Fanfics Brasil - Capítulo 1 Ventos de Outono

Fanfic: Ventos de Outono


Capítulo: Capítulo 1

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Tudo o que eu viu não parecia nenhuma dúvida há muito tempo. Eu sentava no mesmo balanço, via mesma grama verde que só fica assim quando a época de chuvas chega. A casa simples e suja lá na frente era a mesma desde que eu nasci, há dezenove anos atrás. Uau, eu realmente estou ficando velha.


O balanço onde eu estava era muito especial para mim, lembro-me do meu pai amarrando-o no galho do imenso carvalho que, quando eu nasci já era enorme. Tinha sido meu presente de natal quando eu tinha somente cinco anos, e desde então ele tem sido minha inspiração de todas as noites tristes e angustiadas que tenho passado. Triste sempre foi, eu não tinha amigos muito menos tive um namorado. As pessoas da cidade (que aliás tem apenas três mil habitantes) não eram muito amigáveis. Quanto a escola, foi um terror, os grupos de jovens eram divididos em dois : os caipiras que passariam a vida ali e trabalhariam nos negócios dos pais e os "pseudo-riquinhos" que provavelmente iriam fazer intercâmbio ou estudar fora. Claro que, ambos me odiavam.


Eu era pobre, muito pobre. Nunca passei fome, ainda bem! Mas meus pais sobreviviam pela minúscula carpintaria que abriram na frente de casa, o dinheiro que faturavam era para comprar a janta e o almoço do dia seguinte. Minha mãe, pobrezinha, cuidava da casa e passava a maior parte do tempo preocupada com a minha irmã, Júlia.


Júlia tinha dezessete anos vividos de forma muito errada. Ela era "doutorada em cagada" como eu disse a ela milhares de vezes, sempre deu problemas aos meus pais. Desde notas baixas no colégio até o cara de trinta e poucos anos que se encantou com ela e sempre a perseguiu. Claro que, na frente dos meus pais, ela negava e dizia que ele iria atrás dela enquanto ela tentava dispersa-lo. Mas eu a conhecia o suficiente para ter certeza que ela a provocava de maneira absurda.


Nunca tive muitas expectativas em minha vida, achava que o emprego no único mercado da cidade seria o bastante para eu me manter até sabe-se lá quando! Mas, minha paixão pela escrita e pelos livros fizeram uma luzinha bem fraquinha acender lá no fundo do meu coração. Certa vez, eu estava na biblioteca da cidade e decidi mexer um pouco em um dos computadores ultrapassados de lá, nunca fui de mexer em computador, mas naquele dia algo me dizia para ir lá e pesquisar algumas coisas.


Faculdade sempre foi perda de tempo, de acordo com meus pais. Eles não terminaram o colégio, então com certeza não tinham a miníma noção do que realmente era uma faculdade. Mas para mim, era um sonho distante. Até o momento. Enquanto navegava a procura de sites literários, me deparei com a propaganda de uma universidade com nome estrangeiro e um tanto quanto esquisito. Decidi clicar por pura curiosidade, a faculdade era com certeza absurdamente maravilhosa e com certeza muito cara. Tinha mais certeza ainda quando li "Melhor Faculdade do País". Com certeza era um sonho muito distante. Mas decidi sonhar mesmo assim, afinal, não custava nada.


Quando fui ver os cursos, vi que eles tinham "Letras-Literatura", meus olhos brilharam, é claro. Enquanto eu lia a grade curricular do curso me deparei com um pequeno anúncio que piscava, chamando minha atenção: "VAGAS PARA BOLSISTAS. INSCRIÇÕES AQUI." Não pensei duas vezes, claro. Me inscrevi e fiquei sabendo que na semana seguinte iria fazer a prova numa cidade vizinha, eu fui, esperançosa.


Mas hoje, três meses depois dessa prova, eu estou no meu balanço triste e angustiada. Talvez meu destino seja mesmo ficar para sempre aqui nessa cidade minúscula, com essas pessoas que não gostavam de mim e muito menos eu delas. Havia desistido de ohar na caixa de correios quando eu percebi que em dois meses nada chegou, Talvez meu destino fosse ficar aqui,


–Clara! - ouvi a voz estridente da minha irmã, que atravessava o quintal vindo em minha direção, com um papel branco em sua mão e um sorriso gigantesco no rosto.


Júlia vinha correndo com seus longos cabelos pretos que parecia um liquído prestes a ser derramado nor ar. Eu e minha irmã éramos muitos parecidas, tínhamos a pele clara e várias sardas. Seríamos quase gemêas se não fosse pelo meu nariz horrível que eu infelizmente puxei do meu pai. Éramos diferentes também na personalidade, Júlia era totalmente extrovertida e simpática. Fazia amizades até com o cara mais emburrado do mundo. Já eu, desengonçada por natureza, sempre fui tímida apesar da minha língua afiada ter sido útil quando alguma patricinha vinha me provocar.


–Meu Deus! Mas que desespero é esse? - eu perguntei sem nem me dar ao trabalho de levantar do balanço. Júlia sentou-se em meu colo, ofegante.


–Você não vai acreditar Clara - ela disse me entregando o papel branco que havia em suas mãos. - Você... você foi aceita! - e essas palavras invadiram meu estômago e começaram a puxa-lo para fora. Peguei o papel de sua mão, quase o rasgando. Meu corpo inteiro começou a tremer, e eu me senti tão enjoada que estava prester a morrer agoniada com minha falta de coordenação ao tentar segurar o papel, que naquele momento, parecia pesar uma tonelada.


"Clara Sousa


Conforme o resultado satisfatório no processo seletivo para bolsa de estudo, informamos por meio desta que você está apta para ingressar em nossa universidade com cem por cento de desconto nas mensalidades [...]"


Aquilo foi tudo o que meus olhos conseguiram ler do imenso texto impresso no papel, senti meu coração acelerado, o sangue correndo rápido por minhas veias, uma pulsação na minha cabeça e meus olhos se encherem de lágrimas. Eu estava prester a realizar o maior sonho da minha vida, e tudo iria mudar.


Júlia me abraçou e eu desabei em lágrimas encostada no ombro da minha irmã, eu estava prestes a ser beliscada e acordar no meu quarto minúsculo? Não! Aquilo era verdade, e essa foi a melhor coisa que já havia acontecido até o momento. Até agora, com certeza, pois diante de uma oportunidade dessa eu com certeza iria ter muitas surpresas.


Minha mãe, percebendo o alvoroço, saiu correndo da cozinha e veio em nossa direção. Ela estava com o avental sujo e o cabelo castanho embaraçdo. A preocupação era nitída em seu rosto, mesmo assim eu corri em sua direção e abracei.


–Por Deus Clara! O que está acontecendo, por que está chorando?- ela perguntou segurando meu rosto entre suas mãos, eu sem falar nada, apenas entreguei a carta em sua mão. Ela, apressada, tirou os óculos do bolso e seus olhos correram rápido pelo papel. Ela ficou boquiaberta e me olhou, com os olhos arregalados.- Vo-você conseguiu- ela gaguejou- Esse é o seu sonho Clara, vai nos deixar... - ela disse triste, eu a abracei com toda força que ainda me restava.


–Não fala isso mãe! Eu me formar e tirar a gente dessa pobreza, vou ajudar nossa família! - eu disse feliz, ela apenas me abraçou. Eu amava minha mãe mais do que a mim mesma, ela era a principal pessoa pela qual eu me sacrificaria para dar uma vida melhor, e eu com certeza daria isso a ela.


–Seu pai vai ficar preocupado com você, sabe como ele é. - ela disse limpando as lágrimas ralas que caíram sobre seu rosto. E logo isso me preocupou também. Meu pai sempre quis que eu e minha irmã nos casassémos com algum filho de um fazendeiro das proximidades, ele era um bom homem e sustentava a casa praticamente sozinha, eu e minha irma deveríamos ser totalmente gratas a ele. Mas somos, o problema é sua personlidade superior e interesseira.


–Eu vou conversar com ele hoje mãe. - eu disse suspirando, Júlia me abraçou por trás beijando minha bochecha.


–Não acredita que minha irmã vai para o Rio de Janeiro, seria bom se eu pudesse ir também.- ela disse e soou como uma suplica a minha mãe, que revirou os olhos.


–Temos muito o que resolver. - ela disse e voltou para a cozinha. Eu me virei para Júlia e a abracei com força, eu nunca havia ficado tão feliz em toda minha vida.


Eu e Júlia ajudávamos nossa mãe a preparar o jantar e conversávamos animadamente sobre como seria minha ida a faculdade. Minha mãe estava preocupada com dinheiro, mas eu havia falado que minha intenção era trabalhar quando eu chegasse no Rio. E Júlia insistentemente falava sobre ir comigo, sei que isso era quase impossível, mas seria bom se eu tivesse minha irmã por lá.


O jantar estava quase pronto quando ouvimos a porta bater, o que indicou que meu pai havia chegado. Meu estômago se revirou umas quinhentas vezes e logo ele apareceu, com a mesma expressão carrancuda de sempre. Minha mãe foi até ele e deu um beijo rápido em sua bochecha, era o máximo de contato que eu e minha irmã víamos entre eles. Meu pai sentou-se na mesa grande da cozinha e olhou para mim e para minha irmã, desconfiado.


–Que caras são essas? - ele perguntou passando os dedos pelo bigode, já começando a ficar branco.


–Pai, você não vai acreditar o que aconteceu...- eu disse enquanto ia até a estante da sala para pegar a carta, então entreguei. Ele leu rápido e arregalou os olhos. - Eu estou tão feliz pai, o senhor não tem ideia.- eu completei, esperançosa.


–É o seu sonho Clara.- ele disse, sério - Como, como vamos fazer? - ele perguntou sério e olhou para minha mãe, que foi em sua direção e suspirou preocupada.


–Clara disse que vai se manter enquanto estiver estudando, vai trabalhar e tudo mais. - Minha mãe disse dando um sorriso sem graça, era claro que ela estava tão desconfortável quanto eu nessa situação. Meu pai suspirou.


–Eu não sei, Clara, você tem certeza que é isso que quer? - ele perguntou triste, por um momento eu senti que devia ficar pelos meus pais. Mas não, é claro que não! Eu sabia que se eu me formasse iria ajudar principalmente eles.


–Sim pai, eu realmente quero isso. - eu disse decidida, Júlia deu pulinhos do meu lado.


–Pai, eu posso ir com a Clara? Por favor! - ela suplicou, nosso pai revirou os olhos.


–Você vai fazer o que em uma cidade grande como aquela? -ele perguntou irritado - Mal sabe se limpar sozinha!


–Pai, não fala isso! Eu vou fazer dezoito daqui a um mês, e é daqui a um mês que a Clara vai. - ela disse animada, eu também comecei a ficar animada com a ideia de Júlia ir comigo, mas minha mãe bufou.


–Não Júlia, fora de cogitação! - ela disse e se virou. Júlia bufou e foi para o quarto, eu fui para o quintal e me sentei na grama. Não estava com fome aquele dia, queria apenas pensar na mudança radical que iria acontecer na minha vida daqui a pouco mais de um mês.


Me deitei na grama, estava um pouco úmida mas a sensação era boa. Era lua minguante, fechei os olhos. Era a melhor faculdade do país, e com certeza a mais cara. Quem seriam as pessoas que eu encontraria lá? Será que teriam outros bolsistas assim como eu? Será que eu estava fazendo a escolha certa? Por um segundo tive medo de ser discriminada por ser só mais uma miserável que tinha conseguido uma chance na vida, chance essa que era única. Mas quer saber? Que se dane, eu não estou indo para fazer amigos. Mas seria bom ter Júlia comigo, pra eu não me sentir completamente fora do ninho.


–Clara, venha jantar querida. - minha mãe gritou, levando meus pensamentos ruins para longe. Eu me sentei.


–Estou indo mãe. - eu disse e dei uma última olhada para a lua, então eu sorri. - Vai dar tudo certo. - sussurrei para mim mesma, e a esperança logo encheu meu peito de novo.


Era quase uma da manhã e Júlia estava sentada na beira da cama fazendo planos completamente absurdos sobre fugir comigo. Coisas do tipo entrar na minha mala, ou seduzir o motorista, dar sonífero para meus pais, etc... Tudo absurdamente a cara da Júlia.


–Clara, não vai ser estranho? - ela começou, com uma cara confusa - Ir para uma cidade grande, pra uma faculdade de gente trilionária, sei lá... O princípe dos Estados Unidos deve estar estudando lá. - ela disse rindo, eu revirei os olhos.


–Para a sua informação - comecei - Estados Unidos não tem princípe, e eu não ligo para as pessoas que estudam lá. Estou indo para estudar, não para fazer amigos.


–Até parece Clara! - Júlia revirou os olhos - Vai passar quatro anos sem conversar com ninguém? Você é ridiculamente anti-social.


–Só porque eu não sou uma vaquinha falante igual a você não quer dizer que eu seja um bicho do mato e não sabia como iniciar uma conversa. - eu disse irritada, Júlia jogou o travesseiro acertando-o direito no meu nariz.


–Eu não sou uma vaquinha! - ela gritou rindo. - Só queria ir com você, você é a minha melhor amiga. - eu a puxei pra perto de mim e a abracei.


–Vou sentir saudades da minha vaquinha. - eu disse a apertando com força, fiquei imaginando como seria a vida sem a minha irmã. Alguns minutos depois adormecemos, e foi um sono rápido e agitado. Era como se meu coração estivesse querendo pular para fora do meu peito. Acordei com o sol batendo em meu rosto.


O cheiro de café invadiu meu quarto e eu sorri, eu sentiria falta daquele cheiro. Café fresco misturado com o cheiro de grama úmida. O barulho da água do pequeno riacho logo atrás do balanço que, apesar da minha fobia de água, era uma das minhas partes preferidas da casa.


Minha fobia de água começou quando eu tinha apenas oito anos e fui jogada para a piscina velha e suja da minha antiga escola. Eu, claro, lutei, lutei e lutei para subir mas era como se algo me puxasse para baixo. De repente acordei no hospital público da cidade, com os olhares atentos dos meus familiares em cima de mim. Fiquei desacordada por sete horas mas parecia que eu havia piscado os olhos e de repente me teletransportado para outro lugar.


Fui até o banheiro me espriguiçando, e após fazer minha higiene pessoal, decidi procurar por Júlia. Mas ela não estava em casa.


–Onde está Júlia mãe? - perguntei me sentando à mesa, minha mãe ergueu as sobrancelhas, tinha um ar preocupada em sua feição.


–Ela saiu cedo dizendo que ia encontrar um amigo, mas sabe como Júlia é. Estou preocupada.- ela disse, e eu logo fiquei preocupada também.


Júlia, desde os quinze anos, deu muito trabalho aos meus pais. Principalmente quando se tratava de namorados, ela sempre teve o dedo mais podre do universo quando se tratava de homens. Perdeu a virgindade com um cara sete anos mais velho que ela, quando ela tinha apenas dezesseis anos. E, quando achou que tinha encontrado seu amor eterno, se viu sozinha pois o cara havia se mudado sem dar nenhuma satisfação.


Desde então ela se relaciona com os maiores babacas que eu já tive o desprazer de conhecer. Todos mais velhos e mais aproveitodores. Algo me dizia que isso não iria acabar bem, e eu infelizmente estava correta.


A porta da frente escancarou-se de uma maneira absurda, o barulho fez com que eu e minha mãe pulassémos. Meu pai apertava o braço de Júlia, que tinha uma cara de choro misturada com raiva, enquanto meu pai estava tão bravo que eu imaginei fumacinha saindo de seu nariz. Ele jogou Júlia em direção a minha mãe, que já estava perplexa com a situação.


–Essa menina não tem jeito! - meu pai gritou, eu me levantei rápido. Júlia começou a soluçar.


–O que aconteceu? - minha mãe perguntou, agora segurando Júlia em seus braços.


–Ela estava agarrada na praça com um homem de trinta e cinco anos. - meu pai disse - trinta e cinco anos! - ele gritou, indignado. Aquilo não me espantou, mas eu senti pena do meu pai. O coitado achava que Júlia era a virgem bobona. Mal sabia ele que eu era a virgem bobona, e isso era vergonhoso.


–E daí pai? Eu tenho quase dezoito anos sabia? - ela retrucou, ele ameaçou um tapa mas minha mãe entrou na frente dos dois.


–E agora? Como eu vou voltar para o trabalho? A cidade toda já sabe a p... - ele começou a falar o palavrão, mas eu o interrompi.


–Não precisa disto pai! - eu disse, mas ele se virou para mim com os olhos vermelhos de raiva.


–Você não se meta Clara! - ele gritou e virou-se para Júlia novamente. - Sabe o que vai acontecer? Você vai para o Rio de Janeiro com a Clara e vai trabalhar, quem sabe assim você vire uma mulher de verdade. - ele disse isso e eu tive que me conter para não olhar para Júlia, que disfarçadamente, fez um sinal de positivo para mim. Aquela maluca conseguiu o que queria, e da pior forma possível.


Depois de todo o sermão e ofensar do meu pai, Júlia pulou de alegria assim que ficamos sozinhas. Eu pulei de alegria junto com ela, é claro. Afinal de contas eu não estaria mais sozinha, e quem sabe as coisas ficariam mais fáceis daqui a um mês. O que me resta é somente contar os minutos para esse mês passar, e espero que seja o mais depressa possível.



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Autor(a): mariiacarolyna

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