Fanfics Brasil - Lápide Vínculos

Fanfic: Vínculos | Tema: Original


Capítulo: Lápide

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Capítulo 17- Lápide


Quinta-feira, 02 de Outubro de 2008.


 Antes mesmo de se levantar da cama, Skylar já pressentia que aquele seria um dia de merda.


 O senso comum diria que seu estômago embrulhado e a dor de cabeça eram resultantes da garrafa de vinho que tomou sozinha naquela madrugada enquanto assistia à reprise de uma série de comédia, cuja a única coisa engraçada era a cara repuxada da atriz principal.


 Skylar, no entanto, preferia acreditar que eram presságios.


 Conferiu o relógio digital sobre o criado ao lado de sua cama e constatou que não teria tempo para tomar banho. Teve, então, que contar com a água gelada da pia e uma boa quantidade de maquiagem para dar um pouco de dignidade à sua cara de morto-vivo.


 Queria mais do que tudo ir trabalhar vestindo calça de moletom e blusão, mas aquela não era e nunca seria uma opção, graças ao rígido código de vestuário da Fall’s.


 Com a maior má vontade do mundo, enfiou-se em vestido crepe preto, cor que combinava com ela e seu humor. Calçou as sandálias azuis-marinhos, rezando para que o salto não a fizesse torcer o pé, e vestiu o blazer de mesma cor antes de descer para a cozinha.


 Sheila, ainda com seu pijama azul de carneirinhos, estava debruçada sobre um livro da faculdade na mesa da cozinha. Skylar, por conhecer a irmã que tinha, sabia que aquilo não era dedicação, e sim desespero.


 — Quando é a sua prova? — perguntou com a voz arrastada enquanto colocava a cafeteira para funcionar e pegava uma aspirina na gaveta para tomar junto com o café. Preferia chá, mas quem mandava era a ressaca.


 — Em uma hora. — Desviou os olhos do livro para a irmã. — Eu esqueci de estudar, tá legal?! — justificou-se antes mesmo que Skylar resolvesse questionar.


 O “esqueci” de Sheila estava mais para “saí com Robbie ontem à noite ao invés de me preparar para a prova de Sociologia da Comunicação”.


 — Ainda bem que não sou eu quem paga sua faculdade.


 — Nem me lembre. Amy vai me matar se eu... Esqueci de te avisar! — exclamou um pouco mais alto do que devia, irritando tanto Skylar quanto seus miolos latejantes. — A Amy me ligou ontem avisando que vai vir para cá.


 — Merda... — praguejou, recordando-se que o último contato que teve com Amethyst foi quando gritou com ela via telefone por ter passado seu número para os Hancox. — Quando ela chega?


 — Hoje é quinta-feira, então... Hoje.


É... Skylar realmente teve um mau presságio.


 — Porra, Sheila! Não podia ter me avisado antes?!


 — Avisado como, se eu mal te vi ontem?! — argumentou, indignada por estar levando a culpa.


 — É para isso que existe celular, caramba!


 — Na boa, que diferença faz? Com você sabendo ou não, Amy vai estar aqui em algumas horas.


 — Se eu soubesse disso antes, teria tempo de fazer as malas e ir para o apartamento do Mar... — Interrompeu-se abruptamente, sentindo uma pontada no peito.


 Um silêncio sepulcral tomou conta da cozinha e o clima melancólico se fez tão presente que parecia um terceiro indivíduo. Como qualquer pessoa “madura”, Skylar calou-se, fingindo que aquela frase nunca tivesse sido pronunciada, e pegou uma caneca de café. Depois de minutos, ocupados por tentativas falhas de se concentrar nos estudos e esquecer a situação da irmã, Sheila tomou coragem para perguntar:


 — Vocês terminaram?


 — Lógico que não! — Sua resposta, além de acidentalmente rude, saiu rápida como uma bala de revólver.


 Skylar reconhecia que ela tinha motivos para pensar e perguntar aquilo, já que não falava com Mark desde a briga, que ocorrera há mais de duas semanas. Realmente parecia que tinham terminado ao invés de “apenas” adiado o casamento.


— Você devia contar para ele. — aconselhou. Sheila não aguentava mais falar aquela frase, aplicável tanto para Ethan quanto para Skye. Ela já havia se tornado clichê.


 — Eu não vou fazer isso! Ele vai me odiar, me achar um monstro! — falou, transtornada. — Eu... Eu não suportaria isso...


 — Estamos falando do Mark, não de um genérico qualquer. Mesmo que ele fique chocado ou bravo, o que eu duvido muito, isso não vai durar, porque ele é simplesmente louco por você! Depois de tudo o que passaram juntos, você não devia duvidar disso nem por um minuto.


 Em seu coração, Skylar sabia daquilo. Mark a amava. Agarrava-se naquilo com todas as suas forças, pois era e única certeza que tinha em meio ao mar de dúvidas frio e escuro em que vinha se afogando nas últimas semanas.


 Entretanto, outro sentimento a dominava: temor.


 Responder às perguntas de Mark seria bem mais do que pronunciar um conjunto de palavras reveladoras. Seria uma verdadeira tortura, pois verbalizar aquelas lembranças perturbadoras era o mesmo que revivê-las. Todas aquelas imagens e sentimentos negativos voltariam a ela com força total, em um baque que abalaria todas as suas estruturas.


 — Eu sei disso. — disse em um fio de voz. — Eu quero contar, realmente quero... Mas eu não posso... Não consigo...


 — Skye... — Olhou-a com preocupação, se sentindo inútil por não poder ajudá-la de alguma forma.


 — Vai querer carona? — Apesar de ter desviado completamente do assunto, sua expressão perturbada continuava a mesma.


 — Eu vou de ônibus, não quero te atrasar. — Skylar assentiu e, antes que ela deixasse a cozinha para pegar sua bolsa e ir para o trabalho, Sheila acrescentou. — Você sabe que eu vou sempre estar aqui para você, não sabe?


 Skye foi até a irmã e deu-lhe um beijo na testa.


 — Eu sei. — disse com um sorriso fraco, mas sincero. Sheila já havia lhe deixado puta de raiva incontáveis vezes, mas nunca triste. Ela era e sempre seria um dos poucos pontos altos de sua vida.


(...)


 — Nós temos mesmo que ir? — perguntou Esther, lançando um olhar pidão para Nate.


 Ambos estavam na cama do garoto, que conseguia comportá-los mesmo sendo de solteiro, enrolados em um edredom de estampa infantil. Esther estava deitada no peito desnudo de Nate e este, por sua vez, afagava seus cachos dourados.


 — Se você não se importar em levar ferro na faculdade por perder uma prova, não. — Ela cobriu o rosto com o edredom e soltou um gritinho de frustração.


 Não queria nada além de ficar ali com ele, apenas curtindo a preguiça e a maravilhosa sensação de calor humano. Era quase mágico.


 Assim que deixasse aquele quarto, retornaria à sua irritante vida cotidiana, com provas, aulas e pais bravos por não ter avisado que passaria a noite fora. Isso tudo sem contar o constrangimento de encontrar com a família de Nate quando estiver de saída. Com que cara olharia para os pais dele? E para a irmã, que com certeza daria um irritante sorrisinho debochado? Só de pensar na cunhada, Esther já se sentia cansada. Com apenas 12 anos, Nicola Cooley, ou Nicki, era um verdadeiro demônio com cara de anjo.


 — Se eu não conseguir um emprego no St. Camillus* assim que me formar, eu vou ficar muito puta. Estou fazendo um tremendo esforço para sair daqui, poxa! Isso tinha que ser contabilizado no meu histórico...— Bufou, “fingindo” estar contrariada. Nate soltou uma gargalhada gostosa, que acabou contagiando Esther.


 Era mesmo necessário sair dali?


 — Vamos levantar, preguiçosa. — disse Nate, que resolveu tomar a frente e sair da cama.


 Ele também tinha uma prova para fazer e não podia se dar ao luxo de perdê-la, principalmente por causa das noites de sono que perdera para se preparar para ela. Nate sempre foi um aluno dedicado, diferente dos dois melhores amigos. Ninguém nunca entendeu ao certo como diabos um exímio vagabundo feito Ethan conseguiu ser aprovado em Direito. Talvez, apenas talvez, o fato de ser filho do juiz Stanley Harvey tivesse algo a ver com isso...


 Esther precisou de uma força de vontade descomunal, que nem sabia que tinha, para se sentar no colchão. Procurou suas roupas com os olhos e só se levantou ao encontrá-las, cada uma jogada em um lugar diferente do cômodo. O vestido azul escuro com pássaros brancos, em cima do computador antigo, sua meia calça preta e saltos boneca, perto da porta e seu casaco preto, no pé da cama.


 — O que acha de Marilyn Monroe? — Resolveu quebrar o silêncio enquanto se vestia. Referia-se à festa de abertura dos jogos universitários, que, como sempre, seria à fantasia para aproveitar o mês do Halloween. Apesar de ser uma festa da faculdade, não-alunos também podiam ir.


 — Clichê. Aposto que vai ter no mínimo umas dez garotas com essa fantasia. — respondeu rapidamente enquanto procurava por seu moletom preferido no guarda roupa bagunçado. — Que tal Alex DeLarge versão feminina?


 Esther contorceu sua face em uma careta desgostosa. Adorava Laranja Mecânica e a fantasia seria perfeita, se não fosse um pequeno detalhe:


 — Essa foi a da O’Flahertie ano passado.


 — Ah, é mesmo... — sorriu amarelo.


— Como pôde se esquecer? Ela ficou ridícula com aquela peruca loira.


— Como eu poderia me lembrar? Toda e qualquer breguice daquela festa foi ofuscada pela fantasia de Nutella* do Ethan. E pela briga que ele arrumou com o parrudão do Derek Casey por causa de uma garota com fantasia de Robin Wood...


— Eu não me lembro disso. — afirmou de cenho franzido enquanto fechava o zíper lateral do vestido. — Por Deus, Nate, seus amigos são malucos. Você não combina com eles, é tão... Sei lá, tão...


 — Maravilhoso? Lindo? Genial? Incrível? Gostoso? — interrompeu-a com um sorriso que misturava zombaria e divertimento.


Esther sorriu de forma carinhosa e o beijou como uma espécie de resposta.


 Recentemente, aprendera que ele era tudo aquilo e um pouco mais.


(...)


 Ao contrário do que Skye esperava, seu dia não foi nenhuma desgraça. Ela não foi demitida, não derramou nada em seu vestido, sua sala não pegou fogo, seu computador não deu defeito e apagou todo o seu trabalho, o pneu do carro não furou...


 Tudo ocorreu dentro da normalidade, foi até chato, na verdade. O pior que aconteceu foi seus cigarros terem acabado, sendo que ela só podia comprar um maço novo quando terminasse o expediente. Entretanto, ela ainda predizia que algo ruim aconteceria, afinal, Amethyst estar chegando da Rússia era quase um prognóstico de calamidade.


 Foi com o sentimento de desânimo antecipado que Skylar estacionou seu carro azul na garagem, não deixando de notar e torcer o nariz para o utilitário preto que também estava parado lá, e entrou em casa com a animação de um frango que ia para o abate.


 Encontrou com Amethyst já na sala. Ela estava sentada confortavelmente no sofá assistindo a um dos DVDs de Skye, Pulp Fiction, com uma taça de vinho na mão. Não pôde deixar de notar o visual da irmã: um vestido de padrão listrado preto e branco com os ombros de fora e mangas compridas que ia até na metade das coxas e seus cabelos negros presos em um elaborado meio rabo. O que Amy usava casualmente era o que Skye e Shae escolheriam para festas.


 Assim que percebeu a presença de Skylar, Amethyst virou-se e cumprimentou a irmã, da maneira que qualquer pessoa normal faria, e recebeu a seguinte resposta:


 — Que carro é aquele na minha garagem?


 — Eu aluguei. — respondeu, segurando-se para não revirar os olhos ou repreender a irmã pela falta de cortesia. Não estava com cabeça para discussões supérfluas.


 — Alugou? Por quê? — Estampou seu estranhamento. Quando estava em Limerick, Amethyst só andava de taxi.


 — Porque eu achei mais confortável. Vou ficar aqui por um tempo um pouco maior do que o costume.


 — Quanto tempo? — Novamente, a sensação ruim tomou conta de Skye.


 — Um mês. — contou de forma monótona, como se estivesse falando do tempo nublado daquele dia. — Ou dois, quem sabe.


— Como? — Skylar fitou-a atônita.


 Aquilo só podia ser brincadeira...


 — Você ouviu.


 Skye fechou os olhos e contou até três mentalmente para tentar não perder a calma que não possuía. Dois meses. Dois malditos meses!


 — Dois meses? Vem cá, Amy, você não tem marido, quatro filhos, trabalho, amigos, amante, animal de estimação ou até mesmo um clube do livro lá na Rússia para se preocupar não?


 Amethyst respirou fundo e massageou as têmporas.


 — Skye... — começou a falar com uma mansidão controlada. — Será que dá para você estender a bandeira branca pelo menos dessa vez? Meus últimos dias foram terríveis e se eu não tiver nem que seja um momentinho de paz, eu juro que vou enlouquecer e isso não vai ser nenhum pouco legal, irmãzinha.


 — Paz?! Você quer paz?! Esse seu pedido é engraçado, Amy, já que você tirou a minha quando fez aquela palhaçada de passar o meu número para o Tony!


 — Vai começar com esse assunto de novo?!


 — É lógico que sim! Por sua culpa o Mark brigou comigo! Sabia que ele até adiou o casamento?! Você ferrou comigo!


 Amethyst bufou. Ela sabia sim, Sheila lhe contara. Palhaçada era Skylar atribuir-lhe as coisas ruins de sua vida. Palhaçada era ela não ter coragem para resolver seus próprios problemas.


 — Você ferrou a si própria! — explodiu, levantando-se e indo até a irmã. — Por que diabos você insiste em manter esse segredo?! Já faz muito tempo, Skye, se livre disso! Não está fazendo bem nenhum para você, muito pelo contrário!


 Skylar fitou-a com uma expressão de puro asco.


 — Falar é fácil!


 A Dzerjinsky, que fez questão de ignorar o comentário da jornalista, continuou:


 — Você realmente gosta do Mark? — Ela sabia que a pergunta era praticamente retórica, porém queria ver a reação da mais nova.


 — Que pergunta idiota é essa? — Levantou a mão direita e apontou para seu dedo anelar, mais especificamente, para o anel de ouro rosê rodeado por uma delicada fileira de brilhantes. Sua aliança era única coisa que a tranquilizava, mesmo que minimamente. A joia a lembrava de que, apesar das turbulências e incertezas pelas quais seu relacionamento com Mark estava passando, eles ainda estavam, tecnicamente, juntos. — Eu não estou usando isso aqui à toa!


 — Me escuta, Skylar. — Aproximou-se ainda mais dela e a segurou pelos ombros, olhando no fundo de seus olhos. — Se é assim, então conte-lhe a verdade; não apenas para fazer as pazes e sim porque ele merece saber. Continuar desse jeito só vai destruir o que vocês dois têm. Não deixe que seu passado acabe com o seu futuro.


 Skylar desviou sua face da de Amethyst e fechou seus olhos com força. Não sabia por quê, mas estava difícil de respirar. As mãos macias de Amy pareciam dois pedaços de chumbo sobre seus ombros. Ou talvez, fosse apenas suas palavras que foram pesadas.


 A verdade era pesada.


 Ainda com o rosto voltado para o chão amadeirado, abriu suas pálpebras lentamente e, com um olhar vazio e uma voz tão baixa quanto um sussurro, disse:


 — Eu não posso.


 Soltou-se da irmã e subiu para seu quarto sem correr, mas com pressa. Após fechar a porta de madeira escura, levou a mão a um dos bolsos de seu blazer azul marinho e tirou de lá um cigarro, junto de seu isqueiro zippo de metal, e o acendeu. Sentou-se no chão, também de madeira, e apoiou as costas na cama, tragando lentamente enquanto digeria o que Amethyst lhe dissera.


 Deveria mesmo contar à Mark? Mas e se ele a achasse um monstro? E se ele não quisesse saber mais dela?


 “Ele merece saber. ”


 Repreendeu-se por ter aquele tipo de pensamento. Mark a amava e provou aquilo diversas vezes. Ele a aceitava e a queria do jeito que ela era, mesmo após Skye ter lhe dito sobre seu passado, ou, pelo menos, grande parte dele.


 Mas ainda sim...


 Antes, as chances de contar a verdade para Mark eram inexistentes, pelo menos em um futuro próximo. Agora, ela estava cogitando a possibilidade. Aquilo era assustador. Via-se atormentada por um dilema do qual não poderia escapar e cujas consequências da decisão, seja lá quais fossem, poderiam ser terríveis.


 Ficou tão distraída com seus pensamentos frenéticos que teve a falsa impressão de que o filtro demorara pouquíssimo tempo para se queimar por completo. Jogou a bituca no cinzeiro sobre o criado, errando a mira, e retirou outro do maço em seu bolso. Praguejou quando percebeu que tinha empurrado seu isqueiro sem querer para debaixo da cama ao se sentar no chão e logo tratou de recuperá-lo.


 Ela o pegou de volta, mas no processo esbarrou em um objeto que lá escondia e há muito permanecia intocado: uma velha caixa vermelha de sapato.


 Skylar puxou a caixa para si, não antes de acender o segundo cigarro, e a pôs sobre suas pernas sem se preocupar em sujar seu vestido preto com a poeira abundante daquela superfície gasta e desbotada. Abriu-a com um pouco de hesitação e fitou seu conteúdo, que era composto por cartas, abertas e ainda lacradas, e meia dúzia de fotos de diferentes tamanhos e datas. O que era simples para muitos era importante para ela.


 Pegou uma das fotos aleatoriamente e encarou sua imagem. Assim como as outras, já a vira tantas vezes que tinha os detalhes mais bobos e insignificantes gravados em sua mente de um modo que não poderiam ser apagados com facilidade. Pensou várias vezes em queimá-las, mas nunca teve coragem. Afinal, aquela era a única parte de seu passado que não a deixava triste.


 (...)


 Mark estava no sofá da sala, sentado e com o notebook sobre o colo, trabalhando em um artigo ao som do noticiário das oito quando a campainha soou. Como seu interfone não tocou antes, imaginou ser um engano. Por isso, não fechou o notebook ou desligou a TV quando foi abrir a porta sem nem espiar pelo olho mágico antes. Aquilo foi um erro, pois se o tivesse feito, teria a oportunidade de disfarçar a cara de susto.


 Amethyst Dzerjinsky, vulgo sua cunhada com quem não tinha o mínimo contato, era a última pessoa na Terra e planetas adjacentes que esperava receber em sua humilde residência. E a expressão séria da mulher deixava claro que ela não estava ali para uma visitinha casual.


 — Amethyst?


 — Oi, Mark. — Sorriu por pura convenção social. — Posso entrar? — Mark acenou positivamente com a cabeça e abriu espaço para que ela passasse.


 Amy correu os olhos pelo apartamento limpo e bem organizado, sem deixar de pensar no quanto contrastava com o buraco negro que era o quarto de Skylar. Por fim, pousou seus orbes azuis em Mark, que ainda estava com as roupas do trabalho — camisa social cor de grafite e jeans escuros —, mesmo que seu expediente tivesse encerrado há algumas horas.


 Mark Thatcher estava longe de ser um modelo de beleza. Seu rosto triangular, pele bronzeada, silhueta magra, boca fina, olhos ambares e cabelo loiro escuro cortado na nuca lhe davam uma aparência que não superava o comum. Ele era até sem graça, na opinião de Amethyst.


 — Me desculpe se eu estiver sendo grosso, mas o que está fazendo aqui? — Enquanto perguntava, Mark imaginou se Skye sabia sobre aquilo e, no caso da resposta ser negativa, qual seria a sua reação ao descobrir. As pouquíssimas coisas além do básico que sabia sobre Amethyst eram graças à Sheila, visto que Skylar só abria a boca para falar da irmã mais velha se fosse para criticá-la.


 — Como não temos intimidade o suficiente nem para que eu possa fingir que vim aqui para tomar chá a fofocar, vou direto ao assunto: a sua briga com Skye.


 — Novamente, me desculpe, mas isso é entre Skye e eu.


 — E desde quando isso é motivo para eu não me meter? — Seus lábios pintados de vermelho escuro se repuxaram em um breve sorrisinho cínico, o que provocou em Mark a vontade de jogar a educação para o alto e expulsá-la de seu apartamento naquele mesmo instante. — Antes de tudo, quero que saiba que eu não tiro a sua razão. Se um dia eu souber que o Dmitry esconde algo dessa gravidade de mim, eu vou fazer da vida do filho da mãe um inferno até que ele resolva abrir a boca.


 De tudo que Amethyst falou, duas palavras ecoaram com mais intensidade para o Thatcher:


 — “Dessa gravidade”? — Repetiu de cenho franzido. Desconfiar que o segredo de Skylar era grave era uma coisa. Agora, ouvir isso de uma terceira pessoa, uma fonte séria, era algo completamente diferente. Um sentimento estranho preencheu seu âmago, causando-lhe uma sensação incômoda e desesperadora: preocupação.


 Será que o quê Skylar escondia era algo que pudesse fazer-lhe algum mal?


 — Do jeito que você fala até parece que a Skye está na mira de um assassino.


 — Sinceramente? Pelo modo estranho que ela está agindo, eu espero qualquer coisa.


 — Ela tem motivos para se comportar assim. Você a conhece, sabe que ela tem tendência a fugir de situações particularmente dolorosas. — E lá estava mais um comentário que embolou ainda mais a cabeça de Mark.


 — Não estou com paciência para joguinhos, Amethyst. — irritou-se. — Você não disse que queria ir direto ao ponto? Então faça isso!


 Amy viu-se obrigada a engolir seu orgulho e a vontade de responder-lhe à altura com a ajuda de um sorriso sem humor — afinal, ninguém dizia a Amethyst Cheryl O’Flahertie-Dzerjinsky o que fazer, ainda mais com aquele tom — e dar ao cunhado o que pedia. Pelo menos naquela hora, naquela situação, seus sentimentos deviam ficar sufocados no segundo plano. Estava ali unicamente por causa de Skylar, não podia se esquecer.


 Jamais.


 — Vim aqui por dois motivos, Mark. O primeiro deles é pedir que tenha paciência com a Skye.


 — Estou cansado de ser paciente. — As palavras saíram carregadas de uma revolta justificada. Amava Skylar com o melhor de si e sempre a apoiaria contra toda e qualquer adversidade, mas cansara-se de ficar no escuro, perdido e sem ter seus sentimentos considerados.


 — E eu estou cansada das reclamações e da carranca constante do meu marido. Mas adivinha só? Eu quero continuar com ele mesmo assim, porque amo aquele idiota e vou continuar amando até que eu comece a odiá-lo. Ou até o final dos meus dias, que é a opção mais romântica, mais aceita e igualmente fantasiosa. — Revirou os olhos tediosamente. — A questão aqui é que você não é nenhuma exceção. Todos temos que engolir sapos se quisermos que as coisas fluam e possamos continuar com quem amamos, e alguns deles são tão grandes que as vezes parece que vamos nos sufocar. No pior dos casos, eles nunca descem, ficam entalados na garganta, te incomodando e te frustrando. Mas é assim que as coisas são. — Sorriu melancólica, para em seguida querer se estapear por estar desviando o foco de forma tão estúpida.


 “Skye em primeiro lugar...”, repetiu em sua mente como um mantra, “Sempre”.


 — Não fale como se eu fosse um adolescente que ainda está na primeira namorada. Sei disso melhor do que qualquer pessoa, já que devo ter engolido o brejo inteiro nos últimos quatro anos. Aguentei e enfrentei de tudo para poder ficar com a sua irmã, e ainda faço isso todo santo dia.


 — Então faça mais. — Foi até Mark, ficando face à face. — Seja paciente. Não tome nenhuma atitude em relação a Skye, apenas espere. Ela vai te contar quando se sentir preparada. Por mais que ela te ame, esse é um assunto complicado que a assusta mesmo depois de tanto tempo.


 As palavras de Amy, aparentemente, atingiram Mark, cumprindo seu objetivo. Novamente, a postura de preocupação foi adotada. Que diabos de segredo era esse que deixava Skylar tão mal assim?


 — Ela está bem? — Por mais fora de contexto que a pergunta fosse, não pôde deixar de fazê-la. Não via Skylar há tempo demais e a falta de notícias estava enlouquecendo-o.


 — Já esteve pior. — respondeu com um leve dar de ombros, recordando-se das coisas que Shae lhe contara sobre a condição de Skye nos últimos dias.


 Mark assentiu com o peito apertado. Apesar de tudo, não pôde conter o pequenino, porém incômodo, sentimento de culpa. Saber que tinha deixado Skylar mal, mesmo que ela fosse “culpada” pela briga, não era algo que melhoraria seu dia e muito menos seu humor.


 — Qual é o segundo motivo? — questionou, ansiando adiantar as coisas para que, assim, Amethyst encerrasse logo aquela visita. Estava cansado e com a cabeça à mil. Precisava, e muito, de um tempo para pensar.


 Ela demorou mais do que o normal para responder, sua postura repentinamente tensa era a de quem avaliava se algo era ou não uma boa ideia. Por fim, disse:


 — Como eu disse antes, não tiro sua razão de estar tão nervoso. Mesmo que você decida atender ao meu pedido de ser paciente, não é garantia nenhuma de que não se sentirá confuso ou inquieto. Deve ser horrível e extremamente caótico se ver no meio de um problema que você não conhece a causa, ficar imaginando milhares de coisas e nunca chegar em nada além de dúvidas e mais dúvidas. — Novamente, Amy fez aquela pausa misteriosa e insegura, mas acabou por continuar após um breve momento. — Venha comigo, quero te mostrar uma coisa.


(...)


 Para Shae, o twister girava tão rápido que poderia alcançar a velocidade da luz a qualquer momento. As luzes multicoloridas de tonalidade neon, presentes em praticamente todo o parque temático, embaralhavam sua visão, fazendo parecer que ela estava olhando através de um caleidoscópio. Seus gritos alegres se misturavam às risadas de Ray, que, por fim, se fundiam a dos outros ocupantes do brinquedo, cuja faixa etária era composta, em sua maioria, por adolescentes de 15 anos.


 Aquela vibe gostosa e toda aquela energia não estavam presentes três horas antes, quando Sheila estava trabalhando e Ray conversando com Scott no bar do Reagan’s. Nenhum dos dois estava feliz e a aura irritadiça os acompanhava feito uma sombra. Shae, por ter se ferrado na prova de Sociologia e Comunicação, o que já era esperado; e Ray, por os investidores ingleses terem voltado atrás em relação à abertura da filial em Manchester, deixando a construtora em maus lençóis.


 Uma hora, como sempre acontecia, Sheila e Ray acabaram conversando entre si. Por não terem tocado no assunto, e nem quererem, um não sabia qual era o problema do outro, mas sentiram que algo estava errado. Então alguém — Sinead? Emma? Connor? — comentou sobre o parque de diversões que se instalara em Limerick naquela semana. Como voltar para casa e ficar sozinho não melhoraria humor algum, decidiram ir entre olhares de “o que acha? ” e “que mal tem?”. Foi difícil, mas Shae conseguiu convencer Emma a cobrir seu horário em troca de pegar seu turno de sábado.


 Se um homem beirando a casa dos 30 e uma garota de 18 anos juntos em um lugar daqueles era ridículo, eles não sabiam, e pouco se importavam para a falar a verdade; mas que estava sendo divertido, estava. Muito.


 Naquela noite, ele não podia chamá-la ou tratá-la feito criança, já que ambos precisavam extravasar e estavam se comportando como tais. Comeram muitos doces, fizeram caretas na máquina de fotos e como ditava os livros e filmes românticos, mesmo que não fosse o caso deles, ganharam bichinhos de pelúcia nas barracas de jogos. Ray deu para Shae o coelho cor-de-rosa que conseguiu no tiro ao alvo e ela deu-lhe o pato amarelo que conquistou no mesmo jogo logo em seguida.


 Montanha-russa, casa de espelhos, trem fantasma — cujas mascaras dos “monstros” eram mais engraçadas do que assustadoras —, mixer, navio viking, carrinho de batida e, por último, o twister. Depois dele, a escolhida foi a barraquinha de guloseimas. Tanto Ray quanto Sheila já estavam cansados de rodar e ficar de cabeça para baixo.


 — Eu poderia vir aqui todos os dias! — Sheila exclamou com um sorriso gigante quando, assim como Ray, praticamente largou-se em um banco de madeira estilo praça que ficava próximo à bilheteria. — Sabe, Ray, eu nunca te vi tão vivo antes. Você é sempre tão “Sheila, não faça isso”, “Sheila, já está tarde”, “Sheila, não beba”. —imitou sua voz com deboche. — Juro que achei que você só ia me deixar ir no carrossel.


 — Para falar a verdade, eu esperava que eles te barrassem nos brinquedos legais. — brincou, se referindo à altura mínima para entrar em certas atrações.


 Em resposta, Sheila deu-lhe um murro no braço.


 — Idiota!


 Ray gargalhou da irritação da garota. Shae aproveitou o momento de distração para roubar uma mordida de seu pretzel como represália. Tal ato rendeu uma reclamação de ar bobo, sem uma queixa real.


 Como um dia detestável podia gerar uma noite tão boa?


 Sheila queria continuar ali, naquele meio tão alegre e colorido que a bela vista do ponto mais alto da roda-gigante se tornava dispensável. Nem precisava ir mais em brinquedo algum, estava cansada demais para continuar com aquilo, apenas ficar sentada, com a brisa gelada da noite de outono tocando seu cabelo e a companhia de Ray.


 — Minha irmã mais velha está aqui, ou seja, minha casa, se já não virou, vai virar um campo de guerra. — contou, de maneira um tanto aleatória, com a melancolia cuja qual ela e Ray fugiram ao ir para o parque.


 Sheila amava suas irmãs, mas separadamente. Quando Amy e Skylar dividiam o mesmo ambiente por mais de quinze minutos, a situação começava a desandar ao ponto de ficar insustentável. Sheila detestava aquilo com todas as suas forças.


 Qual era o problema delas?


 Para Shae, a resposta imediata seria “Skye”.


 Sim, ela culpava a irmã do meio, mas não que Amy fosse um exemplo de boa conduta. A mais velha podia não ser lá a pessoa mais fácil do mundo — nenhuma das O’Flahertie eram, para falar a verdade —, mas pelo menos ela tentava, ao contrário de Skye, que era quem iniciava as brigas em 90% dos casos.


 Sheila nunca conseguiu compreender a natureza hostil do relacionamento das mais velhas. Era normal irmãos brigarem; Nate vivia se atracando com Nicola, Ethan sempre trocava farpas com Vince e ela discutia com Skye por qualquer besteira. Era o cotidiano de qualquer família. Todavia, Amy e Skylar ultrapassavam os limites do bom senso e beiravam a infantilidade. Era simplesmente absurdo.


 — E você fica no fogo cruzado...


 Sheila meneou a cabeça em concordância e pousou seus olhos em suas mãos, que estavam sobre suas coxas.


 — Eu só queria que elas dessem um tempo. Tem vezes que me sinto como uma professora de jardim de infância separando dois alunos brigões... É ridículo.


 Ray queria muito falar algo que pudesse ajudá-la, mas nada lhe vinha à mente. Não podia se culpar, no final das contas. Há muito não tinha contato com qualquer coisa relacionada a laços familiares.


 O Kavanaugh evitava pensar muito no que deixou para trás, fosse por medo de se arrepender ou sentir raiva. De toda forma, aquilo não importava, não era mais parte de sua vida e devia ser esquecido. Entretanto, a situação de Shae, inevitavelmente, o fez lembrar-se de Rixon. Quando crianças, eram o perfeito estereótipo de irmãos gêmeos, estavam sempre juntos, não importando a hora ou lugar. Junto ao companheirismo, residia as brigas e disputas incessantes. Seu pai dizia que era difícil saber se eram amigos ou inimigos. Contudo, com o passar dos anos e as desavenças que surgiram na família, a segunda opção foi se destacando cada vez mais.


 A vida era engraçada, pensou. Nunca julgou que sentiria saudades de Rixon, e lá estava ele, ansiando pelo retorno da época em que seus conflitos com o irmão se limitavam a competição por brinquedos e a escolha do canal de TV. A época sem cicatrizes em que tudo era infinitamente mais fácil.


 Ao perceber que o clima depressivo retornara, Ray tomou a primeira atitude que pensou ao se levantar e dar a mão a Shae para que ela fizesse o mesmo. Ela o olhou com uma expressão confusa e ele falou:


 — Vamos embora.


 — Mas já? Você não disse que não queria voltar para casa tão cedo? — retorquiu com uma cômica cara amuada.


 Ray sorriu ao responder:


 — E quem falou em ir para casa?


(...)


 Quando Mark já havia elegido “Amethyst aparecer do nada em seu apartamento” como uma das coisas mais bizarras que lhe acontecera em tempos, ela lhe surpreendeu com uma ida noturna ao cemitério da cidade. Nada, absolutamente nada, superaria aquilo.


 Ainda que os postes de iluminação espalhados pelo lugar cumprissem bem sua tarefa, ele continuava sinistro. Não era a escuridão que provocava aquilo, e sim a atmosfera.


 A maioria das lápides eram no formato padrão — retangular — e se dispunham enfileirados sobre a bela tapeçaria verde-claro que era o gramado do cemitério. Algumas delas eram tão antigas e desgastadas que a textura da pedra se assemelhava a blocos retirados das ruínas de um castelo medieval.


 Estava pensando em perguntar sobre o que diabos estavam fazendo ali, quando Amy voltou-se bruscamente para ele e advertiu:


 — Antes de prosseguirmos, quero que jure que nunca, jamais, em hipótese alguma você vai contar à Skye sobre isso.


 Ter ido ao cemitério sozinho com Amethyst em uma noite de quinta-feira não era algo legal, sensato ou agradável de se discutir com Skylar. Entretanto...:


 — Me desculpe, mas não vou jurar nada. Não vou e nem quero guardar segredo algum da Skye. — Só porque sua noiva fazia aquilo, não significa que tinha que copiá-la. Ele não era assim, sentia que esconder algo relevante dela era quase o mesmo que traí-la. E Mark, independente de tudo, jamais faria aquilo.


 Amethyst fitou-o de sobrancelhas arqueadas.


 — Tem certeza? Garanto que o quê tenho para te mostrar é uma coisinha bem interessante. Prefere ficar na curiosidade? — falou como se fosse uma vendedora fazendo uma oferta imperdível.


 — Não vou mentir para ela. — reafirmou com invejável convicção.


 Para sua surpresa, Amethyst não ficou brava ou revoltada por ter ido até ali à toa. Ela sorriu de um jeito intrigante e disse:


 — Bom menino. — Após isso, virou-se e continuou seu caminho para dentro do cemitério, deixando um Mark desnorteado para trás. — Não vai vir? — Olhando por cima do ombro, perguntou com a voz um pouco mais elevada por conta da distância.


 — “Vir”? Como assim? Não prometi nada.


 — Tenho ouvidos, Mark, sei exatamente o que disse ou deixou de dizer.


 — O que você não tem é coerência. — Touché. — Não tem medo que eu conte para a Skye que você me mostrou seja lá o quê?


 — Vou correr o risco. — Deu de ombros e replicou com despreocupação


 — Por quê?


 Amethyst se aproximou de Mark, retornando seu caminho, e falou com um tom de voz baixo, porém firme e afiado:


 — Porque eu a amo, mais do que qualquer um, mais do que você. E eu prefiro que ela me odeie a vê-la infeliz.


 Depois daquilo, Mark concluiu que o melhor a fazer era calar a boca e segui-la. Não podia negar que estava curioso a respeito do quê Amethyst queria tanto lhe mostrar, mesmo que tivesse corrido o risco de não saber de nada ao se recusar manter segredo de Skye.


 O Thatcher não demorou muito para perceber que o caminho que percorria com a cunhada provavelmente era o mesmo que levava aos túmulos da família O’Flahertie. Lembrava-se vagamente da localização por já ter visitado-os com Skye duas ou três vezes.


 Percebeu que haviam finalmente chegado ao destino quando Amethyst deteve-se de frente para uma lápide, que não era velha nem nova, com uma simplória placa de metal sem qualquer foto ou adorno. Nela, não estava gravado o nome de Michael, Sofia, Violet ou qualquer familiar de Skylar que já ouvira falar. Era um nome completamente estranho em uma lápide que nunca reparara.


Wendy Madeleine O’Flahertie


 


 


 


* Para quem tiver curiosidade/não conseguiu imaginar, a tal fantasia de Nutella consiste em uma blusa de manga comprida marrom, calça marrom e um rótulo gigante de Nutella colado no peito. Sim, eu sei que é tosco kkkkk
* St. Camillus é um hospital de Limerick.
Por favor, comentem para que eu saiba o que estão achando, isso me deixa extremamente feliz e é muito importante.
Kisses e até mais!



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Autor(a): Lilie

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