T ODOS OS lugares que Alfonso olhava estavam desertos. Armas disparavam à sua volta, faiscantes e altas. A missão de resgate rápido não tinha transcorrido conforme o planejado. Sem problemas. Os fuzileiros estavam sempre preparados. Ele enviou uma mensagem pelo rádio para reportar a emboscada, enquanto Phil e Matheus tiravam o lançador de foguetes do receptáculo.
– Toc, toc. – Phil abriu um largo sorriso. Alfonso sentou-se abruptamente na cama. Um punho se ergueu furiosamente, o outro desceu até a altura do quadril em busca da arma. Mas o quadril estava nu. Assim como o restante dele. Estremecendo, limpou o suor que escorria por sua testa e concentrou-se em se situar rapidamente. Nu. Numa cama. Com um corpo feminino sexy e quente aninhado sob o lençol junto ao seu. O sol ao amanhecer se filtrava pela janela sem cortinas. Além de uma cômoda larga, de uma pilha de caixas de mudança e da cama de casal onde estavam, não havia mais nada no quarto. O apartamento de Anahi. Onde ele se encontrava havia dois dias incríveis, repletos de sexo e erotismo. Virou a cabeça para o lado. Ela estava deitada sobre o lençol de cetim onde havia desabado após a mais recente explosão de paixão de ambos. Com o rosto para baixo e os cachos loiros espalhados ao redor, deixando-lhe apenas parte da tatuagem de rosa no ombro à mostra, estava profundamente adormecida. Levando em conta que haviam dormido talvez um total de seis das 52 horas anteriores, não era de admirar. Mas sentia-se gratificado. Precisando de ar fresco e de espaço após o pesadelo, saiu da cama silenciosamente e, pegando o jeans, deixou o quarto. Contornou caixas de mudança, ainda enfileiradas e etiquetadas junto à parede da sala de estar. Não estivera brincando ao dizer que acabara de se mudar de Nova York. A maior parte de suas coisas, exceto por algumas peças grandes de mobília, ainda estava empacotada. Calculava que ela devia ter se mudado para ali uma ou duas semanas antes. A maioria das mulheres não teria aberto as caixas, pendurado as cortinas e enchido o apartamento de objetos pessoais àquela altura? Não que houvessem conversado muito, mas ficara com a impressão, durante um dos intervalos de descanso entre as ardentes sessões de sexo, que Anahi não estava com pressa para se instalar ali. Por quê? Estaria sentido falta de Nova York? Não era fã do sol da Califórnia? Sabia que ela já morara ali antes, mas não em que época. O que a levara a partir? O emprego seria o bastante para fazê-la ficar dessa vez?
E por que ele se importava tanto? Importar-se, querer saber se ela estava ali havia muito tempo, curiosidade sobre seu passado, presente e futuro. Eram todas coisas que estavam fora dos seus limites. Eram péssimas ideias para um homem que jogava roleta russa para viver. Atravessando o piso cerâmico mexicano da sala de estar, contornou a mesa de jantar com passos silenciosos e foi até a pequena cozinha, que ficava separada apenas por um balcão. Os únicos objetos visíveis eram uma cafeteira elétrica, uma panela e duas taças para vinho. Inclinou-se na pia e meteu a cabeça debaixo da torneira, deixando que a água fria dissipasse o remanescente de náusea que o sonho ruim causara. Não havia usado sexo para amortecer as lembranças, mas, se tivesse sido o tipo de pessoa que fazia isso, com certeza não teria adiantado de nada. Sacudindo a água do cabelo curto, usou uma folha de papel-toalha para enxugar o rosto e olhou pela janela para o pequeno jardim abaixo, na área comum do prédio baixo. Flores coloridas de aspecto tropical desabrochavam entre as folhagens, inocentes e convidativas. Sentiu-se feliz, vivo e tomado por um peculiar contentamento em relação a Anahi. Ela o fazia rir. Ao observá-la nas poucas vezes em que dormira, fora dominado por uma espécie de paz que o deixara assustado. Seu corpo curvilíneo era um mar de prazeres, em que queria mergulhar e explorar repetidamente. Mas seu lugar não era ali. Era avesso a relacionamentos, para começar. E, embora Anahi tivesse dado a entender que também não estava em busca de um
relacionamento, era o tipo de mulher que desejaria ter um. Ou talvez o tipo de mulher com o qual ele conseguia associar relacionamentos. Deveria voltar à base naval dali há dois dias. Era provável que estivesse fora do país em mais uma missão antes do final da semana seguinte. E ela não queria envolvimentos com integrantes da Marinha. Ao menos quando eram sinceros o bastante para deixá-la saber que eram da Marinha antes que houvesse algum tipo de envolvimento, pensou ele com uma pontada de culpa. Era tempo de pôr um fim naquilo. De dizer adeus e voltar à vida real. Desviou os olhos do jardim abaixo e pousou-o em suas mãos. Mãos que poucas horas antes haviam explorado e acariciado o delicioso corpo de Anahi por inteiro. Que eram tão competentes com uma arma quanto para fazê-la gemer e suspirar com um esplêndido orgasmo. Mãos que eram armas. Recordou a dor profunda no rosto da mãe de Phil durante o funeral. Seu único consolo era o de que ninguém ficaria tão arrasado se ele próprio acabasse parando num caixão coberto por uma bandeira. A mãe era a única pessoa da família que tinha e, num caso desses, ela provavelmente não ficaria sóbria o bastante para comparecer. Era melhor desse jeito. Era melhor não se envolver com ninguém. Não pedir a ninguém que corresse o risco de se afeiçoar, de acabar tendo de enfrentar a dor. Era mais fácil.
