Fanfic: Pode beijar a noiva(adaptada) | Tema: Vondy

Lembrava-se muito bem dos olhos castanhos capazes de mexer com o coração de um homem, principalmente se começassem a lacrimejar...

Muito tarde, Christopher entendeu que seu alívio tivera vida curta. Lady Denham não teria sucesso na visita aos parentes de Dulce; a viúva de Alfonso não procurara conforto no seio de sua família pouco afetuosa. De modo algum. Havia permanecido em Faires e mandado a carta por algum escocês a caminho de Londres, em busca de outra forma de sobrevivência, pois as florestas de cores pardas haviam se extinguido.

De qualquer forma, Christopher teria de encará-la, assim como aqueles olhos castanhos e a animosidade que ela ainda sentia por ele.

Certamente, ele disse a si mesmo, Dulce não poderia continuar a nutrir aquele rancor. Dulce Saviñon sempre fora sincera, atraente, a pessoa mais calorosa e nobre que conhecera. Ela não poderia estar com raiva dele por algo que acontecera havia doze longos meses.

Ou poderia? Além de sincera e generosa, ela também tinha um traço de teimosia no temperamento, traço esse que, Christopher estava convencido, era responsável por todo o problema.

Naquele momento, olhando para ela sentada à sua frente na carruagem, era difícil saber como Dulce se sentia ao vê-lo de novo. Evidente que ela não ficara nada contente com o ocorrido na cabana. Christopher não podia culpá-la. Desde o momento que entrara naquela casa minúscula em que Dulce e Alfonso viveram juntos, tudo virara de pernas para o ar, até mesmo o aparelho de jantar de Limoges. Primeiro vira o que parecia ser uma bela mulher sendo molestada por um gigante camponês, depois tomou a atitude mais honrada que aprendera na vida, proteger o sexo frágil; para então descobrir que Dulce não precisava exatamente de proteção, tão pouco estava agradecida por seu empenho em salvá-la.

O agradecimento foram os machucados nos nós dos dedos que Christopher ganhou.

Ele não deveria ter ficado surpreso com essa reação, pois a franqueza era uma das muitas qualidades que Dulce possuía e que o irritava, mas que também o atraía. Bem diferente das demais senhoritas da sociedade cujas mães ansiosas sempre atiravam as filhas para ele.

Ele se supreendera também com o fato de ela o tratar com tanta indelicadeza mesmo depois de sofrer tamanha perda – ele não se referia à porcelana. Esperava lágrimas. E não foi assim.

Mas desde quando Dulce Saviñon - Herrera , ele se corrigiu com firmeza, Herrera! – fizera o que era esperado?

Ela não estava de luto. O vestido cinza que usava sob o manto era bem gasto, a renda dos punhos estava um tanto puída, as mangas bufantes estavam fora de moda. Não importava o que Dulce Herrera vestisse; um hábito de freira não esconderia sua beleza.

Christopher suspirou e olhou através dos vidros trincados do coche para a paisagem por onde passavam. Não podia imaginar por que alguém gostaria de viver tão próximo ao mar. A cabana de Alfonso ficava em um penhasco que certamente era coberto pela neblina todas as manhãs e bombardeado pelo sol, chuva e neve no restante do dia. Não se viam árvores. Christopher não podia conceber local menos acessível e mais desprotegido.

Nenhum sinal de sepultura. Como Christopher nada encontrara no cemitério nas cercanias da cidade de Faires, presumira que o jazigo estivesse em algum local daquele isolado penhasco. O reverendo Peck, para quem Alfonso trabalhava, não fora cooperativo. Dissera que tantas vidas tinham sido perdidas na epidemia de tifo, incluindo a de Alfonso, que seria impossível manter o registro de todos os sepultados. Quando os aldeões começaram a morrer a uma média de seis por dia, foram feitas valas comuns, embora Christopher tivesse quase certeza de que Dulce não permitiria que isso acontecesse com seu marido. Seria algo pelo qual poderia estar agradecido, pelo menos uma coisa a agradecer desde que embarcara nessa viagem.

A questão fundamental no momento era o que deveria ser feito, em nome de Deus? Nada decorrera como o planejado, já que seu plano fora elaborado nos poucos segundos que se passaram entre ver Dulce através do vidro trincado do carro fúnebre de Murphy e aproximar-se da porta da cabana. Chegara rapidamente à conclusão de que a missão de recuperar os restos mortais de Alfonso seria em vão.

Outra missão, bem mais importante, e muito mais premente, tomara o lugar da original. E Christopher estava decidido a não falhar nessa.

Dulce, sentada em frente ao conde, não padecia com batalhas interiores. Na verdade, ela começava a achar que afinal – depois de tanto tempo – as coisas começavam a melhorar. Não apenas ele não fizera qualquer pergunta – graças a Deus! – sobre a morte de Alfonso, como também a deixara sentar de frente para a estrada, ocupando o banco oposto. Ela odiava viajar de costas.

Não demorou para Dulce achar que sua sorte não duraria... principalmente quando as rodas do veículo afundaram em um buraco da estrada e o conde de Denham foi jogado para fora do assento. Por um instante perturbador, Dulce pensou que ele poderia cair em seu colo, embora não soubesse por que isso a perturbaria. Talvez por ele ser tão grande e seu peso, ao cair sobre ela, poderia machucá-la.