Ai meu Deus, ai meu Deus, ai meu Deus! Ela perdeu o ritmo da música e se embaralhou nos próprios pés. Também precisou retirar algumas pétalas e mudar alguns compassos cedo demais para tentar encobrir sua falha.
Porque, naquele lampejo breve, quando a luz o atingiu bem em cheio, ela reconheceu o rosto, aqueles ombros, aquele cabelo.
Era Alfonso Herrera quem estava ao lado do bar. Alfonso era o mesmo estranho moreno e sombrio que tinha feito o sangue dela bombear nas veias, latejar entre as pernas, tanto na semana passada, quando ela o vira ali pela primeira vez, quando alguns instantes atrás, quando ela dera uma olhada nele outra vez.
O desgraçado. Será que ela nunca iria se livrar dele? Será que nenhum homem um dia iria fazê-la experimentar aquele sentimento louco/excitado/ávido toda vez que estivesse nas imediações? E o que, diabos, ele estava fazendo ali, afinal?
Pior… o que ele iria fazer se descobrisse que ela, a mulher que o havia expulsado da confeitaria dois dias atrás, era a Rosa Escarlate?
Com a mente dominada pelas ramificações da
presença de Alfonso, Anahi finalizou seu número. Assim que acabou, disparou para trás das cortinas e enfiou os braços em um roupão curto de seda que estava pendurado nos bastidores. Mal notando a presença dos membros da equipe, que imediatamente seguiram para rearrumar o palco para mais dançarinas típicas, ela desceu correndo a escadaria que dava para seu camarim particular.
Normalmente, todas as dançarinas dividiam um, e Anahi não era nenhuma diva que exigia um espaço particular. Porém, o dono do Leather and Lace insistira em lhe dar um cômodo particular, do tamanho de um armário de casacos, por levar muito a sério a proteção da identidade de Anahi. Uma vez que ele percebera o quanto o “mistério” em torno da Rosa Escarlate melhorava a reputação da boate, e trazia mais clientes, ele promovera a ela um camarim exclusivo.
Antes que ela pudesse entrar, ouviu a voz dele:
– Aí está você! Espere um segundo, quero que você conheça alguém.
Ela não estava em condições de conhecer ninguém, especialmente um dos primos de Harry ou um de seus velhos amigos de pescaria. Sempre havia alguém pronto para recorrer às velhas amizades ou relações de
parentesco para conhecer as dançarinas.
Vendo pelo lado positivo, Harry era tão protetor quanto um papai urso, e as apresentações nunca iam além daquele aperto de mão breve ou de um autógrafo
– a despeito do que alguns homens que ele trazia pareciam querer outra coisa.
Grudando-se a um sorriso impessoal por trás da máscara que ela ainda não tinha tirado, Anahi se virou.
– Este é Alfonso Herrera, Acabei de contratá-lo para reforçar nossa segurança.
Anahi desabou contra a parede. Se não estivesse lá, ela simplesmente teria caído sobre o piso de ladrilhos, mas felizmente o ombro pousou em um painel duro de madeira em vez disso e a manteve em posição vertical.
Era mais do que o coração dela aguentava. Percorreu seu corpo e pousou em algum lugar perto de seu estômago, que agora estava revirando de ansiedade.
– Esta é…
– Rosa – interrompeu ela rapidamente, cortando Harry antes que ele pudesse dizer seu nome verdadeiro. Ela pigarreou, buscando o tom rouco e sensual que sempre usava quando cumprimentava os fãs nos bastidores do Radio City. Aquele bem diferente da voz
que Alfonso tinha ouvido na confeitaria há dois dias.
– Prazer em conhecê-lo.
Ele estendeu a mão. Ela a segurou. O tempo não parou nem nada assim, e o piso não curvou sob os pés dela. Mas, droga, o toque dele era gostoso.
Ele tinha mãos grandes. Mãos fortes. Mãos competentes de um soldado. Elas eram capazes de força bruta. No entanto, igualmente capazes, ela sabia, de cuidados ternos. Como quando as mãos dele a ajudaram a colocar seu vestido horroroso de dama de honra no lugar, e então delicadamente a ergueram à pista de dança e de volta à valsa tantos anos atrás.
– O irmão de Alfonso, Joey Herrera, mandou-o para cá. Você se lembra dele, não lembra? Ele fez todo do trabalho no andar de cima. Você o conheceu no mês passado.
Sim, ela o havia conhecido… e tinha sido muito mais complicado do que este encontro com Alfonso, que quase não conseguia ver nada do rosto dela por causa da máscara. Ela mal teve tempo de se enfiar atrás de um biombo antes de ficar cara a cara com o irmão mais velho de Alfonso.
Agora ela precisava se perguntar… será que Joe a vira? Será que a reconhecera? E será que agora estava
bancando o senhor Protetor da Vizinhança ao enviar o irmão caçula para vigiar a garota que morava no quarteirão?
É possível.
Deus a poupasse dos homens italianos.
Uma vantagem: ele não havia contado para Tony. Porque de jeito nenhum seu cunhado superprotetor iria deixar de discutir sobre o novo emprego de Anahi. Ele iria até ela com um sermão de irmão mais velho sobre como ela simplesmente precisava desistir agora, imediatamente, se não o quanto antes. Ou isso ou contaria a Maite, que teria um colapso escandaloso sobre o que os vizinhos e seus rapazes doces e influenciáveis, pequenos maníacos selvagens, na opinião de Anahi, iriam pensar.
– Harry, ajude! Tem um diretor de empresa à porta dizendo que tinha reserva para dez pessoas – berrou uma voz desvairada, do topo das escadarias. A recepcionista que ficava no balcão de entrada desceu três degraus ruidosamente e o viu, o alívio evidente no rosto dela.
– Você precisa subir aqui.
Resmungando, Harry deu de ombros para Alfonso como se pedisse desculpas.
– Perdão. Nunca falha. É o seguinte, por que você
não conversa com a… Rosa… e pega uma ideia de como é a rotina e agenda das dançarinas, e então me encontra lá em cima em meia hora?