Anahí
A moto ronca sob minhas pernas quando coloco os braços bem apertados em volta da cintura de
Alfonso. Devo admitir que me sinto um pouco melhor em relação a algumas coisas depois da nossa
conversa. Acho que só o tempo vai eliminar o medo de estar caindo, novamente, na mesma
armadilha, com o mesmo tipo de homem. Mas, se algum dia eu conheci um homem que
merecesse o risco, esse homem é o Alfonso.Sorrio só de imaginá-lo entrando na garagem mais cedo, lançando para o ar uma das velas de
ignição do meu carro. Ele a pegou e depois deu uma piscadela para mim, ao colocá-la no bolso.
Depois foi direto para a sua moto. Com um sorriso malicioso e um aceno de cabeça, ele
acariciou o banco de trás.
— O que eu sou capaz de fazer só para estar entre as suas pernas.
Eu ri. Não tinha como evitar. Seu sorriso era tão atraente e envolvente. Tão leve e
despreocupado. Era tudo o que eu queria sentir naquele momento. Às vezes, é bom se livrar de
problemas e preocupações. Mesmo que seja por apenas alguns minutos. E Alfonso me proporciona
isso. Muitas vezes.Não fico nem um pouco satisfeita em ver o contorno familiar da minha rua surgir à minha
frente. Estou curtindo a companhia de Alfonso, me sentindo segura sob seus cuidados. Não quero
que o passeio termine.Mas termina. Alfonso para ao longo do meio-fio. Espero para ver se ele vai abaixar o descanso da moto. Como ele não faz isso, eu suspiro e me levanto.Alfonso me observa enquanto desafivelo o capacete sob meu queixo, antes de retirá-lo e entregálo
a ele. Ele o pega com um pequeno sorriso no canto dos lábios. Ele não o coloca imediatamente. Posso quase apostar que ele está pensando a mesma coisa que eu — como partir sem um beijo.Depois de tudo o que compartilhamos nas últimas semanas, depois de todas as palavras e beijos e noites e manhãs, parece tão estranho nos despedirmos como amigos. No meu íntimo,parece um mau agouro nos separarmos desse jeito.
— Bem, obrigada — digo meio constrangida, tentando não me inquietar. Alfonso franziu o cenho.
Tenho vontade de fazer o mesmo. — Humm, nos vemos amanhã?
— Você vai trabalhar no seu turno, certo?
Aceno a cabeça.
— Sim.
— Ligo pra você de manhã. Que tal?
— Acho ótimo. — Já é alguma coisa.
O silêncio torna-se tenso.
— Vou esperar você entrar. Não sei por que ela não deixou as luzes acesas.
Olho para trás, em direção às janelas escuras do apartamento.
— Você ainda se surpreende diante de algo egoísta e indelicado da parte dela?
O sorriso de Alfonso é pequeno e torto.
— Acho que não. Mas, caramba!
Suspiro.
— Pois é. Mas é o jeito dela. Algumas coisas não mudam nunca.
Silêncio novamente.
— Bom, falo com você amanhã. Obrigada pela carona. Boa noite.
— Pra você também.
Aceno a cabeça e me espanto ao me virar para subir a calçada em direção à porta. Só havia dado alguns passos quando Alfonso me chama. Então me viro, cheia de expectativa.Ele também não aguentou.
Volto rapidamente na direção de Alfonso. Fico totalmente desanimada quando ele me entrega a
minha bolsa, que ele havia amarrado na traseira da moto, atrás do banco.
— Você esqueceu.
Sorrio educadamente e pego a bolsa de suas mãos, virando-me mais uma vez em direção ao apartamento. A expectativa no meu peito se transforma em uma sensação desconfortável.Como as coisas podem ter mudado tanto, tão rapidamente?
Os comentários de Angel, a voz de minha mãe e um monte de escolhas erradas desabam sobre a minha cabeça, como um deslizamento de pedras.
Ao me aproximar da porta, procuro a chave na bolsa. Estou distraída no instante em que enfio a chave na fechadura e giro a maçaneta, antes de dar adeus a Alfonso. Mas ele não está na moto. A moto está no descanso, com o motor desligado. Ele está subindo a calçada, com passos firmes,vindo na minha direção. Antes que eu possa sequer pestanejar, sinto minhas costas sendo pressionadas contra o metal frio da porta, os lábios de Alfonso nos meus e suas mãos no meu cabelo.Eu me derreto em seus braços. O alívio de saber que ele sentia o mesmo que eu luta para dominar o desejo de arrastá-lo para o meu quarto, fechar a porta e fingir que não existe nada nem ninguém do lado de fora.Mas antes que eu possa ceder a esse impulso, Alfonso recua, o que me permite respirar e
oferecer ao pensamento racional a pequena brecha que ele precisa para entrar de volta na minha mente.
Seus olhos, mais escuros do que a noite à nossa volta, buscam os meus, enquanto seus dedos deslizam do meu cabelo aos meus ombros, e descem pelos meus braços até agarrarem as minhas mãos.
— Me faça um favor — sussurra ele, enrolando os meus dedos nos seus e levando-os à sua boca.
— O quê?
Sem perder o contato visual, ele roça os lábios nos meus dedos.
— Sonhe comigo esta noite — diz ele em tom suave. Em seguida me olha, esperando por uma resposta. Não tenho palavras, portanto simplesmente assinto. Ele não precisa saber que ninguém mais está em meus sonhos. Ninguém. — Sonhe com meus lábios provocando você. — Então elepega um dos meus dedos e beija a pontinha. Sua voz é como veludo e suas palavras soam comoum afrodisíaco. — Sonhe com a minha língua sentindo o seu gosto. — Ele lambe meu dedo. Uma
onda de desejo sacode o meu íntimo. — E eu vou sonhar com você. Vou sonhar com a sensação
de estar dentro do seu corpo quente e úmido. — Como se quisesse me mostrar o que sente, Alfonso ch*upa o meu dedo, sugando-o para dentro e para fora da boca, por cima da sua língua. Eu mal consigo respirar.
Ele para o movimento, mas, antes disso, dá uma mordida leve no meu dedo. Sinto uma chama
por dentro, uma gota de lava num vulcão em ebulição.
— Boa noite, Anahí — diz ele baixinho. Em seguida se vira e vai embora.