Anahí
Aposto que olhei para a porta do escritório umas 10 mil vezes, sempre esperando ver o rosto de Alfonso. Estou quase tendo um ataque. A sensação é de uma faca enfiada na barriga toda vez que lembro que ele não retribuiu a minha declaração de amor. Mas eu o amo. Estou apaixonada por
ele. Não posso imaginar viver o resto da minha vida sabendo que ele morreu para me salvar. Mesmo se eu não conseguir ficar com ele, se não conseguir viver esse sonho com ele, se não conseguir o seu coração, isso não muda o fato de que o amo mais do que jamais amei alguém. E
só de imaginá-lo deixando essa vida por minha causa é algo insuportável. Mesmo se não puder tê-lo, só de saber que ele está vivo... e são... e salvo... já basta.
Só de saber que ele está por aí... em algum lugar... Pela milésima vez, sinto as lágrimas no fundo dos meus olhos.
Por favor, meu Deus, por favor, meu Deus, por favor, meu Deus.
Esse mantra está atravessando a minha cabeça quase constantemente. Não sei como consegui preparar uma única bebida esta noite. Acho que tenho um puta piloto automático a meu dispor. Isso é, ele só não funciona na hora de me vestir.
Mais uma vez, lanço os olhos à porta. Quando estou desviando o olhar, decepcionada, avisto Vinicius. Ele sorri. Não é um sorriso sedutor ou um sorriso particularmente feliz. É mais um sorriso
de compaixão. Queria saber o que ele está pensando, o que ele sabe. Não sei muito bem por que ainda me preocupo. Se as coisas não derem certo entre mim e
Alfonso, não vou continuar trabalhando aqui, de qualquer maneira. Então qual é o problema? Você é uma tremenda idiota. Esse é o problema.
Verdade. Totalmente verdade.
Vejo as luzes da boate começarem a diminuir. É como eu sei que uma canção lenta vai começar a tocar. Era tudo o que eu precisava agora: uma canção de dor de cotovelo para acabar de arrancar o meu coração.
Reconheço a canção de Saigon Kick logo nas primeiras notas. Meu pai me ensinou muito bem. Como suspeitei, a música é como uma facada no peito. A preocupação com Alfonso, associada à letra da música, é o suficiente para me deixar sem fôlego. Literalmente. Por alguns segundos,
sinto dificuldade para respirar.
Mas então, de repente, fico bem.
De pé, na porta do escritório, está Alfonso. Seus olhos estão fixos nos meus, e eu os sinto, realmente os sinto por todo o meu corpo. É como estar nua, no meio da noite, numa chuva quente de verão. Ele está em todo lugar. Está na minha pele, sob a minha pele, no meu coração, na minha alma. Sinto que poderia explodir de desejo de ir até ele. Uso toda a minha força de vontade para ficar parada, para controlar a minha expressão. Para fingir. E consigo. De alguma forma, eu consigo. Até ele caminhar na minha direção. Então eu paro. Paro tudo. Paro de me mover, de respirar, de pensar. Tudo que consigo fazer é ver as pernas compridas de Alfonso reduzirem a distância entre nós. Sem uma única palavra, ele abre caminho entre o mar de gente. Quando chega perto de mim, vai até o balcão, estende o
braço e me oferece a sua mão. Seus olhos estão fixos nos meus, e o resto do mundo desapareceu. De repente, não importa
quem está olhando. Nada importa, além de Alfonso. Nada nunca importou. E nada jamais importará. Eu acaricio seus dedos e ele agarra minha mão. Eu pego impulso e coloco um joelho sobre o balcão. Alfonso solta a minha mão, dá um passo à frente e me puxa sobre a superfície lisa, me pegando em seus braços. Posso sentir sua respiração, quente e rápida, soprando em meu rosto. Posso sentir a sua necessidade, selvagem e faminta, queimando a minha alma. E por apenas um segundo, tenho a impressão de sentir seu amor também. Ele me queima, mas de um modo completamente diferente. Como uma marca a ferro, que diz que sempre serei dele e ele sempre será meu.
Então ele abaixa a cabeça e seus lábios cobrem os meus. Vagamente, ouço gritos, assobios e aplausos, mas não me preocupo. Não me preocupo com quem vê, com quem sabe nem como se
sentem a respeito. Só me preocupo com o homem que me tem nos braços. Sempre nos seus braços. Quando Alfonso levanta a cabeça, sua boca está curvada em um sorriso malicioso.
— Eu já te disse que te amo? — pergunta ele.
Meu coração dá uma cambalhota tripla dentro do peito, e eu sinto que isso se reflete no meu sorriso radiante.
— Não. Tenho certeza de que me lembraria.
Alfonso começa a andar em direção à escada lateral, a que leva à sala VIP, onde o vi pela primeira vez. Não importa para onde ele me leve, desde que não me deixe.Nunca.
— Bem, a culpa é sua. Toda vez que eu tinha uma grande oportunidade de falar isso, você falava antes de mim. E você sabe tão bem quanto eu que não sou o tipo “estraga prazer”. Eu gosto de prazer. E muito.
— Ah, eu sei — digo brincando. — E desta vez — acrescento, inclinando a cabeça em direção à multidão animada — você vai ter. Aos montes.
— O mais engraçado é que a única coisa que eu quero é você. Só você. Se dependesse de mim, eu faria o mundo desaparecer e ficaríamos só nós dois. Somente você e eu.
— Queria que você fosse um mágico.
— Bem, não sou mágico, mas tenho alguns truques na manga — diz ele com uma piscadela.
— Jura?
— Juro. Quer ver?
— Claro.
Alfonso sobe as escadas, dois degraus de cada vez, e, quando chegamos ao andar de cima, ele se curva para que eu possa abrir a porta da sala VIP. Ela se fecha, automaticamente, atrás de nós