Fanfics Brasil - Miserável Vínculos

Fanfic: Vínculos | Tema: Original


Capítulo: Miserável

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Capítulo 6- Miserável


Quinta-feira, 22 de Maio de 1997.


Skylar retirou os sapatos de salto vermelhos, abriu a porta de entrada cuidadosamente, entrou na casa e trancou-a novamente. Tudo no maior silêncio possível para que sua avó não acordasse.


Fez o caminho para seu quarto na ponta dos pés silenciosa, como uma ninja, quase prendendo a respiração ao passar em frente à porta dos aposentos da idosa. Porém assim que entrou em seu quarto viu todos seus esforços irem por água a baixo: Violet estava lá, sentada em sua cama de braços cruzados, vestida com uma longa camisola amarela envolta por um roupão rosa-terra e com um olhar severo por baixo dos óculos de armação retangular.


— Eu posso saber onde você estava? — Sua voz continha um misto de severidade e preocupação.


Skylar forçou-se a pensar em uma resposta convincente. Se ela contasse que tinha ido à festa de um ex-peguete no meio da semana, bebido todas e dormido com um desconhecido, Violet explodiria sua cabeça de tanta falação.


— Na casa da Liz. — mentiu.


— Skylar Rose O’Flahertie, não minta para mim!


— Eu tô falando a verdade! — insistiu.


— Você por acaso acha que sou idiota? Eu liguei para a casa dessa menina essa madrugada, e sabe o que ela me disse? — Fitou os olhos azuis da neta intensamente. — Que vocês brigaram e não estão mais se falando, o que me leva a repetir a pergunta: onde você estava?


Skylar fechou os olhos e respirou fundo. Estava morrendo de cansaço e não estava nem um pouco disposta a inventar histórias mirabolantes que com certeza seriam contestadas pela avó, que no final lhe daria um belíssimo sermão. Preferiu tocar o “foda-se” e pular direto para a parte do sermão para que pudesse ir dormir o mais rápido possível.


— Estava por aí. — É claro que ela não contaria exatamente onde estava, Violet não precisava saber de sua vida.


— Por aí? Isso lá é resposta?!


— É. — respondeu despreocupada ao mesmo em que tirava os brincos de argola e colocava-os em cima da penteadeira.


Violet levantou-se, caminhou até a neta e pôs as duas mãos em seus ombros, ficando frente a frente com ela. Skylar fitou-a. Suas olheiras se destacavam na pele alva e enrugada, indicando que passara mais uma noite em claro por sua causa. Aquela estava longe de ser a primeira vez que sumia no meio da noite.


— O diretor da sua escola me ligou ontem, ele disse que você mal foi ás aulas no último mês e que se continuar assim pode repetir o ano por falta. O que você anda fazendo?


— Coisas. — respondeu desconfiada. Como o assunto tinha passado de “onde você estava essa noite” para “o que você faz quando mata aula”?


— Me responda direito! — Apertou os ombros da neta com mais força numa tentativa de ser mais intimidante.


Skylar não disse absolutamente nada, sequer se moveu, apenas desviou o olhar. Violet afrouxou o aperto até solta-la e deixou que seus braços caíssem ao lado do corpo. Deu dois passos para trás e disse:


— Eu sei o que você faz quando falta às aulas, apenas quis te dar a chance de se explicar, de provar a mim que tudo o que ouvi foi mentira, mas você rejeitou-a. Essa menina, Liz, me contou várias coisas sobre você naquela ligação. — Skylar arregalou os olhos. — Ela me disse que você sempre se encontra com um tal de Bradley, um aspirante a detento... — A adolescente fez menção de interromper, mas a idosa levantou a mão em um pedido silencioso para que a neta deixasse-a terminar de falar. — E que mesmo “namorando” ele, você ainda fica com outros meninos, incluindo o namorado dessa Liz. Isso sem contar que você recentemente criou o costume de roubar bebida dos supermercados. — Ela parou para tomar folego, como se cada palavra queimasse sua garganta. — O que está acontecendo, Skylar?


Skye fechou os olhos com força para conter a raiva e amaldiçoou até a oitava geração de Liz. Graças a ela levaria bem mais que um sermão.


— Estou aguardando sua resposta.


— Você está esperando pelo quê, hein?! — explodiu. — Pare de fazer essas perguntas idiotas e fale logo o que tem para falar!


— Não eleve o tom de voz comigo, mocinha! — repreendeu-a. — Não vou te xingar porque sei que vai entrar por um ouvido e sair pelo outro. Eu só quero entender o que está acontecendo, mas isso é difícil porque você não colabora, está sempre zangada e age como se eu e sua irmã fossemos suas inimigas quando tudo o que queremos é te ajudar! — desabafou.


— Me ajudar?! Entender o que está acontecendo?! Você virou psicóloga por acaso?! Eu não tenho e não estou fazendo nada de errado, você e a Amy são duas estraga prazeres, isso sim! Sabe quem precisava realmente de ajuda, vovó? A mamãe! Mas você se importava? A Amy se importava? Não! Apenas continuaram com suas vidinhas perfeitas até a merda bater no ventilador! — Parou de falar ao perceber que estava prestes a chorar.


Violet caminhou até ela e deu-lhe um tapa no rosto. O choque que Skylar sentiu com a ação da avó a fez esquecer-se da dor. Ela sempre fora uma mulher doce, perdia a paciência e gritava às vezes é claro, mas nunca partira para a violência. Pelo menos não até aquele momento.


— Jamais diga que eu não importava com minha filha! — A voz da idosa estava embargada e seus olhos azuis brilhantes por conta das lagrimas. — Você não sabe de nada! Tem dezesseis anos, mas tem a mentalidade de uma criança de oito e a amargura de um senhor de noventa! Você é ingrata, egocêntrica, rabugenta, trata todo mundo como se fosse seu capacho, acredita que seus atos não terão consequências e se acha independente mesmo não sabendo arrumar a própria cama! Acha mesmo que terá um futuro se continuar de jeito?! Acha que as pessoas te suportarão?! Que terá alguém do seu lado apoiando todas as suas idiotices?! — Violet nunca gritara tanto.


Ela colocou a mão no peito coberto pelo roupão, como se estivesse segurando seu coração sob a pele, e continuou a falar, só que em um tom mais brando:


— É em momentos como esse que eu invejo aquelas mães desnaturadas que não dão a mínima para os filhos. Elas não têm que passar noites em claro, rezando para que eles estejam bem, seja lá em que buraco se meteram; não têm que buscá-los no hospital quando eles bebem tanto que acabam tendo que tomar glicose na veia, não têm que aturar ingratidão, caras feias e malcriações apesar de fazerem de tudo por eles. Mas eu não sou e nunca fui assim. — Enxugou uma lágrima que descia por sua bochecha. — Se você acha que vou ficar de braços cruzados vendo você jogar sua vida fora, está muito enganada! Não sei ainda o que vou fazer, mas saiba que em breve tomarei uma atitude! — avisou. — Agora trate de tirar esse resto de maquiagem, tomar um banho e por uma roupa decente que daqui à uma hora eu quero você pronta para ir à escola. A partir de hoje eu vou te levar e buscar para garantir que você não falte mais para se encontrar com aquele vagabundo. — Saiu do quarto praticamente deslizando em suas pantufas marrons.


Lágrimas desciam descompassadas pelo rosto de Skylar, borrando ainda mais sua maquiagem. Não chorava de culpa ou tristeza, e sim raiva. Pegou um vidro de perfume encima da penteadeira e atirou-o perto do batente da porta, por onde Violet passara segundos antes. Cacos voaram para todos os lados e o aroma adocicado preencheu o cômodo imediatamente. Jogou-se na cama e afundou a cara no travesseiro para que seus gritos odiosos fossem abafados.


(...)


Entrou na sala de aula andando rápido e esbarrando nos alunos que estavam em seu caminho, podendo ser comparada a um rinoceronte, e sentou-se em sua carteira nos fundos da sala, não deixando de lançar um olhar mortal a Liz, que conversava com um grupinho de garotas perto da janela. Colocou a mochila em cima da carteira de deitou a cabeça sobre ela, tentaria tirar pelo menos um cochilo antes que a professora chegasse.


— Pensei que tivesse esquecido o caminho da escola.


Abriu os olhos e viu Jenny sentada na mesa ao seu lado com uma expressão aparentemente desinteressada. Ela era uma das poucas pessoas na escola que despertava a simpatia de Skylar, talvez fosse pela constante cara de sono, pelo jeito despreocupado ou pelo simples fato dela não rotula-la de piranha como quase todos daquele lugar. Podia-se até dizer que tinham uma relação próxima a amizade.


Próxima, pois Skylar não tinha amigos, apenas companheiros de farra. Mesmo que Jenny fosse uma exceção à regra, elas sequer se viam fora da escola, o que não caracteriza uma amizade.


— Minha vó descobriu que eu ando matando aula e resolveu começar a me trazer e buscar aqui todo santo dia. — respondeu desgostosa.


— Que bosta, hein? — Remexeu a mochila e tirou de lá um maço de cigarros. Skye a olhou como se estivesse louca. — Relaxa, a professora vai demorar chegar ainda. — explicou-se e a colega pareceu relaxar. — Aceita?— A O’Flahertie pegou um cigarro.


— Você tá péssima, Ky.— comentou enquanto acendia seu cigarro com um isqueiro que tirara do bolso da calça, passando-o para a colega logo em seguida.


— Fui a uma festa essa noite e quando cheguei em casa levei o maior esporro da minha vó e não consegui dormir. Você acredita que a Liz me dedurou?


— Considere isso uma vingança por você ter dormido com o namorado dela. — Soltou fumaça pela boca, alguns alunos às olharam assustados quando perceberam que elas estavam fumando dentro da sala de aula. A historia de que Skylar tinha dormido com Bernard, namorado de Liz, há três semanas se espalhara como fogo em rastilho de pólvora.


— Tá defendendo aquela cadela? — Estreitou os olhos.


— Não estou defendendo ninguém, apenas dizendo que você não tem o direito de reclamar.


— Direito? Saiba que isso não vai me impedir de esfregar a cara daquela vaca no asfalto. — Cuspiu as palavras com ódio.


— Eu não vou perder meu tempo discutindo com você. Faça como quiser, Ky.


Skylar bufou, na maior parte do tempo ela gostava do jeito relaxado de Jenny, mas não naquele dia. O problema não era com a garota e sim com a própria O’Flahertie, parecia que tudo estava irritando-a, desde o sol de inicio de verão até o cara mascando chiclete algumas carteiras à frente.


Ela queria que o mundo explodisse.


Assim que a professora de biologia entrou na sala, Skylar e Jenny apagaram seus cigarros e jogaram dentro da mochila de um garoto distraído. Todos os alunos foram para seus devidos lugares e a aula sobre reprodução humana começou.


Particularmente, Skylar considerava aquela matéria uma perda de tempo. Que tipo de idiota não sabia como aquilo funcionava? Era só fazer sexo e, se o indivíduo em questão for muito azarado, nove meses depois ele terá um ser molengo e com cara de joelho tirando-lhe o sono, a paciência, o tempo livre e a vontade de viver.


A aula se arrastou por cerca de 40 minutos até que uma coisa no mínimo curiosa aconteceu: a professora começou a chorar do nada, pediu “desculpas” e saiu da sala, fazendo com que todos ficassem com cara de “mas que droga foi essa?”.


— O que deu na Sra. Hancox? — Skylar perguntou à Jenny. Não que ela se importasse de verdade, mas não era todo dia que se via um professor sair da sala aos prantos.


— Sei lá. — Deu de ombros.


Um garoto sentado na frente de Skylar pareceu se interessar por sua dúvida, então ele se virou para ela e disse:


— Recentemente ela descobriu que não pode ter filhos.


A O’Flahertie franziu o cenho confusa.


— Como você sabe disso?


— Ela é amiga da minha mãe. Ela foi lá em casa esses dias pra trás e eu a escutei falando disso.


Skylar pretendia falar mais alguma coisa, mas mudou de ideia ao perceber que com a saída da professora ela teria a oportunidade de, pelo menos tentar, tirar um cochilo.


E não deu outra. Só acordou quando recebeu um cutucão de Jenny, indicando que a educadora havia retornado.


Mesmo que não estivesse mais chorando, seu estado era deprimente. Ela não disse uma palavra sequer aos alunos, que a encaravam assombrados, apenas juntou suas coisas que estavam na mesa e saiu da sala.


Um alvoroço começou entre os estudantes, que se dividiam em dois grupos: os curiosos que não paravam de fazer perguntas — suas dúvidas por sinal, foram sanadas pelo mesmo garoto fofoqueiro que contara a Skylar sobre o problema da Sra. Hancox — e os que conversavam sobre assuntos paralelos. Tudo só se acalmou quando o professor seguinte, o de física, entrou em sala.


Skylar nem prestou atenção nos cálculos escritos na lousa, a única coisa que ocupava sua mente era a expressão desolada da docente. Ela já vira aquela mesma expressão estampada várias vezes na face de sua mãe no intervalo de dois anos entre a morte de seu pai e a dela. As lembranças daquela época faziam com que certas feridas fossem reabertas, desestabilizando-a completamente.


As festas, os garotos, as drogas, a bebedeira e as fugas eram seus refúgios, seus analgésicos. As únicas coisas que faziam com que as lembranças dolorosas sumissem...


Mesmo que temporariamente.


(...)


— Ela fez isso de novo? — Sua voz saiu arrastada e sem o mínimo tom de surpresa.


— Fez. O único lado bom foi que ela não estava caindo de bêbada como nas outras vezes, se é que isso pode ser chamado de bom. Você não sabe o que mais eu descobri...


Amethyst sentou-se em uma poltrona amarela localizada ao lado da mesinha de madeira, onde se encontrava o telefone, e a janela de seu quarto. A barriga de quase nove meses de gestação a impossibilitava de ficar muito tempo de pé sem se cansar. Ouviu atentamente aos relatos de Violet sobre uma garota chama Liz que lhe contara as últimas gracinhas de sua irmã.


Skylar era muito nova para beber daquela maneira, mas isso nem era sua maior preocupação, e sim a promiscuidade. Ela estava se comportando como uma prostituta, só que sem a parte do dinheiro. Isso tudo sem contar as coisas que não sabiam, tinha quase certeza que Skye aprontava bem mais do que chegava a seu conhecimento e ao de Violet. Expirou pesadamente quando a avó terminou de contar.


— Estou pensando em mandá-la para um daqueles internatos onde só se aceitam meninas.


— Nem pensar, isso é muito radical!


— Tem alguma sugestão melhor?! — O tom de voz sério de sua avó deu lugar a um raivoso. Mesmo que a tutela de Skylar pertencesse a Violet, era Amethyst que ditava as regras do jogo, já que era ela que bancava a maior parte do sustendo da avó e da irmã do meio na Irlanda. Por isso que a cada acontecimento ou decisão tomada sobre Skylar, Amethyst tinha que ser informada e consultada.


— Agora não, mas eu vou arranjar.


— Até você pensar em alguma coisa ela já vai ter tido uma cirrose!— Não pôde deixar de rolar os olhos com o exagero da idosa.


— Que tal ela vir passar um tempo aqui em Moscou? Pode não resolver o problema, mas vai acalmar as coisas, sem falar que ela vai poder passar um tempo com a Sheila. Eu sei que a Skye sente falta dela.


— No meio do período letivo? Você tá caducando, Amethyst? Você também se esqueceu de que ela não sabe falar russo? Como você pretende segurar alguém como a Skylar por sabe-se lá quanto tempo em um lugar onde ela só pode se comunicar com duas pessoas: você e a Sheila? Sem contar que ela vive falando que não gosta daí. — Rolou os olhos novamente. Skye nunca tinha pisado na Rússia, não tinha ido sequer ao seu casamento e falava que não gostava do país apenas para tentar irritá-la.


— Vó, essa é a única opção que eu posso lhe dar. Você tem que entender que eu não consigo fazer muita coisa daqui, eu tenho que ir até ai e ver a Skye pessoalmente para então pensar em alguma outra coisa. — Ouviu a avó bufando do outro lado da linha. A imagem cômica da idosa usando um de seus muitos vestidos floridos, sandálias de couro com os cabelos grisalhos presos por um lenço e a mão livre agitando um espanador de pó enquanto conversavam veio-lhe a mente.


— Quando vai ser a sua próxima visita?


— No final de julho. Eu queria ir antes, mas tenho que aguardar um tempinho depois do bebê nascer para poder viajar.


— Entendo... Mas eu não posso ficar dois meses de braços cruzados!


— Você não vai! Troque as fechaduras, tome o celular dela, vigie-a 24 horas por dia... Faça qualquer coisa, segure as pontas!


— Eu vou tentar. Agora mudando de assunto... Já escolheram um nome?


— Alexander. — O nome saiu de seus lábios como uma oração.


— Belíssima escolha! — A voz de Violet transmitia toda a satisfação que ela sentia por estar ganhando seu segundo bisneto. — Mesmo que ele esteja prestes a nascer, fico feliz que tenham escolhido um nome. Seus pais arrumaram tanta confusão na hora de nomear você e as suas irmãs que me dá preguiça só de lembrar. Sabia que era para você se chamar Skylar e não a sua irmã? E que Sheila quase se chamou Margaret?


— Sim, eu sabia. — Riu. — Lembro-me até hoje do tanto que a mamãe gritou com o papai por ele ter registrado a Shae com o nome “errado”. Foi uma das cenas mais engraçadas que já vi! Ele me confessou que fez isso porque a nova chefe dele chamava-se Margaret e ele a odiava.


— Seu pai era doido! Agradeço aos céus por você ter puxado à sua mãe e rezo para que Sheila vá pelo mesmo caminho, de maluca nessa família já basta a Skylar.


Riu ainda mais com o comentário da avó. Elas ficaram mais alguns minutos relembrando o passado, até que Violet finalmente se lembrou do preço da chamada internacional e encerrou a ligação.


A Dzerjínsky pegou um livro, que estava na mesma mesinha do telefone, e se dirigiu para o jardim nos fundos da casa pensando na irmã do meio.


Mesmo não demonstrando muito, ela estava tão preocupada quanto Violet, ainda mais depois do que ficara sabendo. Desde pequena, Skylar sempre fora meio fora da caixinha, mas nunca chegara àquele ponto. Sabia que aquilo tinha relação com a morte de Sofia. Dentre as três, Skylar fora a mais afetada. Amethyst já estava morando na Rússia, portanto não vivenciou a fase depressiva seguida de suicídio da mãe, e Sheila nem se lembrava direito.


Sentou-se no banco de madeira, perto de uma árvore de lilases, e distraiu-se da situação de Skylar com a visão de Sheila e sua filha mais velha, Nika, brincando de pega-pega. A pequena russa corria o máximo que suas perninhas de quatro anos de idade permitiam, entretanto, não chegava nem perto de conseguir alcançar a tia.


Ventava bastante naquele fim de tarde, os cachos castanho-claros de Sheila voavam de um lado para o outro, tampando sua visão em certos momentos e se misturando à fita azul bebê que prendia seu cabelo. Foi em um desses momentos de cegueira parcial que ela tropeçou e caiu de cara em um canteiro de petúnias.


— Tetya! Poluchili li vy bol'no?* — Nika correu gritando até a tia. Sheila levantou a cabeça e lançou um olhar fulminante para Amethyst, que estava tendo uma crise de riso. Amethyst forçou-se a parar de rir da desgraça da irmã, caminhou até ela e ajudou-a a se levantar.


— Tá tudo bem. — Deu-lhe um beijo na testa e começou a tirar algumas folhas presas que ficaram presas em seu cabelo. Às vezes, Amethyst optava por falar em inglês com Sheila. Ela tinha o medo, um tanto estúpido e infundamentado, de que ela se esquecesse de sua língua natal. Isso também servia para tentar ensinar o idioma a Nika, mas ainda não obtivera nenhum avanço em relação à filha.


— Vamos para dentro passar alguma coisa nesses ralados. — Deu a mão esquerda para a irmã e a direita para a filha e foram caminhando para dentro da casa.


Muitas vezes ela se esquecia de que Sheila era apenas sua irmãzinha, chegando a tratá-la da mesma maneira que tratava Nika. O mesmo acontecia com Dmitry, ele gostava brincar dizendo que ela era sua filha adotiva. Aquele era mais um motivo pelo qual a O’Flahertie mais nova não fora tão afetada pela morte dos pais: ela teve quem tomasse seus lugares.


Com um aperto no coração, Amethyst imaginou se as coisas teriam sido diferentes para Skylar se tivesse lutado mais para ficar com sua guarda.


(...)


Liz estava encostada na parede ao lado do portão da escola com os fones de ouvido no volume máximo e folheando distraidamente um caderno de capa amarela. Suas amigas, junto da maioria dos alunos, já haviam ido embora e sua mãe estava atrasada para busca-la.


Aquele era o momento perfeito.


Skylar caminhou até ela decididamente e bateu a mão em seu caderno, derrubando-o no chão, e deu-lhe um tapa na cara. O barulho estalado soou alto e a face da garota ficou marcada. Liz retirou os fones, colocou a mão sobre o local atingido e gritou raivosa:


— Você tá maluca?!


— A única maluca aqui é você por ter me dedurado. — Deu-lhe outro tapa.


Dessa vez, Liz não deixou barato.


Deu um soco no nariz de Skylar, que recuou, soltando um urro de dor, e depois partiu para cima dela. As duas caíram na calçada e Liz ficou por cima, dando-lhe tapas. Skylar agarrou suas madeixas ruivas e puxou-as para o lado com força, tirando a garota de cima de si e invertendo as posições.


Conseguiu dar cerca de quatro tapas na face da garota antes de sentir dois braços fortes puxando-a para traz.


— Que zona é essa?! — Tanto Skylar quanto Liz, que estava sentada no chão tirando o cabelo da cara, reconheceram a voz.


— Bernard?— Perguntaram em uníssono.


Bernard fingiu não ter ouvido a O’Flahertie, e pôs sua atenção em Liz, que estava se levantando com a ajuda de seu melhor amigo, Taylor. A ruiva murmurou um agradecimento para Taylor e pegou seu caderno do chão.


— Você tá legal, Eliza? Precisa de ajuda? Quer que eu te acompanhe até sua casa?— Bernard ofereceu.


A garota encarou o ex-namorado com ódio.


— Não quero nada vindo de você! — As palavras deixaram seus lábios feridos como veneno. — Por que não ajuda essa puta maconheira ao invés de fingir que se preocupa comigo?


Taylor correu para ajudar Bernard a segurar Skylar, que se debatia ferozmente na tentativa de se soltar e voar no pescoço da adversária.


— Fala assim de mim de novo e eu risco esse seu cabelo de fósforo no chão! — ameaçou.


— Assim fica difícil, queridinha. — Aproximou-se de Skylar, ficando cara a cara. Como ela estava com os dois braços presos ela não poderia lhe machucar. — Como você quer que eu me refira a alguém cuja cama é tão frequentada que dá para abrir uma franquia do McDonalds?


Skylar fez algo que ninguém esperava: impulsionou a cabeça para frente e mordeu o nariz da ruiva com força. Liz gritou apavorada e recuou colocando as mãos no nariz para conter o sangramento. Bernard e Taylor, pasmos, soltaram Skylar e correram para ver como Liz estava.


— Qual é o seu problema?! — Bernard voltou-se raivoso para a morena. — Viu só o que você fez com ela?!


Skye fitou-o incrédula.


— Por que você tá defendendo a Liz desse jeito, hein, Bern?! Até parece que você gosta dela! Se me lembro bem, você vivia reclamando dela quando estávamos juntos! Do que você a chamava mesmo? Me lembrei! Patricinha, nojenta, sem sal, chorona, grudenta... — Foi enumerando os adjetivos nos dedos.


Liz esqueceu-se momentaneamente da dor no nariz e partiu para cima de Bernard, dando-lhe vários tapas e socos enquanto ele tentava se defender. Skylar riu da cena.


— Seu filho da puta! — urrou. — Além de ter me traído com a minha amiga você ainda falava essas coisas de mim?! Você não vale nada!


— Eliza, se acalme e me deixa explicar, por favor!


— Explicar? — Skylar se intrometeu. — Não tem nada pa...


— Cala a boca! — Bernard gritou. — Se tem uma coisa que me arrependo com todas as minhas forças foi de ter ficado com você, Skylar.


Skylar deu um sorriso irônico.


— Jura? Porque você não parecia nem um pouco arrependido até a Liz descobrir.


— Já chega! — Liz berrou com lágrimas nos olhos. — Eu não sou obrigada a escutar isso!


Liz fez menção de sair correndo, mas foi impedida por Bernard, que a segurou pelo braço.


— Tira a mão de mim! — Empurrou o ex-namorado. — Você é a maior decepção da minha vida! Usa o resto de vergonha na cara, que eu acredito que você ainda tenha, e não chegue mais perto de mim. Enquanto a você, Skylar... — Virou-se para a morena, que assistia a cena de braços cruzados. — Eu devia ter dado ouvidos aos que me disseram que você não vale nada, que eu não devia fazer amizade com gente do seu tipo.


A mãe de Liz parou com seu carro prateado do outro lado da rua e buzinou para a filha, que limpou as lágrimas e foi até ela, mas não antes de deixar mais um recado para Skylar:


— Apesar de tudo, sinto pena de você, porque sei que vai ter uma vida miserável.


Aquela última frase deixou Skylar visivelmente abalada.


— É, meu amigo... Você nunca vai ter a Liz de volta. — Taylor comentou.


— Isso tudo é culpa sua! — Bernard voltou-se para a O’Flahertie.


— Minha?! — Indignou-se. — Do jeito que você fala até parece que eu te droguei e te levei para cama! Vê se vira homem e assume as coisas que faz, filho da puta!


— Sua...


— Já chega, Bern! Vamos embora. — Taylor disse.


— Já vão tarde. — provocou. — Me faz um favor, Bernard? Faça das palavras da Liz as minhas e nunca mais fale comigo.


— Como se eu quisesse ter contato com uma piranha feito você! Espero que você realmente tenha uma vida miserável. — Saiu pisando duro com Taylor em seu encalço.


Skylar desejou que um ônibus atropelasse Bernard no caminho para casa.


Lágrimas começaram a descer por seu rosto sem que ela percebesse. Estava zangada com Bernard. Com Liz. Com Taylor. Com seus colegas de escola. Com todos que agiam como se ela não merecesse respeito. Com todos os meninos que a chamavam de piranha, mesmo já tendo ficado com ela. Com todas as meninas que a olhavam torto. Com ela mesma.


Principalmente com ela mesma.


Por que tinha que ser daquele jeito?


Lembrou-se das palavras de Liz e Violet. Ambas diziam que ela teria uma vida horrível a menos que resolvesse mudar de comportamento.


O problema era que Skylar não mudaria e tinha plena consciência disso.


Ela era fraca e medrosa. Talvez até mais que Sofia.


Do mesmo jeito que Skylar bebia, se drogava e ficava com um monte de caras para se esquecer e fugir da pessoa miserável que ela era, Sofia cortou os pulsos e se afogou numa banheira para fugir da dor de perder o marido.



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Autor(a): Lilie

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Capítulo 7- Papai Noel Não Existe. Sexta-feira, 8 de Agosto de 2008. Ethan acordou bem cedo, queria ir até a casa de Sheila antes de ela ir para a universidade para contar-lhe sobre o beijo de Nate e Esther. Tinha certeza de que, assim que ele lhe contasse, ela deixaria aquela política de silêncio estúpida para trás e o ajuda ...


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