Encaminhou-se até a sala de estar que ainda não tinha um ar familiar e deu-se conta da tensão que se formou em seus ombros. Ele estava sentado junto à mesa de jantar, lendo o jornal com os pés descalços apoiados numa cadeira. Bem, se estava descalço, não se preparara para sair correndo a qualquer momento, certo?
– Olá. – Alfonso dobrou o jornal e sorriu. Foi amistoso o bastante, mas, de repente, Anahi sentiu-se como se tivesse voltado para debaixo da água fria do chuveiro.
– Achei que deveria deixar você dormir um pouco. Deve estar fatigada.
– É muita gentileza sua. – Ela fechou melhor o cinto do robe de seda e se adiantou mais pela sala. Devia beijá-lo? Agir de maneira casual? Não soube ao certo.
– Mas você também não dormiu muito. Não está cansado?
– Estou acostumado a dormir pouco. Por causa do trabalho? Por não gostar de dormir? – Por quê? Alfonso levantou-se e deu de ombros com um sorriso antes de estreitá-la em seus braços.
– Bom dia – murmurou e, então, beijou-a nos lábios. Anahi se esqueceu por completo da sua pergunta. Droga, se esqueceu até do próprio nome naqueles momentos em que ele entrelaçou a língua com a sua numa voluptuosa cadência.
– Está com fome? – perguntou-lhe ele, enfim, de encontro aos lábios.
– Com fome?
– Sim. Estou faminto. Achei melhor esperar para preparar algo para nós. Está pronta para comer?
– Hum, claro. – Ela permaneceu no lugar, um tanto confusa, enquanto ele lhe deu um beijo breve na ponta do nariz e, então, soltou-a para se encaminhar à cozinha ao lado. Seria ótimo fazerem uma refeição juntos, disse a si mesma seguindo-o, pois teriam a chance de partilhar também algum tempo que não estivesse ligado a sexo. Assim que a viu se aproximar, ele lhe fez um sinal para que voltasse.
– Vá se sentar e relaxe. Leia o jornal. Eu cuido disto. Um homem que cozinhava e não esperava ajuda? Ora, ora... Surpresa demais para protestar, Anahi girou nos calcanhares e foi se sentar no sofá da sala anexa. Continuou sem palavras. Ele a havia mandado embora da própria cozinha. Para cozinhar para ela. Devia estar irritada, ou eufórica? Para uma mulher que se orgulhava de suas habilidades na arte da comunicação, estava tendo grande dificuldade para saber como conversar com Alfonso no momento. Era evidente que o fato de não conseguir saber como se sentia em relação a cada pequena coisa não ajudava. Era melhor parar de se preocupar e apenas desfrutar a experiência, concluiu, enfim. Embora aqueles dois dias de puro erotismo, paixão e sexo ardente tivessem sido memoráveis, até os coelhos precisavam fazer uma pausa de tempos em tempos. Com os joelhos moles ao recordar o último tórrido idílio de ambos naquela noite, ajeitou o robe de seda melhor em torno de si e observou Alfonso preparar ovos mexidos do outro lado do balcão da cozinha. O que era mais sexy? Um homem na cozinha lhe preparando especialmente algo delicioso e nutritivo? Ou sua figura irresistível, apenas de jeans, com o botão aberto e descendo até a altura de seus quadris estreitos e bronzeados? Deus do céu... Anahi suspirou, apoiando o queixo na mão. O corpo do homem era a personificação da perfeição masculina. Músculos puros, sem um grama de gordura em lugar algum. Os ombros eram largos, a pele dourada sob o sol matinal que adentrava pela janela.
– Eu nem sequer sabia que havia ovos na geladeira – comentou, esforçando-se para despertar a mente de seu torpor sexual. Desviou o olhar do corpo tentador dele e pousou-o mais atentamente no balcão de divisão entre a cozinha e a sala. Uma garrafa de suco de laranja, um pacote de torradas, uma tigela com uvas, um pote de geleia.
– Você foi até o mercado?
– Apenas até o apartamento ao lado. Pedi algumas coisas emprestadas à sua vizinha. Com a frigideira na mão, ele se virou para olhá-la. Anahi sentiu sua pele se arrepiar por inteiro enquanto as ondas de calor sexual a percorriam mais uma vez.
– Desculpe. Eu deveria ter tido alguma coisa aqui para você comer. Um hóspede tendo de sair em busca de ingredientes para o seu café da manhã? Isso é negligenciar as normas da boa etiqueta. – Ela se sentiu culpada enquanto se levantou. Alfonso estreitou os olhos e, então, o brilho ardente os iluminou. Dando-se conta de repente que a frente do robe estava toda aberta, ajeitou-o com mãos trêmulas. A respiração e o pulso se aceleraram. Perdera a conta do número de orgasmos que haviam partilhado, da variedade de maneiras que haviam dado prazer um ao corpo do outro. Não deveria estar reagindo desse jeito. Ficando tão excitada tão facilmente. Não deveria saber mais a respeito dele antes de sentir tão mais do que desejo? Não deveriam ter passado muito mais tempo juntos, vestidos, antes de começar a desejar lhe proporcionar orgasmos durante o Halloween, o Natal e, oh, certamente, orgasmos no Dia dos Namorados?
– Gosto de cozinhar. Além do mais, você me deu o jantar ontem à noite. – Alfonso deu de ombros, ignorando o pedido de desculpas repleto de culpa que ela quase esquecera que fizera antes de mergulhar em seus devaneios e preocupações. Ele dividiu os ovos mexidos em dois pratos, acrescentou torradas e colocou-os no balcão. Anahi franziu a testa diante da ordem tácita – o homem era bom nisso –, mas pegou os pratos assim mesmo e colocou-os na mesa. Contornou o balcão para ir pegar os talheres, enquanto ele levava o suco, a geleia e as uvas para a mesa e sentava.
– Ontem, eu lhe servi fettuccine e legumes no vapor que tirei do freezer da geladeira e aqueci. – Riu ela, enquanto posicionava os talheres ao lado dos pratos. Puxou uma cadeira, mas, antes que pudesse sentar, Alfonso segurou-a pela cintura e acomodou-a em seu colo. Rindo, deliciada, Anahi abraçou-o pelo pescoço e virou a cabeça de lado. O cabelo ainda molhado causou uma sensação de frio contra a pele nua onde o robe de seda tornou a ficar aberto. Os olhos verdes de Alfonso escureceram até um tom de verde oliva, repletos de desejo. Ela conhecia aquela expressão agora. Sabia quais eram as promessas que continha. Alfonso era exigente na cama. No chuveiro. E no balcão da cozinha às 2h00 da manhã. Onde quer que fizessem amor, era como se ele tomasse completamente conta do próprio ser dela, extraísse cada gota de prazer que podia oferecer e encontrasse um meio de retribuir com ainda mais.
– Aposto que os ovos mexidos ficariam deliciosos se eu os comesse em cima do seu abdome – disse-lhe Alfonso ao ouvido, numa voz rouca, sedutora.
– Aquele fettuccine com queijo derretido estava irresistível desse jeito... Era o que acontecia quando uma mulher não tinha um estoque de calda de chocolate e chantilly disponível, pensou Anahi entre divertida e arrepiada com o timbre sedutor daquela voz e as lembranças tórridas de uma refeição erótica como nunca fizera antes. Quase deixou escapar que gostaria de estar com a despensa melhor preparada da vez seguinte, mas, felizmente, ele tomou seus lábios e a beijou demoradamente. Com volúpia e extrema habilidade. Anahi correspondeu com uma paixão que jamais se esgotava. Ao contrário, alastrava-se numa combustão instantânea e parecia cada vez mais intensa. Ele, enfim, interrompeu o beijo por um instante para arquear uma sobrancelha de maneira sugestiva na direção de seu prato na mesa. Anahi hesitou. De repente, não soube por que não queria. Levando em conta a intensidade de suas reações ao homem – e talvez por causa disso mesmo –, não soube onde encontrou forças para resistir, mas subitamente não sucumbir pareceu a coisa mais importante do mundo. Precisava de um pouco de distância, percebeu. Um pouco de espaço para compreender melhor aquele... O quê? Não era um relacionamento, era? Nem sequer sabia o sobrenome dele. O que fazia para viver. Não era que não tivessem conversado ao longo desses dois dias. A maior parte das palavras trocadas, porém, tivera mais a ver com erotismo do que qualquer outra coisa.
– Eu detestaria arruinar o sabor dos ovos mexidos com o gosto do meu sabonete líquido – declarou, soltando um ligeiro riso, como se aquilo tivesse sido uma piada em vez de uma óbvia desculpa. Alfonso não se queixou, porém, nem sequer insistiu no assunto. Apenas sorriu, deixou-a levantar de seu colo e pegou os talheres. Aguardou até que estivesse sentada na cadeira oposta para começar a comer. O homem era perfeito. Como isso era possível? Não era. Ela ajeitou-se melhor na cadeira e, quando os joelhos de ambos se roçaram, continuou a sentir aquela corrente eletrizante percorrendo-a.
– De onde você é? – perguntou após alguns momentos, depois
de sorver um gole de suco. Deu-se conta de repente de que, embora soubesse exatamente de quanta pressão Alfonso gostava que aplicasse quando o acariciava, do que precisava fazer para enlouquecê-lo de paixão, desconhecia praticamente tudo a seu respeito.
– Nasceu na Califórnia?
– Não. Nasci e cresci na Carolina do Sul, mas agora sou mais uma espécie de nômade. Anahi aguardou. Mas aquilo foi tudo. Ele não disse mais nada a respeito, não explicou. Apenas continuou fazendo a refeição. Mas como assim?
– Um nômade, hein? Isso significa que está apenas visitando a Califórnia, ou vai ficar aqui por uns tempos? Ele terminou os ovos mexidos e, então, lançou um olhar inquiridor ao prato dela, o que a levou a pegar obedientemente um pouco dos ovos mexidos com o garfo.
– Vou ficar aqui por uns tempos. Gosto do clima do Sul da Califórnia.
– E temos praias maravilhosas – comentou Anahi com um sorriso, lembrando-se de onde haviam se conhecido. E arrepiou-se um pouco ao relembrar que também tinham feito amor pela primeira vez numa praia. Alfonso não retribuiu o sorriso, contudo. Seus olhos ficaram sérios, sua expressão mudando repentinamente. Como se alguém tivesse fechado um livro abruptamente diante de seu rosto. A dor que ela percebera no bar do clube estava de volta ali, irradiando-se dele como algo quase palpável.