Alfonso
Estou muito agitado para conseguir dormir. Quanto mais se aproxima o raiar do dia, mais ansioso
fico para ver como tudo isso vai acabar.
Olho o relógio. Sem janelas no quarto, não posso ver o sol nascer, mas sei que está
amanhecendo. E isso me faz pensar em Anahí , dormindo pacificamente, assim espero, na casa
de sua mãe. Sozinha.
A ideia de Caio possivelmente enroscado ao lado dela me deixa totalmente descontrolado.
Com um resmungo, lanço o braço sobre os olhos e tento desanuviar a mente.
Mas não funciona. Não consigo deixar de pensar nela.
Talvez se eu telefonasse e deixasse tocar só uma vez...
Ela não tem um sono muito leve. Um toque não deve acordá-la se ela estiver dormindo. Mas
se ela estiver acordada...
Aperto a tecla de discagem rápida para o seu celular descartável e o telefone automaticamente chama o número dela. Ele toca uma vez. Quando eu estava prestes a apertar o botão para desligar, a voz abafada de Anahí atende a ligação.
— Oi — diz ela, sem acrescentar mais nada. Eu abro um sorriso. Posso quase ver o olhar tímido no seu rosto quando ela diz isso. E com essa única palavra, percebo que ela está feliz por eu ter telefonado. Agora quero ir até a casa da mãe dela, entrar sorrateiramente pela janela e transar lenta e tranquilamente com ela contra a parede.
— Você está acordada.
— Estou. Não consigo dormir. Você também?
— De jeito nenhum. Minha cabeça não sossega.
— Sei como é.
Há um longo silêncio, durante o qual tenho certeza de que ela está se perguntando qual é a
minha intenção. Entretanto, antes que eu possa falar, ela se antecipa e diz:
— Na verdade, gostei de você ter ligado. Há algo que eu quero dizer. É uma coisa que eu
deveria ter dito antes, mas não disse. E agora lamento não ter feito isso. Quando estávamos frente
a frente. Mas sou uma idiota, então...
Sorrio na escuridão. Eu apostaria mil dólares que ela está mexendo no cabelo. É o que ela faz
quando fica nervosa. E é perfeitamente óbvio agora, pela velocidade de suas palavras, que ela está nervosa.
— O que você queria dizer? — Tenho quase certeza de que já sei. Consigo perceber como ela
se sente em relação a mim quando não está lutando contra isso e quando não fica perdida no
passado, que às vezes bloqueia seus pensamentos. E eu espero que, depois de tudo o que aconteceu, ela saiba como me sinto. Mas ela é mulher. Acho que mulher gosta de tudo nos mínimos detalhes. Diferente dos homens, as mulheres precisam de palavras, do caráter definitivo delas. Os homens não. Mas de qualquer maneira, eu não me importaria de ouvir Anahí dizê-las. Ouço sua respiração profunda e a imagino fechando os olhos com força, como se estivesse
pulando de uma ponte ou algo assim. Dando um salto. E, em se tratando de Anahí , provavelmente é como se isso fosse a mesma coisa.
— Acho que estou apaixonada por você — fala ela sem pensar. — Por favor, não diga nada!
— ela se apressa em dizer, antes que eu possa falar qualquer coisa. — Não quero que se sinta obrigado a dizer nada em resposta. Eu só não queria que você fosse resolver essa situação sem saber como me sinto. Queria que soubesse que realmente estou tentando deixar o passado para trás e não deixar isso ficar na minha cabeça e estragar as coisas entre nós.
— Não me sinto obrigado a dizer nada.
— Tudo bem — diz ela de forma inexpressiva. — Bem, isso é bom. Porque eu não ia querer
que você fizesse isso.
— Não vou. Se eu disser “eu te amo” é porque é o que eu sinto, e não porque é uma resposta
esperada.
— Certo — diz ela baixinho. — Ah, droga! Minha mãe acordou. Vou ter que desligar. Por favor, tenha cuidado hoje!
— Pode deixar.
— A gente se vê logo?
— Assim que eu souber que você está segura.
— Por favor, faça isso ser logo.
Eu rio.
— Vou me esforçar ao máximo para fazê-los se curvarem à minha vontade.
— Não deve ser difícil. Você é muito bom nisso.
— Como você sabe?
— Você já usou seu poder de persuasão comigo, mais de uma vez.
— Gata, eu ainda nem comecei a usá-lo. Espere só até você voltar.
— Vou cobrar de você essa promessa — murmura ela, o sorriso evidente em seu tom de voz.
— Pode apostar. Você vai fazer o que eu mandar, certo?
— Sim, coronel — diz ela, brincando, referindo-se ao nosso gracejo quando ela pensava que
eu era Miguel .
— Muito bem. É assim que eu gosto.
— Talvez eu até faça uma saudação quando você vier me pegar.
— Vou me encarregar da saudação. Tenho certeza de que haverá partes do meu corpo em
posição de sentido quando eu for pegá-la.
— Você é tão malicioso.
— Mas só do modo positivo.
— Certo — diz ela baixinho. — Só do modo positivo.
— Tente descansar um pouco. Ligo pra você quando voltar.
— Tudo bem. A gente se fala mais tarde.
Há uma pausa. Nenhum de nós dois quer dizer adeus. Portanto não falamos nada. Ela
simplesmente desliga. E eu faço o mesmo.