Fanfic: Virgem por acaso [Terminada]

Sábado à noite — ainda

Assim que ela alcançou a calçada lá fora, uma gigantesca limusine — tão negra quanto o humor de Annie — estacionou na beira da calçada do SoHo Grand Hotel. Vários passantes pararam para olhar. Annie juntou-se a eles. Sua noite estava arruinada, mas se pudesse dar uma olhada em, digamos, Madonna, se sentiria um pouquinho melhor. A porta se abriu. A perna de uma mulher apareceu. Era uma perna e tanto, longa, musculosa, cintilando em meias pretas finas. Uma perna glamourosa. Pertencente a alguém famoso e bonito. A multidão se acotovelou perto da limusine. A segunda perna surgiu. Annie tinha certeza de ter reconhecido a ponta daquele salto de couro de grife. Antes que pudesse fugir, o restante do corpo de Fiona Chadornnay emergiu.

— Anahí Portillo! — chamou Fiona. — Achei que tinha visto você aí em pé.

A multidão encarou a mulher fatal de 57 anos, elegante esta noite com um vestido Prada preto, longo, tomara-que-caia, e maravilhosos diamantes. Ela devia ter vindo de um bazar beneficente para estar vestida de maneira tão conservadora, pensou Annie. Seu cérebro gritou "Corra! Corra!". Mas Annie sabia muitíssimo bem que teria de ficar ali e manter uma conversação. A primeira pergunta de Fiona seria "O que está fazendo aqui e por que não está com Jorge?" — uma questão que Annie não tinha humor para responder. Fiona fechou a porta da limusine, andou até sua subalterna e perguntou:

— Como é que eu estou?

Annie poderia falar sobre aquilo facilmente.

— Está radiante, brilhante, de parar o trânsito, de abrir a boca...

— Basta — disse Fiona. — O que está fazendo aqui?

— Vim aqui para pegar um homem, mas ao invés disso fui fodida mentalmente por uma dupla de atores de cinema grosseiros e arrogantes — disse ela. — Já tinha dado errado com outro cara mais cedo hoje à noite, quando fritei minhas sobrancelhas, depois de ter descoberto que Christian Chavéz está usando meu nome e minha aparência na Internet como ajuda masturbatoria para milhões de assinantes cheios de tesão. Não liguei para Jorge porque, não importa o quanto você pense que sou como você, eu simplesmente não poderia conviver comigo mesma se pagasse por sexo. E tem mais, dentro de doze horas serei virgem novamente. Ficarei fresca e inocente como um carneirinho, e pronta para ser abatida.

Fiona olhou para Annie como se ela tivesse vomitado na calçada.

— Eu desagrado você? — perguntou Annie. — Parece que estou fazendo isso com simplesmente todo mundo que encontrei esses dias.

Um homem de fraque preto apareceu ao lado de Fiona. Seu rosto era familiar para Annie, mas ela não tinha certeza de como. Ele tinha cerca de 45 anos, rosto redondo precisando de um barbeador, pele morena, cabelos negros ondulados, óculos ovais empoleirados num nariz tamanho família. Ele colocou seu braço em torno da cintura de Fiona e disse:

— Pronta para entrar?

Fiona disse:

— Anahí Portillo, este é Randy Gestalt.

O nome refrescou sua memória. Randy Gestalt, presidente e dono da Mercury Matrix. Ele tinha aparecido na capa da revista Fast Company alguns meses atrás. Era um dos mais jovens bilionários da América, tendo feito uma enorme fortuna à maneira antiga: comprava empresas falidas por uma merreca, desmontava ou reforçava-as artificialmente e depois as vendia a outras empresas com lucro. Se poderia pensar que vender empresas falidas era uma fórmula para desastres financeiros, mas havia sempre alguma megacorporação (AOL e CBS, por exemplo) que adoraria a chance de absorver uma empresa doente, presumindo que poderiam injetar nova vida com seu sopro mágico.

Com muita freqüência, a pequena empresa morria de morte natural de qualquer maneira. Enquanto isso, a mega-corporação era recompensada pela aquisição com descontos de impostos e boa divulgação (afinal de contas, se não fosse pela megacorporação, a equipe da fracassada.com estaria sem trabalho meses antes). A Mercury Matrix ganhava milhões com uma pontocom morta por vez. O responsável, Randy Gestalt, era adorado pela comunidade da Internet. Ele não era visto como o homem que atacava subitamente como uma águia para ficar com os ossos. Era visto como um cavaleiro branco, o homem que cavalgaria no pôr-do-sol para providenciar uma nova morada para a empresa órfã empobrecida, ou fazer um acordo com bancos e credores para se certificar de que a equipe ficaria desempregada mas com alguma coisa, mesmo se aquilo significasse dez centavos para cada dólar do pagamento devido a eles.

Fiona e Randy juntos podia significar apenas uma coisa.

Annie disse:

— Prazer em conhecê-lo, sr. Gestalt.

 — Igualmente. Fiona? — Ele fez um gesto para ela se apressar, tinham de ir para dentro antes de entrarem em combustão espontânea.

— Vá você, preciso falar com Annie — disse Fiona. Ela o beijou nos lábios, um beijo molhado. Ele não se moveu, não era homem de acatar ordens ou ser dispensado tão rapidamente por uma... bem, o que Fiona era para ele afinal? A chefe de Annie disse:

— Só cinco minutos, por favor, Randy. — Ele deu uma olhada em Annie, perturbado com o fato de que uma garota com a barriga visível (um inseto, uma ralé) pudesse tirar dele a atenção de Fiona.

— Não gosto de entrar sozinho num restaurante e estamos atrasados — disse ele. — Vamos.

Fiona, que não era mulher de acatar ordens de nenhum homem, não importava qual fosse o relacionamento, disse:

— Annie, entre conosco.

Randy pegou o braço de Fiona. Fiona pegou o braço de Annie, e os três entraram no hotel. Graças a Deus passaram direto pelo bar e foram até o restaurante do hotel.