Fanfic: um amor infernal{dyc}

Capítulo 1 - 3ª parte

Ela observou por baixo de um dos carros enquanto vários pares de bota passaram correndo, e gemeu quando viu as pernas das calças camufladas enfiadas nos canos delas. Aparentemente, o prefeito tinha cumprido a ameaça de convocar a Guarda Nacional se os protestos saíssem do controle novamente. Ela não discordava da decisão, só da oportunidade. Ele deveria ter assumido o controle da situação semanas antes, ao invés de deixar que as coisas alcançassem um ponto de ebulição.
 Ela acrescentou mais aquilo à lista de pecados dos políticos. Desde que a imprensa havia revelado que o prefeito já sabia dos planos para revelação mundial do sobrenatural pelo menos uma semana antes do resto da população, aquela lista tinha crescido a proporções astronômicas. Dul pensou que teria sido bom se ele tivesse um plano de contingência preparado com antecedência, só para o caso do público não aceitar bem a notícia do milênio.
 Era só uma idéia, já que Dul não era política nem nada parecido, ela só achava que fazia sentido.
 A única coisa que definitivamente não fazia sentido para ela naquele momento era passar o resto da noite agachada entre dois carros velhos. Ela não apenas se sentia ridícula, como estava começando a sentir cãibra nas pernas. Gastão não estava à vista, mas ela achava que poderia abrir caminho até o furgão da emissora e chegar em seu apartamento na tranqüila Greenwich Village sozinha. Afinal, ela era uma menina crescida, com 27 anos, e perfeitamente capaz de cuidar de si mesma. E talvez ela até conseguisse evitar se afogar num mar de autopiedade.
 Talvez.
 Arriscando outra olhadela por cima do capô do carro, Dul fez uma careta. A visão da multidão e o som dos soldados gritando para restaurar a ordem por alguma razão não lhe inspiravam muita confiança.
 Dulce de abaixou e olhou de trás de um pneu careca para as fileiras de veículos estacionados. O furgão que havia trazido ela e Gastão estava estacionada a meio quarteirão de distância, esperando pela fuga perfeita, a provocando com sua proximidade. Quinze metros de distância, que poderiam ser quinze quilômetros, pois haviam pelo menos trinta irritados protestantes, alguns empunhando seus cartazes como se fossem porretes, entre ela e o carro. Desde que não podia alcançar a droga do furgão, Dulce fez dele o objeto de seu ressentimento.
 De algum lugar da vizinhança, um lobo uivou, e instantes depois o som de sirenes acrescentaram uma trilha sonora para o pandemônio.
 Dul fez uma careta. Era a trindade perfeita para completar a noite: polícia, ambulância e um lobisomem.
 Dul ainda não se acostumara a pensar seriamente em palavras como aquela, não sem hesitar e completar com um "como naquele filme...". Mas desde que haviam se passado apenas seis semanas desde o Desvelo, como tinham chamado o anúncio, ela achou que não estava sendo preconceituosa.
 Afinal, não era todo dia que uma garota tinha que mudar toda a sua visão de realidade para acomodar todo o elenco da programação de outubro do Sci-Fi Channel, e graças a Deus por isso! Tudo ainda tinha uma qualidade surreal, como se fosse um sonho do inconsciente coletivo da humanidade, do qual logo todo mundo ia acordar e esquecer de coisas como vampiros até o próximo filme do John Carpenter ou livro da Anne Rice.