Fanfic: Virgem por acaso [Terminada]

Quarta-feira, fim da tarde

Na hora em que Annie voltou ao trabalho, já estava atrasada para uma RMI (Reunião Muito Importante) sobre a qual não sabia nada. Aparentemente, tinham mandado um memorando urgente por e-mail. Ela descobriu quando viu Janice em seu pequeno (e agora sufocante) escritório, escrevendo um bilhete furioso em letras maiúsculas com tinta vermelha ("ONDE VOCÊ ESTÁ, PORRA..."). Um bilhete mais apropriado para Annie teria sido: "Onde está a porra?"

— Não sei como não recebi esse e-mail — disse Annie.

 — Se eu tivesse tirado duas horas de almoço no meio da semana de trabalho mais crucial na história da empresa — disse Janice —, eu também não o teria recebido.

— Tive de levar Maite para casa. Ela ficou cheia de câimbras durante o almoço. Nunca vi ninguém sofrer tanto de paralisia. Tive de carregá-la, os braços dela sobre os meus ombros enquanto eu arrastava seu corpo pesado nas costas. Estou exausta. Mas realmente sinto um pouco de orgulho por ajudar uma amiga em necessidade.

— Você será uma amiga em necessidade de emprego se não estiver na Tartaruga em trinta segundos — ameaçou Janice enquanto bufava na direção da sala de reuniões.

Isso deve ser sério, pensou Annie. Janice não fazia o tipo chicoteadora. Aquela era a ocupação favorita de Fiona (junto com botox e injeções de colágeno). Annie entornou o conteúdo da sua bolsa, agarrou o bloco de notas e andou em passos rápidos para a sala de reuniões. Quando entrou na sala grande (e também sufocante), o olhar de Fiona atingiu-a como um bastão de beisebol. Evitando aqueles olhos, ela murmurou umas desculpas e sentou-se.

— Espero que não tenha sido muito inconveniente para você aparecer, Annie — disse Fiona com acidez. Ela estava a perfeita mulher perversa hoje, com um vestido de couro preto. Em julho. Fiona sempre se gabava de que nunca sentia calor (tinha passado suas cinco vidas anteriores no inferno, pensou Annie). — Você conhece Christian, certo? — Fiona fez um gesto na direção do homem na cabeça da Tartaruga.

Annie realmente já conhecia Christian Chavéz. Eles tinham se encontrado muitos meses atrás numa festa em Silicon Alley para a empresa dele, a sacana.com, um site interativo de pornografia (antigamente, Christian era executivo da New York Giants). Ele tinha 30 anos, era alto. Cheirava a Old Spice e novos milhões. Na festa da sacana.com, Chrsitian tinha feito um pequeno discurso sobre comédias e tragédias pontocom. Ele predissera que os únicos websites a sobreviverem à primeira era do gelo online seriam os i-dinossauros (AOL, Amazon, Yahoo!) ou URLs com peitos. E provavelmente estava certo. Quando fora apresentado a Annie por Fiona (que fizera uma representação sem-vergonha para ele, declarando em voz alta para dúzias de pessoas ouvirem que ela tinha "aparecido num filme para maiores, dez anos atrás, quando tinha vinte e tantos anos" — uma afirmação que levantava muitas sobrancelhas, principalmente porque poucos acreditavam que dez anos atrás ela tivesse trinta e poucos anos), Christian olhara de perto para Annie e dissera:

 — Só há uma maneira de dizer se você é realmente loira.

— Perguntar à minha colorista? — disse Annie, tentando evitar comentários grosseiros sobre colarinho e punhos. Felizmente, ele se distraiu com um capitalista do Crédit Suisse e ignorou-a pelo resto da noite.

Ele não a tinha esquecido, entretanto. Durante os dias seguintes, Christian a tinha inundado com telefonemas e e-mails. Ela se convencera de que já era tempo de estabelecer alguma comunicação.

Christian estava conectado (no sentido italiano, já que ela tinha ouvido sussurros), mas certamente com hordas de presidentes de Internet. Ela concordara em encontrá-lo para um café. Nos primeiros 15 ou 16 minutos juntos, ele tinha feito monólogos de autocongratulação olhando para os peitos dela, com frases tipo "E, comecei meu primeiro negócio em meu quarto no dormitório da universidade em Harvard, quando eu tinha vinte anos, vendendo fotos de estudantes da graduação nuas. Uma ou duas noites comigo, e essas estudantes gostosas

— muito gostosas, as mulheres mais sensuais de Harvard e, acredite em mim, mulheres sensuais do tipo gostosona em Harvard eram difíceis de encontrar onde estava eu? Ah, sim, essas mulheres fariam qualquer coisa que eu quisesse. Posar nuas, assinar um contrato de modelo. Concordar em me pagar um boquete na estátua de John Harvard no meio da Harvard Square".

— Parece uma experiência rica e recompensadora, Christian — disse Annie.

— Ganhei rios de dinheiro — disse ele, assentindo. — O bonito era que aquelas garotas eram de verdade. Meus fregueses podiam vê-las andando pelo campus. Em Harvard. Isso é um material de masturbação muito melhor do que a Penthouse para um bando de caras tarados que não conseguiam um traseiro nem numa granja de coelhos. Eles eram nerds, mas inteligentes, meus colegas de classe. Fui desafiado intelectualmente em Harvard, e preciso daquele tipo de estímulo. Estímulo sexual. O tempo todo. Como agora. Olhando para você. Eu adoraria colocar a mão embaixo de sua saia e...

— Em que escola você estudou mesmo? — perguntou ela. Quatro meses mais tarde, Annie tinha relutantemente incluído Christia em sua lista A Fazer de candidatos para a Semana de Emergência de Sexo. E aqui aparecia ele, como num passe de mágica, na cabeça da Tartaruga. Seria o destino?, perguntou-se.

— Bom ver você, Christian — disse ela, sorrindo calorosamente.

— Ótimo ver você também — disse ele para os peitos dela.

Fiona deu início à reunião e o grupo de doze produtoras, gerentes de produto e vendedoras viraram seus óculos de hastes de ossos e cortes de cabelo assimétricos para Fiona.

— Agenda: finalizar o período — disse ela. — A cal-cinhas.com e a sacana.com estão formando uma parceria de mercado. Vamos fornecer lingerie ilimitada para as modelos de Christian e links para o site dele. Em troca, ele vai nos dar banners gratuitos, um clique de publicidade em cada menu, uma chamada na página principal e um item com descrições dos produtos do dia nas páginas.

— Vamos para a cama com um site pornográfico? — perguntou Annie, chocada (esta informação estava no memorando?). Um site "erótico intelectual", certamente. Um site de encontros, ainda melhor. Mas uma URL que sem a menor vergonha se chamava de "o melhor material para masturbação da web"? Certamente sua parceria era contraproducente. A calcinhas.com vinha empurrando a carroça do mercado de massa desde o início. A idéia era diferenciá-la dos varejistas de lingerie de luxo na Internet. Unir a calcinhas.com com um site pornô iria fazer sua carroça adernar mercado abaixo, montanha abaixo, privada abaixo.

— Digo isso com o mais profundo respeito pela capacidade da empresa de Christian — disse Annie —, mas a sacana.com não é meio obscena?

— Já recebi e dispensei sua preocupação — disse Fiona. — Podemos ter classe e não sermos caras ao mesmo tempo. Isso não é difícil de conseguir. Olhem para mim. — O aposento cheio de pessoas olhou para suas unhas. — Nossa queima de capital é de duzentos mil dólares por mês. Precisamos de mais tráfego. A sacana.com tem cinco milhões de entradas por dia. Deveríamos agradecer a Christian por nos escolher para sermos um de seus parceiros. E ele generosamente se ofereceu para nos dar uma janela de marca, bem como um empréstimo, em troca de um milhão de ações da empresa a quatro dólares por lote. — O atual preço das ações era de 7 dólares por lote (o maior preço em 52 semanas tinha sido 67).

O empréstimo parecia uma barganha de loucos, mesmo para os ouvidos insensíveis de Annie. A calcinhas.com estava tão desesperada por dinheiro? Aquela tinha de ser uma oferta que Fiona não poderia recusar. Annie podia ver suas racionalizações acontecendo. A calcinhas.com estaria em boa companhia. Christian já tinha negócios de parcerias cruzadas com pelo menos 20 websites, incluindo um arranjo de um milhão de dólares com a AOL (palavra chave: "sacana"), uma janela promocional automática quando qualquer pessoa comprava "literatura para adultos" na Amazon e outra tela instantânea quando qualquer homem (de 18 a 70 anos) se registrava nas compras do Yahoo. Uma parceria com o "toque pessoal" do rei da Internet pornô podia trazer mais tráfego. Mas quanto as babacas adolescentes gastariam em calcinhas? Além do que, a idéia de uma logomarca da calcinhas.com enfeitando as mal cobertas bundas de modelos que se deitavam em sofás-cama e se masturbavam em ritmo de disco por um dólar por minuto era embaraçoso. Apenas uma razão a mais para sair deste trabalho. Que venha janeiro, eu pego o dinheiro e fujo para as montanhas, prometeu Annie.