abaixou a cabeça e esfregou os dedos pelos cabelos. Ficou em silêncio por alguns segundos.

                - Heloísa... Eu não agüento mais... Minha vida está um inferno com você! Eu já desisti de achar que, algum dia, você vai conseguir controlar esse seu ciúme desmedido. Você não vai, Heloísa. Você É assim. Nós nunca teremos paz, eu vou ter que pisar em ovos com você pro resto da vida, porque isso está em você. Infelizmente...

Ela soltou um soluço.

                - A culpa não é só minha, William.

                - É. A culpa é só sua. Eu NUNCA, nenhuma vez, fiz NADA pra te provocar alguma desconfiança sobre a minha fidelidade. Você procura motivos pra brigarmos, você simplesmente transforma uma coisa boba em uma catástrofe mundial. Hoje nós viemos pra cá brigando dentro do carro porque você não queria vir pro aniversário da Fátima e não queria que eu viesse também. Porra, Heloísa, ela é a minha melhor amiga. Você tentar me afastar de QUALQUER mulher desse mundo, por mim tanto faz. Mas tentar me afastar dela, eu não admito. Não mesmo, nunca admiti e nem vou. Porque eu preciso ter minha vida, minhas escolhas e minha individualidade. O que eu sempre quis de você era um mínimo de confiança, confiança essa que você nunca depositou em mim. Como você acha que podemos dar certo?

                - William, o seu problema é que não ENXERGA que os anos se passaram. Assim como você não admite que eu te obrigue a se afastar dela, EU NÃO ADMITO que o MEU namorado passe a madrugada inteira trancado sozinho dentro de um apartamento com uma mulher. William, vocês não são mais duas crianças que tomam banho juntos. Vocês são UM HOMEM E UMA MULHER, adultos. Ela não é mais aquela garotinha descabelada, toda cheia de hematomas na canelas e cotovelos, chutando bola na rua com você, como você sempre mostra nas fotos da infância de vocês. Ela cresceu, William. Ela é uma mulher linda, é só parar um pouco pra observar a quantidade de macho que baba em cima dela. Isso faz com que eu me sinta CONSTANTEMENTE ameaçada por ela, porque eu tenho certeza que... – ela respira fundo, tentando conter o choro. - ... que se você tivesse que escolher entre mim e ela, você escolheria ela. Como você está fazendo agora, indiretamente. Eu estou errada, William?

Ele abaixou e sacudiu a cabeça, confuso. Não conseguiu responder, ficou calado sem conseguir olhar pra Heloísa. Ela sorriu, melancolicamente.

                - Não precisa dizer nada, você já respondeu. Sabe o que eu acho, William? Vocês foram feitos um para o outro. – William olhou com os olhos arregalados para ela, incrédulo – É isso mesmo que você ouviu. Você pode ter quantos relacionamentos você quiser, não há mulher nenhuma no mundo disposta a suportar essa concorrência. É uma guerra perdida. Por isso que não há mulher mais perfeita pra você do que ela. Eu sempre tentei mostrar pra você que ELA era um empecilho pra você viver a sua história com o amor de sua vida, que eu achava que era eu. Mas eu estava equivocada. O amor da sua vida é ela, William. Sempre foi. É a Fátima que você ama. Você é que nunca percebeu. – Heloísa virou as costas. Entrou no primeiro táxi que, imediatamente, estacionou na frente dela.

William ficou ali, plantado por alguns segundos. Não conseguia digerir nada do que acabara de ouvir. Ele seguiu até o próprio carro. Sentou-se no banco, recostou a cabeça pra trás. Sentia as mãos tremerem, mas não teve vontade de chorar. Tristeza não era exatamente o que ele sentia. Se sentia anestesiado, meio estupefato. Respirou fundo, ligou o carro e dirigiu até em casa, sem pensar em nada, completamente avesso a tudo que acabara de acontecer.