Fanfic: Virgem por acaso [Terminada]

Quarta-feira, de madrugada

Os braços estendidos de losie e as Gatinhas no relógio de Anahí Portillo mostravam 3 da manhã. Seus pensamentos pulavam dos eventos sangrentos dos últimos dois dias para a lascívia. (Annie sentada sozinha numa enorme mesa de reuniões em forma de tartaruga, no meio de uma sala mal-iluminada. Subitamente, feixes de luz vindos de cima revelavam homens nus em gaiolas cercando a mesa. De alguma forma, Annie sabia que os homens aprisionados estavam trancados lá dentro há quase um ano — com alimentos, água, exercícios, mas privados de contato físico de qualquer tipo enquanto eram forçados a assistir a pornografia dez horas por dia. Annie era a primeira mulher de carne e osso que qualquer desses doze clones de Tony McGuinty tinha visto durante meses. Eles estavam praticamente espumando por cada orifício apenas com a visão dela num conjunto de renda branca de tanga e camisola. Com o ruído de portas de metais, as gaiolas se abriam. Os homens emergiam e corriam para Annie, um olhar de fome depravada em suas expressões, ereções gigantescas em suas mãos.) A destruição das horas de sono de Annie continuou. A masturbação não era tão sonífera quanto teria gostado. Annie se lembrou de ter lido uma vez que a pior coisa da insônia era ficar olhando o relógio enquanto os minutos da sua vida tiquetaqueavam, sem utilidade. Com aquela tortura aguda, Annie sentou-se na cama e jogou para longe as cobertas. Ela vagou até a sala de estar e ligou o computador. Podia checar os e-mails. Ela se conectou. Uau, pensou, quando viu que Gigi da swerve.com tinha respondido. Após os dois últimos dias, Annie receberia bem a absolvição da mulher que, sem saber, tinha iniciado Annie nessa busca. Ela abriu o e-mail e leu.

“Querida Anahí. Obrigada por me oferecer o trabalho, mas tenho contrato com a swerve e não posso escrever conteúdo de natureza sexual para qualquer outra mídia eletrônica. Mas se você tiver contatos na mídia impressa, estou tentando vender a proposta de um livro e apreciaria qualquer ajuda ou indicação. Obrigada."

“É isso?”, pensou Annie. Ela correu a tela para ver se havia algum anexo ou adendo ou pós-escrito. Nada. Que frustração inexorável. Annie se aberto ali e não recebera nada de Gigi em troca (o mesmo tratamento que vinha tendo de sua crescente lista de encontros desastrosos). Annie olhou os outros e-mails. Ucker tinha mandado um e-mail em branco, com o link para um endereço na swerve.com. Annie clicou no link. Um artigo apareceu em sua tela, por Gigi XXX. Este era chamado "Piedade para o celibato acidental". Seu coração se apertou. Ela leu o texto, com a mão no peito. Ele começava:

"Celibato intencional, como foi explicado a mim pelas mulheres que já chamei de `amigas`, é um objetivo orientado. O objetivo por si só vale a pena (autoconhecimento). Questionei, numa coluna anterior, se o fato de evitar sexo vai ensinar a você qualquer coisa que já não saiba. Recebi uma avalanche de respostas da sempre-em-expansão frota de leitores assexuados-por-escolha-própria. Noventa e nove por cento acreditam que estou falando merda e disseram mais do que isso em suas cartas. "Pelo menos estou fazendo algo inventivo com minha bunda (várias coisas, na verdade — observe o espaço para cobertura dolorosa e detalhada sobre sexo anal). De onde estou sentada, uma coluna que incita pessoas a atribuírem poderes super-humanos ao meu reto merece um Pulitzer. Convido cada leitor que me mandou um e-mail revoltado a vir a nossos escritórios em Nova York, ficar de joelhos e contemplar minha bunda miraculosamente falante. Eu posso fazer uns vídeos e colocá-los na swerve.com para que todos possam apreciar a maravilhosa façanha.

"Um e-mail, entretanto, não era raivoso. Buscando clareza, a leitora queria saber se ficar por acaso um ano sem sexo tornava o celibato menos merecedor de escárnio. Acho que ela acordou um dia e se deu conta de que não tinha estado nua com um homem há bastante tempo, e queria que eu dissesse a ela que estava tudo bem, como se eu fosse algum tipo de alta sacerdotisa do sexo com poderes mágicos (bem, eu tenho o tal ânus falante...). Tenho a impressão de que essa mulher é uma fóbica social viciada em trabalho sem muitos amigos e pessoas amadas com quem possa discutir as deficiências e desapontamentos de sua vida."

Apesar da bofetada escaldante, Annie se forçou a continuar a ler.

"Para esta mulher", escreveu Gigi, "e todas as outras que deixaram o sexo escapar da paisagem árida de suas vidas, cuja existência é sem paixão — e tem sido há tanto tempo que elas nem podem lembrar por que a paixão já significou alguma coisa para elas um dia —, eu tenho um recado. Vou digitá-lo em letras maiúsculas agora (o que odeio fazer, mas parece garantido): NÃO EXISTEM ACASOS. Somos todos responsáveis pelo que acontece (ou não acontece) a nós. Se esta mulher ligasse para luxúria e paixão e — certo, vou chegar lá — amor, ela teria pelo menos tentado transar. (Que se registre, aquelas que tentaram ativamente fizeram esforços realmente femininos para conseguir um encaixe e não conseguiram... pensando bem, até as mulheres mais horrivelmente sem atrativos podem encontrar alguém que as coma. Exigência é uma forma racionalizada de evitar.) "Vamos dizer que esta mulher realmente ligue para paixão, mas que tenha suprimido a compulsão a se unir a outra pessoa (não importa se por uma noite, uma semana ou a vida inteira). Então ela está bem pior do que minhas amigas de outrora, que estão dispensando de propósito a melhor coisa da vida pela besteira do que elas chamam `autoconsciência`.

Elas chamam `autoconsciência`. Esta mulher, esta triste e perversa iludida, divorciou sua vida tanto do pau quanto da consciência (pau e consciência, gosto disso; pode ser um bom título para uma paródia de romance de Jane Austen). A nova virgem por-acaso-de-propósito devia procurar ajuda. Ajuda profissional. Ela não devia ter se voltado para mim. Não tenho paciência para pessoas que têm medo de suas emoções, que têm uma aversão patológica ao risco. Sou uma romântica incurável. Acredito que a vida não vale a pena ser vivida se você não está amando ou tentando encontrar o amor. Além do mais, sou uma viciada em sexo clinicamente diagnosticada. Também sou uma piranha."

Nunca, em toda a sua vida, pensou Annie, enquanto lia as últimas palavras do assassinato de caráter de Gigi, ela tinha sido dada como alimento aos cães daquela forma. Annie era uma pessoa doce. Ela não merecia ser destruída por uma mulher a quem ela oferecera emprego (um emprego que não existia, mas Gigi não podia saber aquilo). Questionar toda a existência de Annie porque ela tinha tido um ano ocupado?

Insulto! Injúria! Ousadia! Mijona! Era fácil para Gigi ser cruel com Annie, usando um pseudônimo e uma foto que não mostrava o seu rosto. Annie prometeu que jamais leria qualquer outra palavra digitada no teclado daquela escritora pusilânime. Annie pegou o e-mail que recebeu de Gigi e atirou de volta uma resposta.

"Querida Gigi, recebi seu e-mail. Uma pena suas restrições de free-lancer. Eu realmente tenho dúzias e dúzias de contatos em editoras. Mas é arriscado dar nossos nomes e telefones para escritores desconhecidos que ainda não publicaram nada. Tenho certeza que você vai entender. Tudo de bom para você em sua iniciativa, Annie."

Depois de apertar o botão ENVIAR AGORA e rir baixinho, Annie se vestiu. Em seu acesso de fúria, jamais seria capaz de dormir agora. Vestiu calças de ciclista, uma blusa furada cor de lavanda e suas mules rosa.

Ela adorava aquelas mules com uma rosa no topo. E elas iam carregá-la para fora dessa câmara de tormento e para a cidade à noite. Ela estava com fome. A afronta tinha lhe dado apetite.