Fanfic: Invisível(adaptada) | Tema: Vondy

— Você se lembra de como ele é? Se lembra de cada aspecto do que viu?
— Sim, mas...
— Então deve supor que ele se lembre de tudo com a mesma clareza. Provavelmente mais. Neste jogo você é um peão, e ele é um rei. Até onde sabemos, foi uma armadilha.
Dulce não responde, por isso Christian pergunta:
— Que tipo de armadilha?
Any suspira. Minha presença e a de Christian evidentemente são uma imposição, mas, pelo seu tom de voz, fizemos bem em vir até aqui.
— Vocês não têm ideia do que Arbus andou aprontando — diz Any. — Mesmo que não veja Christopher, ainda se sente atraído até ele. Pode ser inevitável. Ele quer o poder que virá quando a maldição for cumprida.
— O que a senhora quer dizer com “a maldição for cumprida”? — pergunto.
— Ela quer dizer que Arbus quer dar uma olhada no próprio trabalho — explica dulce. — Cada maldição tem uma história, e cada conjurador sente curiosidade natural pelo modo como esta vai acabar.
Any lança um olhar severo a Dulce.
— É um modo de encarar isso — diz ela.
— A senhora está dizendo que ele sabe onde Christopher está? — pergunta Christian.
— Estou dizendo que é possível. E estou dizendo que também é possível que ele soubesse que Dulce é uma rastreadora ligada a Christopher. Na verdade, é possível que tudo que Dulce testemunhou fosse apenas para fazê-la se revelar. E foi exatamente o que ele conseguiu. Arbus poderia não saber da ligação de Dulce com o neto, mas certamente sabe que há uma garota em Manhattan capaz de ver... como você chamou?
Ah, sim. O trabalho dele.
— A senhora acha que foi uma armação? — pergunta Dulce. É evidente que ela não havia cogitado esta opção até agora e sente-se tola por isso.
— Acho que um homem com a experiência de Arbus precisaria de um motivo para fazer uma aparição pública — diz Any. — E seria muito conveniente que você testemunhasse isso. Mas o que eu sei? Talvez ele esteja velho demais para se importar agora. Isso é possível. A questão é se é provável.
Olho ao redor do magistorium em busca de respostas. Mas Any está dizendo que não sabe, e nós também não. Olho para todos os exemplares nas prateleiras. Estamos cercados por tantos livros, tantas palavras, tantos pensamentos... e nem um deles sequer pode nos ajudar. Penso: qual é o sentido de toda essa magia se ninguém sabe realmente como usá-la? Mas acho que a mesma coisa poderia ser dita sobre a vida. Que é outra forma de magia, só que menos aparente.

Any começa a fazer perguntas muito objetivas sobre meu avô para Dulce, e me pergunto se meu interrogatório pareceu tão violento. Ela responde de maneira indiferente — talvez por já ter passado por isso comigo ou talvez porque a ideia de uma armadilha tenha vindo à mente com toda a força e, neste mesmo instante, ela lamente parte de sua coragem. Não quero que se sinta assim. Não importa o que Any diz, salvar outras pessoas sempre é mais importante que salvar a si. Tem de ser, ou nenhum de nós faria o bem.
Conforme Dulce explica, olho mais uma vez em volta do magistorium. Esta fortaleza de livros. E penso maldosamente nos Três Porquinhos. Eu me pergunto se somos os porcos que construíram a casa com livros, palavras e pensamentos. O que acontece quando o Lobo Mau chega ali? Será que a casa se mantém de pé? Ou será que tudo é destruído?
— Era tão... poderoso — diz Dulce. — Intenso. Você pode falar tanto quanto quiser sobre isso, mas quando está lá, não há meio de explicar. Simplesmente é. E você tem de reagir.
— Você não está pronta — diz Any.
— Mas que importância tem estar pronta quando uma coisa dessas está acontecendo? — retruca Dulce.
— Não pode fazer algo assim de novo — insiste Any. — Precisa prometer que não fará.
— Prometo — diz Dulce.
Confiro a reação de Any, depois a de Christian. Avalio a minha.
Todos nós sabemos que ela está mentindo.
Christian fala a maior parte do tempo durante o trajeto para casa, fantasiando em voz alta sobre dar a Any um makeover e lhe arranjar um reality show num canal a cabo. São como bolhas de sabão verbais — palavras sem peso para nos fazer sorrir apesar de tudo.
Admiro a tentativa. Dulce parece não estar escutando.
Quando chegamos a nosso andar, ocorre um momento tenso em que cada um de nós percebe que não sabemos qual será o próximo passo de Dulce. Será que voltará a meu apartamento ou vai para casa com Christian?
Ela olha para mim como se pedisse desculpas.
— Minha mãe deve chegar em casa logo — diz ela. — Então...
— Posso apenas pegar você emprestada um pouquinho mais? — Não quero deixá-la ainda, não desse jeito. — Prometo que vou devolvê-la.