PROVAVELMENTE EU estava canalizando a dançarina dentro de mim. Porque adentrei outro
reino quando Alfonso me beijou. As inibições caíram por terra. A insegurança contra a qual
tinha lutado durante toda a minha vida foi banida para o século seguinte.
Sentia-me linda. Poderosa.
E muito sensual.
Eu queimava de dentro para fora enquanto a mão de Alfonso percorria minhas costas.
Minha cabeça girava como se eu tivesse bebido bem mais do que três goles de
champanhe. Graças a Deus aquele era um parque público. Embora se assemelhasse à
Terra de Ninguém agora, um guarda do parque poderia chegar a qualquer momento. Isso
ajudaria a manter minhas roupas no lugar.
Pelo menos, eu achava que ajudaria. Não havia como dizer o que a combustão
espontânea era capaz de fazer.
Eu queria poder gravar aquele momento para sempre e reprisá-lo como um filme. Eu o
dividiria quadro a quadro e repassaria cada um deles. Em algumas vezes, me concentraria
no toque dele e onde as mãos aqueciam meu corpo. Em outras, me concentraria no beijo e
na dinâmica dos lábios dele sobre os meus.
Na atual circunstância, só tinha o agora, e meus sentidos estavam tão sobrecarregados
que eu estava uma pilha de nervos, formigando. Até mesmo minhas mãos zuniam com
uma carga quase elétrica. E, no entanto, ele só se concentrava em minha boca, tratando-a
com o cuidado mais requintado.
Alfonso beijava como um deus. Não era muito bruto. Não muito delicado. Apenas
maravilhosamente direto. Caí para trás com o beijo, derretendo no cobertor, molenga por
causa daquela degustação erótica.
Gentilmente, ele segurou minha nuca antes de minha cabeça tocar o algodão acolchoado
do cobertor. Melhor ainda, o corpo dele acompanhou o meu, de modo que agora eu sentia a
pressão sutil de seu peito contra meus seios, o peso quente de uma coxa prendendo a
minha. A brisa refrescante flutuava por entre as árvores e sacudia as folhas, o restante do
mundo em silêncio, exceto por um estrondo de um trovão lento a distância e por nossas
respirações ofegantes. Nunca me esqueceria daquele momento e da magia que Alfonso
causava em mim. Disse que não ficaria nua? Já estava repensando isso quando ele dobrou
um joelho, a coxa cada vez mais entre minhas pernas.
Siiiim.
Não tinha dito a palavra em voz alta, mas com certeza a expressei com todo meu
corpo. Minhas pernas se entreabriram mais. Meus braços envolveram o pescoço de Alfonso.
O sexo pairava no ambiente, e ainda não tínhamos tirado nenhuma roupa.
– Venha para casa comigo. – Alfonso sussurrou as palavras ao meu ouvido, a ideia se
enxertando em minha consciência tão engenhosamente que era como se eu mesma
tivesse pensado nisso.
Vá para casa com Alfonso.
Aquela ideia era louca, e ainda assim cativante. Se ele fosse mesmo capaz de guardar
aquele segredo… será que eu iria correr o risco? Novos riscos tinham ficado mais
atraentes desde minha dança no Backstage. E se eu estivesse entrando em algum tipo de
golpe de sorte, no qual as coisas davam certo para mim? Então, mais uma vez, talvez eu
simplesmente fosse perder meu coração para ele e terminar mal. Quanto mais o conhecia,
mais gostava dele. E isso tornava o fato de estar com ele muito mais arriscado do que
um encontro sexual anônimo, como aquele do qual poderia ter desfrutado com ele no
Backstage naquela primeira noite.
Mais um trovão ressoou e a brisa ficou fria de repente, então Alfonso rolou, saindo de cima
de mim.
– É melhor embalarmos as coisas – disse, olhando para o céu, que estava ficando mais
escuro a cada segundo.
Peguei a garrafa de champanhe e as taças quando os primeiros pingos de chuva densos
nos atingiram. Dando um gritinho por causa do frio que senti, o ajudei com o cobertor e
saí correndo para o carro enquanto o céu se abria.
Em segundos, a chuva se transformou em dilúvio. Alfonso colocou a bolsa com a comida
sobre o ombro e estendeu a manta acima de nossas cabeças, mas já era tarde demais.
Nossas camisas estavam encharcadas. Meu cabelo estava grudado na cabeça. Eu
provavelmente tinha linhas de rímel escorrendo pelo rosto, como uma espécie de palhaço
gótico.
Quando um trovão soou alto, levei um susto imenso e agarrei o ombro de Alfonso. Ele me
enfiou debaixo de seu braço e puxou mais o cobertor. Senti o calor de seu peito através da
camisa encharcada e desejei poder ficar na chuva para sempre.
Como tive a sorte de aquele homem me notar?
Quando ele apertou o controle remoto para destravar o carro, tomei uma decisão.
Poderia nunca mais ter uma chance como aquela e me arrependeria para sempre se não
saboreasse o momento. Eu me preocuparia com meu coração mais tarde. E nesse meio
tempo, simplesmente iria zelar por ele com cuidado extra.
– Vamos para sua casa – falei enquanto o cobertor ainda nos cobria. Mesmo com a
chuva torrencial barulhenta, minhas palavras ditas suavemente ecoaram no espaço
fechado.
Minha solicitação foi compreendida.
Ele fez uma pausa perto do veículo, ficando de pé em silêncio ao meu lado na chuva por
um instante antes de se virar para olhar para mim. Seus olhos castanhos - esverdeados estavam ainda
mais escuros do que o normal, uma intensidade cálida que eu não tinha visto brilhando ali.
Nem mesmo quando dancei seminua no poste para entretê-lo.
– Obrigado. – Ele me beijou… um encontro breve e rijo de bocas que pareceu selar o
acordo. – Você não vai se arrepender.
Essa última parte foi um sussurro ao meu ouvido antes de ele se afastar. Arrepios
percorriam minha espinha e meus mamilos enrijeciam sob a camisa. E não tinha nada a
ver com a chuva.
Agora, só queria saber o quão rápido o carro dele poderia ser.
RIMOS MUITO no trajeto até a casa de Alfonso. Isso foi uma surpresa divertida, já que eu
ainda estava um pouco tensa por ir com ele, mas terminamos nosso piquenique no carro,
comigo lhe dando comida na boca enquanto ele dirigia. Houve momentos sensuais, quando
ele mordiscou meu dedo ou chupou um pouco mais do que o necessário. Mas também me
diverti muito em outro sentido, não sexual, e me perguntei como aquilo ao menos era
possível.
De alguma forma, Alfonso me deixou mais confortável do que jamais estivera com um
cara.
– Você mora em Brentwood? – De repente percebi nosso paradeiro, mesmo com a
visibilidade limitada pela chuva.
– Na região de Mandeville Canyon. – Ele reduziu quando entramos em uma rua
residencial. – Não é tão chique quanto a propriedade do meu pai, mas gosto daqui.
Coloquei os restos de comida de volta na bolsa e verifiquei novamente a rolha na
garrafa de champanhe. Sim, tecnicamente estávamos errados, pois Alfonsobebera e estava
dirigindo. Mas como poderíamos desperdiçar aquele champanhe caro? Talvez Alfonso pudesse
bancar esse tipo de coisa, mas eu odiava a ideia de desperdício.
– Já vi fotos da casa em que você cresceu. – Havia um exemplar da revista
Architectural Digest no escritório com uma reportagem a respeito. Fiquei novamente
impressionada pelas enormes diferenças de nossas origens. Até mesmo por nossos estilos
de vida atuais. – Na praia de Malibu, certo?
– Sim. – Com a testa franzida, ele tamborilava no volante, os ombros tensos. Seu bom
humor pareceu desaparecer à menção do pai.
Então prontamente redirecionei a conversa.
– Eu moro em Mar Vista. – E tinha sorte por viver lá, mesmo com minha casa sendo
antiga. – É a casa do meu pai, mas estou comprando-a dele por um preço ridiculamente
baixo. Acho que ele quer que a casa compense o fato de ele ter caído fora durante minha
infância.
Deixando-me a sós com minha mãe perfeccionista e supercrítica. Muitas vezes me
perguntava como ele vislumbrara uma criança como eu lidando com ela, quando meu pai,
um homem adulto, morria de medo dela também.
Alfonso lançou um olhar de soslaio para mim enquanto entrava em uma propriedade
particular que ficava longe da estrada. A hera cobria as paredes de pedra cinzenta de uma
casa, algo que parecia ter saído de um livro inglês de jardinagem. Os arbustos e o
paisagismo escondiam parcialmente uma fachada romântica e encantadora, bem diferente
do que eu esperava do homem hipermásculo no banco do motorista.
– Minha mãe fez o mesmo. – Alfonso apertou um botão no painel e a porta da garagem de
madeira polida se abriu. – Acho que ela estava tão cansada de brigar com meu velho sobre
o casamento que se cansou quando chegou a hora de resolver a custódia dos filhos. Então
ficamos presos com meu pai.
– Ela era jovem, certo? – Lembrei-me de fotos da mãe dele, a atriz que o pai dele
supostamente seduzira quando ela ainda era adolescente. – Talvez ela tenha achado que
seu pai fosse proporcionar uma vida melhor para vocês.
Entramos na garagem escura e a porta abaixou silenciosamente atrás de nós. De
repente fiquei muito consciente de Alfonso e do que eu tinha acordado ao pedir para ir para
casa com ele. Meus batimentos cardíacos aceleraram.
– É difícil perdoar um pai que só põe você para baixo, não é? – Ele desligou a ignição e
se virou para mim, me oferecendo total atenção.
Era uma coisa inebriante.
Dei de ombros.
– Tendo lidado com a minha mãe, não posso culpar meu pai completamente.
– Isso é realmente… – Ele olhou para o nada por um minuto, como se estivesse
procurando a palavra certa. – Altruísta. Um jeito muito altruísta de enxergar a situação.
A tepidez no olhar escuro de Alfonso era quase uma carícia, e eu estava tentada a me
inclinar para ele. Aninhar-me nele. Sabia que as coisas estavam indo muito depressa, mas
não ligava. Ninguém nunca tinha prestado atenção em mim do jeito que Alfonso fizera.
Ninguém nunca tinha olhado para mim com aquele calor predatório que me fazia contrair
os dedinhos dos pés.
– N-n-não sei nada sobre isso. – Ai, Deus. Quem diria que eu iria gaguejar por estar
excitada? Respirei fundo e tentei manter a calma. – Tentei ser amarga sobre toda a
situação no começo. – Sentia como se devesse confessar a verdade. – Mas era muito
cansativo e improdutivo.
– Anahí. – Alfonso cobriu minha mão com a dele. – Não quero que você fique tensa. –
Ele se referia à minha gagueira. Ele me ouviu tropeçando nas palavras e interpretou como
nervosismo. Eu não tinha certeza do que dizer. – Se você tem qualquer dúvida…
– Não tenho. – Fui enfática desse jeito mesmo. Apertei a mão dele. – Não estou tensa.
Ele não fez menção de entrar. Ou de me perguntar sobre meus problemas de fala.
Naquele silêncio breve e constrangedor que se seguiu, mordi meu lábio. Então deixei a
verdade escapar:
– Tenho problemas de fala. Um distúrbio. – Nunca tinha certeza de como rotular minha
condição de uma forma que fizesse as pessoas entenderem. Eu odiava a palavra
“gagueira”. – Chama-se disfemia. É uma espécie de disfluência na fala – esclareci. Então,
quando percebi que estava balbuciando, acrescentei: – Um problema com meus
articuladores do aparelho fonador.
– Ah. – Ele assentiu, tentando absorver a coisa toda. – Eu não tinha a intenção de ser
bisbil…
– Não. – Balancei a cabeça. – Você foi muito legal. Normalmente a coisa se intensifica
quando estou nervosa ou emocionada, mas agora, sinceramente, não estou tensa.
– Tudo bem. – Ele estendeu a mão para segurar meu queixo. – Isso é bom.
– Na verdade, isso me causa problemas intermináveis, até mesmo agora, muito tempo
depois de eu ter feito uma extensa terapia da fala.
Ele deu um sorriso torto.
– Estou feliz porque você não está tensa.
– Ah. – Fiquei um pouco tonta agora que ele de fato estava me tocando. Minha pele
zunia com nova sensibilidade. – Eu sou um pouco… inquieta. Ansiosa, acho.
O sorriso malicioso que ele exibiu mostrou uma fileira de dentes brancos e perfeitos.
Gostei de fazê-lo sorrir daquele jeito. Fez minha temperatura subir e minha respiração
acelerar.
– Eu também. – Ele se inclinou para mais perto, o hálito quente em meus lábios quando
seu nariz roçou o meu. – Que tal entrarmos?
Olhei em volta do banco da frente, lembrando como tinha imaginado nós dois juntos ali.
Tinha inventado fantasias elaboradas depois que saí do Backstage, imaginando o que
poderia ter acontecido caso tivesse encontrado Alfonso no estacionamento naquela noite.
Minhas pernas montadas nas coxas dele. O assento reclinado para nos acomodar.
Será que era bobagem da minha parte ainda estar pensando nisso?
– Que tal um beijo primeiro? – Eu me transformava em uma mulher diferente com
Alfonso. Mais ousada. Mais sexy.
E muito excitada.
Ele balançou a cabeça lentamente, o polegar roçando meu queixo em um golpe suave.
– Assim que começar a beijar você, Anahí, não acho que eu vá ser capaz de parar.