Alfonso
Quando atendi e ouvi as palavras “você colocou o anúncio?”, eu sabia que era a segunda linha de
defesa do meu pai. Supondo, naturalmente, que Miguel fosse a primeira. É inteiramente possível,
contudo, que esta pudesse ser mais útil. Espero que seja.
Depois que fecho a porta do escritório atrás de mim, eu respondo.
— Sim, coloquei o anúncio.
— Arranje outro telefone. Pegue a estrada por volta das nove, esta noite. Ligue para este
número seis minutos depois disso. Darei novas instruções.
A ligação é cortada, deixando-me aflito. Eu gostaria, pelo menos, de ter feito umas perguntas.
Claro, pensando bem, talvez não seja recomendável dizer muita coisa no meu telefone pessoal.
Infelizmente, isso não diminui minha irritação.
Minha mente começa a formular planos e estratégias. O que mais me preocupa, no entanto,
não é como me proteger, mas o que fazer com Anahí enquanto estiver fora. Qual seria a melhor
maneira de mantê-la em segurança?
Caio é um cara bacana e fez tudo o que podia. Mas agora me sinto inseguro em deixá-la aos
cuidados de qualquer outra pessoa. Então analiso as minhas opções e concluo que, afora a
hipótese de levá-la comigo, o que me recuso a fazer porque poderia ser muito perigoso, o lugar
onde ela provavelmente estaria mais segura é aqui, atrás do balcão, na Dual. Cercada por
centenas de testemunhas. Nunca sozinha.
Agora, explicar isso a Anahí sem parecer um babaca insensível é a parte difícil. Qual a
melhor forma de abordar esse assunto?
Sua vida foi completamente virada de cabeça para baixo por minha culpa e da minha família;
seu apartamento foi saqueado; você foi raptada e drogada, teve uma briga com a vaca da sua
prima e com sua mãe, a rainha do gelo, mas será que dava, por favor, para trabalhar um turno na
minha boate esta noite?
É, isso não vai colar, de jeito nenhum.
Eu volto ao quarto e faço o que deveria ter feito quando a campainha tocou.
— Muito bem, todo mundo pra fora! Tenho que falar com Anahí e ela precisa de um pouco
de privacidade pra se vestir.
Ninguém discute, naturalmente. Na realidade, Caio até parece um pouco envergonhado por
ter sido tão grosseiro. Foi realmente indelicado da parte de todos nós mantê-la nessa situação. Só
mesmo Anahí para ficar tão tranquila, tão serena, mesmo cercada de gente e aturando conversas
desagradáveis, enrolada na roupa de cama. Debaixo de toda aquela beleza exuberante há uma
estrutura de aço. Espero que, depois de hoje, ela se dê conta disso.
— Obrigada — diz ela quando Caio fecha a porta atrás deles.
— Desculpe não ter feito isso antes.
— Bem, na realidade não houve exatamente um momento apropriado. Isso aqui estava
parecendo um circo! Só estava faltando a mulher barbuda e um engolidor de espada, embora a
Rachel pudesse ser capaz de engolir algo quase tão grande.
Ela dá uma risada e isso me faz querer abraçá-la. Não sei por que, realmente, mas é o que
tenho vontade de fazer.
— Bem, na posição de chefe dessa trupe que agora cerca a sua vida, peço desculpas por
desapontá-la.
Uma expressão de ternura toma conta do rosto de Anahí . Seus olhos são penetrantes,
como uma dor suave, quando me encaram. Sem quebrar o contato visual, ela deixa as cobertas
caírem abaixo do peito e desliza o corpo para a borda da cama. Em seguida, caminha lentamente
na minha direção, nua como veio ao mundo. Só que mil vezes mais bela.
Ela para quando seus mamilos roçam o meu peito.
— Você não me desapontou. Você encheu de vida a minha existência. Nunca se arrependa
disso.
— Mas eu...
— Psiiiu — diz, colocando o dedo nos meus lábios. Ela adora fazer isso. — Por favor.
Aceno a cabeça e me esforço para controlar a reação do meu corpo à sua proximidade.
Tenho de aprender a aguentar ficar perto dela, aprender a pensar em outras coisas além de
arrancar sua roupa com os dentes e mergulhar nela como em uma cama macia e úmida,
coberta de pétalas de rosas.
Eu pigarreio e me concentro no assunto que eu precisava resolver com ela, em primeiro
lugar.
— A ligação que eu recebi há alguns minutos...
Sua expressão torna-se séria, preocupada.
— Sim. O que era?
— Era sobre o segundo anúncio que eu coloquei. Preciso me encontrar com o cara esta noite.
Mas acontece que não estou tranquilo em deixá-la. Nem um pouco. Mas sei que não é uma boa
ideia levá-la comigo, portanto não tenho escolha.
— Não se preocupe — diz ela docemente. — Vou ficar bem.
— Claro que vou me preocupar com você. Mas acho que arranjei uma maneira de garantir a
sua segurança. Quer dizer, se você concordar.
— E qual é?
Ela parece desconfiada, o que acho meio engraçado.
— Não vou trancá-la em uma sala em qualquer lugar, se é isso que você está pensando. — A
expressão em seu rosto diz que era exatamente isso o que ela estava pensando. — Pra falar a
verdade, é algo que você já fez antes.
— E o que seria? — pergunta ela, querendo mais detalhes.
— O que acha de fazer um turno esta noite? Eu imaginei que, atrás do balcão, com centenas
de pessoas à sua volta, seria o lugar mais seguro em que eu poderia deixá-la.
— Tudo bem. Por que não disse logo? Você me deixou preocupada.
— Porque não quero que você pense que sou um babaca insensível. Você teve um dia
péssimo. Um dia realmente péssimo e...
— Nem todo o dia foi péssimo — diz ela, olhando para mim por baixo dos seus cílios espessos.
Isso me leva de volta à necessidade de me esforçar para pensar em outras coisas além de tê-la
em cima de mim, como se montasse um garanhão premiado.
— Bem, ruim o suficiente, digamos. De qualquer maneira, pedir que você trabalhe parece
algo que um cretino egoísta faria, e não quero que você pense...
— Você não é um cretino egoísta. Você não ouviu uma palavra do que eu disse à minha mãe?
— Sim, mas...
— Nada dessa história de “mas”. Alfonso, eu te amo.
Como o idiota que sou, fato que culpo exclusivamente à posse de testículos, eu congelo. Não
digo absolutamente nada. Omito todas as coisas que estou sentindo. Todas as coisas que preciso
dizer. Apenas fico olhando para ela. Como um perfeito idiota.
Posso ver a decepção estampada em seu rosto e me mata ver sua luta para combater esse
sentimento. Mas ela consegue. Ela se recupera, sorridente e animada, embora seu coração
provavelmente não sinta o mesmo.
— Além disso, acho que o trabalho me fará bem. Vai me ajudar a manter a mente ocupada.
— Tem certeza?
— Absoluta — diz ela concordando, a angústia transparecendo em sua expressão gentil. —
Vou tomar banho. Pra valer desta vez. — Ela brinca, tentando de todas as formas demonstrar
alegria. Então fica na ponta dos pés e beija meus lábios levemente. — Agradeça a Caio por
trazer a minha bolsa.
— Ele trouxe suas coisas?
— Deve ter trazido. Eu acabei de ver a bolsa no canto, há um minuto.
— Certo, eu falo com ele.
— Obrigada — diz ela com um sorriso, antes de passar por mim e se dirigir ao banheiro.