QUANDO Alfonso percebeu que havia buracos nos bombons, ficou vermelho. Mas o rubor nada tinha a ver com o reflexo do recheio de cereja dos doces, e sim com a raiva que sentia.
Ele precisava saber mais, especialmente depois do que Jackie lhe dissera sobre algumas flores que Anahi havia repassado a Leah no fim de semana anterior. Mas ele não queria fazer aquilo ali.
– A polícia está a caminho – murmurou ele para Harry. Então, sem dizer nada, agarrou o cotovelo de Anahi e a tirou do camarim, seguindo diretamente para o camarim particular dela.
Ela saiu tropeçando e ele percebeu que talvez a estivesse apertando demais. Mas não podia soltar; não conseguia relaxar o aperto. Ele não iria permitir que ela se afastasse mais do que 15 centímetros dele… ou que qualquer um se aproximasse a menos de 15 centímetros dela.
– Alfonso, acalme-se – murmurou ela.
– Estou calmo. – Mortalmente calmo.
– Não, não está. Você está explodindo – disse ela, assim que adentraram o camarim.
Alfonso fechou e trancou a porta. A última vez que havia trancado a porta daquele cômodo havia sido o início de uma das experiências sexuais mais fantásticas que ele já experimentara. Realmente gostaria de estar trancando a porta pelo mesmo motivo agora.
Mas não estava. Estava trancando a porta para manter Anahi, a mulher que ele agora sabia que amava, a salvo de alguém que havia tentado feri-la pelos menos duas vezes até então. Talvez até mesmo mais.
Olhando para baixo, ele viu a cadeira nova diante da bancada de Anahi e ficou nervoso outra vez. Ele se inclinou e a golpeou com a palma da mão, fazendo-a colidir contra a parede. Ela não desabou.
Mas também não abrandou a suspeita dele a respeito da cadeira anterior.
– Por que você fez isso? – perguntou ela, a voz calma e equilibrada.
Que bom que um deles estava calmo.
– Só estou me certificando de que nosso amigo não sabotou outra cadeira.
Os belos lábios de Anahi se abriram formando um
“O” perfeito como se a compreensão a tivesse atingido. Aquilo, mais do que qualquer coisa, parecia finalmente dar sentido à situação. Ela agarrou a beirada da mesa e cedeu de encontro a ela.
– Alguém está realmente tentando me ferir?
Ele se aproximou e passou os braços em torno dos ombros dela, puxando-a para si.
– Acho que sim, querida.
– Por quê?
– Não faço ideia. Por que assediadores fazem as bobagens que fazem?
Jogando a cabeça para trás para olhar para ele, ela murmurou:
– Assediador? Por que alguém iria querer se aproximar de mim apenas para fazer algo estúpido como me deixar doente?
Ele tinha algumas respostas. Havia muitos homens lá fora que gostavam de bancar os heróis. Talvez alguém estivesse armando para Anahi passar mal ou cair apenas para se aproximar dela como aquele que viera em seu socorro. Quem poderia saber como algumas mentes sombrias e deturpadas funcionavam?
– Talvez alguém tivesse esperanças de que você desmaiasse no palco, para que ele pudesse dizer ser
médico e vir em seu socorro.
Ela bufou impacientemente.
– Isso é tolice.
– Mas não é impossível – insistiu ele. – Aquelas flores que chegaram na semana passada… Jackie disse que eram para você, mas você as deu para Leah?
Semicerrando os olhos, ela assentiu.
– Você acha que elas têm algo a ver com isso? Aquilo parecia incrivelmente óbvio para Alfonso.
– Você ganha alguns presentes anônimos e a pessoa que termina com eles fica doente.
Ela descobriu rapidamente onde ele queria chegar.
– Harry disse que Leah estava doente no domingo passado…
– E Jackie também. Elas dividem um camarim e ambas cheiraram e tocaram as flores quando as colocaram em um vaso.
Anahi balançou a cabeça, obviamente sem querer acreditar naquilo. Ele não a culpava. Não podia ser fácil para ela pensar que alguém estava mirando nela.
Porque pensar naquilo o estava matando totalmente.
– E você acha que havia algo nas rosas…
– Poderia ter sido inseticida, veneno para baratas, qualquer coisa. As duas ficaram tontas e enjoadas, e
foram para casa com dores de cabeça terríveis.
Alfonso não sabia muita coisa sobre exposição a pesticidas domésticos comuns, mas com certeza conhecia a utilização de armas químicas no meio militar. Havia sido treinado para lidar com todos os tipos de ataques químicos e imaginava que os sintomas mais básicos seriam semelhantes.
Anahi finalmente deixou os braços dele, o rosto adorável tenso e cansado. Ela abriu a boca e balançou a cabeça, parecendo quase… magoada… por alguém estar atrás dela.
Mas a mágoa não durou muito. Assim que ela olhou para a cadeira substituta, franziu ainda mais a testa e estreitou os olhos. Alfonso notou o cerrar do maxilar dela e soube que ela estava ficando brava.
– Que desgraçado covarde! – Ela bateu a mão espalmada contra o tampo da bancada, murmurando mais alguns palavrões. – Você vai descobrir quem fez isso, Alfonso.
Ele gostou do retorno daquela ferocidade. Anahi não deixaria nada abatê-la por muito tempo… era uma das coisas que ele amava nela. E ele planejava lhe dizer isso assim que eles chegassem a toda aquela coisa do “eu amo você” e “eu também”, o que aconteceria em
breve, se tudo acontecesse do jeito que ele desejava. Muito em breve.
– Pretendo descobrir. Vamos começar questionando todo mundo para ver se alguém percebeu a presença de seu admirador secreto por aqui.
Embora não tivesse dito a ela, Alfonso também pretendia observar a equipe cautelosamente quando conversasse com todos. Não era impossível que alguém que trabalhava ali na Leather and Lace estivesse por trás dos ataques. Um atendente de bar obcecado, uma dançarina ciumenta que almejava o posto de estrela de Anahi. Talvez até mesmo um segurança desejando se tornar herói. Diabos, talvez até mesmo Harry querendo incitar uma reportagem para trazer publicidade à boate. Ele conseguia até enxergar a manchete: “Dançarina misteriosa mais quente de Chicago é perseguida por atacante desconhecido”.
Era possível. Qualquer coisa era possível.
– Vou ficar de olho na multidão esta noite e ver se alguém age de forma suspeita, ou se reconheço alguns dos sujeitos que costumam vir em todas as noites que estou trabalhando. – Olhando para o relógio de pulso, ela acrescentou: – Preciso me apressar.
Aquele comentário afastou tudo o mais da mente
dele. Alfonso balançou a cabeça veementemente.
– Você não vai subir no palco esta noite.
Ela ergueu a máscara, virando-se para o espelho.
– É claro que vou.
Alfonso encarou o olhar dela no reflexo.
– O diabo que vai.
– O diabo é o que você vai encontrar aqui se me obrigar a fazer desse jeito – rebateu ela. – Porque se você disser isso outra vez vamos ter uma briga daquelas.
Alfonso não conseguia acreditar. Ela havia acabado de descobrir que alguém provavelmente tentara envenená- la e, ainda assim, queria dançar.
– Anahi você não pode estar falando sério.
– Ah, pode apostar que estou. Já estamos com uma garota a menos por causa de Leah e eu deixei Harry em apuros no último fim de semana. – Com os olhos brilhando, ela acrescentou: – Além disso, ninguém vai me obrigar a descer do palco.
A expressão dela traiu sua determinação pura tanto quanto suas palavras. E ele teve de se perguntar se havia duplo sentido ali.
Porque, apesar de tudo que havia acontecido no início daquela noite, ele não tinha se esquecido do que
eles estavam falando antes de Leah passar mal. Ela basicamente perguntara a ele se ele iria assisti-la dançar, e ele se esquivara da resposta. Alfonso não deixara de notar o brilho nos olhos dela ou a decepção que lhe fazia contorcer a boca. Mas ele não tinha sido capaz de tranquilizá-la porque até mesmo ele não sabia como iria reagir quando o momento chegasse.
– É perigoso demais.
– Há quatro seguranças robustos e enormes lá em cima para assegurar que nada aconteça – insistiu ela. Perfurando-o com o olhar, ela acrescentou: – Além disso, você vai estar lá para me proteger. Ou não vai? Talvez haja algo mais importante para resolver na hora.
Alfonso agora tinha certeza de que ela estava se referindo à conversa que haviam tido mais cedo. E talvez ela tivesse o direito de fazê-lo.
Mas demorar um pouco para desejar ver a mulher que ele amava ficar nua diante de um monte de outros caras não tinha absolutamente nada a ver com a preocupação dele com ela agora.
– Não é isso.
– Ah, sim, é. – Anahi deu a volta no biombo. Considerando que não oferecia qualquer privacidade por causa do espelho, aquela atitude era uma
declaração.
Uma declaração franca… de que as barreiras estavam subindo entre eles.
– E, honestamente, estou cansada de perguntar a respeito. Você pode assistir ou não, mas a Rosa Escarlate vai dançar esta noite.
Ela arrancou o roupão então, vendo-o observá-la, e jogou o sutiã e a calcinha no chão.
– Droga – murmurou ele, como sempre incapaz de tirar os olhos vorazes dela. Ela era tão incrivelmente linda. A mulher fazia o coração de Alfonso parar toda vez que ele olhava para ela.
Anahi continuou a ignorá-lo, pegando a calcinha fio- dental e a vestindo. Então cobriu os mamilos franzidos e sombreados com aquelas duas pétalas cor-de-rosa ridículas.
– Não faça isso – pediu ele com a voz apertada, rouca. – Não até sabermos que você está em segurança. – Quando ela saiu de trás do bimbo e ergueu o queixo em desafio, ele acrescentou: – Você não precisa ir lá.
– É meu trabalho.
– É algo que você faz por meio período por diversão e para esfregar na cara da sua família e do mundo que
você não é mais a doce e pequena Anahi Portilla – disse ele, frustrado além da razão pela recusa estoica dela em ouvir os motivos dele.
Ela pareceu chocada com a acusação dele.
– Como você pode dizer isso? Minha família nem mesmo sabe que estou aqui.
– Eu sei, e isso prova meu argumento. Você mantém s ua diversão secreta fora dela sem nem mesmo ter de encarar as consequências. Você não está sendo honesta com ninguém, nem mesmo com você mesma, sobre o motivo de estar fazendo isso e sobre o que você realmente deseja.
Ela deu um solavanco, como se ele a tivesse estapeado. Fechando os olhos e balançando a cabeça, Alfonso se perguntou como havia deixado aquela conversa rumar para fora de controle tão rapidamente.
– Você certamente pode falar com muita propriedade
– disse ela finalmente, seu tom gélido.
– O quê?
– Você me acusa disso, mas está fazendo exatamente a mesma coisa, Alfonso Herrera. Enganando sua família com essa ideia de que você vai ficar cantando “O sole mio” e ficar jogando pizzas para cima com Tony e seu pai. Enquanto isso, você esconde suas funções noturnas
fazendo algo empolgante e perigoso em um lugar que eles nunca aprovariam. Eu chamo isso de hipocrisia.
Ele não conseguia acreditar que ela havia virado as acusações para ele assim.
– Isso é ridículo.
– Então por que você não disse ao Tony que não vai ficar com eles? Por que não contou ao seu pai sobre essa “empresa de segurança” que está pensando em abrir com seus colegas fuzileiros?
Deixe a cargo de uma mulher utilizar como recurso algo que você contou a ela há menos de um dia durante uma briga.
– Isso não tem nada a ver com o fato de você ir para o palco e se exibir diante de alguém que quer ferir você. – Mas, mesmo quando Alfonso disse aquilo, uma vozinha na cabeça dele sussurrou que ela poderia estar certa. Pelo menos um pouco.
Não que ele fosse admiti-lo agora… não quando ainda precisava resolver a questão da segurança física de Anahi Então ele pressionou:
– Eu não estou no palco tirando as roupas intencionalmente para tentar excitar uma centena de estranhos… um dos quais pode estar tentando me envenenar.
Ela enrijeceu perante o alarde. Assim que ele terminou de falar, o rosto de Anahi estava vermelho feito a máscara dela.
– Bem, é isso, não é? Finalmente chegamos ao ponto.
– Anahi......
Ela ergueu uma das mãos para interrompê-lo.
– Eu sabia que teria origem nisso, e agora aconteceu. Você precisa sair. Eu vou subir no palco esta noite. Quando voltar, espero que haja uma tranca nova na minha porta, para minha proteção. – O queixo e os lábios fartos dela estremeceram. Mas havia uma última coisa a dizer: – E você definitivamente não vai ter a chave dela.