Fanfic: Virgem por acaso [Terminada]

Terça-feira à noite

A transformação mental de Annie — de nunca pensar em sexo para só pensar naquilo — foi sísmica (embora, para ser precisa, sua mente estivesse com mais fixação na busca do sexo do que no ato em si). Seu placar até agora: 0 x 2. Primeiro, uma rejeição total de Marcos, e depois o despencar fulminante das mercadorias flutuantes de Jonatas (seu espírito estava querendo, mas a carne estava mole). Nunca em sua vida ela tinha trabalhado tão duro por tão pouca ação. Como mulher, Annie estava pré-programada para se culpar quando qualquer coisa desse errado (conscientemente ou não). Ela tinha de pensar: Sou eu? É esse o meu destino? Certamente, em algum momento no futuro, ela faria sexo de novo. Não conseguia imaginar passar mais 50 anos intocada. Mas a possibilidade era real: ela podia ficar solteira pelo próximo período de uma década. Poderia dar seminários para o Learning Annex intitulados "Abrace seu ego sem sexo já que ninguém mais faz isso". Ou "Técnicas de masturbação avançadas para os deficientes sexuais". Ou mesmo "Solteira e sem filhos: maldita ou cuidadosa?" Não é necessário dizer que Annie estava imprestável à tarde, na reunião da calcinhas.com. Assim que entrou na sala de reuniões para se juntar às outras e sentar-se à grande mesa em forma de tartaruga, Janice começou com as perguntas. Ela tinha de saber tudo o que tinha acontecido no almoço com o seu precioso e querido garoto. Annie tentou adivinhar se mãe e filho tinham um relacionamento saudável.

— Comemos sushi e depois caminhamos um pouco — disse ela, safa.

— Aonde vocês foram? — perguntou Janice.

 — Ali pelo Midtown.

— Pararam em algum lugar?

— Só andamos.

— Está fazendo uns quarenta graus do lado de fora — disse Janice.

Annie assentiu.

— Estávamos quentes. — Não, isso não. — Estávamos esquentando. — Ai, meu Deus. — Entramos e saímos das lojas por causa do ar-condicionado.

— Então você fez algumas compras — disse Janice, um tanto excitada demais.

Annie lembrou-se, com uma pancada de cilindros em seu cérebro, que o aniversário de Janice estava chegando. Um grande aniversário. Aquilo seria enorme.

Sorrindo com malícia, Annie disse:

— Não deveria dizer mais nada. Não quero estragar a surpresa.

Se Jonatas esquecesse o aniversário de 50 anos de sua mãe na sexta-feira, agora ele estava na cabeça de Annie. Ela digitou um lembrete em seu pad para ligar para o hotel mais tarde e deixar um recado para Jonatas. À sua direita, no fim do rabo da tartaruga, Maite Perroni espiava o lembrete de Annie para si mesma. Em seu próprio pad, Maite escreveu: "Você não perdeu nada."

Annie esperava que Maite estivesse se referindo à porção de hora de almoço da reunião da equipe, e não a seu encontro frustrado com Jonatas.

Fiona ficou de pé na cabeceira da Tartaruga.

— Vamos voltar às idéias de como chamar a linha de rede arrastão. Eu gosto de Coleção Arrastão 2009. Alguém mais?

Silêncio a princípio, como sempre. Rabiscos furiosos de canetas no papel. E aí, a meia dúzia de mulheres no aposento começou a gritar sugestões.

— Arrastão mágico.

— Jogando a rede.

— Vou pescar você.

— Um novo look.

— Arrastão monstro.

— Buraco da rede.

— Annie? — Fiona perguntou impaciente. — Não escutei você falar.

— Que tal... — Annie começou, tentando fazer sua atenção voltar para o assunto em questão. — Que tal: Em que rede você me pegou?

Risinhos nervosos em torno do aposento, ecoando nas paredes. Lá ia ela de novo, as palavras saindo de sua boca antes que seu editor interior pudesse interrompê-la. Ela contraiu-se na cadeira de couro. O capacete negro dos cabelos de Fiona parecia se expandir de fúria. Seria possível que Annie estivesse propositadamente deixando sua chefe furiosa? imaginou. Era como um lobo numa armadilha, mordendo sua própria pata para salvar sua alma, sua vida?

— Será Coleção Arrastão 2009 — disse Janice, tentando cortar o pavio que queimava da bomba de Fiona. — Por que continuar, se já temos um vencedor? Vamos partir para design e produção. Senhoras? Idéias?

A equipe de design tinha uma lista para apresentar. Enquanto o chefe do departamento tagarelava sobre tecido metálicos, Maite, que não tinha nada a ver com quaisquer assuntos de produção, rabiscava animadamente em seu bloco. Annie estava impressionada com a rapidez com que escrevia. Aí Maite empurrou o bloco na direção de Annie. "Em que rede estamos todas presas", dizia o bilhete. "Tenho pensado em minhas opções, pessoais e de trabalho. Deveríamos sair juntas logo, para conversar. Gosto do jeito que você pensa. Gosto de você também."

Annie engoliu em seco, colocou uma marca sobre a palavra "logo" e retornou o bloco para Maite. Annie ousou olhar para sua colega que estava de frente única, sem sutiã. Maite estava sorrindo timidamente, fazendo círculos na marca de Annie várias vezes, até que a tinta fizesse uma grossa mancha no bloco. Certo, pensou Annie, aqui estava uma nova informação para ser processada. Maite teria declarado guerra a todos os homens porque preferia mulheres? Seria ela uma Nova Lésbica? Mais importante, uma diversão mulher-com-mulher (não que ela já tivesse feito aquilo, ou querido aquilo — mas não estava em condições de ser exigente com idade, qualidade, estabilidade ou gênero de seus namoros) iria se qualificar como um evento desrevirginizante?

— Annie — gritou Fiona. — Lista de preços!

Tateando em busca de sua lista impressa de propostas de preços, Annie sentiu as orelhas queimarem. A temperatura delas não voltou ao normal durante boa parte daquela hora. A reunião continuou, sustentando sua tensão aguçada pelo resto da tarde. Nada mais foi resolvido, a não ser a brutal distribuição de tarefas.

Enquanto Annie andava com moleza (essa palavra, não) de volta para o seu escritório, contou 37 itens em sua lista de afazeres, do lugar-comum (negociar com importadores, contratar modelos) ao criativo (inventar nomes sensuais para cada camisola, baby-doll, meia-taça e corpete da nova linha). Provavelmente, na criação, ela se prenderia à lista preferida de vocabulários de Fiona, incluindo palavras como Encantadora, Caçadora, Indecente e Selvagem.