Uma vez que Margaret Portilla nascera em berço de ouro, sempre frequentara as altas rodas, organizando ou comparecendo a eventos dos mais entediantes. O único lado bom havia sido que, exceto por garantir que os filhos comparecessem e se comportassem adequadamente, o almirante e a esposa sempre tinham vivido ocupados demais para fazer alguma coisa exceto ignorá-los a noite inteira. Em se tratando dos pais, se acostumara a achar que era melhor ser ignorado. Mas havia esquecido como tudo isso era enfadonho.
– Esconda o tédio – sussurrou Michael. Graças aos saltos dela, o irmão teve apenas que se inclinar de leve em sua direção, de modo que seu comentário não foi notado por ninguém mais. O que foi providencial, pois a mãe de ambos fazia questão de seguir o protocolo, as normas da etiqueta impecável.
– Estou morrendo de tédio – sussurrou Anahi de volta, com os lábios mal se movendo por trás do sorriso congelado. Na verdade, o que mais a dominava era expectativa. Lançou um olhar ao relógio de pé ornamentado num canto à esquerda do pequeno palanque montado na imensa sala de estar dos pais e suspirou discretamente. Faltava apenas uma hora para a meia-noite. Isso se traduziria em alguns discursos entediantes, mais aclamações ostentosas ao brilhantismo do seu pai e a habitual resposta pomposa dele para encerrar as celebrações, qualquer que fosse dessa vez. Então, ela estaria livre. Para voltar para o seu apartamento e esperar Alfonso. Havia ficado tão agitada depois que ele saíra pela manhã que resolvera, enfim, abrir as suas caixas de mudança. Admitia que abrira a primeira à procura do seu babydoll favorito, uma peça sensual de renda preta e cetim vermelho. Mas, depois de algumas horas, havia transformado o quarto quase vazio e impessoal num oásis confortável. Um oásis que ficaria feliz em partilhar durante mais dois dias de êxtase sexual. A imagem de Alfonso surgiu em sua mente, os olhos verdes intensos, o corpo esplêndido acima do dela. Tão incrível... Tornou a suspirar, mas, dessa vez, uma onda suave de calor sensual envolveu-a como sempre acontecia quando pensava em ambos juntos, no prazer absoluto que encontravam um nos braços do outro. Mal podia esperar para tocá-lo outra vez. Para sentir o corpo dele fazendo parte do seu, ambos ondulando na mesma cadência erótica, febril. Para desfrutar o deleite de seus beijos ardorosos. Mas primeiro, antes de se permitir tudo isso, os dois se sentariam para uma conversa. Embora as coisas fossem maravilhosas entre eles, não faria mais sexo com um estranho. Àquela altura, conhecia o corpo de Alfonso tão bem quanto o seu próprio, mas não sabia de mais nada a seu respeito. Fatos eram fatos. Em termos emocionais, ele lhe era um completo desconhecido.
– Por que o dr. Certinho não está aqui para distrair você? Uma enxurrada de culpa, profunda e cortante, atravessou a névoa sexual em que Anahi estivera pairando. Não tinha motivos para se sentir mal. Não havia compromisso algum entre ela e Christopher, nem concreto, nem tampouco implícito. Era tolice sentir culpa. Apenas porque passara as duas noites anteriores praticamente numa maratona sexual com o homem mais passional e incrível que já conhecera em vez de telefonar para aquele que queria torná-la sua amada? Contraiu o rosto. Não. Não havia razão para culpa. A cotovelada leve e quase imperceptível de Michael lembrou-a de que aguardava uma resposta. Como não se encontrava exatamente no momento propício para falar sobre sua confusão emocional, Anahi deu de ombros e recorreu ao senso de humor.
– Está brincando? Trazer um acompanhante para um evento de família? – sussurrou em zombeteiro horror. – Isso jamais é uma boa ideia.
– Mas ajudaria você a decidir se quer ter um relacionamento com ele ou não – apontou o irmão. – Que outro jeito melhor de ver como o sujeito é de verdade do que fazê-lo enfrentar o nosso velho? Caso se intimide, você verá que é um fraco. Se fizer logo amizade, é um panaca. Ela deu de ombros. O único parâmetro que queria em relação a seu pai era o de que o homem com quem se envolvesse não fosse em nada parecido com aquele que a gerara. Exceto por isso, não se importava nem um pouco com seu comportamento diante do almirante. Estava prestes a pedir ao irmão que lhe desse cobertura, tão logo o brinde terminasse, a fim de poder ir embora, quando notou o gélido ar de reprovação no olhar da mãe. Cutucou Michael sutilmente, que endireitou os ombros de imediato, e ambos dirigiram os sorrisos falsos até o centro do palanque. O pai começou o discurso.
Anahi resolveu não pensar em mais nada por ora e sentiu parte da tensão se dissipar. Concentrou-se nas palavras, ouvindo o pai agradecer a uma lista de dignitários, oficiais e amigos políticos por seu apoio durante a carreira dele ao longo das quatro décadas anteriores. Inclinou-se na direção de Michael.
– Acha que vai nos incluir? – sussurrou.
– Não – murmurou o irmão de volta. – A única maneira de sermos citados num discurso será se ele falar sobre as lutas e desafios que teve de enfrentar.
– Tão logo isto acabar, irei embora.
– Não tão depressa. Lembre que fazemos parte da fila de recebimento dos cumprimentos. Terá de esperar e sorrir até que todos tenham feito sua veneração, ou seja, cumprimentado o nosso pai. Além do mais, acho que deve mesmo ficar – acrescentou Michael com um sorriso maroto. – Aposto que isso deixará a sua noite ainda melhor.
– Tenho certeza de que ficará. Tão logo saísse dali e pudesse ver Alfonso. Olhou sorrateiramente para o relógio de pé, vendo que já eram 23h30. Por que o pai não poderia ter feito um brinde derradeiro a toda sua glória passada num horário mais razoável, em vez de prolongar a festa ao máximo e obrigar todos a ficar ali até tão tarde? Ela olhou ao redor. Os convidados eram idosos, na maioria. Era provável que quisessem leite morno e a cama em vez de um discurso tedioso e champanhe. Observando a multidão, seu olhar passou rapidamente por um rosto em particular. Então, um alerta disparou em sua mente e seu olhar voltou tão depressa na mesma direção que ela deve ter perdido alguns cílios. Alfonso? Com a testa franzida, sacudiu a cabeça em negação. O que ele estava fazendo ali? Então, seu foco aumentou. Uma onda de horror a dominou, gelando-a por inteiro. Não! Seus olhar se alternou abruptamente entre o uniforme e as medalhas que faiscavam no peito dele e, então, observou-lhe o rosto e os homens à sua volta. Fuzileiros navais. O grupo de elite da Marinha americana. O homem que a enlouquecera de prazer, que a fizera até acalentar pensamentos sobre permanência e ansiar por um relacionamento, que a levara a querer brincar de casinha – nua – era a única coisa proibida a seu ver para ter um envolvimento com alguém. Ele era um militar… Um militar de elite que, até então, estivera sob o comando do pai dela. Como era possível que não tivesse enxergado os sinais? Por que Alfonso não lhe contara? E quando, afinal, esses discursos terminariam para que pudesse sair correndo dali?