Fanfic: Pode beijar a noiva(adaptada) | Tema: Vondy

Alfonso bateu a cabeça no canto da lareira e... morreu na hora. Christopher, o pior de tudo foi eu ter ficado feliz quando o sr. O’Malley acertou Alfonso. – Ela deu um riso nervoso, ainda chorando. – De fato, fiquei contente porque eu gostava de Ginnie. Eu mesma tive vontade de bater em Alfonso por ele ser tão carola.

 Dulce parou de chorar. O rosto ainda estava molhado pelas lágrimas, mas seus olhos voltaram a ficar claros, assim como sua voz.

 – Não obstante, eu jamais quis que ele morresse. Foi... foi horrível. O sr. O’Malley entregou-se imediatamente. Era ele de fato quem precisava de ajuda. Ele não tinha mais motivo para continuar vivendo, pois Ginnie morrera alguns minutos depois de Alfonso. A sra. MacTavish e o filho e os MacEwans vieram e levaram-nos, a mim e a Alfonso, de volta para a cabana. No dia seguinte... eles me informaram que... não haviam encontrado um lugar para enterrar Alfonso. O sr. Peck disse que não havia nenhum pedaço de terra vago no cemitério da paróquia, exceto para enterros coletivos, por causa do grande número de mortos pelo tifo. Eu... eu não sabia o que fazer. Atordoada, não conseguia raciocinar. Eu só pensava em enterrar Alfonso em solo consagrado, mas...

 – Dulce – Christopher interrompeu-a e ela de novo levantou a mão para impedi-lo de falar.

 – Foi na noite seguinte à morte de Alfonso que ela voltou. – O olhar distante de Dulce fez Christopher supor que ela enxergava o que acontecera no passado. – Estou me referindo a Clara. Ela havia desaparecido fazia alguns meses. Eu sabia de seu paradeiro, porque ela confiara a mim. Éramos amigas. Ela foi... por muito tempo, minha única amiga na ilha. A vida com Alfonso... não era fácil, como se pode imaginar. Não tínhamos nada, exceto o que ganhávamos dos Peck. Eu... eu não estava muito preparada para a vida conjugal como imaginei que estivesse. Não, não diga nada. – Christopher fechou a boca. – Ser casada com Alfonso não foi... nada do que eu esperava.

 Dulce inspirou fundo e estremeceu.

 – Pelo menos eu contava com Clara. Ela foi amiga, quando eu mais precisava de uma. Foi ela que nos deu a porcelana de Limoges de presente. Clara estava em boa situação, mas seu pai sempre a protegeu demais. A coisa mais excitante que lhe aconteceu foi o período em que lorde MacCreigh começou a cortejá-la. E por certo ela aceitou quando ele a pediu em casamento. Qualquer coisa para sair do domínio do pai.

 Dulce suspirou.

 – O drama teve início quando ela chegou ao castelo MacCreigh. Clara conheceu Sean Stevens, criado do barão. Ele era muito bonito e charmoso, e acredito que ter uma noiva rica como Clara era tão interessante para ele como era para lorde MacCreigh. Eu prefiro pensar que o sr. Stevens gostava um pouco de Clara... Ela certamente o amava. Quando ele pediu para fugirem juntos, ela aceitou. Clara me contou o fato, mas me fez jurar que não diria a ninguém, nem mesmo a Alfonso, para onde ela tinha ido. Eles iam fugir, porque ela já estava grávida dele. Clara afirmou que, uma vez casados, voltariam para a casa do pai como marido e mulher.

 Christopher imaginou o que se seguiria antes de Dulce falar. Era uma história muito familiar.

 – Não ouvi falar dela até a noite subsequente em que Alfonso foi morto. Era uma noite de tempestade. Eu estava sentada na sala da frente da cabana... com o caixão dele. No dia seguinte eu o enterraria com ou sem a permissão do sr. Peck, em uma sepultura só para ele. Eu já havia falado com o sr. MacEwan e com o sr. Murphy e eles haviam prometido ajudar-me. Dulce tornou a inspirar fundo e a estremecer.

 – Ouvi uma batida na porta e fui abrir, pensando que fosse o sr. MacEwan ou a mãe dele que haviam vindo fazer-me companhia. E o que vi deixou-me pasma. Clara estava ali, ensopada até os ossos, pálida como a morte e com uma barriga enorme. Além de o parto estar próximo, ela estava com tifo. Eu soube no minuto em que a vi.

 – Dulce. – Christopher horrorizou-se. – Você não...

 – O que mais eu podia fazer? – Dulce fixou em Christopher o olhar marejado de lágrimas quentes. – Ela era minha única amiga. Claro que eu a fiz entrar. O canalha do sr. Stevens a abandonara. Clara ficara envergonhada de voltar para casa. Ela não disse como vivia, mas pude imaginar pelo estado de suas roupas. Eu a deitei na minha cama, a cama onde eu dormira com Alfonso. Ali ela teve o bebê... uma menina saudável com os cabelos escuros da mãe. Mas Clara... – Os olhos de Dulce escureceram de tristeza. – Ela sabia que não se recuperaria. Lutara muito tempo contra a doença, tentando manter-se viva para dar à luz o bebê. Muito debilitada, não conseguia lutar mais. Tudo o que ela queria e me pediu foi para encontrar um bom lar para a criança e jamais dizer a ninguém o que acontecera. Ela pensava que a verdade magoaria o pai e lorde MacCreigh. Duvido que jamais tenha lhe passado pela cabeça que as pessoas pensassem que lorde MacCreigh a matara.

 Christopher se acomodara na beira da cama, por não ter certeza de que poderia continuar em pé depois da revelação terrível de Dulce. Sentado, encarava Dulce com a mente girando.

– E a menina? – Christopher quis saber.

 – Ah. – Dulce animou-se um pouco. – Eu a embrulhei e levei-a até a casa dos Peck. Deixei-a na soleira, bati na porta e corri. Observei o que aconteceria do celeiro deles. O reverendo Peck abriu a porta e a encontrou. A sra. Peck levou-a para dentro. Ela estava desesperada para ter um filho e passou a considerar Olívia, como a chamaram, como se fosse sua filha. – Dulce sorriu com tristeza. – Sou a única que conhece a verdade. Os Peck não sabem disso nem imaginam quem era a mãe de Olívia.

 Christopher deu uma tossidela. Mesmo sem querer, sentiu que deveria fazer uma pergunta. Por fim a conexão entre seu primo e Clara McLellen estava se esclarecendo.

 – E o corpo dela, Dulce? – ele perguntou, gentil. – O que você fez com o corpo de Clara?

 Ansiosa, Dulce fitou-o de viés.

 – O que eu poderia fazer? Era inverno e o solo estava congelado. Eu não podia enterrá-la sozinha. – Dulce pareceu infeliz.

– Ela pedira tão pouco. Apenas minha palavra de honra para nada dizer, um lar para sua filha... e uma sepultura digna.

Christopher não pôde evitar sorrir e tentou conter-se, embora os cantos de sua boca se contraíssem. Dulce o fitou, como se sentisse ondas de agonia.

– Oh, Christopher, não ria. Foi horrível para mim, mas eu não tive escolha. Considerei que Alfonso não se importaria...

– De partilhar o caixão com uma mãe solteira? – Christopher não impediu mais o sorriso. – Eu diria que não. Murphy ou MacEwan suspeitaram?

Dulce não achou o assunto nada divertido.

 – Não. Pelo menos, eles não pareceram sentir o peso extra.

– Dulce. – Depois de uma história como essa era errado que seu coração pairasse nas alturas. Mas pairava. O verdadeiro motivo da relutância de Dulce em desenterrar o corpo de Alfonso era de fato um alívio para ele, depois de imaginar... que Dulce ainda amasse o primeiro marido e não suportasse saber que o repouso eterno dele seria perturbado.

 Christopher gostaria de cantar, mas isso não seria apropriado para as circunstâncias.

 – De fato, teria sido chocante para os agentes funerários encontrar dois corpos em um caixão onde deveria haver apenas um. Dulce, pelo amor de Deus, por que não me contou?

 – Prometi a Clara que nada diria e... também não foi uma maneira muito respeitosa de tratar Alfonso. Honestamente, pensei que provocaria sua ira, como no primeiro dia em que eu lhe contei...

 – Ah, aquele dia – Christopher disse, quando a voz dela extinguiu-se. – Sim, eu não estava em um de meus melhores dias.

 – Não. – Dulce pareceu surpresa. – Você – ela acabou com a formalidade – estava certo, mas não de bater em Alfonso. Aquilo foi um erro. Você tinha razão em tentar impedir-nos de fugir. Eu fiquei... muito revoltada com você na época e por muito tempo depois. Cheguei a odiá-lo por isso, mas talvez não pelas razões que eu imaginava. Entretanto, agora entendo que sua previsão estava correta. Se o houvéssemos escutado, Alfonso poderia estar vivo hoje.

 Christopher fitou-a com incredulidade.

 – Acha que fiz isso para o bem de Alfonso?

 Aquilo, mais do que qualquer coisa que ele houvesse dito naquela noite, pareceu calar no espírito de Dulce. Ela olhou para cima, piscou rapidamente, como quem acabava de acordar.

 – N... não foi? – ela gaguejou. – Pensei...