A loira deu um sorriso. Seus lábios cheios se curvaram de uma maneira maliciosa, sexy, e não importou o fato de não dirigir aquele sorriso instigante a ele. Seus músculos ainda se retesaram, os sentidos entraram em alerta e outra ereção surgiu. Sim, havia química de sobra entre ambos. Era o momento em que aquilo estava acontecendo e as assustadoras perspicácia e percepção dela que o preocupavam.
– Senti falta da praia – comentou Anahi após alguns minutos de caminhada silenciosa pela beirada da água.
– Onde esteve?
– Em Nova York. – Ela lhe dirigiu um olhar maroto, e seus olhos brilharam sob o luar.
– Não dá para perceber pelo meu sotaque? Antes do treinamento para ingressar nos fuzileiros, Alfonso havia servido como criptógrafo. Em termos civis, um linguista. Falava espanhol, russo, persa e árabe fluentemente. E, vez ou outra, o seu próprio idioma de maneira decente.
– Conheço muitas pessoas de diversos lugares – comentou. – De fato, a origem da maioria é mais fácil de identificar pelo sotaque. Mas você não tem nenhum. – É mesmo? Não tenho nenhum sotaque? Ele riu diante daquele tom afrontado.
– Sou um especialista – assegurou. – Pode acreditar quando digo que você não tem sotaque. Em seguida, talvez pelo fato de estar começando a se descontrair pela primeira vez desde que vira o capacete de Phil explodir, decidiu se exibir um pouco.
– Aposto que se mudou muito quando era criança. E não apenas pelos Estados Unidos. A sua entonação é arredondada demais para ser puramente americana. Europa. Talvez Ásia? Anahi ficou imóvel de repente, ciente da música alta da festa adiante na praia, e pousou as mãos na cintura.
– Michael foi à sua procura e disse algo a você hoje à tarde? – perguntou, estreitando os olhos. Alfonso riu. Não havia muitos meios de entretenimento num navio no meio do oceano e, assim, criara um jogo para adivinhar de onde os rapazes vinham. Phil costumara chamá-lo de “Diga de onde é esse sotaque em dez palavras ou menos”
Seu riso dissipou-se. A lembrança não era mais tão dolorosa, porém. Talvez fosse a tranquilidade da praia à noite, com o calor balsâmico ao redor. Ou a companhia.
– Seu irmão não me contou nenhum segredo seu – garantiu. – Já falei, sou bom em sotaques.
– Você é astuto! – Ela soltou um riso, um som tão cativante e misterioso quanto o próprio oceano.
– Aposto que é uma habilidade valiosa. O seu trabalho está ligado a idiomas?
– Sim. – Mas Alfonso não queria falar sobre seu trabalho. Queria escapar disso no momento. Observou-a mergulhar os pés na água da beira do mar e chutá-la descontraidamente, espirrando gotas para cima. Como seria sentir-se tão livre? Tão à vontade consigo mesmo, com a vida?
– E quanto a você. É psicóloga, ou algo assim?
– Como falei, astuto – cumprimentou-o ela, enquanto chegavam perto do grupo de convidados da festa. Pessoas se espalhavam pela praia, dançando sob as luzes de tochas, mergulhando de roupa e tudo no mar... E em alguns casos, sem roupa alguma.
– Tenho uma especialização secundária em Psicologia, na verdade. Mas não pratico.
– O que você faz?
– Até recentemente, eu trabalhava num laboratório particular em Nova York como especialista em física acústica.
– É mesmo? – disse ele no mesmo tom admirado que ela própria havia usado antes. Uma cientista? Com uma especialização secundária em Psicologia? Tocou as chaves da caminhonete no bolso novamente, calculando que poderia deixar a praia e estar ao volante numa questão de um minuto.
– Sim – confirmou ela num tom de certa reprimenda e com um riso. – Especializei-me em Psicoacústica. O que era aquilo? Conversa de divã? Ele se apoiou nos calcanhares por um instante, avaliando o efeito retardador que a areia teria em sua fuga.
– E Psicoacústica é.... – perguntou hesitante.
– A definição técnica do estudo da percepção do som, medindo a reação psicológica e fisiológica a sons.
– Então, você faz pesquisas?
– Pesquisas, desenvolvimento de projetos – assentiu, dando de ombros antes de olhá-lo com uma sobrancelha arqueada.
– Minha pesquisa atual concentra-se em sanar problemas que interferem na saúde sexual e também em aumentá-la através de mensagens subliminares, programas de neurolinguística e tecnologia de ondas cerebrais. Interessado, um tanto confuso e, uma vez que ela mencionou sexo, totalmente aberto ao assunto, Alfonso voltou a sossegar no lugar e disse num tom encorajador:
– Fale-me mais a respeito. Pelo olhar divertido que Anahi lhe dirigiu, ficou claro que soube que parte queria que abordasse mais.
– Se empregada da maneira correta, a mensagem subliminar oferece a oportunidade de passar pelo fator crítico do cérebro e falar diretamente com o subconsciente. É onde as mudanças acontecem. Não apenas mudanças como a de uma pessoa parar de fumar, ou superar o vício em açúcar, por exemplo. Mas mudanças físicas reais. Quando o trauma ou o condicionamento são fortes demais para uma pessoa superar, a melhor maneira de se fazer mudanças é num nível subconsciente. Essa pode ser uma ferramenta bastante poderosa de ajuda a vítimas de abuso para que vençam bloqueios, corrijam disfunções sexuais, recubram a confiança emocional. Levando em conta o entusiasmo na voz dela e a maneira como estava radiante, era evidente que ali estava uma mulher que tinha paixão pelo seu trabalho. Ele lhe lançou um olhar inquiridor.
– Está falando no uso do som como terapia psicológica?
– Sim. É algo mais profundo do que isso e deve se feito em conjunto com a psicoterapia em vez de substituí-la, mas você compreendeu a ideia geral da maneira correta. Alfonso gostava de um pouco de música agradável durante o sexo quando possível, mas aquilo era um tanto peculiar. De qualquer modo, estava ficando excitado só em ouvi-la, com aquela voz um tanto rouca e repleta de paixão e entusiasmo – mesmo que fosse pala falar de trabalho, em vez de algo mais pessoal, como a evidente atração entre ambos.
– Como passou do campo da Física Acústica para o da saúde sexual? – indagou curioso.
– Enquanto eu estava estudando Psicologia, fiz estágio numa clínica que ajudava vítimas de abuso. Era de cortar o coração – disse num tom sério, olhando para o mar.
– Anos, vidas inteiras sofriam o impacto de um único acontecimento e, não importando quanto essas pessoas quisessem superar isso, ou quanto tenhamos tentado ajudá-las, havia coisas que a mente simplesmente não as deixava vencer. Alfonso não disse nada. Não conseguiu. Sua própria mente estava voltando para a missão, para o último momento em que vira Phil. Anahi tinha razão. Era extremamente difícil tirar certas coisas da mente.
– Estou deixando você entediado, não é? – Ela o olhou com uma expressão preocupada, e o luar cintilou sobre seus lábios cheios, agora curvados num ângulo inclinado, com um ar cabisbaixo.
– Ora, claro que não. Estou fascinado. Além do mais, gosto de mulher que tem esse entusiasmo pelo sexo. – Alfonso deu um sorriso malicioso.
– Disse certo. O entusiasmo por sexo é sempre bem-vindo. – A voz de Anahi soou tão sedutora quanto a noite que envolvia a praia.
– E quanto ao que eu disse errado? Ela abriu um sorriso doce, com uma expressão de empatia e profunda compreensão que disse a ele que ali estava uma mulher que se importava realmente com os outros. Não apenas com seu trabalho. Mas com as pessoas, buscando meios de ajudá-las, de lhes tornar as coisas melhores. E a julgara de certa forma intimidante pela maneira como captava tudo, mas era simplesmente perceptiva, a seu jeito espontâneo.