Fanfic: Pode beijar a noiva(adaptada) | Tema: Vondy

Não havia necessidade – Dulce argumentou, sentando-se diante da penteadeira – de atingi-lo com tanta força.

 – Ele a estava ameaçando – Christopher discordou. – O que eu poderia pensar além de que você estava sendo atacada?

 – Por lorde MacCreigh? – Dulce sacudiu a cabeça. – No jantar dançante dos Cartwright?

 – A suposição era razoável – Christopher contestou. – Afinal, dizem que ele fez coisas piores.

 – Lorde MacCreigh estava apenas preocupado. – Dulce começou a retirar os grampos do penteado. – Ele recebeu algumas notícias ruins.

 – E como eu poderia adivinhar? Vi Geoffrey Bain, um homem que desejava casar-se com você, comportando-se de maneira ameaçadora. E o que – Christopher, em pé com o cotovelo no consolo da lareira, observou a esposa e tentou ignorar o latejar da mão direita – ele ficou sabendo que o deixou tão transtornado?

 Dulce fitou de viés o reflexo de Christopher no espelho de moldura dourada defronte a ela e desviou rapidamente o olhar.

 – Ele pensou ter visto Clara. – Dulce pegou a escova e segurou-a com força.

 Christopher arqueou as sobrancelhas.

 – Clara, a noiva dele?

 – Sim. – Dulce manteve o olhar nas cerdas de crina de cavalo da escova.

 Christopher se movimentou com impaciência.

 – Como isso é possível? Ele a matou porque ela fugiria com o criado dele. Não foi?

 – Não – Dulce negou. – O assassinato de Clara é uma história forjada que se alastrou com boatos e conjecturas.

 – Verdade? – Christopher arqueou as sobrancelhas. Na realidade, ele não estava muito interessado em investigar os problemas românticos de Geoffrey Bain. Queria falar sobre os próprios. Mas não achou Dulce muito inclinada a discutir alguma coisa sobre eles naquele momento.

 Ele não a culpava. Lembrava-se da maneira como ela reagiu quando a viúva mencionara o túmulo de Alfonso. Devia ter pensado em advertir a mãe sobre o assunto antes. No entanto, tanta coisa acontecera desde a chegada deles a Londres que o motivo real que o levara a Faires nem fora ventilado...

Maldito erro! Era evidente que a morte de Alfonso ainda era uma lembrança dolorosa para Dulce.

Dulce estava sentada de cabeça baixa, segurando o cabo de prata da escova. Em algum lugar da casa, um relógio soou as horas. Ainda era cedo. Eles haviam saído da casa dos Cartwright logo depois da discussão de Christopher com MacCreigh, sem despedir-se de ninguém. Até a viúva ignorava o que acontecera no corredor e ainda estava no baile. Quando Christopher deixou o barão, MacCreigh buscara consolo nos braços de Maite, que os encontrara por acaso. Ficou horrorizada e oferecera solidariedade; na opinião de Christopher, à pessoa errada.

 E quanto se pode pedir que um homem suporte? Não era apenas com o fantasma do primeiro marido de Dulce que Christopher teria de lutar, mas também com os barões ruivos?

 – Então era Clara que MacCreigh viu?

 – Não era – Dulce respondeu com suavidade, sem olhar para o marido. – Clara está morta.

 – Mas você não acabou de dizer... – Christopher espantou-se.

 – Lorde MacCreigh não a matou. Ela morreu de tifo.

 – Mas por que então todos... – Christopher parecia confuso.

 – Porque eu nunca revelei a ninguém – Dulce mantinha o olhar na escova que estava em seu colo – o que realmente aconteceu com Clara. Ela implorou que eu jurasse não contar... mas agora, acho que preciso... Ah, Christopher. – Ela olhou para cima com lágrimas nos olhos. – É sobre Alfonso e Clara.

Christopher fitou-a com intensidade. A última coisa que esperava ouvir é que havia uma conexão entre seu primo e a noiva de lorde MacCreigh. Era tão espantoso que por um momento ele pensou não ter ouvido direito.

 – Como disse?

 Dulce deixou a escova de lado.

 – Temos de falar sobre Alfonso. É maravilhoso que você nunca tenha me perguntado antes, mas acho que agora... devemos discutir isso.

 – Eu presumi – Christopher disse, desejando tomá-la nos braços e beijar a testa franzida de preocupação – que você não quisesse falar sobre Alfonso.

– Isso foi antes, mas agora eu quero. 

– Está bem. – Christopher afastou-se da lareira e pensou em chamar Burroughs. Naquela altura inferiu que precisaria de um uísque. Era possível que não tivesse coragem de encarar com fria sobriedade o que estava por vir. A noiva de MacCreigh e seu primo Alfonso? Aquilo era realmente impossível. Mas poderia... poderia... explicar algumas coisas. – Por favor, não permita que eu a interrompa.

 Dulce continuava sentada na banqueta da penteadeira, de cabeça baixa. Christopher notou que os olhos dela pareciam muito longe.

 – Ele foi morto. – O tom rouco da voz de Dulce, que tanto agradava a Christopher, tremeu.

 Ele entendeu que a revelação custaria a ela muito mais do que as dez mil libras.

 – Sei disso – ele falou com gentileza. – Por aquele sujeito chamado O’Malley.

 – Sim, mas eu não lhe contei o motivo. A epidemia de tifo estava no auge. – Dulce olhava as mãos. – A sra. O’Malley, assim a chamávamos por cortesia pois eles não eram casados, estava morrendo. Tom O’Malley veio chamar-nos porque o reverendo Peck estava em outra casa, que eu não me lembro onde era, e ele achava que era hora para os últimos sacramentos. O sr. O’Malley estava fora de si de tanto sofrimento. Embora ele e Ginnie, esse era o nome dela, nunca houvessem se casado, estavam juntos havia muitos anos e ele a amava, à sua maneira.

 Dulce suspirou.

– Ginnie... era uma mulher estranha. Quase nunca ia à igreja. Alfonso costumava pedir-lhe para assistir aos sermões com mais frequência, ou pelo menos permitir que o reverendo Peck fizesse o casamento deles. Ela apenas ria... bem, ela era mesmo esquisita. Ginnie amava muito a natureza e costumava atormentar Alfonso, questionando-o que se Deus havia criado a terra e tudo o que nela havia, por que as preces dela não podiam ser ouvidas em um prado de carneiros com a mesma clareza que em uma igreja?

 Dulce interrompeu-se e de repente fitou Christopher.

 – Quando chegamos à casa deles naquela noite, e eu também fui para ver se podia ajudar em alguma coisa, Ginnie não estava delirando. Estava morrendo, muito magra, grisalha e macilenta, mas a mente continuava afiada como de costume. Quando Alfonso chegou à parte de renunciar os pecados... ela disse que não o faria, porque não se lembrava de haver cometido nenhum pecado. Alfonso lembrou-a que a vida com o sr. O’Malley fora um pecado longo e contínuo, pois eles não eram casados, e ela apenas riu...

 Dulce parecia não perceber as lágrimas que deslizavam por seu rosto e caíam sobre as palmas das mãos viradas no colo.

 – Alfonso disse que, se ela não pedisse perdão pelos pecados, ele não poderia dar-lhe a absolvição. Ele começou... a guardar suas coisas. Alfonso estava muito cansado. Todos a quem conhecíamos tiveram morte na família. Foi... horrível. Ainda assim, ele deveria ter levado em consideração os sentimentos do sr. O’Malley. Ele deveria... mas não o fez. Quando o sr. O’Mal-ley viu que Alfonso realmente pretendia ir embora, ele... ele...

 Dulce se interrompeu. Christopher deu um passo à frente, ansioso para estancar, se pudesse, o fluxo daquelas lágrimas.

 – Dulce. – Ele tentou estendeu as mãos para segurar os ombros brancos e macios.

 Contudo, ela levantou a mão para evitar que ele o fizesse.

 – Não. – Dulce falou entre lágrimas. – Não. Eu preciso contar tudo. O sr. O’Malley atingiu-o com apenas um soco.