Incrivelmente, Dulce estava calma, tranquila. Sentada ao lado de Christopher, com a mão entrelaçada a dele, ela observava a repórter que ajeitava o gravador e as folhas sobre seu colo. As câmeras já estavam posicionadas e faltava apenas começarem a entrevista. Na noite anterior ela e Christopher passaram horas conversando, planejando e se amando. Estavam decididos a darem uma banana para os preconceituosos e demagogos e viverem o amor. Naquele mesmo dia, à tarde, após a saída de Rose e Emmett,Christopher recebeu o telefonema de duas escuderias, ambas jogando alto para tê-lo na equipe. Obviamente ele iria analisar tudo, iria conversar com seu agente para depois dar uma resposta. Mas Dulce não gostou quando Christopher sugeriu dar um tempo na carreira. Ela sabia que isso era conversa fiada. Se desse um tempo, ele não voltaria mais.
— Podemos começar, Christopher? Posso chama-lo assim, não posso?
— Sim, Hellen. Claro.
— Bom... não vou negar que essa história é polêmica. É o assunto de todos os jornais e revistas nas duas últimas semanas. O senhor Victor deu várias entrevistas, respondendo às perguntas dos repórteres. Eu queria fazer diferente. Queria que você me contasse sua história. Sua noiva pode ajudar, se quiser. Somente depois, se achar necessário, eu farei uma pergunta. Pode ser?
Dulce simpatizou logo com a repórter. Era exatamente isso que Christopher tinha em mente. Em um caso como esse, era sempre perigoso responder a perguntas previamente formuladas.
— Perfeitamente.
— Então pode começar.
Christopher apertou a mão de Dulce e sorriu pra ela antes de começar.
— Tudo começou há sete anos...
Christopher narrava a história deles e Dulce se emocionava. Agora era mera telespectadora do que começou com uma paixão e se transformou nesse amor imenso. Qualquer pessoa que ouvisse esse relato de Christopher não teria dúvida alguma do amor que os unia.
A cada frase a repórter se inclinava mais na direção deles, a mão sobre o queixo, parecendo completamente fascinada com o que ouvia. Em determinado momento ela interrompeu Christopher.
— Espere ai. Isso tudo é incrível demais. Estou adorando ouvir você, mas eu preciso dizer isso.
— Fique à vontade.
— Quer dizer que... você mudou por causa dela? É como se... o mundo desabasse pra você no momento em que soube que eram irmãos... ai você se fechou pra vida?
— Exatamente.
— Você não poderia ama-la, não poderia ser amado por ela, mas ao mesmo tempo não conseguia refrear e não queria amar mais ninguém.
— Sim. Foi assim que aconteceu. Não é que eu me obrigava a isso, eu simplesmente não conseguia.
—É a história de amor mais linda que já ouvi. Mas... continue.
Christopher continuou relatando os fatos. Quando contou sobre a volta de Dulce, ela interferiu.
— Eu me sentia exatamente igual ao Christopher. Eu tentei me envolver com outro, mas não deu certo. Não dava mais para ficar longe dele e guardando esse amor. Então eu voltei. Ele tentou fugir... mas eu insisti.
A repórter sorriu e incentivou Dulce a continuar falando. Depois Christopher retomou a palavra, contando até os últimos acontecimentos.
— Então a história é essa. Eu não quero empurrar nosso relacionamento goela abaixo de ninguém, eu só quero que respeitem nossa situação. É difícil de entender ou aceitar? Sim, eu sei que é. Mas estamos falando de amor e não de uma transa qualquer. Eu não quero que nosso relacionamento seja julgado de forma tão vil.
— Posso dizer o que penso?
— Claro.
— Nossa sociedade é hipócrita e demagoga. Eu já vi milhares de pessoas na rua comentando sobre vocês. Eles dizem: eu não concordo. Eu sou contra incesto. Gente... ninguém tem que concordar com nada. Cada um tem que cuidar da própria vida. O que conta aqui não é o amor entre irmãos, e sim o respeito a dois seres humanos. É fácil falar que é contra, que isso é errado quando não está sentindo na pele.
Ela fez uma pausa, rabiscou algo na folha e voltou a falar.
— O que tenho a dizer é que admiro vocês dois por se prontificarem a contar a história de vocês, que aliás é linda. E digo mais uma coisa: pessoas que apontarem o dedo e discriminarem também não merecem o respeito de vocês. Gente... estamos falando do respeito ao ser humano, às suas escolhas.
Dulce sentia o coração batendo tão disparado que era quase impossível respirar normalmente. Christopher estava igualmente eufórico. Falou o que queria, abrindo-se por inteiro, mostrando tanto amor que nem mesmo ele conseguia dimensionar. Ele agradeceu à repórter e ela mais uma vez os parabenizou, prometendo que a revista sairia no dia seguinte e a reportagem iria ao ar naquela noite.
— Uau... ela foi incrível, Christopher.
— Não foi? Sinceramente eu fiquei com medo que mandasse alguma louca que dissesse um monte de merda.
Eles se abraçaram fortemente e depois se beijaram, lentamente, saboreando o momento.
— Estou me sentindo mais leve.
— Eu também.
Nesse momento Chris entrou com uma bandeja, onde estavam duas taças de vinho.
— Acho que meus patrões precisam de uma bebida agora.
— Como sempre certeiro, não é Chris?
— Sei de todas as suas necessidades.
Christopher pegou as taças, entregando uma a Dulce com um olhar penetrante.
— E você Dulce? Sabe de todas as minhas necessidades?
Ela arfou e estremeceu quando seus dedos se tocaram ao pegar a taça.
— Talvez.
Com um sorriso nos lábios, Chris se afastou, deixando-os a sós.
— Sabe do que estou precisando agora?
— Você eu não tenho certeza... mas imagino que seja o mesmo que eu preciso agora.
As duas taças foram abandonadas quase intactas sobre a mesa. Os dois subiram para o quarto de mãos dadas, ambos trêmulos como se fosse a primeira vez. E de fato era. A primeira vez sem medo, sem se preocuparem com o que diriam se descobrissem. A primeira vez inteiramente livres para curtirem um ao outro sem a preocupação de estarem ferindo ninguém. Pelo contrário, eles é que foram feridos por preconceito, maledicência e intolerância. Agora tinham absoluta certeza que amor não deve ferir, não deve julgar, não deve separar. Amor apenas floresce, amadurece...e se fortalece.