Fanfic: Aldeia da Lua Azul | Tema: Lobos, yaoi, lua, lemon
Capítulo 01:
Decisão
Os olhos verdes espiavam por entre as folhas enquanto o homem recolhia a lenha que havia acabado de cortar. Estava suado, com o peito nu a mostra e levemente sujo de carvão. Ele era alto e forte, com os cabelos revoltos moldados para cima. Poderia ser facilmente confundido com um dos lobos de sua vila.
Sempre, antes do sol se por ele ia para lá. Sentava-se próximo a um tronco de sequoia e começava a cortar toda aquela madeira em seu ritual diário, enquanto sem ao menos perceber, era vigiado por um pequeno lobo no alto da árvore mais antiga.
O coração do lobinho se entristecia quando o homem recolhia toda a lenha e sumia naquela imensidão de arvoredos, voltando apenas no outro dia. Já fazia tempos que se encontrava a bisbilhotar a vida daquele humano que o cativava tanto. Suspirou quando ele foi embora e apressou-se em descer pelos galhos grossos, dependurando-se com toda a agilidade de sua raça. Olhou uma vez mais para onde o humano seguira e correu de volta para a floresta, indo sentar-se na pedra branca a qual estava acostumado.
Observou o sol se transformar em um ponto alaranjado atrás das montanhas. Os cabelos pálidos e selvagens voavam delicados com a brisa de fim de tarde e enroscavam as flores que serviam com o propósito de enfeitar, mas que há muito já haviam perdido a finalidade.
O ser que ali se encontrava não dava muita atenção a beleza, se preocupava mais em desvendar os mistérios que rondavam aquele povo tão diferente e que diziam aos quatro cantos que odiavam os lobos.
O rosto fino e sujo exibia pontinhos marrons que para muitos poderia ser considerado um charme, sobressaídos na pele extremamente clara. A boca grossa formava um leve bico enquanto assoviava uma velha cantiga. Torceu o nariz quando sentiu o cheiro particular de um dos companheiros.
“Remi!”
Os olhos verdes se estreitaram ao ter o nome chamado com tanto desespero. Gostaria de poder passar mais tempo apreciando o silêncio e pensando melhor no que gostaria de fazer da vida.
Ledo engano.
Deveria saber que o faro do outro lobo não seria enganado, mesmo que ele tivesse tentado despistar com o casaco de pele de raposa que ganhara do beta da matilha.
“Até que enfim te encontrei.”
Um pequeno lobo de cabelos castanhos perfeitamente presos em uma trança de raiz surgiu na cena. Juri era um lupino da mesma matilha de Remi. Diferente deste, o outro lobo de pelagem escura apreciava ficar sozinho e era pouco comunicativo.
”O Alfa Cairon o proibiu de bisbilhotar os humanos.” Fez questão de lembrar ao amigo o que o líder falara durante a última reunião. “Ele está louco atrás de você juntamente com o seu tio!”
Tio. Floryan era o único parente vivo do pequeno Remi. Um lobo solitário que vivia em prol do sobrinho. A mãe havia morrido durante o parto e o pai, fora um varão desertado que abandonara a matilha quando o albino ainda era um filhote.
Remi encarou o horizonte com os verdes flamejando. Tinha como hobby ficar apreciando os humanos que viviam na comunidade próxima a aldeia da Lua Azul onde a matilha se encontrava. O acordo selado era não haver perturbações por ambas as partes.
Lobos não se envolviam com humanos e vice-versa. Estavam até mesmo proibidos de olharem um humano nos olhos. Quem quebrasse a regra seria desertado da matilha.
“Se você contar, Juri...” Iniciou a ameaça que pensara há dias no caso do amigo realmente decidir contar. “Eu digo a todos o que o Apollo da aldeia Deusa da Lua fez quando-“
“Não diga, Remi!” Suplicou o lobinho com o coração a pulos. “Não posso imaginar o que meu irmão faria se descobrisse...” Lembrava-se claramente do beijo desajeitado que recebera do outro lobo.
Remi voltou a encarar o amigo. Juri era o irmão mais jovem de uma ninhada de cinco filhotes e um deles era Ellion, o Beta da matilha que não desgrudava do irmão caçula. O esposo de Ellion, o doce Suya tentava sempre fazer com que este largasse de ser tão possessivo com o pequeno lobo, mas nada funcionava contra aquele temperamento difícil.
“Queria conversar com eles.” Desabafou aquilo que não poderia contar a mais ninguém. Um aperto incomodava o coraçãozinho do pequeno lobo. Humanos pareciam tão mais interessantes...
“Por Hécate, Rémi! Não diga um disparate desses!” Repreendeu o colega e pôs-se a olhar para os lados, temendo que alguém pudesse ter escutado. “Cairon tem ouvintes em todos os lugares.”
Era bem verdade que o Alfa tinha seus espiões em ambas as partes da floresta e tinha os olhos bem pregados naquele que era considerado a maior de todas as encrencas.
Remi era constantemente chamado a presença de Cairon para ser bronqueado e constantemente proibido de fazer alguma coisa.
Ultimamente havia sido proibido de chegar perto da comunidade dos humanos, mas ser proibido não queria dizer que ia obedecer.
“Vamos que já anoitece.” Alertou o amigo. “Ellion vai acabar brigando comigo...”
Por fim teve de concordar com Juri. Era melhor voltar e ouvir a bronca um pouco mais cedo.
Como esperado, Suya já estava aos prantos esperando pelos lobinhos desgarrados. O companheiro do beta era um homem de aparência delicada e longos cabelos negros que caiam pesados até abaixo da cintura. Estava usando a túnica de dormir, por isso, agarrou os dois lobos e os puxou para dentro da cabana luxuosa do Beta.
“O que foi que vocês fizeram?” Perguntou em tom baixo, mas desesperado. A mão delicada de garras longas tocava o ombro de cada um dos adolescentes. “Todos estão loucos atrás de vocês!” Falou preocupado olhando com constância para o portal de madeira trabalhada, esperando a presença imponente do marido irromper por aquela porta e começar com a gritaria.
“Por favor, Suya, não nos acuse!” Juri praticamente suplicou, agarrando-se as vestes de tecido leve do cunhado. “Nós só estávamos colhendo frutas e-“
“Não me tomem por tolo! Sei bem que não estavam colhendo fruta alguma.” Repreendeu os lobinhos, pousando as mãos na cintura. “O Alfa está vindo!” Anunciou o Beta agarrando os lobinhos de forma que chegava a sufocar.
Um homem grande e de semblante assustador atravessou a porta com os olhos em chamas e a respiração de um búfalo.
Cairon era um varão alto e de proporções fortes e rústicas, com cabelos ruivos e curtos quase raspados e uma barba de pelos grossos e vermelhos cobriam boa parte do rosto.
Juri fechou os olhos com força enquanto Remi continuou encarando os olhos castanhos do líder. Era conhecido também por ser audacioso e não ter rédeas na língua, falava sempre o que lhe vinha a cabeça.
“Suya, deixe-nos!” A voz grossa e autoritária quebrou o silêncio veloso que carregava o ambiente.
O Beta afagou o cabelo de ambos os lobos e desapareceu pela porta da cozinha, separada apenas por uma grossa cortina de pele vermelha, indo rezar as divindades Lupinas para que livrassem os pequenos de um castigo...
Cairon aproximou-se a passos pesados dos lobos menores e sentou-se em uma das grandes cadeiras de madeira que compunham a sala de reuniões daquela cabana. Pousou o olhar de líder sob os dois e suspirou, passando a mão pela barba russa que despontava do queixo largo.
“Não vou pedir para que se justifiquem, pois já estou cansado de tantas desculpas.” Começou, encarando especificamente o lobo albino. “O que vocês entendem pela frase ‘Não chegue perto dos Humanos?’” Ironizou enquanto buscava paciência para lidar com aquela situação.
Juri olhou para Remi e voltou a encarar o líder, mas desviou os olhos assim que o mesmo lhe retribuiu o olhar. Apertou as mãos na túnica azul que vestia e tomou coragem para responder a pergunta do Alfa.
“Quer dizer que não devemos nos aproximar deles em nenhum momento.” Agradeceu mentalmente por não ter gaguejado feito idiota e largou o tecido das vestes, iniciando o processo de desamassar o pano.
“E porque não devem se aproximar?” Indagou alto e imponente, mostrando quem realmente mandava ali.
Remi em nenhum momento retirou os olhos verdes de cima do Alfa. Mostrava claramente que não tinha medo algum daquele lobo exageradamente grande. Mantinha-se impassível, em sua melhor postura com a cabeça erguida e os dedos das mãos entrelaçados frente ao corpo.
Cairon dedicou um olhar mais atento ao lobo pequeno com as vestes encardidas de terra e até mesmo rasgadas em certas partes. Os cabelos revoltos e a pele muito pálida, davam a impressão de estar doente a dias. Pensava em quem iria querer se acasalar com um lobo desleixado e que só causava dores de cabeça, de qualquer forma, aquilo era problema de Gaia, o lobo casamenteiro, ele que movesse céus e terras para encontrar um bom marido para o lobinho aventureiro.
“Por que os humanos matam seus semelhantes e odeiam o povo da lua.” Mais uma vez Juri quebrou o silêncio para responder o líder.
Não era difícil expressar o ensinamento que os anciões passavam de geração em geração e o conselheiro escolar Meredith, também tinha a preocupação de passar adiante. O problema era que para Remi, manter-se longe dos humanos era praticamente impossível, visto que ele adorava tudo que envolvia aquele povo tão diferente.
“E porque teimam em desobedecer as regras de nosso clã?” Não evitou que o tom saísse mais alto e carrancudo do que deveria. Espalmou a mão forte na mesa redonda de madeira, controlando a força para não parti-la ao meio.
Juri instintivamente deu alguns passos para trás e agarrou o braço magro de Remi que permanecia de corpo presente, mas a alma deveria estar vagando há horas pelos arredores da floresta.
“Os estudos estão acabando.” Voltou a falar e dessa vez tinha um tom mais brando. “Sabem o que isso significa. Se não forem capazes de serem bons esposos, instruídos e obedientes estarão condenados a viver por ai, servindo de escória para os outros lobos!” Os olhos castanhos flamejavam. “Querem ser a escória de seu povo?”
Os olhos escuros de Juri se arregalaram e instantaneamente uma lágrima pesada contornou o rosto redondo. Não conseguia nem se imaginar sendo um largado, um alguém que as divindades não abençoariam com filhotes.
“Não, líder!” A voz soou quase como um sussurro, mas carregava todo o desespero que tinha em ficar sozinho.
Remi não se pronunciou. Não queria iniciar uma nova discussão a respeito de acasalamentos e comportamento perfeito. Não via a hora que o líder calasse a boca e os dispensasse daquela conversa tediosa.
“Juri, deixe-me a sós com o seu amigo.”
O pedido surpreendera até mesmo Suya, que escutava tudo com o ouvido pregado a parede da cozinha. O que o Alfa pretendia falar com Remi? Espalmou as mãos no peito e foi em busca de uma vasilha com água. Ultimamente estava se sentindo com náuseas e se cansava mais rápido do que o normal.
Juri olhou compadecido para o amigo. Soltou-lhe o braço e se encaminhou também para a cozinha, passando tão rápido que não percebeu a presença do cunhado, indo diretamente para o quarto.
Cairon levantou-se e quebrou todas as regras ao tocar na pele branquela de Remi, por debaixo da túnica encardida, sentindo a frieza e a maciez daqueles braços finos e delicados. Ambos os olhares se encontraram em um misto de ansiedade e surpresa.
Remi sentia com precisão a pele queimar sob o toque do líder. Estava tão chocado que não conseguia emitir nem som, nem gestos. Apenas a boca pequena e levemente ressecada estava entreaberta, em um pedido mudo de explicação.
Cairon percebeu que fora precipitado em sua decisão de fazê-lo enxergar o futuro e o largou, arrependendo-se de tê-lo tocado daquela forma tão íntima.
“Eu me exaltei, desculpe-me.” Foi o que disse assim que se afastou do corpo menor.
Remi olhava para o nada, com os verdes perdidos em qualquer coisa que não fosse a presença imponente do Alfa.
“Amanhã, depois dos estudos.” Voltou a falar percebendo o estado em que o lobo albino se encontrava. “O lobo Gaia, vai fazer o ritual para mostrar seu noivo e futuro marido.” A decisão havia acabado de ocorrer, mas ele realmente achava que era o certo.
“O quê?” Remi exaltou-se voltando a realidade e avançando contra o líder. “Faltam tantas luas cheias para concluirmos os estudos!” Se precisasse, ele enfiaria um tapa na cara do Alfa, tamanho o seu descontentamento com a situação.
Remi tinha razão. Faltava certo tempo até terminarem os ensinos, mas o desespero de ter uma escória na matilha era tanto, que começariam a procurar o noivo imediatamente.
“Já decidi!” Foi o ultimato e a partir da frase, saiu da cabana, deixando o lobinho completamente desesperado.
O albino levou os dedos na pele onde o líder havia tocado e sentiu com fúria uma torrente de lágrimas escorrerem pelos olhos verdes.
Definitivamente ele não iria se casar.
Autor(a): miima
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