Alfonso
Eu me sinto ao mesmo tempo confiante e culpado quando Olivia aperta os braços em volta da
minha cintura. Estou muito contente por ter esperado que ela entrasse em casa com segurança.
Se eu a tivesse deixado em casa somente alguns minutos antes, ou se ela tivesse ido para casa
sozinha...
O ar gela o suor frio que brota na minha testa.
Eu solto o guidão por um instante para abaixar a mão e roçar os dedos nas costas da mão dela.
Quero que ela saiba que eu sei e que estou aqui. Aliás, eu sou o responsável por ela estar correndo perigo, o que causa toda a culpa.
Se eu não tivesse me interessado tanto por ela, se eu tivesse deixado as coisas somente como
um caso sem importância, como todos os outros, ninguém pensaria em ameaçá-la para me
pegar. Por gostar muito dela, acabei pisando na bola. Agora eles estão atrás de mim e, por
conseguinte, atrás de Anahí.
Eu não desejaria nada de mal à Mia. Quer dizer, ela é uma filha da puta, mas não merece
morrer por causa disso. E eu tenho certeza de que é isso o que eles planejam fazer com ela. O
que eles tinham planejado fazer com Anahí.
Este pensamento me deixa apavorado.
Então eu acelero. Minha única preocupação neste momento é levá-la para algum lugar
seguro. Depois vou pensar no que fazer. Não tenho nenhum plano de contingência; depois de todo
esse tempo, nunca pensei que eles descobririam que eu tenho os livros. Pelo menos até que fosse
tarde demais para eles poderem fazer qualquer coisa com relação a isso.
Mas eu sou um cara esperto. E meu pai adquiriu uma tremenda experiência com esse tipo de
gente. Nós vamos pensar em alguma coisa. Temos que fazer isso. Ponto.
Eu pego o caminho mais complicado que consigo imaginar para chegar à parte central da
cidade, ao hotel que tenho em mente. De vez em quando, dou uma conferida nos espelhos
retrovisores para ver se há faróis ou qualquer outro sinal de que alguém está nos seguindo. Não
posso dar nada por certo ainda.
Quando paro diante da entrada luxuosa do hotel, surge o manobrista. Ele é jovem e parece
louco para dirigir a minha moto.
Quando saltamos, dou uma gorjeta ao rapaz e fico observando enquanto ele leva a moto para
o estacionamento fechado, no subsolo. Imagino que meu paradeiro não será facilmente
descoberto. Vou tomar todas as precauções possíveis.
Agarro a mão de Anahí e a conduzo ao luxuoso hall do hotel. Ficar escondido aqui com ela vai
custar uma boa grana, mas ela merece cada centavo. Além disso, ela talvez nunca tenha tido a
oportunidade de ficar em um lugar como este antes. Se eu conseguir fazer com que ela se sinta
segura, ela pode até curtir o lugar. O fato de tê-la só para mim, num lugar como este, por um
período de tempo indefinido, é um enorme bônus.
Uma garota morena atrás da mesa da recepção nos recebe.
— Pois não?
— Estamos só de passagem. Não temos reserva. Você tem alguma suíte disponível para a
semana?
— Uma suíte? Claro, senhor. Deixe-me verificar a disponibilidade para essas datas.
Enquanto ela digita alguns dados no computador, lanço os olhos à Anahí. Ela parece estar
numa boa, considerando-se tudo o que aconteceu. Está um pouco pálida, mas sei que está
morrendo de medo, portanto isso era esperado.
Ela levanta os olhos para mim e sorri. É um sorriso pequeno e tenso, mas não deixa de ser um
sorriso. Para mim, já está bom.
Aperto sua mão e me curvo para beijar seu rosto. Antes de voltar à posição normal, sussurro
em seu ouvido:
— Prometo que não deixarei nada acontecer a você.
Quando me inclino para trás e examino seus grandes olhos azuis, eles estão brilhando com
lágrimas não derramadas. Seu queixo treme e meu coração se aperta dentro do peito.
Sou o responsável por isso.
Não sei se é receio por sua própria segurança ou a de Mia, ou se é apenas o choque pelo
que acabou de presenciar, somado a todas as coisas que aconteceram em sua vida nos últimos
dias, mas algo a está deixando arrasada. Posso ver isso e me sinto responsável.
Ela retribui o gesto e aperta minha mão. Considero isso um bom sinal, um sinal de que talvez
ela não me culpe completamente. Bem, talvez ela não me odeie completamente. Porque a culpa,
sem dúvida, recai sobre mim.
— Senhor, realmente temos uma suíte disponível até o próximo fim de semana. O senhor tem
nosso cartão de pontos?
— Não.
— Certo. Só vou precisar da sua carteira de motorista e do cartão de crédito que o senhor
gostaria de usar para o pagamento.
Noto que ela não menciona o preço do quarto. Suponho que esteja subentendido que, quando
você pede uma suíte em um hotel como este, a conta será exorbitante. Entrego a ela o cartão de
crédito corporativo da Dual. Ele está registrado no nome da empresa, portanto ninguém deve
conseguir rastrear seu uso. Além disso, especifico que quero a reserva também no nome da empresa, para fins de faturamento e impostos. Ela acena a cabeça num gesto que demonstra ter entendido.Para a maioria das pessoas, isso pareceria completamente razoável. E ela não é exceção.Várias vezes, vejo seu olhar se dirigir à Anahí. Com certeza, ela acha que sou um executivo que está tendo um caso ilícito às custas da empresa. Mas eu não me preocupo com o que ela pensa,desde que seja algo bem longe da verdade.
— Aqui estão as suas chaves, senhor. A suíte fica no 15º andar. Os elevadores ficam bem
atrás da parede d’água. Basta passar a chave diante do sensor infravermelho quando as portas do elevador se fecharem. Ele o levará ao seu andar. Seu quarto é à esquerda. Se precisar de
qualquer coisa, meu nome é Angela. Será um prazer ajudá-lo.
— Obrigado, Angela. Só uma pergunta: vocês têm serviço de quarto 24 horas?
— Sim, senhor. Jantar no quarto está disponível a qualquer hora para nossos hóspedes.
— Ótimo. Então acho que é só isso para esta noite.
— Sim, senhor. Aproveite sua estadia conosco.
Após pegar as chaves e o pacote de informações que Angela me entrega, pouso a mão na
parte de baixo das costas de Anahí e a conduzo aos elevadores. Dentro do elevador, seu silêncio
continua. Não tento incentivá-la a conversar porque sei que ela só tem perguntas a fazer,
perguntas sobre coisas que não devemos discutir em um elevador público.
Quando o elevador para suavemente e as portas se abrem com um ruído abafado, eu conduzo
Anahí para fora e seguimos para a esquerda. Abro a porta da suíte e deixo-a entrar.
Por sua expressão, posso perceber que ela nunca tinha visto acomodações como estas. Apesar
do choque e do medo, ela está visivelmente impressionada. E a suíte que nos deram é de alto
padrão. Fico feliz de ter dinheiro para oferecer-lhe algo assim, embora as circunstâncias não
sejam as melhores.
A primeira coisa que noto quando entro no quarto são as janelas do chão ao teto, que dão vista para o impressionante horizonte de Atlanta. Elas são o pano de fundo da sala de estar em frente,bem como da sala de jantar à esquerda. Ambas as salas são decoradas nas cores bege e
vermelho-escuro. A iluminação é suave, o que proporciona um efeito calmante ao ambiente.
Como homem, eu aprovo totalmente. Há uma enorme TV em um canto da sala e, um pouco
atrás, portas duplas que se abrem para o quarto.
Vou direto ao guia de serviços hotel encadernado em couro, na mesa de centro. Abro na
página do cardápio e o entrego à Anahí.
— Tenho certeza de que você está com fome. Por que não escolhe algo para pedir do serviço
de quarto? Eu espero eles entregarem antes de sair.
— Sair? Aonde você vai?
— Alguém vai me ligar dentro de quarenta minutos. Quero estar na boate quando receber
essa ligação, para que eles não possam rastrear meu GPS. Depois do telefonema, vou comprar
telefones pré-pagos para usarmos, até que eu possa resolver isso.
— Resolver? Alfonso, me diga o que está acontecendo.
Suspiro. E penso novamente: Merda, odeio tê-la arrastado para tudo isso. Se eu tivesse ficado
longe dela...
— Eles estão com Mia. E querem que eu leve os livros. Eles irão ligar uma hora depois do
primeiro telefonema.
— Você não pode entregar os livros sozinho, Alfonso. Eles matarão vocês dois! Você tem que
chamar a polícia. Meu tio é um homem muito influente. Ele pode fazer algumas pessoas
moverem céus e terras para salvar a filha.
— Por isso é que ele não pode saber nunca o que está acontecendo. Isto é, enquanto as coisas
não estiverem resolvidas. Será um risco maior para ela se chamarmos atenção. Eles terão mais
razão para se livrarem do problema. Se eu puder resolver isso sem alarde, resgatar Mia,posso traçar um novo plano.
— Você vai lá sozinho? Você acha que depois de dar o que eles querem, eles o deixarão ir
embora? Ainda por cima levando Mia? Alfonso, eu não sei quem são essas pessoas, mas sei que
não é isso o que eles irão fazer. Criminosos não agem assim.
Quero dar uma risada. Parece até que ela tem muita experiência com criminosos. Ha, ha!
Com certeza, isso tudo é baseado em alguns filmes clássicos de gângster.
— Anahí, meu pai conhece essa gente. Melhor do que ninguém. Não vou fazer nada enquanto
não falar com ele. Os livros estão escondidos. Eu vou dizer que eles estão em um cofre e que só
posso pegá-los na segunda-feira, quando os bancos abrirem. Eu já teria dito isso a eles, mas eles só disseram que estavam com Mia, me mandaram pegar os livros e avisaram que me
telefonariam dentro de uma hora, indicando um lugar para me encontrar.
— Quer dizer que você vai deixar Mia com eles até segunda-feira?
A expressão em seu olhar diz claramente que ela considera isso algo que só um monstro faria.
Ela aperta o guia de serviços do hotel sobre o peito, e eu me aproximo e toco seu rosto.
— Se eu tivesse outra escolha, não faria isso. Mas não tenho. Eu preciso de tempo. Eles não
farão nada com ela enquanto não tiverem o que querem. E preciso ter absoluta certeza de que
tenho tudo sob controle antes de dar a eles o único trunfo de que disponho.
Ela busca o meu olhar. E eu a fito. Sei que ela tem dificuldades para confiar em mim, que
acha que não passo de um bad boy. A realidade da minha situação só faz piorar as coisas. Se ela
puder continuar comigo, só mais um pouco...
— Você pode confiar em mim? Por favor! Sei que não tenho dado muitas razões para isso,
mas só desta vez, siga o seu coração. Eu prometo, prometo, que não vou desapontar você.
Mesmo ao dizer essas palavras, sei que não há como cumprir tal promessa. Mas posso
prometer que, se eu desapontá-la, não será porque deixei de fazer todo o possível para agir como o homem que ela merece. Quero merecer o risco. Quero que ela finalmente se apaixone pelo
cara certo.
Ela não diz nada, apenas concorda com a cabeça. Sei que é difícil para ela, mas o fato de
estar disposta a tentar me enche de esperança. Talvez se eu trouxer algumas coisas pessoais, isso a ajude a relaxar. Eu sei que ela deixou a bolsa em casa, e eu não a peguei quando saímos. Vou até lá para buscá-la quando voltar. Talvez isso faça com que ela se sinta melhor. Por outro lado,eu sou homem. Ou seja, como vou saber se isso vai adiantar?
— Afinal, o que você quer comer? Eu posso pedir. Assim você pode comer enquanto eu vou
até o seu apartamento pegar a sua bolsa, mais algumas roupas e trancar a porta. Há algo
específico que você queira que eu traga?
Ela faz uma pausa para pensar e acena negativamente a cabeça. Não sei muito bem por que ela está tão quieta, mas não quero pressioná-la.
— Também vou precisar do seu celular. Vou levá-lo para a boate e deixá-lo lá, a título de
prevenção. Enquanto isso, você pode usar um dos telefones que eu trouxer, está bem?
Ela acena a cabeça novamente.
— Você pode ligar pro seu pai e pra Rachel pela manhã. Apenas diga a eles que o seu
telefone está desativado durante alguns dias, e que você vai ligar para saber notícias deles.
Jogaremos esse telefone fora depois que você falar com eles, e você pode usar outro para ligar
depois, durante a semana.
Seu sorriso é propício, mas muito tenso.
— Vai ficar tudo bem. Vou fazer com que fique tudo bem.
Ela faz um gesto de assentimento, mas permanece sem falar nada. Eu me recuso a admitir a possibilidade de já ter causado danos irreparáveis. Terei de encontrar um modo de fazê-la
confiar em mim, de nos tirar desta encrenca. Talvez depois...
Vc está rindo Cami pq vc é mal.
continua......