Candy PDV
Within Temptation - Frozen
O seguia já fazia um tempo, por isso vi quando foi atingindo por uma lata. Os caras que a jogaram fugiram assim que Christopher desabou. Estacionei o Mustang a alguns metros dele e me aproximei lentamente. Quando o alcancei, fiquei parada observando a chuva espalhar pela calçada o sangue que brotava da testa do ex-Falcon. Com um sorriso o cutuquei com o pé e constatei que estava inconsciente, então coloquei uma perna de cada lado do seu corpo e me abaixei para encará-lo de perto.
- É um fraco mesmo! - Balancei a cabeça decepcionada. - Você... não é... NADA! - Cuspi em sua face. Os olhos de Christopher mexeram, mas ele não teve forças para abri-los. - Não é nem um desafio. - Revirei os olhos me levantando. Sem piedade, chutei suas costelas e desisti definitivamente do verme. - Cansei de você.
Dei-lhe as costas e fui para o Mustang, mas após alguns passos meus pés se tornaram pesados demais e não consegui me mover.
Dulce PDV
Foi difícil, mas recuperei um pouco da razão e olhei para trás. A imagem do homem caído, gravemente ferido, mexeu comigo. Fez-me lembrar do dia em que estive em uma situação parecida. Eu não era o tipo de pessoa que podia dizer: o sofrimento que passei não desejo nem pro meu pior inimigo. Porque, de fato, não só desejei como impus a Christopher o mesmo tipo sofrimento. No início foi maravilhoso, só que com o tempo comecei a me sentir cada vez mais perdida. Enfeitar-me já não me fazia sentir-me bonita, o álcool já não me embriagava, o fracasso dos Falcons já não me causava euforia. Sentia como se estivesse desaparecendo... E ninguém sequer notava.
Exausta, fui até Christopher e me ajoelhei junto ao seu corpo. Meu tolo coração me traiu mais uma vez, fazendo circular por todo o meu ser um sentimento que eu rejeitava com todas as forças. Chegava a ser ridículo sentir aquilo por alguém que só me causou dor. Christopher nunca demonstrou um pingo de afeto por mim, no entanto, lá estava eu: Completamente dividida. Uma idiota carregando uma paixão que nem toda a razão do mundo era capaz de eliminar.
Às vezes me pergunto quando foi que caí nessa infeliz armadilha. O problema é que nunca consigo encontrar uma resposta coerente. Talvez tenha ficado obcecada, pois ele foi o único que me tocou quando eu era apenas uma “mancha”. Mesmo sabendo que foi com intenções imundas, eu me senti mais viva naquele dia do agora que tenho tudo que sempre quis. Ou talvez tudo no universo gere um oposto só para equilibrar, assim como preto e branco, verão e inverno, dia e noite, fogo e gelo... É possível que junto com o ódio tenha vindo também o amor. Infelizmente, esses dois sentimentos habitam em mim em quantidades tão grandes que, por vezes, me sufoco com seus excessos.
Suscetível às emoções, coloquei minha mão direita sobre o ferimento de Christopher e ele gemeu muito baixo. Fixei bem meus olhos em seu lindo e marcado rosto, então as lembranças tomaram-me com veemência, provocando um amargo choro.
“Eu fui tão cruel e maldoso, fiz coisas com essa menina que não se faz nem a um animal.”
“Quando olho pra dentro de mim mesmo... só vejo uma pessoa muito, muito feia.”
“Por muito tempo tentei imaginar como ela se sentia, mas só recentemente compreendi o tamanho do sofrimento que afligi a alguém tão indefesa.”
Ver Christopher entregue à sua punição não me trazia glória e satisfação, apenas me empurrava para o abismo onde o joguei. Finalmente estava percebendo que nessa história paga com orgulho e aflição não havia vencedores, ambos éramos perdedores. Será que tinha que ser assim? Duas almas transtornadas demais para seguir em frente?
Onde está a paz que vem com a justiça? Onde está a calmaria depois da tempestade? Por que ainda sinto tanta dor?
O pranto levou-me ao limite e desejei estar no lugar de Christopher, ficar estendida lá, sem sentir nada. Ao ficar perdida nesse conflito, lembrei-me de uma frase que me serviu como bússola: perdoa-se na medida em que se ama.
Será que isso me faria dormir à noite? Me faria enxergar um caminho para percorrer? A pergunta mais difícil era: será que eu seria capaz de perdoar?
Observei as linhas faciais de Christopher, os pequenos detalhes que faziam dele alguém singular. Então reuni tudo que ainda havia de bom no meu coração e permiti que o frio provocado pela tempestade aplacasse o fogo dentro de mim. Não era fácil, mas era necessário congelar o ódio para que, assim, eu pudesse sonhar com um pouco paz.
Mantive-me firme em minha decisão e aos poucos uma sensação diferente foi surgindo. Ela me fez ter a nítida impressão de que a água estava levando embora uma camada grossa de sujeira que se impregnara em mim. Talvez, só talvez, algo semelhante estivesse acontecendo com Christopher, pois ele pronunciara meu nome. Embora não tenha ouvido sua voz, pude ler em seus lábios.
De olhos fechados coloquei minha boca junto à dele e sussurrei:
- Acabou. - Selei o difícil perdão com um beijo.
Sua respiração estava tão fraca que mal pude senti-la em meu rosto, porém seus lábios frios e proibidos me trouxeram um breve conforto.
Assim que afastei a minha boca, os olhos dele se abriram, mas não conseguiu mantê-los abertos por mais de um segundo. Preocupada com seu estado, não perdi mais tempo e liguei para a emergência. Fiquei com Christopher até a ambulância chegar, depois o deixei ir embora tendo plena consciência de que já não podíamos partilhar o mesmo colégio. Nem sequer a mesma cidade.
Ao chegar em casa, fui para o banheiro e, com uma toalha, tirei o que sobrara da maquiagem. Encarei meu rosto limpo por algum tempo, em seguida, fui até o closet e arranquei de lá o velho uniforme do Democracy. Já não tinha motivos para voltar ao colégio, pois a vingança acabara e nada mais me restava. Eu não fazia a menor ideia do que ia fazer com a minha vida.