Fanfic: Virgem por acaso [Terminada]

Quarta-feira à noite

O coq au vin estava delicioso. Como entrada ela pediu a terrine e, como sobremesa, um suflê. Como parte desse arranjo elaborado, Christian tinha deixado o boleto impresso de seu cartão de crédito com o maitre d`. Um homem adorável, muito tipo vovô. Ele não viu mal algum em deixar Annie assinar seu nome na ausência de Christian.

Saciada e um pouco zonza, Annie pegou um táxi para casa. Foi quando o beliscão de ansiedade começou e se transformou num soco na hora em que chegou ao SoHo. E se humilhar e insultar Christian colocasse um empecilho em seus planos para a calcinhas.com?

A idéia parecia absurda. Ninguém tomava decisões de um milhão de dólares por conta do sucesso de um jantar romântico. Christian tinha um plano de negócios e não se incomodaria com a calcinhas.com a menos que houvesse um potencial de lucro. Não seria possível que ele tivesse feito o contrato de parceria apenas como desculpa para ver Annie novamente. Ela tinha uma auto-imagem saudável, mas tinha certeza que ninguém arriscaria toda aquela grana por um encontro com ela. Por outro lado, Christian realmente parecia estar alimentando uma obsessão. Valeria quatro milhões de dólares (a quantidade de ações que ele estava para comprar) ouvir Annie murmurar as palavras "raiz máscula"? Quanto mais ela pensava em Christian, mais estranho ele parecia. As pessoas realmente faziam roteiros em suas cabeças, escrevendo diálogos de fantasias, dando a si mesmas as melhores falas. Mas ninguém (saudável) iria digitar as palavras e esperar que o ser consciente do outro lado da mesa as lesse (pelo menos, não de graça, não num segundo encontro). E mais, agora que a peça de um ato "Meu encontro com Anahí" tinha encerrado sua noite de estréia, Christian ficaria inspirado para escrever uma seqüência chamada "A noite em que torturei e assassinei Anahí?". Aquele roteiro incluiria Annie implorando por sua vida (ao longo de frases de "Eu sou inútil, patética e incapaz, mas ainda anseio para ver a luz de outro dia, especialmente se me deixarem lustrar seu tronco duro de manhã, à tarde e à noite")? Christian disse que era apenas um jogo. Até que ponto um jogo perigoso?, perguntou-se ela.

Para se distrair, Annie tirou seu Palm III e deletou o nome de Christian da sua lista A Fazer. A lista ficava cada vez mais anêmica com o passar do dia. Ela precisava de um novo estoque de candidatos. O táxi a deixou bem do lado de fora do seu prédio. Annie conseguiu relaxar quando estava a salvo entre as portas duplas da frente. Enquanto esperava o elevador, pensou no rosto manchado e confuso, logo antes dele ter fugido dela.

A imagem a fez ficar exausta. A noite sem dormir estava acabando com ela. A exaustão pesava em seus ombros como um manto de ferro. Mal conseguia ficar de pé para esperar as portas do elevador se abrirem. Finalmente, elas se escancararam. Lá dentro, o Garoto Vampiro, a criatura de cabelos-de-corvo da noite do 4C, estava com as mãos nos bolsos dos seus jeans pretos. Ele a viu e franziu a sobrancelha. Ela ficou sem se mexer, encarando também. Eles olharam um para o outro, silenciosos e imóveis. Eles deviam ter ficado assim — Annie do lado de fora do elevador; o Garoto Vampiro dentro — por alguns momentos, porque as portas automáticas do elevador se fecharam e, fazendo isso, quebraram o encanto. Annie inclinou-se para trás, ficando contra a parede do saguão. Ela rapidamente tirou seu pó compacto e refez a maquiagem. Ela viu o B sobre o elevador se acender e soube que o elevador tinha ido para o subsolo. O Garoto Vampiro tinha obviamente tido a intenção de sair no saguão. Ele voltaria para lá num segundo. Ela preparou um sorriso caloroso, endireitou sua blusa manchada e esperou. Mas quando as portas do elevador se abriram, ele estava vazio. Enquanto ia para o quarto andar, Annie respirou fundo algumas vezes. Como ele a tinha prendido em seus olhos daquele jeito?, pensou. E onde ele tinha ido? Teria se transfigurado num morcego e voado? O Garoto Vampiro tinha poderes inegáveis e tangíveis. Em seu andar, Annie passou pelo apartamento 4C — a caverna do Garoto Vampiro — e imaginou o que ele fazia lá durante o dia. Ficava escondido no escuro ou dormia num caixão? Talvez ela devesse deixar um bilhete. Apenas um pequeno convite para aparecer para alguma chupação de sangue casual, sem amarração-de-cordas. Ela se livraria do seu problema (e se tornaria imortal, para fechar).

Ela pescou dentro da sua bolsa o bloco de notas cor-de-rosa. E rabiscou:

Sou a loira do 4A. Acabamos de nos encarar por um instante que durou a vida inteira no saguão. Se quiser me encontrar, retome esse bilhete marcando um encontro, com horário e local. Ou apenas dê uma passada Annie. Ela deslizou a folha sob a porta dele.