Miguel
— Meu pai está preso. Por assassinato.
Precisava falar assim, sem pensar? Idiota!
Não sei por que me sinto tão estimulado a contar à Anahí todos os meus segredos sujos, mas
vou em frente. Talvez porque ela se sinta inadequada. Eu sei muito bem como é isso. Em um
mundo onde aparência e reputação representam tudo, tenho que me esforçar muito para me
assegurar de que tudo o que falo e faço esteja acima de qualquer crítica. Manter distância do
meu pai e de sua detenção foi uma proeza quase impossível, mas eu resisti. Após anos e anos de
muito trabalho, puxando o saco das pessoas certas, finalmente consegui. E agora estou um passo
mais perto do meu objetivo.
Depois do que pareceu uma eternidade enlouquecedora de silêncio, olho para ela. Anahí está
me encarando, a boca ligeiramente aberta, com o choque. Seus olhos azuis brilhantes, escuros
na luz fraca, estão focados exclusivamente nos meus. Mas o que mais me chama atenção não é o
que eles expressam — surpresa, desconfiança, curiosidade, talvez um pouco de compaixão —, e
sim o que não está estampado neles. Julgamento. Desprezo. Medo. Todas as coisas que vi, muitas
vezes, nos olhos das pessoas, quando tinha de contar-lhes a minha história.
Agora mais do que nunca quero beijá-la.
Cacete! Ela fica cada vez mais atraente.
— E então? Não vai fugir, sair gritando? — pergunto, sem conseguir evitar o leve tom de
amargura na voz.
Ela me surpreende com um sorriso e um olhar hesitante.
— Acho que já ficou claro que eu não tenho nada a ver com as pessoas com as quais você
lida normalmente.
Rio. E é um riso verdadeiro.
— É, verdade.
Ela se vira para mim. A única coisa que seu rosto expressa agora é curiosidade. Fico contente
de ver que o traço de compaixão desapareceu. Dentre as muitas coisas que eu gostaria de
inspirar nesta garota, compaixão não faz parte da lista.
— Quer conversar sobre isso?
Eu dou de ombros, em dúvida.
— Isso não me incomoda mais como antigamente. Agora é como se fosse parte do meu
passado, mais do que qualquer coisa.
— Deve ser mais do que isso para você querer me falar a respeito.
Ela é bem perceptiva. Tão inteligente quanto bonita. E provavelmente não faz ideia disso.
— Talvez. Não sei. Eu nem mesmo sei por que mencionei isso.
Então olho para as luzes da cidade. Agora me sinto como um idiota por ter tocado no assunto.
— Mas mencionou — insiste Anahí. — Agora vai ter que me contar ou serei forçada a pensar
que você é cruel e sádico.
— Talvez seja.
Ela aperta os olhos, me avaliando.
— Ah, qual é. Não acredito. Além disso, não existe alguma lei contra crueldade e punição
extrema? Você não pode ser um advogado e transgressor das normas ao mesmo tempo.
Não consigo segurar uma risada diante da sua lógica. Pergunto-me o que ela pensaria se
soubesse a verdade.
— As pessoas fazem isso o tempo todo.
— Mas você não é como as “pessoas”. Você é o cara que está se preparando para me tirar
dessa aflição.
— Aflição é? — pergunto, incitando-a.
Sei que o meu sorriso provavelmente deixa transparecer o rumo que meus pensamentos
tomaram, e Anahí consegue me surpreender novamente ao entrar no jogo.
— Sim, aflição — repete ela com um sorriso. — Você não é o tipo de homem que deixaria
uma garota aflita e ficaria por isso mesmo, não é?
Embora ela pareça amável, inocente e tímida, de vez em quando parece pronta para
participar de um jogo muito mais íntimo e perigoso. Sei que não deveria estar pensando em jogos
ou aflição, ou em nada mais em relação à Anahí Portilla.
Mas não dá para evitar!
Pensamentos obscuros e sujos vêm à mente, coisas do tipo: quanto prazer eu teria em deixá-la
aflita. Mas não a espécie negativa de aflição. Não, de jeito nenhum. Quero Anahí
experimentando a espécie de aflição que a faça suar e se contorcer e me implorar para que eu a
penetre.
Sinto a necessidade de ajeitar a calça e lembro a mim mesmo que estou entrando num
terreno perigoso. Minha mente entende isso, mas observar o rosto dela, seus olhos brilhantes e os
lábios carnudos me impede completamente de transmitir a mensagem para outras partes do meu
corpo.
— Só se ela gostar — respondo, estendendo o braço para afastar a longa mecha de cabelo
Loiro do ombro de Anahí. Os fios parecem seda entre os meus dedos. Assim como a sua pele,
nas costas da minha mão. — Do que você gosta, Anahí ?
Acho que vejo seu peito inflar ao tomar fôlego. Talvez ela resolva interromper o jogo. Deus
sabe que eu não vou. Posso até me arrepender depois, mas agora não estou pensando em nada
além de como seria ver Anahí sem aquele vestido vermelho.
Ela me olha espantada. Não sei se isso significa realmente a aceitação do desafio ou se é
somente o que estou esperando. Então, passa a língua nos lábios e abaixa um pouco a cabeça,
olhando para mim por entre os cílios.
Ela é tímida. Mas não de um modo forçado. É o jeito dela. E isso me deixa ainda mais
excitado.
— Quer dizer que você não sabe? — pergunta. — Imaginei que um general de quatro estrelas
saberia todos os tipos de coisas que os mortais não sabem.
— Talvez eu prefira fazer um reconhecimento do terreno, antes de atacar.
— E como é esse reconhecimento?
Sei que devo parar enquanto ainda há tempo. Só que não há como.
— Eu gosto de usar todos os meus sentidos para penetrar o terreno com segurança.
— Penetrar o terreno? — pergunta ela, arqueando os cantos da boca.
— Claro — respondo. — Para poder planejar o meu ataque.
— Reconhecimento? Para um ataque? Não me diga.
— Primeiro começo com o toque. — Estendo o braço e roço sua covinha com a ponta do
dedo, então arrasto a mão lentamente na direção do seu lábio inferior. — O toque é
importantíssimo. A textura do terreno me diz até que ponto... o meu ataque tem de ser agressivo.
Alguns lugares requerem uma estratégia muito mais delicada do que outros.
— Sei — diz Anahí suavemente. Eu sinto o hálito quente dela fazer cócegas no meu dedo. —
O que mais?
— Cheiro — continuo, deslizando a mão pelo seu cabelo para suspendê-lo enquanto aproximo
o rosto da pele ligeiramente perfumada do seu pescoço. — Uma determinada fragrância pode
me dizer se eu estou indo na direção certa. Algo doce. Algo... almiscarado — murmuro.
Ouço sua respiração falhar quando mordo, delicadamente, sua orelha.
— E ouvir também é importante — sussurro. — Às vezes os sons mais suaves, até um gemido,
podem me dizer muito a respeito do quanto estou perto de atingir meu objetivo.
Sinto as mãos dela agarrarem meus braços. As unhas estão penetrando a minha pele, através
da camisa. Não consigo pensar em mais nada além do quanto quero senti-las nas minhas costas.
A sua respiração está se tornando mais rápida e entrecortada no meu ouvido.
— O que mais? — pergunta ela, ofegante.
Eu me afasto ligeiramente e observo sua expressão. Suas pálpebras estão pesadas por cima
dos olhos deslumbrantes, e seu rosto está corado, pelo clima que está rolando entre nós. Ela
também não quer parar. Não há dúvida.
— Sentir o sabor.
Seus olhos oscilam até minha boca e voltam a se focar nos meus.
— E do que você sente o sabor?
— De tudo. Quero sentir o sabor de tudo.
Se em algum momento tive a chance de resistir a ela, essa chance se evapora no instante em
que ela se aconchega a mim, assim como o último respingo de elegância que normalmente sou
capaz de demonstrar. O beijo que deveria ter começado lento, começa como um incêndio
florestal. O primeiro toque da sua língua me consome.
E me sinto perdido.
Minhas mãos estão no seu cabelo e a minha boca está devorando a dela. Não me preocupo
com o lugar onde estou, nem com minha namorada para cujo pai eu trabalho. Não consigo
pensar em mais nada além do quanto quero penetrar o corpo firme e sensual da garota nos meus
braços.
Mas por quê? Por que eu a quero tanto?
Nenhuma resposta vem à minha mente. Todo o pensamento parece se fechar, quando ela me
envolve em seus braços e sinto aquelas unhas cravarem a minha pele.
Solto um gemido enquanto a beijo, e ouço o gemido dela em resposta. Puxo seu cabelo, talvez
um pouco mais forte do que pretendia, e seu beijo torna-se voraz. Ela aperta o corpo contra o
meu, como se não estivesse perto o bastante. Eu a pressiono contra a parede. Meu corpo está
colado inteiramente ao dela. Posso sentir cada centímetro duro do meu corpo pressionando cada
centímetro macio do corpo dela. É a roupa entre nós que me faz interromper o beijo.
Eu me afasto ligeiramente para poder fitá-la. Seus olhos estão pesados e seus lábios, inchados.
Posso ouvir a sanidade mental bater na porta, mas eu a ignoro quando ela se inclina lentamente
para a frente, na ponta dos pés, para morder meu lábio inferior.
— Ah, meu Deus — solto um gemido, mergulhando de volta no beijo. Anahí recomeça
exatamente do ponto em que estávamos, sem reservas.
Sem quebrar o contato com seus lábios, eu me curvo para pegá-la nos braços e carregá-la até
uma das chaises longues, distante do elevador. Eu a deito confortavelmente, e me levanto para
observá-la.
Seus joelhos estão ligeiramente dobrados, permitindo-me uma olhada furtiva nos seus belos
tornozelos. Minha atenção não se desvia dali. Eu me ajoelho, pressiono os lábios no topo do seu
pé, levantando seu vestido, enquanto deslizo a boca até sua panturrilha.
Minha mão acaricia suavemente a sua pele lisa, empurrando o vestido ao mesmo tempo,
enquanto faço uma trilha com a língua até seu joelho, e depois até a parte interna da sua coxa.
Ela afasta as pernas ligeiramente.
Um convite.
Arranho delicadamente sua pele sensível com os dentes, enquanto as pontas dos meus dedos
sobem até tocarem sua calcinha úmida. Eu ouço sua respiração ofegante. Fico excitado só de
pensar nos gemidos que ela soltará quando meu corpo estiver em contato com o dela.
É quando ela se enrijece que percebo que há algo errado. Levanto a cabeça e meus olhos
encontram os seus em estado de alerta.
Fico confuso quando os vejo encherem-se de lágrimas.
— O que foi, Anahí ? Eu te machuquei?
Não acho que tenha pegado pesado...
Ela nega com um gesto de cabeça.
— Não, é só... Eu só... Não podemos fazer isso.
Por mais que eu odeie admitir, sei que tem razão. Mia é muito importante nos meus planos
para eu estragar tudo agora. E Anahí é uma garota muito bacana para eu arrastá-la para minha
vida bagunçada.
Com um suspiro, pouso a testa no seu joelho.