Fanfics Brasil - 1.Helena e Felipe. Além dos Nossos Sonhos

Fanfic: Além dos Nossos Sonhos | Tema: Textos, Cronicas e Historias.


Capítulo: 1.Helena e Felipe.

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O ar está quente e quando abro a porta rapidamente sinto uma leve pontada de incerteza. Pergunto-me novamente se estou inteiramente segura do que pretendo fazer em seguida, porém minha intuição sabe o quanto estou me enganando, pois não consigo capitular nada que me faça agir racionalmente.


Mantenho minha respiração calma apesar de toda euforia de meus pensamentos. Com sucesso, faço meus pés me levarem para o interior da grande casa. Subo todos os degraus da escada com uma urgência avassaladora; tento ver onde estou pisando, mas o carpete felpudo amarronzado que mantém a beleza estonteante do lugar não é capaz de prender de total maneira minha atenção. Chego ao segundo andar com meus batimentos ofegantes.


Nunca subi além das escadas. O corredor se estende com portas fechadas de cada lado, e por um segundo é como se fosse possível tornar o ar do ambiente mais acolhedor, porém não consigo sentir essa leveza. Continuo seguindo pela fraca escuridão que contorna o corredor enquanto noto de relance os quadros belos pendurados em diversos cantos das paredes.


Sigo em direção à parte mais afastada do local onde é possível ver um brilho traiçoeiro surgindo através da porta entreaberta. É de lá que escuto o som; uma bela música que adentra meus ouvidos e deixa uma sensação bem vida de tranquilidade.


Concentro-me na melodia com uma intensa satisfação. Percebo, à medida que as teclas do piano são pressionadas, que sei exatamente quem está tocando; não quero de fato acreditar, mas é ele. Tenho essa impressão, pois noto a paixão com que o piano é tocado. Um som alto e intenso.


Mantenho-me inteiramente quieta enquanto empurro a porta lentamente a fim de obsevar o interior do quarto. Encosto meus ombros na madeira fria da porta e durante os minutos seguintes, eu o observo.


Meus olhos encontraram o tom escuro preenchido em cada partícula do quarto; as paredes contém um brilho perfeitamente ingênuo de verde escuro adornados com o mais leve marrom. Nunca imaginei realmente descobrir como seria a projeção desse quarto; mas agora, que sei apenas o suficiente de toda arquitetura contida ali, posso notar o quanto minha visão e meus ouvidos são capazes de me tirar o fôlego.


Mas a música, as teclas compondo um som maravilhosamente belo me faz ter a sensação de adentrar em um ambiente ainda desconhecido. Em um canto afastado do quarto há um grande piano; a visão é ofuscada quando vejo o garoto sentado em sua frente tocando vorazmente as teclas negras e brancas. Vejo a maneira que seus dedos deslizam rapidamente sobre elas e percebo que nada mais importa, nem mesmo o motivo que me fez adentrar aquela casa.


Quero dizer a ele que é lindo... A perfeição com que ele toca, porém minha boca está seca o suficiente, então não sou capaz de obrigar as palavras a se formarem naturalmente como antes.


De repente, quando a música para e todo o quarto é mergulhado em um longo silêncio, sinto meu coração acelerar de um modo frenético, e é como se nenhum de meus pensamentos, e nenhuma parte de minha intuição esperasse por aquele momento; sei que ele ira me ver, e imaginar sua reação é algo que me deixa trêmula e nervosa.


- Felipe. – sussurro seu nome de maneira inaudível quando seus olhos azuis – nitidamente chocados – encontram minha expressão falsamente calma.


- Helena? – o tom de sua voz é elevado, e meu nome em seus lábios me dá uma nítida sensação de desconforto. – O que você está fazendo aqui?


Obriguei minha mente a formalizar rapidamente uma resposta, porém eu me senti tão confusa por ter tomado a espontânea decisão de invadir sua casa, que não me senti pronta para dar qualquer justificativa.


Minha respiração estava arfante, meu corpo se sustentava em meio a uma inquietação agonizante, tudo o que eu pude pronunciar foi um pedido inaudível de desculpas.


- Qual o seu problema?  - grita Felipe novamente, porém dessa vez notei a calor avermelhada de sua expressão inquieta. – Você viu o que acaba de fazer, Helena? – ele passa a mão rapidamente sobre seus cabelos escuros.


Ele respira profundamente; está tentando manter um pouco de sua calma. Vejo sua expressão ficar suave como antes, porém não confio bruscamente em sua voz embaçada de uma ira cortante.


- Desculpa... – sussurro novamente; percebo uma gota mínima de arrependimento em seu olhar. – Eu invadi sua casa... Desculpa, e-eu...


As palavras ficam presas em minha garganta e volto a respirar com dificuldade.


- Sinto muito, eu não devia ter agido assim. – Felipe pronuncia pausadamente enquanto se senta na beirada de sua cama; seu rosto não está mais em brasa, e para meu alivio sua calmaria é notável.


Um longo silêncio decai sobre o quarto. Felipe quebra a quietude enquanto me preparo para ocupar o espaço ao seu lado, porém dou alguns passos em sua direção e paro; a mesma coragem que tive para entrar em sua casa sem permissão... Sei que não terei agora.


- E você não devia ter feito isso. – seu olhar sobre o meu é profundamente tolerante. – Isso é errado. Você invadiu minha casa.


- Eu precisei fazer isso; é diferente. – me justifico; limpo a garganta e tento parecer indiferente ao invés de surpresa. – Eu quis. E, além disso, foi necessário.


- Apenas me diga por quê. – Felipe grita outra vez, e agora sinto uma fúria recém-descoberta no seu tom voz. – Preciso que você diga um motivo que satisfaça.


- Você não está assim porque invadi sua casa, está assim porque invadi sua privacidade. – minha voz soa fria e me pergunto como consegui coragem para dizê-las. – Não há nenhum mal disso.


Felipe deita suas costas na coberta macia em sua cama, e vejo com atenção como seus olhos repousados olham com retenção para o teto totalmente branco do quarto.


- Tanto faz. – ele diz e me aproximo lentamente em sua direção tentando compreendê-lo. – Na verdade, eu não esperava ver o seu rosto aqui. Nunca esperei.


- Por quê?


- Não tem motivo para você está aqui. – ele faz uma pausa, olha em meus olhos e sussurra: - Você me odeia. Então eu não entendo.


- Não é verdade. – digo logo em seguida. – Você é insuportável na maior parte do tempo. Mas eu não te odeio.


Ainda deitado, Felipe revira os olhos.


- Não mereço sua sinceramente. – ele se senta novamente; Felipe parece nervoso, porém não é a mesma ira de antes.


Assim como eu, ele apenas parece inseguro; não consigo considerar nenhum motivo aparente para compreendê-lo.


- Talvez não. Mas eu quero ser sincera com você. – fito a imensidão de seus olhos azuis.


São tão belos. Quero repreender a mim mesma por pensar tais palavras, mas da mesma maneira que disse a Felipe que quero ser realmente sincera com ele, também desejo ser sincera comigo mesma, pois é o certo a fazer. Sua beleza me fascina na maioria das vezes.


- Que dia é hoje? – ele pergunta repentinamente.


- Dia 25 de Setembro.


- E que horas são?


- Não sei. Talvez umas 8hs.


Felipe me olha com um olhar naturalmente confuso, e noto uma decepção em sua expressão. Um sorriso rápido e caloroso se forma em seus lábios macios, e então a decepção aparente apenas some, e quando olho novamente para o azulado de seus olhos vejo um entusiasmo inesperado.


- O que foi? – pergunto após Felipe continuar me encarando.


- Se hoje for sexta, como eu espero que seja; você devia está na escola. – diz ele francamente, mostrando seu sorriso.


- Eu cabulei aula.


- Não acredito. – Felipe parece surpreso e seu tom fez com que se comprovasse minha teoria.


Meu consciente, a cada segundo que tento mostrar a mim mesma indiferença quanto a isso, me faz sentir um pesar avassalador por saber que isso é errado; sinto também uma culpa misteriosa por compreender finalmente os motivos que me levaram a fazer isso.


 


- Porque você faltou? – ele me pergunta. – Hoje tinha prova.


- Eu sei. – digo a ele secamente; suas palavras me mantém temporariamente inquieta. – Eu precisei fazer isso.


- Helena, senta aqui.


Ele sobe na cama e encosta suas costas na parede esverdeada que fica rente a cama. Imobilizo todos os meus movimentos a partir do único segundo que entendo finalmente seu pedido. O ar ao meu redor oscila gravemente quando percebo a minha hesitação em falar OKAY. Apesar de ser tudo o que quero naquele momento, tenho a certeza de que conheço o perigo de dizer sim.


- Minha mochila...


- Coloque-a em qualquer lugar, mas venha. Por favor. – Felipe diz, e noto a urgência de sua voz.


Olho em seus olhos a procura de algum espaço que demonstre a malícia repentina, algo que me faça entender seu pedido inesperado. Sempre tive a impressão de que Felipe me odiasse; nunca rebati com ele sobre isso, mas nunca nutri nenhuma certeza de que minhas suspeitas fossem reias.


Tento controlar meus pensamentos. O medo que sinto é quase tão ameaçador quanto todas as ideias que tento não notar soltas em minha mente. A expressão de Felipe não mostra suas intenções, percebo que ele mantém uma calmaria dentro de si. E eu preciso disso.


Solto minha mochila sobre a cama e me debruço sobre ela. Não estou perto o suficiente de Felipe; mantenho uma curta distancia entre nós, e me sinto segura com os centímetros que nos separam. Meus músculos se contraem quando encosto minhas costas na parede.


Respiro e toda tensão some no momento seguinte. Percorro os olhos sobre o restante da parede e vejo uma quantidade quase infinita de fotografias e retratos desconhecidos. Todos alinhados corretamente; alguns sobre outros onde não há mais nenhum espaço para novas imagens.


Faço o possível para estreitar os olhos e ver de maneira nítida o conteúdo de cada foto. Batatas fritas retratadas em um pequeno quadrado com dimensões perfeitas para a fotografia. Uma nota musical entrecortada por desenhos de milhares de corações negros presos em correntes formadas por pássaros. Apenas o corpo de uma mulher, as curvas finas quase invisíveis em meio ao tom acidentado na imagem, e o seu colar em forma de lua crescente totalmente nítido. Muitas imagens presas na parede. E cada uma dela com um significado oculto.


- Não olhe. – Felipe interrompe minha observação.


Tento não sorrir ao encarar seus olhos. Porém é impossível; sua expressão suave mostra que estamos fazendo aquilo que achávamos impossível.


- Que foi? – ele pergunta ao notar meu sorriso.


- Não estamos brigando. – respondo, rindo com a observação.


- Não estamos agora.


Mantenho minhas mãos repousadas sobre os joelhos. Estão quentes e suadas.


- Isso é bom, não é? – pergunto a ele, um pouco incrédula ao pensar em uma resposta para minha pergunta.


Felipe hesita em responder.


- É ótimo. O que você acha?


- É bom. Eu fico tranquila.


- Por quê? – Felipe levanta levemente suas sobrancelhas ao aguardar minha resposta.


- Sinto que você não me odeia tanto. – mordo meu lábio até sentir uma queimação vacilante, pois preciso me certificar de que serei sincera. – Parece que sua raiva passa. E eu gosto disso, de ver como você é quando não estamos brigando.


- Eu não te odeio. – seu olhar demonstra uma tristeza que reconheci no mesmo instante. – Nunca vou odiar. Só tenho raiva da maneira como vejo você fechada em seu próprio mundo.


Aquelas palavras me sufocam por dentro. Cada pontada de voz que adentra meu corpo faz com que meus pelos se arrepiem imediatamente, porque eu sei que são verdades, e dói não ter coragem o suficiente para assumir.


- E eu tenho raiva da maneira como você se fecha no meio da sua própria satisfação. – digo a Felipe, dizendo as palavras com elevado cuidado.


- É diferente. – ele diz rapidamente. – Porque você faz isso?


- Eu gosto. – afirmo convicta de que não é o suficiente para ele, então continuo. – Não estou completamente sozinha.


- Você não tem amigos, Helena.


- Amigos de verdade não. Nunca tive. – eu tento controlar a tristeza, mas o tom de minha voz faz parecer impossível escondê-la. – Mas minha solidão é reconfortante.


 - Como isso é possível? – Felipe parece analisar em minha expressão o quanto estou sendo sincera.


- Eu já me acostumei. Não é assim tão ruim, e com o tempo eu percebi que é o melhor a se fazer.


Felipe mexe com as mãos freneticamente. Na maioria das vezes o vejo passar seus dedos nos fios emaranhados de seu cabelo negro.


- Você acha que não somos bons o bastante para você? – ele me pergunta e sinto o quanto pareço confusa ao entender de fato sua pergunta.


- Não se trata de ser o bastante ou não. – afirmo a ele. – Eu acho desnecessário passar o restante da minha vida dando justificativas a pessoas que não sabem quem eu sou realmente.


- E quem você é realmente?


- Não sei Felipe. E não quero que descubram por mim.


Ele parece aceitar minha resposta, porém vejo um raio de tensão surgir na linha pontiaguda de seu rosto.


- E você? – pergunto enquanto puxo minha mochila. Pressiono a maciez de seu tecido em meus braços de maneira reconfortante.


- O que você quer saber?


- Quem você é? – torço para que sua resposta seja tão sincera quanto à intenção de minha pergunta.


Suas palavras somem e penso que não será dessa vez que descobrirei quem Felipe realmente é. E um peso acolhedor força meus olhos a encarar a expressão pensativa dele.


- Eu acho que também não sei. – ouço a sinceridade contida em sua resposta. – O que eu faço; minhas atitudes, meus pensamentos... Essa pessoa não sou eu de verdade. Não importa se é como vocês me vêm.


Permaneço em silencio até saber que preciso dizer algo reconfortante a ele. Mas apesar de não compreender de fato quem eu realmente sou nesse mundo, e apesar de sempre me manter confusa em relação a isso, eu nunca recebi nenhum conforto de ninguém, então não sei o que dizer a ele; não sei o que ele espera que eu diga; e de fato, eu nunca fui boa em conversar.


- Eu sei. – após alguns segundos é tudo o que eu consigo oferecer.


- Não! – ele exclama, contraindo sobre si aquele leve estresse de antes. – Todas as vezes que eu fui grosso, ou estúpido com você, era por causa dessa parte sua que mexe tanto comigo. – ele faz uma pausa e vejo os músculos de seu pescoço rígidos. – Eu pensei que tivesse odiado você no primeiro segundo em que a vi naquela sala de aula. Mas eu estava errado, não odiei você. Odiei suas atitudes, por você ser tão diferente. Por ter tanta coisa boa em você, por ter coisas que eu daria tudo para ter.


Sinto o impacto de suas palavras no mesmo instante em que as escuto. Olho em seus olhos fixamente e tento mostrar toda minha compreensão. Minha presença ali, naquela casa, naquele quarto, no meio de toda sua privacidade, faz com que minhas atitudes não sejam racionais. E quando toco levemente a pele macia de sua bochecha percebo o quanto meu controle sobre meu braço estendido é fraco, chegando a ser parcialmente inútil manter minhas ações pensadas.


- Quero você perto de mim. – ele me pede docemente.


- Eu estou aqui. – digo a ele. Felipe toca meus dedos e retira minha mãe de seu rosto, porém não solta meu pulso; ele mantém sua mão em contato constante com a minha. Sinto a onda de calor naquele ponto onde nós tocamos.


- Mais perto de mim. – ele mexe com algo inteiramente desconhecido dentro de mim quando ouço seu pedido. – Por favor.


Uma pouca distância nos manténs separados. Ele gesticula para o espaço ao seu lado e novamente reluto em aceitar seu pedido. Tento consultar uma parte racional de mim, mas não consigo, não naquele momento, quando tenho seu olhar voltado totalmente para mim.


- Eu vim obrigar você a fazer o trabalho de jornalismo. – digo rapidamente a ele, acredito que seja uma boa tentativa para distraí-lo.


- Só por isso você veio? – vejo como o humor de sua voz muda com meu comentário.


- Faz três dias que você não vai à aula. – desejo completar dizendo de maneira natural o quanto isso pareceu preocupante no primeiro dia.


- Sim. - ele aperta delicadamente a palma de minha mãe e então sinto a explosão contagiante de uma estranha animação. – E você reparou.


- Todos os professores perguntaram de você para mim.


- E se não fosse eles. Você teria notado?


Sorrio e balanço a cabeça de maneira afirmativa.


- Você faz a minha noite ser insuportável. – digo de maneira sarcástica, mas Felipe não esconde um sorriso charmoso. – Isso foi decepcionante, não ter você para me irritar.


- Desculpa. – ele diz, e pelo tom de sua voz, sei que não é pelas suas faltas excessivas no colégio.


- Não precisa pedir desculpa por ser quem você é.


- Mas eu não quero ser assim. Não com você. Você não merece alguém como eu, você não merece ouvir uma palavra se quer do que eu tenho a falar; mas me desculpa.


Eu acredito no que Felipe diz. É difícil assumir isso a mim mesma quando todos os dedos estão apontados para ele, quando comentários estão por todas as partes, quando sei que os rumores são verídicos, mas sei que nesse momento, por mais que seu passado seja ruim o bastante, ainda tenho a possibilidade de entendê-lo.


- Tem algo em você que me surpreende. – digo a ele, tentando sem sucesso esconder um tímido sorriso.


- De qual lado meu você está falando? – ele revira os olhos. – Do ruim ou do péssimo?


Ele mantém seu olhar sério, o que me faz rir de maneira silenciosa.


- Do seu lado incrível e bom.


- Helena, não minta. Por favor.


Ouço a decepção naquela voz inteiramente bela. De repente - não me importando de fato com minhas próximas atitudes – seguro o pulso quente de Felipe e puxo seu corpo em minha direção, para mais perto de mim.


- Sou eu que quero você. – digo docemente, enquanto vejo uma animação nos olhos de Felipe. – Mais perto de mim.


Ele solta minha mão, e antes que eu sinta seus dedos novamente em contraste com minha pele, o vejo se aproximar totalmente de mim, e aquela distancia de antes, é desfeita no mesmo instante.


- Eu sou uma pessoa observadora.


- Percebi; você continua me encarando. – os lábios finos dele se curvam em um mínimo sorriso, e posso ver um traço malicioso em seu rosto.


Desvio meus olhos enquanto sinto minhas bochechas esquentarem.


- Não; continua. Nenhuma mulher nunca me olhou assim.


Felipe toca meu rosto e me obriga a olhar para ele novamente. Não resisto ao seu pedido silencioso.


- Eu observei você ao longo desse ano. Vi seu lado bom, e quis descobrir quem você era realmente. – tento manter um tom neutro a minha voz. – Mesmo que para isso eu tivesse que descobrir seu lado ruim primeiro.


- Descreva meu lado bom, se possível. – ele pede e vejo um sorriso encorajador e tímido de sua parte.


- Você é extrovertido, eu admiro isso em você. – olho para a porta entreaberta do quarto enquanto resposto, mas rapidamente olho de relance para ele e o vejo sorrir. – Você é corajoso, algo que nunca fui. Ao contrario de mim, você sempre demonstra segurança.


- Não sou corajoso. – Felipe adverte confiante em suas palavras. – Eu não chamaria o que eu faço de ter coragem.


- Não me refiro a isso. Você enfrenta as pessoas que se opõem a você.


- Você sabe por que elas se opõem contra mim? – Felipe pergunta, e não espera de fato uma resposta, pois completa no instante seguinte. – Porque eu transo com duas meninas diferentes por semana! Eu frequento todas as baladas dessa região. É desse tipo de coragem que você fala?


- Esse não é você de verdade. Eu sei que não é. – controle uma repentina queimação nos meus olhos ao ouvir sua sinceridade e toda agonia escondida por detrás de suas palavras.


- Não é. Mas eu deixo as pessoas pensarem isso. – ele me olha e vejo um tom de suplica em seu olhar, e em seguida ouço seu sussurro. – É dessa coragem que você se refere?


Eu percebo sua tensão: - Isso é apenas uma de minhas covardias.


- O que você faz é errado. Mas você continua fazendo apesar de saber disso; você continua enfrentando as opiniões alheias como se isso não significasse nada para você. Felipe, você é corajoso sim, você apenas usa sua coragem para algo errado.


- Aonde você quer chegar com isso? – Felipe me pergunta.


- Eu queria ter essa mesma coragem para enfrentar meus próprios pensamentos e talvez as pessoas. – assumo a ele, aonde quero chegar posso não saber, mas sou capaz de assumir coisa a mim mesma que antes eu não era capaz. – Você sabe conversar, e eu sou um fracasso conversando com qualquer pessoa.


Ouço a risada de Felipe e automaticamente sorrio sabendo o quanto ele deve achar engraçado minhas palavras sobre absolutamente tudo.


- Gosto da maneira que você conversa comigo.


- Você não faz ideia de como me sinto falando com você.


Ele me causa algo friamente bom e assustador. Bom o suficiente para querer descobrir cada pensamento dele; e assustador por saber que não é certo estar com Felipe. Minha mente reconhece o seu passado, e naquele momento quero ouvir que é mentira tudo que sei sobre ele, mas sei também que tais palavras não são possíveis.


- Você não tem medo. – digo automaticamente sem nenhum motivo aparente.


- Do que? De pegar AIDS? Não, eu não tenho medo. – ele diz. Felipe parece exasperado com meu comentário. – Eu uso camisinha.


Não me sinto segura por reprimir qualquer tipo de sorriso, então mantenho notável meu riso sarcástico.


- Você não tem medo de dizer o está na sua mente. – explico; meu joelho toca ligeiramente na perna dele, sinto aquela nova sensação reconfortante entre nós e posso dizer que Felipe sentiu o mesmo.


- Sempre. Eu preciso me esvaziar de meus pensamentos quando posso.


- Entendo.


- Em outras vezes quero apenas preencher o vazio. Estou o tempo tentando fazer isso.


- Então você transa. – digo abertamente a ele; não como se o questionasse, mas como se confirmasse aquilo que eu já sei, aquilo que todos já sabem. – Como você se sente preenchendo o vazio com isso?


Minha voz está alterada, percebo imediatamente. Uma onda leve de raiva se apodera de mim e sinto uma queimação quando jogo a pergunta no ar e espero uma resposta satisfatória.


- Sim! Eu transo. – ele admite e vejo em seu rosto o pressentimento de que ele sabe qual será minha próxima reação. - Para ser mais especifico, transei com duas garotas essa semana... Por enquanto, é isso o que me mantém vivo.


- Queria que isso não fosse verdade. – digo. E por dentro, estou decepcionada; porém não há nada em suas palavras que seja totalmente desconhecido, pois o tempo todo eu soube.


- Helena? – quando ouço seus lábios sussurrando meu nome noto meus olhos reprimindo uma lágrima repleta de tristeza e de uma melancolia real. – Mas você já sabia disso. E está aqui mesmo assim, por algum motivo especifico.


- Vim pelo trabalho. Preciso da nota. – digo rispidamente meus motivos, mas Felipe torna a não acreditar.


- É o último bimestre. Um trabalho a menos para você, não faz a mínima diferença. – ele afirma e uma expressão fria se apodera de seu rosto.


- Pra mim não, mas pra você sim. – nossos olhares se cruzam; tiro sua mão de minha pele no momento em que sua confissão faz o devido sentido para mim. Transei com duas. Sinto o nojo daquelas palavras, e não posso lutar contra uma rápida lágrima que molha meu rosto sem se importar com nada além de tudo estar errado. – Eu quero continuar vendo você no próximo ano.


- Porque isso é importante pra você? – Felipe estende sua mão e sinto sua mão quente em minha bochecha onde noto a queimação de uma segunda lágrima.


Não reprimo seu toque. É delicado e errado, mas não posso bloquear a sensação de seus dedos.


- Apesar de toda raiva que sinto de suas atitudes... – começo dizendo, respiro profundamente de maneira silencioso e completo, sentindo meu coração em uma velocidade irreal. – Eu gosto de você.


- Isso é inacreditável. – ele confessa e noto que seus olhos fogem dos meus com uma urgência desconhecida. – Eu sou rebelde e você é comportada.


- Aparentamos ser assim, mas não somos. Não de verdade. – digo rapidamente. – Todas as pessoas tem o direito de fazer suas próprias escolhas. Então podemos escolher o que vamos ser.


- Mas nunca é assim tão fácil.


- Essa mudança exige algo de nós.  – eu completo.


 Felipe olha para mim com um ar interrogativo, mas depois o ouço sussurrar quase para si mesmo: - Sacrifico.


- Você está pronto para o sacrifício? – pergunto a ele, mostrando minha curiosidade.


- Nunca ninguém está pronto. Você está?


- Talvez não. Você é feliz?


- Tenho uma alegria temporária quando satisfaço meus desejos. – ele me olha e completa. – Não chamaria isso de ser feliz. É algo solitário.


Não estou sentindo as lágrimas inundarem meus olhos como minutos atrás, porém sinto uma repulsa ao considerar os motivos que me levaram a chorar.


- Você gosta de mim assim? Sendo o garoto que todas as mulheres desejam? – Felipe pergunta.


Sua pergunta faz inúmeras dúvidas surgirem em meus pensamentos.


- Isso pode mudar.


- Eu sei, mas é difícil, não é? – ele me mostra um riso sarcástico. – É pior quando se está sozinho.


- Mas você não está sozinho. – quero tocar sua pele e reconforta-lo como nunca imaginei fazer, mas eu sou um fracasso quando se trata de ajudar as pessoas, então tudo o que desejo é que minhas palavras sejam o suficiente para ele.


- Você está aqui. Mas não da maneira que eu quero.


Não vejo malicia em seu olhar ou em sua expressão, e muito menos em seu tom neutro de voz, porém eu consigo de alguma maneira entender o significado de suas palavras.


No minuto seguinte, quando prendo minha respiração acelerada e controlo grande parte dos meus batimentos, tomo a decisão de me levantar e ir embora, porque a parte consciente de mim mesma sabe que é o melhor a si fazer, mesmo hesitante em tomar tal atitude.


- Não, Helena.


Faço o possível para sair da cama lentamente; quero apenas apreciar o aroma nítido do quarto: a posição perfeita de todas as fotografias, a coloração escura das paredes, o piano de cauda ao fundo. Lembro-me da perfeita melodia que Felipe tocava quando invadi sua privacidade, o som maravilhoso e belo vindo de encontro com os meus sentidos. Meu corpo ansiou por aquilo novamente, mas não foi possível, e talvez nunca mais fosse realmente possível, então tive apenas um vislumbre do que aconteceu. E em minha mente, aquelas teclas sendo pressionadas tiveram o efeito de me deter involuntariamente; foi através daquela arte que soube que precisava ficar mesmo com uma parte de mim rejeitando tal hipótese.


- Helena. – ouço seu lamento.


Percebo os dedos aquecidos de Felipe em volta do meu braço. Ele me puxa para perto de si com delicadeza, mas não estou convicta de quais as suas verdadeiras intenções.


- Eu não vou ser a terceira essa semana. – digo a ele antes de imobilizar meus movimentos; enquanto sinto sua mão encostar com maciez meu rosto e fazer um leve carinho em minhas bochechas vejo a cor azulada de seu rosto e me lembro do mar, do mar que nunca conheci, da água e do horizonte ainda desconhecidos.


- Você. Não. Será. A. Terceira. – Felipe pronuncia cada palavra pausadamente, fazendo o possível para que eu compreenda o significado de cada uma delas. – Você é melhor do que qualquer noite que eu possa chegar a ter. Melhor do que qualquer relação de prazer.


- Você promete?


Seus dedos continuam tocando minha bochecha; coloco uma de minhas mãos sobre a sua e com a outra toco seu rosto. Sua pele é quente como imaginei, é lisa e sobre a camada de cor clara vejo o quanto a considero perfeita. Não consigo neutralizar a sensação ruidosa de calor quando sinto intensamente o desejo de ter seu toque por toda a minha pele. Cada partícula de consciência sussurra para mim o quanto isso é perigoso, mas como passei toda minha vida cuidando de mim, e me mantendo afastada de qualquer coisa que bloqueasse meu raciocínio, sei que consigo lidar com essa situação.


- Prometo. – ele murmura.


Sua boca está razoavelmente perto da minha, porém não vejo nenhuma malicia em sua expressão, pois é como se seu desejo não esteve presente. Sinto seu halito frio vir em minha direção quando ouço suas palavras, um toque silencioso e doce, quase doce como o sabor discreto de minha fruta favorita.


- Por você ser quem você é agora... Você devia ter nojo de mim. – noto um pesar arrasador em sua voz.


- Não. Pessoas fracas tem nojo, e eu não tenho de você. – digo sinceramente. – Nunca vou ter. Eu vejo esperança quando te olho.


Ele aproxima sua boca da minha, mas para quando já estou a ponto de sentir o gosto de seu beijo. Posso sentir seus lábios quase roçando nos meus, porém não noto nada, além disto.


- Eu sinto muito, mas não vou te beijar. – ele diz.


Sorrio enquanto me afasto apenas o suficiente para enfrentar seu olhar teimoso. Ele me encara sem piscar, e pela maneira com que seus olhos estão repousados sobre mim, é possível ver um ar inocente envolta do seu rosto. Sei que Felipe não ira me beijar, não hoje, e talvez sempre haja algo entre nós que nos impossibilite disso.


- Você quer? – ele me pergunta.


A maneira como seus lábios se movimentam faz com que eu me distraia.


Apenas balanço a cabeça, dizendo silenciosamente a ele que quero.


- Eu sei. Eu também quero, e muito. – ele toca minha nuca e massageia levemente meus ombros, passa seus dedos por toda pele de meu braço e por último entrelaça seus dedos nos meus.


A sensação de conforto é instantânea.


- Então beija. – peço a ele com sussurro quase inaudível.


- Ainda não. A menos que eu mereça. – ele responde. – Eu tenho que me merecer.


- Tudo bem. – concordo.


- Quero te pedir algo. – Felipe pede enquanto vejo um sorriso iluminar fervorosamente seu rosto.


- Sim?


- Deita na cama. Por favor.


Ouço com atenção seu pedido, e pela maneira como seus olhos vagam pelo restante da cama posso dizer que sei exatamente o porquê da solicitação. Mas não é isso, Felipe soou realmente sincero quando disse que não me beijaria; acreditei em sua recusa com toda minha segurança.


Faço como ele pediu. Mantenho-me pronta para qualquer ataque ou para alguma atitude que não me agrade, caso eu esteja enganada sobre seu respeito.


Deixo minhas costas tocarem a superfície macia da cama; minha cabeça toca na compassiva maciez do travesseiro enquanto sinto todo o restante do meu corpo relaxar de uma maneira visível. Tenho a nítida impressão de que meu coração irá explodir em meus ouvidos, pois sinto como está frenético em meu peito, e como soa alto, em meio ao silêncio do quarto. Sinto minhas mãos trêmulas ao lado do meu corpo; quero manter cada músculo em motivo, pois talvez assim eu consiga me distrair da ideia de ter Felipe me observando atentamente.


- Porque você está nervosa? – ele me pergunta, e noto que está atento a cada detalhe que eu possa deixar transparecer.


- Nunca deitei na cama... – sinto minhas bochechas adentrarem em um tom avermelhado. – Bom, de nenhum homem.


- Quero que você fique calma. – ele me pede gentilmente; seus movimentos seguintes me surpreendem e parecem que tiram o restante de meu fôlego.


Felipe deita ao meu lado, e quando olho para ele, noto todo o espaço que sua cama nos disponibiliza. Sinto sua respiração calma, como se minha presença não o deixasse nervoso, mas eu sei que isso não é verdade. Da mesma maneira que sinto uma onda de nervosismo me envolver, suponho que Felipe possa receber discretamente dessa mesma sensação.


- Quero te pedir outra coisa. Mas preciso que você confie em mim. – ele sussurra.


Fecho meus olhos e sinto uma pontada de segurança quando percebo que posso estar honestamente segura com Felipe.


De repente, sinto sua mão sobre minha cintura; o toque faz com eu abra os olhos e olhe para ele.


- Fica comigo, sempre. Por favor.


- Eu ouvi você tocando. Foi perfeito. - digo rapidamente; sorrio e logo em seguida digo em um baixo sussurro: - Claro.


Felipe acaricia meu rosto e fecha os olhos.


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 


 



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Autor(a): luanagc

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