Fanfic: Pode beijar a noiva(adaptada) | Tema: Vondy

Dulce estremeceu. Ela só podia encarar Christopher... seu marido, lembrou-se. Então ele era seu marido.

Mas não realmente. Foi um tanto difícil lembrar-se disso quando ela fitou-lhe o rosto e viu a boca que se pressionara na sua com tanto desejo. Quem poderia supor que Christopher soubesse beijar tão bem? Para ele nunca faltara companhia feminina, mas Dulce sempre creditara isso à sua bela aparência, e sobretudo à sua bela conta bancária. Como poderia ter adivinhado que atrás desse aspecto sereno e atraente batia o coração de um amante tão ardoroso?

Ou talvez ela só sentisse isso porque era, como Alfonso costumava dizer, fisicamente efusiva por natureza.

Lentamente, as palavras que aqueles lábios – que tinham sido capazes de evocar uma resposta tão chocante quando pressionados contra os seus – começaram a tomar forma na mente de Dulce. Ir para Londres. Christopher queria que ela fosse para Londres.

Com ele.

Amanhã.

– De modo algum. – Dulce foi categórica.

Roberts, perto do fogo, parou com a colher no ar antes de mexer o conteúdo da caçarola. Do outro lado da mesa, Christopher arqueou uma sobrancelha.

– Dulce – Christopher ponderou com calma. – Se pensar nisso racionalmente, verá que é, na verdade, o mais sensato a fazer.

– E quem cuidará da educação das crianças enquanto eu estiver fora? – Dulce não sabia se o vinho servira para clarear sua mente ou se o choque inicial de encontrar a cabana limpa estava sumindo. E de repente voltou a seu normal.

O que ela não podia determinar era o que, precisamente, Christopher pretendia.

– Sei como você se sente a respeito de suas crianças, como você diz – Christopher falou com paciência. – Por isso sugiro contratar um professor de verdade enquanto você estiver fora.

– Isso pode levar meses – Dulce disse. – Quando o antigo professor morreu, não tínhamos ninguém para substituí-lo. Faires não é um local popular para acadêmicos qualificados. Eu não poderei sair enquanto não acharmos alguém adequado.

Dulce sentia algo, embora não tivesse certeza, que se assemelhava a receio. Não era possível. Receio? Do quê? Não de Christopher, certamente. Nem de Londres.

Não, não se tratava de medo. Ela precisava pensar nas crianças. Elas precisavam dela e não tinham mais ninguém.

– Por favor, entenda – Dulce disse com certo desespero. – As crianças precisam daquela escola. Para muitos deles, é a única maneira de se sentirem valorizados.

– Estou ciente disso – Christopher afirmou. – Por isso Roberts ofereceu-se para tomar o comando até que achemos um substituto.

Roberts deixou cair a colher, única indicação de que talvez a declaração de seu senhor houvesse sido uma surpresa para ele.

– Seria um prazer para mim, milady – ele murmurou e foi à procura de outra colher.

Atordoada, Dulce afundou na cadeira. Agora não havia como negar. Estava apavorada. E não pelas crianças. Christopher tinha ideia do que estava lhe pedindo? Voltar para Londres? Ele possivelmente não sabia o que estava dizendo.

Ou sabia? Seria aquela uma parte da mudança que se operara nesse novo Christopher que nutrira o súbito desejo de conciliar as coisas para ela? De certo.

Mas, se o plano de ajudá-la incluía uma reunião com a família, ele podia esquecer. Dulce não permitiria tal coisa.

Quando ela e Alfonso deixaram Londres um ano antes, ficara entendido que, abandonados por suas famílias, não poderiam jamais retornar. Ou, pelo menos, Dulce jurara que não voltaria até provar que as predições medonhas de seus tios acerca de seu casamento não haviam se concretizado. Quando retornasse a Londres, seria como uma esposa realizada de um ministro ordenado... e ela planejara ter meia dúzia de filhos para provar como ela e Alfonso tinham uma vida feliz.

Porém ela teria de voltar como a viúva de um cura e, pior, uma viúva sem filhos. E muito pior, uma viúva sem filhos que se casara com o primo de seu marido... o primo rico, socialmente superior, o tipo de homem que sua família queria para ela. O tipo de homem com quem Dulce nunca pensaria em se casar; insistia em um matrimônio apenas por amor e somente com um homem que partilhasse de sua determinação em fazer do mundo um lugar melhor para os menos favorecidos.

O que certamente não explicaria a seus amigos e parentes a razão de ter-se casado com Christopher. Mesmo se contasse que fizera isso apenas para pegar o dinheiro que lhe era devido – e que tinha intenção de destiná-lo a obras de caridade –, todos haveriam de querer saber de onde viera o dinheiro e por que o assassino de Alfonso sentira necessidade de deixar-lhe a herança. O que levaria a questões desconfortáveis sobre o motivo do assassinato de Alfonso.

E Dulce certamente não queria discutir aquilo com qualquer pessoa.

– Oh! – ela gritou ao pensar nisso. – Oh, Christopher, eu não posso! Não posso voltar a Londres. Isso seria terrível.

O conde de Denham pareceu adivinhar o que Dulce diria, pois articulou uma resposta rapidamente.

– Dulce, eu não posso ficar aqui. Tenho negócios urgentes para tratar em Londres.

Dulce pestanejou. Assuntos de negócios. Claro que Christopher precisava voltar para Londres. Ele viera a Faires para desenterrar o primo. Como Dulce rebatera o objetivo, por que ele ficaria?

Por quê?

– Então sem dúvida é preciso ir – Dulce respondeu, sentindo um súbito desalento.

Era um absurdo que ela se sentisse tão desapontada. Era muito bom que Christopher fosse embora! Assim não precisaria preocupar-se de ele ficar sabendo a verdade sobre aquela noite pavorosa em que Alfonso morrera...

E mais, se Christopher partisse, ela não precisaria mais olhar aquela boca e lembrar-se do beijo no castelo de lorde MacCreigh, nem ficar imaginando, se ele a beijasse uma segunda vez, se teria a mesma reação...

Seria bem melhor assim. Christopher voltaria para Londres e Dulce voltaria... a ficar sozinha.

Antes ficar sozinha do que ele descobrir a verdade, o que sucederia se ele ficasse em Faires.

– Não se preocupe comigo – disse Dulce com toda coragem que conseguiu reunir quando Christopher hesitou na resposta. – Ficarei bem.

– Não seja ridícula, Dulce. – Christopher pareceu se recuperar da surpresa pela ansiedade de Dulce em ver-se livre dele. – Minha esposa, mesmo em uma união temporária, não viverá sozinha. Você voltará comigo para Londres e não quero mais ouvir falar sobre isso.

– Mas... – O receio de Dulce tornou-se mais palpável. Voltar com Christopher para Londres? Isso significaria horas sozinha com ele em uma carruagem... e pior, noites em estalagens aconchegantes ao longo do caminho. Quem poderia dizer quanto tempo demoraria antes que sua curiosidade sobre o que ocorrera durante o beijo a fizesse tentar nova experiência?

– Além disso – Christopher continuou, como se ela não houvesse falado – se você ficasse aqui, o juiz Reardon acabaria notando que nós dois... não estamos vivendo como marido e mulher. E não acho que ele aprovará. Ele pode até...

– Não liberar o dinheiro – Dulce terminou por ele, em voz suave. Christopher estava certo. Era esse o tipo de coisa que o juiz Reardon faria. – Mas, Christopher, onde ficarei em Londres? Minha família... tenho receio que minha família possa... Da maneira como parti...

– Entendo que sua relação com seus tios esteja estremecida. – Christopher não mencionou a participação dele no caso, o que Dulce não pôde deixar de notar. – E depois de pensar no assunto, acho que, nessas circunstâncias, será melhor morarmos na minha casa em Park Lane...

– Com lady Denham? Oh, Christopher, não! Eu não suportaria isso!

Lorde Denham pareceu surpreso.

– Minha mãe é uma ogra para você? Pensei que as duas se dessem bem.

– Mas é justamente por isso – Dulce comentou. – Lady Denham sempre foi muito bondosa para mim. – Dulce supunha que fora até mais bondosa do que ela merecera. Afinal, ela fizera muito pouco para convencer Alfonso, sobrinho da viúva, a não assumir tal risco e não se mudar para os confins das Hébridas. – Eu odiaria que ela se decepcionasse sobre a natureza de nossa...