Anahí
Parece que toda vez que levanto os olhos, vejo Alfonso. Às vezes, ele está conversando com
clientes, fazendo seu trabalho como proprietário/gerente. Mas, outras vezes, aparentemente
muitas, ele está me olhando. Isso me deixa nervosa, mas não é um nervosismo para mostrar meu
desempenho. Eu confio na minha capacidade de preparar um bom drinque, mesmo com uma
instrutora aos berros no meu ouvido. Eu não me sinto confiante é com a minha capacidade de
resistir ao que ele sequer tenta esconder.
Alfonso está interessado em mim. E não só como funcionária. Talvez muito pouco como
funcionária, na realidade. Toda vez que meus olhos encontram os dele, me sinto como se ele
estivesse me despindo. E só Deus sabe como eu adoro isso. Aquele olhar sexy, aveludado, que
parece me tocar. Posso quase senti-lo, como mãos no meu corpo e lábios na minha boca.
Admito que tenho uma atração por bad boys, mas Alfonso é... Não sei. Ele é diferente. Atrevome
a dizer que ele é ainda mais perigoso do que minhas desastrosas experiências habituais.
Levanto os olhos e dou de cara com ele novamente. Ele pisca para mim e meu estômago dá
um salto.
— Não é assim que fazemos margaritas aqui — fala Angel, de maneira grosseira, no meu
ouvido. — Quem usa suco de laranja?
Eu dou um suspiro tão alto que parece um rosnado. Poderia explicar como uma pequena
quantidade de suco de laranja acrescenta um sabor extra ao da tequila, mas não me dou ao
trabalho. Já estou de saco cheio do mau humor da Angel.
— Certo — respondo, pousando a garrafa de tequila de forma um pouco mais brusca do que
pretendia. — Então me mostre como vocês fazem margaritas por aqui.
Cruzo os braços por cima do peito e me afasto.
O olhar que ela lança na minha direção é, ao mesmo tempo, furioso e satisfeito. Obviamente,
ela queria que eu perdesse a linha. Bem, ela não perde por esperar.
— Pode fazer, vá em frente. As pessoas estão esperando — digo no tom mais calmo que
consigo, inclinando a cabeça para mostrar o grupo de pessoas à espera, do outro lado do balcão.
Seus olhos azul-claros brilham de raiva e seus lábios vermelhos se contraem. Ela está pronta
para uma briga. E eu também.
— Melhor você deixar esse tipo de atitude lá fora, querida, ou esta pode ser a sua última noite
por aqui.
Ouço as vozes abafadas subirem à nossa volta: várias demonstrações de espanto e sussurros de
“vai ter briga de mulher”. Eu os ignoro e me concentro em Angel.
— Ah é? Acha que está com essa bola toda para se livrar de mim só porque é uma mandona
compulsiva que precisa de atenção 24 horas por dia?
Seu riso é amargo, mas ela não se preocupa em disfarçá-lo. Acho que ela sabe que eu tenho
razão.
Não demorei muito para sacar qual é a dela: não passa de uma garota insegura, que tem uma
situação malresolvida com o pai. Depois do meu teste com o body shot, ela fez o possível e o
impossível para desviar a atenção de mim e atrair todos os olhares para si. Primeiro, trocou a
música para uma mais dançante, da Jessie James. Depois, começou a dançar no bar, fingindo
dublar “Wanted” e sensualizando com qualquer homem que estivesse ao alcance de sua visão.
E, naturalmente, eles adoraram. Afinal, ela é bonita, mesmo com os dreads loiros e longos, e
é sexy de um jeito malicioso. Que homem com um p*ênis que funciona normalmente não
adoraria uma garota assim, se exibindo, provocando-o impiedosamente?
Mas acabei descobrindo que isso contribuiu a meu favor. Enquanto ela descia do balcão, me
lançou um sorriso presunçoso. Estava tentando chamar mais atenção do que eu, mostrando que
podia chamar mais atenção. O que ela não entende é que eu não quero toda a atenção. Ela que
faça bom proveito.
Pensar nisso dessa forma me deixa bem menos irritada. Decido dar a ela o que ela quer: o
amor de todos os homens.
— O que acha de uma competição? Quem perder tem que fazer um número de dança.
Fico um pouco surpresa diante da sua hesitação, mas, quando vejo seus olhos se desviarem
para a minha direita, entendo qual é o problema. Alfonso está conversando com um grupo de
garotas animadas, não muito longe de onde estamos.
Então entendo. Realmente entendo.
Puta merda! Ela está a fim do Alfonso!
Meu primeiro pensamento é que não a condeno. Acho que qualquer coisa com estrogênio
gosta do Alfonso. Meu segundo pensamento é a surpresa com o fato de que eles ainda não tenham
dormido juntos. Isso não é um comportamento típico de um bad boy .
A menos que eles já tenham ficado e ela ainda não tenha dado o caso por encerrado. Isso seria
muito mais típico de um bad boy.
Por alguma razão, o ciúme corrói minhas entranhas.
— Fechado — diz ela com um aceno de cabeça.
— Vence quem fizer a melhor margarita. As duas doses são por minha conta — digo, antes de
me virar para o bando de homens que nos olham e ouvem. — Quem vai querer julgar?
Naturalmente, todos começam a pedir para serem escolhidos. Mas o problema acaba quando
Alfonso se aproxima.
— Eu vou ser o juiz. — Ele se oferece, os olhos desafiadores na luz fraca do bar. — Acho
mais do que justo.
— Claro — aceito, um pouco sem fôlego, quando ele chega bem perto e ficamos cara a cara.
Eu observo Angel. Sua expressão mudou de hostil para completamente feroz. Então me ocorre
que o tiro poderia sair pela culatra. O que começou como um plano inteligente poderia acabar
tendo o efeito contrário.
— Você concorda?
— Por mim tudo bem. — A resposta dela vem acompanhada de um enorme sorriso para o Alfonso.
— Eu sei do que ele gosta.
Os homens em volta do bar começam a gritar e a assobiar, cutucando e provocando Alfonso. Ele
apenas sorri para Angel. E isso me irrita. Não dá para saber se há algo entre eles ou não. Ou se a
reação dele é apenas um sorriso tolerante de patrão.
Espero que, se algum dia houve algo entre eles, que tenha acabado.
Fico revoltada ao considerar que ele possa estar saindo com a Angel, enquanto flerta comigo,
me olhando e me provocando. Eu não deveria me incomodar. Afinal, ele é um play boy e é isto o
que os play boy s fazem.
Mas me incomodo.
Droga!
— Vamos lá, pessoal. Vamos dar uma ajudinha a essas garotas — pede Alfonso.
As pessoas em volta começam a aplaudir entusiasticamente. Alfonso sorri e se vira para ficar de
frente para mim, inclinando-se no balcão. Seus olhos encontram os meus e ele ergue a
sobrancelha, daquele jeito supersexy, então murmura:
— Você tem uma chance de me deixar com água na boca.
Eu suspiro. E todos os pelos do meu braço ficam arrepiados.
Cacete, ele é demais!
Ainda bem que o salão está cheio de gente. Senão, eu poderia passar vergonha tirando toda a
roupa e subindo no balcão para enrolar meu corpo em volta do dele.
A prudência desaparece da minha mente quando faço um comentário brincalhão, em
resposta à provocação:
— Ah, posso fazer muito mais do que isso.
Seus lábios curvam-se em um sorriso que me deixa nervosa.
— Não duvido nem um pouco.
Então desvio o olhar e concentro toda a minha atenção no preparo de um drinque perfeito.
Tenho muito mais dificuldade do que deveria. Meus olhos insistem em voltar a fitá-lo.
Enquanto estou esfregando a borda do copo com o sal, eu me distraio e levanto os olhos. Alfonso
está cantando a música que está tocando, que inclui um assobio; e quando chega a parte do
assobio, ele contrai sua boca perfeita e assobia exatamente no ritmo da música.
Não consigo deixar de fitá-lo. E, como se ele já não tivesse me deixado desorientada o
bastante, quando para de assobiar, meu olhar volta a encontrar o dele, que pisca para mim.
É quando percebo que estou encrencada. Muito, muito encrencada.
Angel me empurra para o lado, a fim de deslizar um copo sobre o balcão diante do Alfonso. Isso
me tira do sério. Eu viro a minha margarita no copo, decoro-a com um pedaço de limão e outro
de laranja, e a ofereço a ele.
Ele prova primeiro a da Angel, em seguida a minha. Depois prova cada uma mais uma vez,
estalando os lábios e degustando os sabores. Eu me pergunto se ele realmente escolherá o melhor
drinque, ou se escolherá simplesmente o oposto, para ver a garota que quer dançando no bar.
Percebo que, seja lá qual for o resultado, eu não vou ficar satisfeita. Se ele escolher o meu
drinque, vou achar que ele quer ver a dança da Angel. Não que me importe o que ele quer ver a
Angel fazer.
Mas importa.
Droga.
Por outro lado, se ele escolher o drinque da minha rival, não só o dela será supostamente
melhor, como terei de dançar, o que realmente não quero fazer.
Ele acena com a cabeça e apanha meu drinque para beber até o fim.
— Temos uma vencedora! — anuncia, apontando para mim.
Sinto-me aliviada e vitoriosa. Mas, ao mesmo tempo, meus sentimentos são contraditórios.
Sem olhar para ele diretamente, retiro o copo vazio, assim que Alfonso o pousa no balcão. Meus
olhos se dirigem para além da Angel, que está sorrindo timidamente para alguém, que eu
imagino que seja o Alfonso.
— Boas notícias, pessoal — grita ela, feliz. — Vou continuar fazendo margaritas do meu jeito,
e vocês terão um pouco de entretenimento esta noite. Assim, todo mundo sai ganhando.
Com um grito entusiasmado de “É isso aí!” Angel se vira para tocar uma música diferente,
escolhendo uma canção bem sugestiva, da qual, não tenho nenhuma dúvida, ela fará bom uso.
Quando a vejo subir no balcão, vou para a outra extremidade, para servir as bebidas ao grupo de
pessoas que não está prestando atenção nela, nem estimulando-a.
Faço tudo que posso para não olhar na sua direção, nem para o Alfonso. Não quero ver a reação
dele. Mas quando os aplausos acompanhados da gritaria animada ficam mais altos, os meus olhos
são atraídos para o lado onde ela está, independente da minha vontade.
Angel, ao que parece, pulou para o colo de Alfonso e está com os braços enrolados em volta do
seu pescoço, aparentemente bem firmes. Ela está sorrindo como o gato que comeu o canário ou talvez, como o gato que quer comer o canário, e Alfonso está rindo.
No momento em que estou voltando a minha atenção para a cerveja que estou virando no
copo, vejo Angel puxar a cabeça de Alfonso e beijá-lo. E não é só um selinho. Parece que ela está
tentando engolir o rosto dele. E Alfonso não está oferecendo resistência.
O líquido frio que jorra por cima dos meus dedos me traz de volta ao que eu estava fazendo. A
cerveja está transbordando, escorrendo pelo meu pulso e caindo na bandeja em cima do balcão.
Pulo para trás e pouso o copo, furiosa, sacudindo a mão para retirar o excesso do líquido. Fico
extremamente irritada comigo mesma por deixar Angel e Alfonso me tirarem do sério, e mais
ainda por deixar que isso me afete de maneira tão visível.
Estou batendo o pano furiosa sobre o balcão molhado, limpando a sujeira que fiz, quando Alfonso
se inclina e fala comigo:
— Preciso que fique por alguns minutos esta noite, depois que a boate fechar. Tem uma
papelada para você preencher. Não deve levar muito tempo.
Levanto a cabeça e fito seus olhos. Quero arrancá-los. E depois cuspir no rosto dele. E em
seguida xingá-lo por ele ser exatamente o que pensei que fosse.
Um bad boy .
Um play boy .
Um destruidor de corações.
Mas também quero beijá-lo. E deixá-lo me carregar até a sala privativa, no andar de cima, e
pôr um fim na longa angústia do desejo que tem me atormentado desde a noite que o conheci,
quando levantei a sua camisa.
Droga!
Ele sorri ao se inclinar para trás.
— A propósito, parabéns pelo drinque. — Então bate no balcão duas vezes, como um tapinha
nas costas, e vai embora, em direção à porta misteriosa, nos fundos do salão.
É oficial: a partir deste momento minha noite começa literalmente a despencar.
Estranhamente, o que eu pensava que ajudaria o humor da Angel parece que só fez deixá-la
mais hostil. Azar o dela. Meu humor desmoronou de forma vertiginosa, levando junto minha
paciência e tolerância, então, pelo resto da noite, revido todas as suas ofensas.
Apesar de estar apavorada por ter de falar com Alfonso, sinto-me realmente aliviada quando a
boate fecha. Angel e eu já tínhamos passado de comentários pouco disfarçados a esbarrões
propositais. Ela esbarrava no meu ombro toda vez que passava por mim. Eu esbarrei nas costas
dela enquanto ela estava virando uma rodada de coquetel de vodca com limão nos copos. A
partir daí, a coisa evoluiu a ponto de ela empurrar um drinque sobre o balcão para ele cair no
chão, espirrando licor Bailey ’s pelas minhas pernas, que ficaram pegajosas e me deram muito
trabalho para limpar. Àquela altura, compreendi que o próximo passo seria puxão de cabelo e
unhadas, enquanto rolássemos pelo chão, rosnando uma para a outra. E, por incrível que pareça,
imagino que esse tipo de coisa poderia pegar mal em qualquer estabelecimento comercial onde
não exista uma piscina de gelatina para briga de mulheres.
Foi aí que parei de implicar com ela. Agora, estou pronta para ir para casa.
Ao fechar minha parte do bar, fico agradecida por lembrar quase tudo o que Vinicius me
ensinou. As coisas nas quais fico um pouco atrapalhada, consigo improvisar, observando
discretamente o que Angel está fazendo na outra ponta. Ela é bem mais rápida do que eu.
Obviamente.
Quando ela termina de limpar a sua área, praticamente corre em volta do balcão e vai para a
porta nos fundos do salão. Ela nem sequer lança os olhos na minha direção, muito menos me diz
qualquer coisa. E não estou nem aí, realmente. Sua atitude não é a razão para o meu estômago
estar em reviravolta. Meu estômago está assim porque acho que tenho uma ideia de quem vai
transar com quem esta noite.
Por isso, não me apresso em limpar o bar. Eu preferia morrer a interrompê-los. Na realidade,
eu realmente gostaria que ele se esquecesse da tal papelada e me deixasse ir para casa.
Estou repreendendo a mim mesma por ficar pensando em um cara como Alfonso, quando a
Angel sai de dentro da sala. Levanto os olhos. À primeira vista, ela parece... aborrecida. Mas
quando percebe que estou olhando para ela, abre o seu sorriso mais brilhante, pega a bolsa atrás
do balcão e segue em direção à saída, caminhando tranquilamente.
Minha vontade é passar a borda afiada de uma folha de papel em cada centímetro do seu
corpo. E depois esfregá-lo em água com sal.
Esse pensamento me faz dar uma risadinha dissimulada. E é o que estou fazendo quando Alfonso
aparece. Ele não está ajeitando a roupa ou nada tão óbvio, mas sei o que ele andou fazendo. E
estou furiosa.
— Já terminou? — pergunta casualmente.
Bufo de raiva.
— E você? — Fico aborrecida comigo mesma por deixar transparecer minha irritação, mas a
pergunta meio que escapa, antes que eu pudesse me conter.
Alfonso me olha confuso por alguns segundos.
— Estou pronto no momento que você quiser. Sei que você precisa ir para casa.
Que conveniente se lembrar disso agora! Você provavelmente está pronto para uma cama.
Uma cama de verdade.
Trinco os dentes, lanço o pano de limpeza no alvejante e pego a minha bolsa embaixo do
balcão. Eu me recuso a me apressar só porque ele está, finalmente, pronto. Eu me recuso! Sei
que sou eu que vou pagar por isso quando estiver exausta amanhã de manhã, mas esta noite,
evitar o confronto direto é tudo que me resta.
Ele caminha na frente, até a porta cuidadosamente oculta, nos fundos da boate. Como
suspeitei, é um escritório. E um escritório muito bem-decorado. Principalmente levando-se em
conta que é numa boate.
As cores predominantes são, ao mesmo tempo, delicadas e masculinas, com fortes tons de
bege e a suavidade do cinza amarronzado. Há detalhes em preto por toda a sala, nas almofadas
jogadas no sofá e nos abajures nas mesinhas de canto. O tom combina com a enorme
escrivaninha preta e o belíssimo trabalho de entalhe na estante atrás.
Há uma porta parcialmente aberta na parede dos fundos. Parece dar para um apartamento
muito bonito e espaçoso, pelo que posso ver.
Com uma sensação de desânimo, percebo que ele e Angel provavelmente estavam lá. Em
uma cama de verdade.
Sinto-me péssima.
Alfonso aponta para uma luxuosa cadeira listrada, preta e cinza amarronzada, em frente à
escrivaninha, enquanto senta-se na cadeira de couro preta, atrás dela. Então digita algumas coisas
no computador e imprime alguns formulários, depois coloca-os diante de mim. Pego uma das
canetas do porta-canetas à minha esquerda.
Em absoluto silêncio, preencho os formulários empregatícios e fiscais necessários, enquanto
Alfonso faz o que assumo ser um arquivo de funcionário. Quando termino de escrever e vejo que
não há mais papéis para assinar, pouso a caneta e espero. Ele finalmente levanta os olhos para
mim e sorri.
— Então, está gostando de trabalhar aqui? Tirando a Angel, naturalmente.
Forço os lábios em um sorriso.
— Sim, obrigada.
Vejo uma expressão intrigada novamente.
— Há algo que você queira falar? Algo que eu possa fazer para tornar o seu trabalho mais
fácil?
Além de ficar longe de mim?
Eu me seguro para não dizer o que quero e mantenho o sorriso, balançando a cabeça
negativamente. Ele se conforma com a minha resposta e me olha atentamente.
— Certo. Bem, acho que devo deixá-la ir para casa, então.
Com um breve aceno de cabeça, eu levanto e saio o mais rápido possível, sem dar mancada.
Depois de passar pela saída e entrar no estacionamento bem iluminado, me rendo ao impulso de
gritar de raiva e frustração. Não chega a ser um grito. É mais algo como um grunhido.
Enfurecida, vou até o meu carro e jogo a bolsa sobre o capô para procurar as chaves. É
quando ouço passos. Então me viro, assustada, e vejo Alfonso se aproximando, até parar ao meu
lado.
— Está tudo bem?
Ele mantém aquela expressão intrigada. Está nitidamente preocupado. Provavelmente ouviu
meu desabafo, já que também estava saindo.
Que maravilha!
— Está tudo bem — respondo com a voz sibilante. — Pode voltar para a boate. Já estou indo
embora.
— Esqueci de dar a você a sua cópia do termo de isenção de responsabilidade — explica,
entregando-me uma folha de papel dobrada.
Eu arranco o papel das mãos dele e o enfio na bolsa.
— Obrigada e boa noite — falo com desdém, voltando a procurar as chaves do carro.
Alfonso agarra os meus ombros e me vira de frente para ele.
— Qual é o seu problema?
Eu perco a cabeça.
— Tire suas mãos de mim — digo num tom exigente, esquivando-me dele de forma violenta.
Ele parece assustado, o que só me deixa mais furiosa. — Você não tem o direito de me tocar. Eu
não sou a Angel.
— Como é que é? — Ele parece realmente confuso. Por fim, parece entender. E fico louca de
raiva. — É por causa daquele beijo?
Então cerro os punhos. É tudo que posso fazer para não atacá-lo fisicamente.
— Não, não é só por causa do beijo. É por causa de beijos, body shots e uma transadinha
casual depois do expediente, no seu escritório, além de um monte de coisas que não deveriam
estar rolando aqui!
Estou começando a ficar descontrolada e sei disso. Também dei um passo à frente, o que me
põe bem perto do peito dele, que é onde o meu dedo indicador está enfiado. Então olho para a
minha mão, como se não tivesse a mínima ideia de como ela foi parar ali, principalmente porque
não tenho mesmo.
Levanto os olhos para Alfonso, mas ele também está olhando para a minha mão. Então, bem
devagar e deliberadamente, ele a pega com seus dedos longos e estica o braço. Puxa com força,
quase me fazendo cair em cima dele.
— É por causa disso? Você acha que estou dormindo com a Angel?
— Claro! Tenho certeza de que não é nenhum segredo.
— Por que diz isso?
Ele está muito calmo. Quase curioso. Chega a ser desconcertante.
— Bem, em primeiro lugar, ela é linda e...
— Você é linda — diz ele, baixinho.
Meu estômago sacode, mas vou em frente:
— E ela te dá mole descaradamente.
— Queria que você me desse mole assim. — Seus olhos deslizam até meus lábios, que pulsam
como se ele os tocasse.
— Pare com isso. Não finja que não está rolando nada.
— Não estou fingindo. Angel e eu temos uma história, mas foi antes de ela começar a
trabalhar para mim. Eu tenho poucas regras, mas uma delas é não me envolver com
funcionárias. E agora ela trabalha para mim. É isso. Nada mais.
— Mas você a beijou. Eu vi.
— Não, o que você viu foi ela me beijar. E me viu evitar uma situação desagradável, no meio
da boate.
— Bem, não parecia que você estava odiando.
— Mas estava. O tempo todo, só estava pensando em beijar você. — Então, ele inclina a
cabeça lentamente e se aproxima.
O sangue está rugindo nas minhas orelhas.
— Mas você não se envolve com funcionárias — lembro a ele, baixinho.
— Faria uma exceção por você. — Seu rosto se aproxima do meu. Lentamente. Um
centímetro de cada vez.
— Mas é a sua regra.
— Vou quebrá-la por você — sussurra ele.
— Não, não faça isso — digo sem fôlego.
— Tudo bem, então está despedida — diz, no instante em que seus lábios tocam os meus.
Eles são quentes e a pressão é suave. No início. Por mais que eu queira resistir, a minha
resolução vai para o espaço quando sinto a sua língua deslizar sobre meus lábios. Sem pensar,
abro a boca.
Aí, já era.
O sabor de Alfonso é como um uísque escocês envelhecido na dose certa: intenso e delicioso. Sua
língua escorrega ao longo da minha, acariciando-a, provocando-a, enquanto ele aperta a minha
mão para me puxar para junto de si. Faço a única coisa que posso: colo meu corpo no dele.
Os dedos da sua outra mão afagam meu cabelo e inclinam a minha cabeça para o lado,
conforme ele aprofunda o beijo. Torna-se mais agressivo, como se quisesse me devorar. E eu
quero isso. Ah, meu Deus, como quero isso.
Em seguida solta a minha mão, e sinto ele tocar a base da minha coluna. Alfonso estica os dedos
e cola o meu corpo ao dele.
Já está ereto. E é imenso. Posso senti-lo pressionando a minha barriga. O calor explode por
mim, formando uma camada úmida entre as minhas pernas. Faz muito tempo e, instintivamente,
sei que qualquer momento sexual com Alfonso seria inesquecível, maravilhoso, arrebatador.
Um momento que eu provavelmente lamentaria pelo resto da vida, quando eu me envolvesse
demais e ele se entediasse demais.
A realidade do que estou fazendo me atinge como um tapa na cara, e pulo para trás. Minhas
mãos estão no seu cabelo, o meu corpo está colado ao dele, e estou tremendo de desejo, dos pés
à cabeça. Mesmo assim, recuo.
— O que houve? — pergunta Alfonso, com os olhos cheios de tesão e, ao mesmo tempo,
confusos.
— Não podemos fazer isso.
— Era brincadeira a história da demissão.
— Não é isso o que quero dizer.
— Então o que é?
Ele retrocede para me dar espaço, mas agarra as minhas mãos para evitar que eu me afaste
completamente. Não sei por que permiti que as segurasse. Provavelmente porque, no fundo, não
quero que ele me solte. Só sei que devo.
— Alfonso, toda a minha vida escolhi o cara errado. O bad boy , o crianção, o rebelde sem causa.
Aposto que você nem sequer completou o ensino médio, estou certa?
Alfonso não me corrige e não nega.
— Viu? Este é o tipo de cara que me atrai. Você é o tipo de cara por quem me atraio. Eu nem
vou fingir que não sinto atração por você. Mas você é a pior coisa no mundo pra mim. Já sofri
demais e estou cansada. Estou cansada de tentar domar homens como você.
Ele me olha atentamente, assentindo com a cabeça devagar.
— Entendo. Realmente entendo. Mas você me quer e eu te quero. Não podemos apenas ter
isso?
Eu olho para ele perplexa.
— Você está brincando, não é?
— Não.
— Você está realmente propondo que a gente transe por transar, sem compromisso?
— Ah, não seria transar por transar — argumenta Alfonso com um sorriso. — Seria tudo que
você quisesse que fosse, com a condição de que, no fim, cada um seguisse seu caminho.
— Este é o problema. Quem escolhe a hora do fim? Você?
— Não, pode ser você. Ou podemos decidir juntos. De maneira aberta e franca. Podemos
parar quando você estiver pronta para parar. Ou antes que se torne algo que você não quer que se
torne.
Sei que deveria estar ofendida, e não intrigada.
— Mas isso é tão... tão...
— É exatamente como a maioria dos outros relacionamentos, só que sem todas as mentiras e
expectativas. Só isso. É prático e inteligente.
— Um relacionamento sexual prático e inteligente? — Sei que a minha expressão é hesitante.
Não há como evitar.
— Sim, mas também ardente, excitante, intensamente prazeroso — defende Alfonso, com uma
voz que assume um ritmo mais lento, mais profundo. Então, ele se aproxima de mim novamente.
— Prometo que você não vai se arrepender. Prometo fazê-la sentir coisas e curtir coisas que
você nunca sequer pensou antes. Farei de cada noite a melhor noite da sua vida, até você dizer
que é hora de parar. Então, vou embora. Sem ressentimentos. Apenas doces recordações —
ronrona, enquanto esfrega as nossas mãos entrelaçadas, de cima para baixo, na sua coxa.
Sei que deveria dar-lhe um tapa, rir na cara dele, ou pelo menos fingir estar profundamente
ofendida, o que deveria ser o caso. Entretanto, não estou. Em vez disso, estou analisando a
proposta.
Alfonso é bastante inteligente para saber quando retroceder e deixar as coisas rolarem
naturalmente. E é isso o que faz.
— Pense a respeito. A gente volta a falar sobre isso no fim de semana. Neste meio-tempo —
sussurra, ao se curvar perto do meu ouvido —, pense na sensação de ter a minha língua dentro de
você.
Então morde minha orelha, e sinto o reflexo percorrer até a boca do estômago. Mordo o lábio
para não gemer.
— Enquanto isso — prossegue —, vou ficar imaginando qual deve ser o seu gosto.
E então, o cretino se vira e vai embora, me deixando molhada de desejo, ao lado do capô do
meu carro.