Fanfic: E tudo aquilo que dissemos? | Tema: Romance, Traição, Amizade

Centro Educaional Novo Amanhã / Domingo / Setembro de 2013

Ja era noite naquela área da cidade. Poucos carros passavam por ali naquele horário. Os poucos transeuntes vestiam casacos, gorros, ou outras peças de roupa próprias para o frio que, unido ao vento, parecia atingir os ossos. O prédio do colégio erguia-se, imponente, sob as luzes alaranjadas de postes, faróis de carros e outros artifícios luminosos típicos ao ambiente urbano. Ouvidos desatentos não seriam capazes de perceber os gritos vindos de dentro do local. Gritos por socorro. Uma voz estridente, clamando por ajuda em profundo desespero.

E então, o silêncio.

A garota de cabelos longos e escuros jazia incosciente, estirada ao longo dos degraus da escadaria central, que dava acesso às salas do segundo andar do prédio. Sangue escorria de sua testa, e seu corpo apresentava diversas escoriações. No topo da escada, a figura ofegante observava a cena, com horror nos olhos. Fitava as próprias mãos trêmulas, sem acreditar no que acabara de fazer. Precisava sair dali com urgência, não podia deixar que descobrissem a sua presença. Virou o corpo na direção oposta e correu. Ao alcançar uma das janelas, fez força para abri-la. E pulou.

Na manhã do dia seguinte, a escola estava interditada. As aulas haviam sido suspenas após uma funcionária ter encontrado o corpo de uma aluna na escadaria central. As autoridades haviam sido acionadas, e as investigações sobre o caso começaram em pouco tempo. A vítima? Uma aluna de dezessete anos do segundo ano do ensino médio: Cristina Oliveira Martins.

Casa de Gabriela / Horas antes do acidente / 2016

Gabriela havia terminado de empurrar a última bagagem para o porta-malas do táxi quando o celular vibrou. Era sua mãe. A garota atendeu a ligação, sorridente.

Gabriela: Oi mãe, tudo bem? Já tô de saída - disse, dirigindo-se ao banco do passageiro do veículo.

Teresa: Oi meu amor... Me desculpa, eu realmente queria estar aí agora pra te abraçar e te desejar uma boa viagem pessoalmente, mas você sabe como essas viagens da empresa são importantes e...

Gabriela: Mãe... Tudo bem... Eu entendo - disse, compassiva, fechando a porta do carro e dando um último aceno de despedida para sua tia e para a empregada da casa, que lhe mandavam beijos e sorrisos.

Teresa: Ai filha... Você não sabe como eu estou feliz por você ir nessa viagem. Vai dar tudo certo! Seis meses em Las Vegas vão esfriar sua cabeça e te ajudar a pensar melhor no futuro, sabe?

Gabriela: É, mas são seis meses de estudo, lembra? - riu.

Teresa: Você nem vai perceber que está lá pelos estudos, minha linda. Você vai amar a cidade! Tudo é muito bonito e limpo e... - dizia, recordando-se da época em que ela mesma havia visitado o local.

Gabriela: Eu sei, eu sei... - respondia, vez ou outra, quando a mão lhe dava um aviso sobre segurança e prevenção - Eu vou me cuidar, mãe, calma! - riu.

Teresa: Eu fico preocupada com você, filha... Depois daquilo... Você sabe... - disse, a voz tenra.

A filha assentiu, em silêncio, o olhar volvendo-se ao passado. O sorriso desfazendo-se lentamente ao lembrar-se de coisas que não queria.

Gabriela: Já faz vários meses mãe. Eu já tô esquecendo de tudo isso. É só não falar sobre o assunto, ok?

Teresa: Sim, sim... Bom, quero que me deixe informada de tudo que fizer, certo? - pediu.

Gabriela: Vou te deixar sabendo de tudo - respondeu, animada.

Teresa: Assim, espero. Se cuida filha, boa viagem. Me avisa assim que chegar lá, ok? E, nunca se esqueça... Eu te amo, tá?

Gabriela: Também amo você, mãe...

Se Teresa soubesse que aquela seria a última vez que ouviria a voz da filha ainda viva, nunca teria desligado o celular.

Centro Educacional Novo Amanhã / Setembro de 2013

Em pouco tempo, o Caso Cristina Martins havia ganhado a mídia nacional. Repórteres trabalhavam incansavelmente para conseguirem mais detalhes com a polícia, e todo novo detalhe era transmitido em minutos.

O que se sabia até então era que a hipótese de acidente ou suicídio estava descartada. Haviam resquícios de pele humana em suas unhas, e os exames de DNA apontavam uma segunda pessoa envolvida no incidente. No local da morte, haviam pequenos pedaços de plástico espalhados pelo chão, e gotas de sangue em uma das paredes. O corpo de Cristina apresentava, além das escoriações provocadas pela queda, pequenos fragmentos de reboco. As imagens das câmeras de segurança da rua seriam analisadas em breve; a busca pelo assassino havia começado.

A família de Cristina pedia por justiça, e um processo fora aberto contra a escola, por sistema de segurança debilitado: a escola não possuía câmeras de segurança funcionais ou vigias noturnos. Um grande escândalo envolvendo comentários maliciosos sobre o caso teve início após a divulgação de infelizes frases em redes sociais.

A comunidade local estava perplexa. Cogitavam a hipótese de estupro seguido de morte, e a história começou a ganhar força, mas o IML logo desmentiu os boatos. A causa da morte foi então revelada. Tratava-se de morte por hemorragia intracraniana.

Segundo andar do CENA - Domingo, minutos antes da morte.

Cristina andava em círculos, nervosa. Não poderia continuar com aquilo. Mesmo aquilo estava além do aceitável.

???: Você me deve isso! - disse, o outro, irritado.

Cristina negou com a cabeça.

Cristina: Pede outra coisa! Isso não! Não aqui, por favor!

???: VOCÊ ME DEVE ISSO!! - gritou.

Cristina recuuou, hesitante. Planejava correr escada abaixo e fugir pelos fundos da escola. Ela podia ser rápida, podia se salvar. Não teria que se submeter às vontades daquele que a pressionava.

???: Foi o nosso acordo! Eu te dei o que você pediu, não dei? Eu avisei que meu preço não era o teu dinheiro... - disse, soturno, enquanto se aproximava da garota.

Cristina, num ato desesperado de auto-preservação, tentou correr, mas foi segurada. O agressor apertava seu braço.

???: Você não vai sair daqui não, sua puta! - disse, levando a mão aos seios da garota. Cristina gritou. Gritou como nunca antes havia gritado em sua vida. A urgência na voz que pedia por ajuda.

???: Cala a boca! Cala a boca! - disse, colocando a outra mão na boca da menina, impedindo-a de gritar.

Ela debateu-se, soltando-se por um breve momento, e gritou uma última vez.

???: CALA A BOCA!! - e, com todas as forças, empurrou Cristina para trás. O baque contra a parede fez o mundo girar. Cristina não sentiu o corpo por alguns segundos, e, numa última tentativa, virou-se para a escada. A queda foi fatal. Ao observar a garota incosciente, a figura entrou em pânico. Pensou em ajudá-la, mas sabia que ela o entregaria. Culpou-se pela maldita ideia. Culpou-se pelo maldito momento. Ele sabia que sua vida estava arruinada. Seria apenas uma questão de tempo até que a polícia o encontrasse. Sem enxergar novas opções, Guilherme virou-se e correu na direção oposta. A janela estava ali. Era apenas um pulo. Um pulo para que a maior mentira de sua vida começasse. Um pulo... Tudo mudaria. Tudo. Mudaria.