Fanfics Brasil - Favores Vínculos

Fanfic: Vínculos | Tema: Original


Capítulo: Favores

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Capítulo 8- Favores


Segunda-feira, 11 de Agosto de 2008.


— Eu não sou a pessoa mais apropriada do mundo para te ajudar a escolher o seu vestido de noiva, Mia.


— Por favorzinho, Ray! O vestido é a parte mais importante do casamento, eu não quero ter que escolhê-lo sozinha, é muita pressão! — choramingou.


— Por que não pede para uma mulher ir com você?


— Porque todas as minhas amigas estão ocupadas.


— E o que te faz pensar que eu não estou? Tem uma pilha de papéis em cima da minha mesa me encarando neste exato momento.


— Mas você pode sair mais cedo do trabalho ou até mesmo pedir um dia de folga.


— E depois nós podemos voar no meu unicórnio mágico até o final do arco-íris, onde um leprechau chamado Amblaoibh vai estar nos esperando com um pote de ouro e uma garrafa de cerveja. — ironizou. — Você conhece o meu chefe, Mia? É mais fácil ele me por no olho da rua do que me dar um dia de folga.


Ouviu Mia soltar um gritinho frustrado do outro lado do telefone.


— Por que você não vai olhar a porcaria do vestido em um dia em que alguma das suas madrinhas possa ir com você? — sugeriu.


— Não é assim que as coisas funcionam, é preciso marcar hora antes de ir à loja.


Ray revirou os olhos. Vestidos eram vestidos, não fazia sentido alguns serem considerados tão especiais só por serem brancos. Mas, por mais idiota que aquilo fosse, ele sabia o quanto significava para Mia. Bufou, não acreditando no que estava prestes a dizer.


— Para quando você marcou?


— Quinta-feira às três da tarde. Você vai dar um jeito de ir? — perguntou esperançosa.


— Não, eu não vou, mas vou ver se arrumo alguém para ir com você. Tudo bem?


A cozinheira soltou um suspiro decepcionado.


— Tudo bem. Mas se for ruiva eu te mato!


Ray franziu o cenho.


— O que você tem contra as ruivas?


— Contra as ruivas em geral? Nada. Contra as ruivas que você namora? Tudo. Convenhamos Ray, eu nunca vi alguém com tantos relacionamentos fracassados que nem você. Imagina se eu faço amizade com a garota e logo depois vocês terminam e eu tenho que escolher um lado? Desde o ano passado isso já aconteceu três vezes.


— Ok, não precisa ficar me lembrando do quão romanticamente miserável eu sou. Não se preocupe, vou arrumar alguém que não tenha a mínima chance de eu pegar. — disse de maneria ácida.


— Não é que você seja romanticamente miserável, você só não consegue manter um relacionamento porque não se dedica, não demonstra interesse nem corre atrás. E também tem a teoria do Scott...


— Vamos deixar para discutir isso outra hora, eu tenho que trabalhar. — Sua vontade de falar sobre sua vida amorosa era nula.


— Tudo bem, até mais.


— Até.


Imediatamente após desligar o celular e guardá-lo no bolso da calça jeans escura, Ray deu-se conta de que tinha acabado de criar mais um problema para si: como e onde ele iria arranjar alguém para ir com Mia até a loja de vestidos?


Com exceção de Mia e suas sete ex-namoradas — que estavam fora de questão por razões obvias — a única mulher que ele conhecia e mantinha contato em Limerick era Phoebe, sua secretária. Ela seria a escolha perfeita se não fosse por um pequeno detalhe: ela estava de licença maternidade.


Ao pensar em Phoebe, Ray lembrou-se de que teria que arrumar uma substituta se não quisesse que seu escritório virasse uma zona maior ainda.


Ao pensar em zona, lembrou-se também da torre de Babel em forma de relatórios em cima de sua mesa que deveria ser analisada até quarta-feira.


Quarta-feira também era o dia em que ele teria que uma reunião de negócios de inestimável importância com investidores ingleses. Essa reunião era essencial para que o plano de longa data de abertura de uma filial em Manchester pudesse ser posto em prática.


Já sofrendo de cansaço por antecedência, Ray passou as mãos pelos cabelos castanhos nervosamente e respirou fundo. Uma coisa de cada vez. Primeiro, ele tinha que se dedicar à papelada.


Para tentar relaxar, ele abriu a última gaveta de sua mesa e tirou de lá um pequeno rádio quadrado e preto com uma antena prateada. Ligou-o e foi trocando de canal até achar um que estivesse tocando alguma coisa, a música em questão era Linger, do The Cranberries. Dobrou as mangas da camisa social azul clara até os cotovelos e começou a trabalhar nos relatórios e só parou cerca de quarenta minutos depois, quando uma voz chamou-lhe a atenção e o fez parar de ler sobre os gastos do último mês.


Era a voz de Chris Martin cantando The Scientist.


Mesmo não gostando da música, Ray quase beijou o pequeno rádio. Ele tinha lhe dado uma possível solução para o problema com Mia.


Sheila O’Flahertie era o nome dessa solução.


(...)


Sheila Siobhan O’Flahertie sabia dançar muito bem.


Em uma festa ela podia não estar entre as mais bonitas, mas sabia como chamar a atenção.


Em compensação, ela cantava muito mal.


Segundo Ethan, o som de Sheila cantando “I Will Always Love You” era o que tocava na recepção do inferno.


Os desenhos de Sheila eram maravilhosos.


No ultimo ano do colegial, por pura implicância, ela fez uma caricatura do diretor, assinou o nome de Esther e colocou no mural da escola. O diretor teve uma reação completamente oposta da que Sheila esperava, ao invés de ficar furioso, ele gostou tanto do desenho que resolveu emoldurá-lo em sua sala. No final das contas, o tiro acabou saindo pela culatra, já que foi Esther quem levou o crédito pela caricatura e caiu nas graças do diretor.


Ela não tinha a mínima vocação para dirigir.


Quando Sheila completou 17 anos, Skylar tentou ensiná-la a dirigir. Depois de dez meses de aulas de direção, a única coisa aprendida foi uma lição: O seguro do carro é uma coisa imensuravelmente importante, nunca, absolutamente nunca, esqueça-se de fazê-lo ou você vai se arrepender amargamente.


Na opinião de Nathaniel Cooley, tinha uma coisa que sua “doce” amiga sabia fazer melhor do que qualquer pessoa: ser chata e implicante.


E naquele exato momento, á uma da tarde do dia 11 de agosto, sentada na lanchonete da universidade junto dele, Ethan e Aaron, era isso que ela estava praticando.


— Eu não acredito que você tá saindo com a Esther! Você sabe que eu detesto aquela garota, Nate! — Sheila ralhou.


Nate não se surpreendeu com a reação da morena, na verdade, estava sendo exatamente como previra quando resolveu contar aos amigos sobre Esther.


— Shae, você é a minha melhor amiga e eu te amo... — Nate começou. — Mas ultimamente eu ando pouco me fudendo para quem você gosta ou deixa de gostar. Já perdi as contas de quantas vezes nós — Apontou com o dedo indicador para si e depois para Ethan. — já terminamos ou deixamos de ficar com uma garota só porque você não gostava dela.


Aaron e Ethan observavam em silêncio, ao mesmo tempo em que seguravam a vontade de rir, o rosto alvo de Sheila ficar vermelho de raiva.


— Você fala como seu eu nunca tivesse feito o mesmo por vocês! — rebateu. — Esqueceu que eu larguei do Kevin por sua causa, Nate?


— Caramba! Vocês três são mais interdependentes do que eu pensei. — O comentário de Aaron rendeu-lhe um olhar fuzilante triplo, vindo de Nate, Ethan e Sheila.


Nate continuou:


— Por minha causa? Jura? Achei que tivesse sido porque você o flagrou com outra garota na festa de formatura. Que bom que você me escutou nas mil vezes que te falei que ele era um cafajeste! — ironizou, fazendo Sheila trincar os dentes de raiva.


— Foi por causa disso que você quebrou o nariz do Kevin? — Aaron cochichou para Ethan, que assentiu. — Você nunca me disse o motivo.


— Pensei que tivesse sido obvio. — Ethan sussurrou de volta. Pelo menos metade das pessoas presentes na festa tinha visto Sheila ser consolada por Nate enquanto Ethan partia para cima de Kevin.


— Não precisa me lembrar disso, ok? Mas você não pode me julgar, não agora que você está indo pelo mesmo caminho. — Sheila disse.


— Não estou te julgando, você sabe que eu jamais faria isso com você. E mesmo caminho? Como assim?


— Bem... A Esther não é flor que se cheire.


Nate indignou-se.


— Não é flor que se cheire? Só porque você não gosta dela?!


— Não!


— Então é por qual motivo?


— Pelo simples fato de ela não valer nada!


— Pelo o amor de Deus, Shae! Você só fala isso por falar, duvido muito que a Esther tenha feito algo para merecer ser chamada assim!


— Talvez ela tenha feito e você não saiba.


Nate estreitou os olhos. Tinha alguma coisa estranha no tom de voz de Sheila, era como se ela estivesse tentando lhe contar alguma coisa.


— Shae... Você sabe algo sobre a Esther que eu não sei?


Ethan e Aaron congelaram. Sheila lançou um olhar significativo para Ethan e usou todas suas forças para dizer:


— Não, eu não sei de nada. Só quero que você tome cuidado com ela, não quero te ver machucado.


Ethan quase conseguiu ouvir Sheila o amaldiçoando via pensamento. Por sua causa, ela estava tendo que mentir para Nate, o cara mais doce e confiável da face da terra.


Nate colocou sua mão sobre a de Sheila, que estava em cima da mesa, e entrelaçou seus dedos.


— Não se preocupe, eu sei me cuidar. — Sua voz estava bem mais suave do que segundos atrás.


— Oi pessoas! — Faith, que acabara de chegar, cumprimentou alegremente antes de dar um selinho em Aaron. Ela vestia uma blusa de manga comprida vermelha, calça jeans e sapatilha bege.


Ela arrastou uma cadeira de outra e mesa e se juntou aos amigos.


— Mudou o cabelo? — Nate perguntou. O cabelo de Faith, antes longo e pintado de roxo, estava azul escuro e cortado no estilo Joãozinho.


— Nãooo! Ela fez um transplante de cabeça, ô imbecil. — Ethan zombou.


Nate deu um tapa na nuca de Ethan enquanto os outros ocupantes da mesa davam crise de riso.


O clima tenso se esvaíra.


— Mudando o assunto completamente... — Ethan começou. — Quais são os planos para a sexta sagrada dessa semana?


— Desculpa pessoal, mas não vai dar. Eu e a Esther vamos ao Locke Bar essa sexta. — Nate disse.


— O que?! — Sheila indignou-se. — Você vai nos trocar por ela?!


— Para de drama, Shae! É só um dia! — Nate disse.


— Um dia o caramba! Essa manhã, a Nancy da minha aula de planejamento de marketing me disse que te viu no cinema na sexta passada.


— Primeiro lugar, eu estava lá sim, mas não com a Esther. Segundo, alguém já te disse que você tá insuportável hoje? O quê que tá acontecendo, Bela? Você não é assim. — Bela era a princesa da Disney favorita de Sheila quando criança, o que justificava o apelido.


Ninguém prestou atenção à segunda pergunta de Nate.


— Com quem você estava? — Ethan, Aaron, Faith e Sheila perguntaram em uníssono.


— Com a Juliet.


— Quem é Juliet? — Os quatro perguntaram juntos novamente.


— Parem de falar juntos, isso é bizarro! — Nate xingou. — Juliet é a prima da Esther.


— É aquela menina de cabelo preto e franja reta que estava com a Esther na fila do Corrach Mad? — Sheila indagou e Nate assentiu.


— Por que você saiu com ela? — Ethan perguntou.


Nate contou-lhes toda a história, desde a festa do Corrach Mad, dia em que conhecera Juliet, até a o dia anterior, quando foram ao cinema assistir O Curioso Caso de Benjamin Button. Inicialmente, seus amigos pensaram besteira, mas fez questão de corrigi-los, dizendo que foi algo completamente inocente, quase a mesma coisa de ter saído com Sheila ou Faith.


—... ela é gente boa, meiga, engraçada e adora vídeo game. Um dia eu vou apresenta-la a vocês.


— Wow! Ela me parecer ser ótima, por que não fica com ela ao invés da Esther? — Sheila sugeriu.


Nate fez um careta.


— Eu gosto da Esther e a Juliet é minha amiga agora.


— Amiga? Você a conhece há apenas onze dias, loirinho. — Faith disse.


— Mas já considero muito. Agora, se vocês me dão licença, eu tenho que ir para a aula.


Nate pegou sua mochila preta surrada que estava jogada ao lado de sua cadeira, jogou nos ombros e saiu apressado.


— A nossa conversa ainda não acabou, Nathaniel. — Sheila gritou.


— Acabou sim! — Nate gritou em resposta, já passando pela porta de vidro da lanchonete. — Vai cuidar da sua vida, Shae!


(...)


Skylar estava sentada na cadeira de rodinhas preta e com os dois pés descalços sobre a mesa de madeira de seu escritório, ao lado de uma caneca azul suja de café e um porta-retratos. Um cinzeiro de cristal estava sobre seu colo; na mão esquerda, segurava um cigarro entre os dedos e na direita, um dos vários dossiês sobre Oscar Doherty.


Surpreendeu-se ao ver que o tão famoso “Caso dos 20 Anos” não era nada mais do que uma investigação sobre um rico empresário (Doherty) suspeito de envolvimento com atividades ilícitas. Essas suspeitas tinham base em seu acelerado, repentino e até mesmo injustificável enriquecimento no final da década de 80 e inicio de 90. A empresa de Doherty, a R.D.E., nunca parou de crescer, apenas diminuiu o ritmo, o que não a impediu de entrar para a lista das maiores companhias da Irlanda em 2005.


Não que Skylar considerasse a matéria boba ou algo do tipo, muito pelo contrário, ela só não conseguia entender o porquê de ela ser tratada como um bicho de sete cabeças. Aquele tipo de artigo era o que mais tinha na Unsmaked, ela mesma havia feito uma dessas pouco tempo atrás. Se não fosse pelo alto valor pago por sua conclusão, Skylar teria deixado-a de lado para se dedicar a qualquer outra que considerasse mais importante ou interessante.


Deu mais uma tragada no cigarro, que estava quase no final, e continuou lendo o dossiê. Quando chegou à última página, encontrou um pequeno pedaço de papel rasgado irregularmente preso por um clipe.


Era um recado de Hugh.


Só para deixar claro, eu não quero que você escreva um artigo sobre as suspeitas contra Oscar, seu suspeito acúmulo de capital e blábláblá. Quero que você prove que elas são verdadeiras, faça o que nenhum detetive teve a capacidade de fazer. São para isso que servem os jornalistas, mais especificamente os nossos jornalistas.


PS: Você provavelmente está se perguntando como é que você vai fazer isso. A resposta é: se vira.


De duas, uma: ou Hugh estava brincando ou tinha enlouquecido a ponto de confundir o escritório da Unmasked com uma delegacia.


Como diabos ela conseguiria provar que Doherty era culpado se nem a polícia tinha conseguido?


Se vira.


Skylar sorriu de canto.


Arranjar provas de que Oscar Doherty era realmente culpado? Aquilo sim era interessante.


Recordações de sua infância inundaram sua mente, mais especificamente da época em que ficava sentada no tapete da sala com um livro de histórias infantis, do tipo que era cheio de gravuras, aberto entre as pernas esperando seu pai chegar do trabalho. Apenas som da porta se abrindo já era o bastante para deixá-la afoita e fazê-la largar o livro em qualquer canto e ir correndo abraçá-lo. Ele sempre sorria e a erguia no ar, acima de sua cabeça, e quando a colocava no chão perguntava como tinha sido seu dia, se brigara com Amethyst, se Sheila aprendera alguma nova palavra, se Sofia tinha lhe dado algum sermão...


Na mesa de jantar, quando a família inteira estava reunida, ele contava histórias — numa versão mais suavizada — sobre seu trabalho, sobre as pessoas excêntricas que entrevistava, as matérias malucas que fazia, os homens maus que queriam colocá-lo na cadeia por coisas estúpidas, que Skylar só viria a descobrir o significado anos depois, chamadas “desacato à autoridade” e “invasão de privacidade”. Sofia, assim como suas filhas, sempre ria de suas histórias, mas a preocupação sempre estava estampada em seus olhos azuis.


Michael gostava de dizer que o desafio de publicar coisas que ninguém quisesse que fossem publicadas era a melhor parte de ser um jornalista. Skylar seguia essa filosofia. Na verdade, foi por causa de Michael que decidiu se tornar jornalista. Ele foi e sempre seria sua inspiração.


Doía lembrar que ele estava morto há dezesseis anos.


Afastou aqueles pensamentos depressivos de sua mente, teria que se encontrar com Mark em pouco tempo e não queria aparentar tristeza. Pensando nisso, pegou seu celular modelo Nokia 1208 para conferir as horas e constatou que teria que sair naquele horário se não quisesse se atrasar.


Largou o cigarro no cinzeiro de cristal, tirando o mesmo do colo e pondo-o em cima da mesa, e jogou o celular dentro de sua bolsa vermelha, que estava no chão ao lado da cadeira de rodinhas. Calçou seus sapatos de salto, vestiu o sobretudo preto por cima do vestido azul marinho e deixou o escritório apressada.


(...)


— Como vão os preparativos para o casamento, Skylar?


— Vão bem, Bea. Está gostando da casa nova?


— Estou sim, a vizinhança é bem tranquila.


— Legal...


Tentando ignorar o silêncio constrangedor que se instalara graças à falta de assunto, Skylar começou a brincar de girar seu anel de noivado no dedo enquanto Bea fingia ler o cardápio. Quem visse a cena poderia facilmente deduzir que as duas mantinham a típica relação de ódio entre sogra e nora.


Bea e Skylar não se odiavam, mas também não se davam bem.


Quando Mark e Skylar começaram a namorar oficialmente, as duas tentaram se entender, mas o afeto que Bea sentia pela ex-namorada de Mark, Angelina, junto do fato de ela e Skylar não terem absolutamente nada em comum complicou tudo. Com o passar do tempo, ambas desistiram do ideal de boa relação e passaram apenas a se suportarem.


Skylar ficou tão aliviada quando olhou por cima do ombro e viu Mark voltando do banheiro que até se esqueceu da raiva que sentia por ele não ter a avisado que Bea almoçaria com eles.


Falaram sobre assuntos aleatórios, desde o casamento até o poodle de Bea. Tudo ia bem até o ponto que Mark mencionou que ele e Skylar ainda não decidiram se iriam morar em seu apartamento ou na casa de Skye.


— Escolham a casa. — Bea sugeriu. — Pelo que me contou, ela só precisa de uma reforma. Além do mais, o apartamento é muito pequeno.


— Pequeno? Para mim ele é do tamanho perfeito. — Skylar disse antes de bebericar a taça de vinho.


— Agora pode até ser, mas e quando vocês tiverem filhos? — Mark engasgou-se com a comida e Skylar ficou segurando a taça no ar.


Sem saber, Bea tocara em um assunto delicado.


— Algum problema? — Bea estreitou os olhos, sem entender a reação do filho e da nora.


O casal trocou olhares e silenciosamente decidiram que deveriam contar de uma vez, para evitar que Bea criasse expectativas futuras.


— Na verdade, mãe... Nós temos uma coisa para te contar. — Mark disse cautelosamente.


Skylar encheu a taça de vinho até a borda e bebeu tudo de uma vez, já prevendo que seria uma conversa difícil.


— Então contem. — Novamente, Bea não estava compreendendo o porquê de ele estar falando igual a um médico que anuncia a morte de um paciente à família.


— Nós não vamos ter filhos. — Mark anunciou.


Bea ficou em silêncio, refletindo sobre o que acabara de ouvir. Sua expressão facial, antes indecifrável para Mark e Skylar, transformou-se em penosa.


— Eu sinto muito por ter tocado no assunto, eu jamais imaginaria que você não pode ter filhos, Skylar. Mas isso não é o fim do mundo. Hoje em dia existem várias opções como adoção e barriga de aluguel.


— Mãe...


— Não tem nada de errado comigo! — Skylar, irritada, interrompeu Mark. — Nós podemos sim ter filhos, a questão é que nós não queremos.


Foi como se um balde de água fria tivesse sido jogado sobre a cabeça grisalha de Bea.


Eles não podiam estar falando sério, podiam?


Aquilo significava que ela não teria netos, já que seu outro filho, Joey, era gay e tinha deixado mais do que claro que ele e seu parceiro não pretendiam adotar uma criança. Imediatamente começou a pensar nas coisas maravilhosas que ouvia de suas amigas a respeito de seus netos, coisas que jamais vivenciaria. Ela nunca mais sentiria a presença infantil ao seu redor, não teria o divertimento de ver Mark se desdobrando para aprender a trocar uma frauda ou acalmar bebê escandaloso, não teria ninguém para mimar e nem para alegrar sua velhice.


“Isso tudo é culpa dessa mulher!” — pensou enquanto cravava as unhas carmesins na barra de seu vestido verde.


Bea podia afirmar com toda certeza do mundo que aquela palhaçada de não ter filhos tinha saído da cabeça de Skylar. Lembrava-se perfeitamente dos planos de Mark e Angelina. Suas carreiras, ele no jornalismo e ela na arquitetura, uma casa no subúrbio de Limerick, pelo menos uma viagem por ano, filhos...


Skylar matara tudo aquilo.


— Eu não acredito que vai fazer isso comigo, Mark! — Bea bateu com as duas mãos com força na mesa. O impacto fez com que os talheres fizessem um barulho metálico contra os pratos.


Diferente de Mark, Skylar não se assustou com a reação dramática da sogra.


— Bea, essa é a nossa decisão e, quer você concorde ou não, deve ser respeitada. — disse firmemente.


— Quem é você para cobrar respeito?! Você não teve respeito nenhum ao se envolver com um homem comprometido!


— Preste atenção nas coisas que está falando, mãe! A Skye não...


— Quem tem que prestar atenção aqui é você! — interrompeu-o gritando, o que chamou a atenção de clientes e funcionários do restaurante. — Como você pôde ser tão burro a ponto de trocar uma moça integra como Angelina por essazinha aí! — Apontou para Skye.


A reserva de autocontrole de Skylar se esgotou no momento que Bea estendeu seu dedo indicador para ela. A O’Flahertie deu um tapa na mão da sogra e se levantou bruscamente.


— Ninguém, absolutamente ninguém, aponta o dedo para mim! Se você eu não amasse tanto o seu filho, eu já teria estragado todas as tentativas do cirurgião plástico de concertar essa sua cara estragada! — Deixou o restaurante pisando duro e sem olhar para trás.


— Você escutou o que ela me disse? — Bea dramatizou.


— Por que você não entende? — A voz de Mark misturava raiva e decepção.


Ele tirou a carteira do bolso de sua jaqueta preta, deixou certa quantia de dinheiro em cima da mesa e levantou-se para ir atrás de Skylar. Nem os chamados de Bea o fizeram parar.


Ao alcançá-la, um quarteirão depois, ele puxou-a pelo braço e envolveu-a num abraço. Ela enterrou a cabeça em seu peito.


— Pensei que não viria atrás de mim depois de eu ter chamado sua mãe de feia. — Sua voz saiu abafada.


— Eu viria atrás de você mesmo se tivesse ateado fogo no meu apartamento. De novo.


Ela colocou uma das mãos em seu rosto e o beijou brevemente.


— Por que você gosta tanto de mim? Eu sou uma bagunça.


Mark sorriu e acariciou a bochecha de Skylar com as costas da mão.


— Eu não sei por que. Talvez seja por você dizer tudo e qualquer coisa que venha a sua cabeça, pelas confusões desnecessárias que arruma, por palavras como tédio e rotina se tornarem desconhecidas na sua presença, por eu nunca saber se você vai me beijar ou gritar comigo... A única coisa que sei com certeza é que eu te amo, Skye. Qualquer coisa além disso não passa de um mero detalhe.


Dizer “eu também te amo” nem passou pela cabeça de Skylar. Era insuficiente.


Uma mulher com as costas e um dos braços fechado até o pulso por tatuagens, mal-encarada, extremamente magra e que sempre estava na companhia de um cigarro ou bebida alcoólica. Essa era Skye. Quem a visse jamais imaginaria o quão próxima das palavras ela era.


Elas eram seu sustento, oras! Como não ser próxima e amá-las?


Mesmo assim ela não sabia usá-las para demonstrar seus sentimentos, pelo menos não completamente. Sabia ser irônica, relatar fatos, escrever crônicas e espalhar notícias, mas não emoções. Entretanto, isso não significava que não conseguia transmiti-las de alguma forma.


Nenhum discurso a lá Nicholas Sparks significaria para Mark tanto quanto o sorriso que brotou na face de Skylar.


(...)


— Desembucha, Tesy. O quê que tá acontecendo? — Brittany percebia muito bem quando tinha algo incomodando Esther.


A Mitchell parou de passar o lápis de olho e desviou o olhar do espelho para a amiga, que estava de braços cruzados e estampando uma carranca.


Mesmo de cara feia Brittany era linda.


Seus cabelos dourados e lisos estavam presos em um rabo alto, deixando as argolas de ouro em suas orelhas à mostra; o batom cereja que acabara de passar se destacava na pele alva, a blusa branca plissada harmonizava com sua calça jeans e a sandália de salto alto amarela com tiras pretas. Ela parecia uma modelo, principalmente se comparada com a garota de óculos, coque alto, moletom rosa, calça jeans e vans preto.


Esther amava Brittany, ela era sua amiga de infância e era horrível sequer imaginar a vida sem ela, mas às vezes a sensação de ser ofuscada a importunava. Essa sensação começou a incomoda-la após o baile de formatura do colegial, quando Brittany deu uns amassos com Ethan Harvey na cabine de fotos.


Nem era preciso dizer como que a festa inteira descobriu...


Esther saiu da festa e passou o resto da noite, que deveria ser uma das melhores de sua vida, sentada na calçada chorando. No dia seguinte, Brittany foi até sua casa e implorou pelo seu perdão, alegando que estava muito bêbada e não teve consciência da besteira que estava fazendo.


Mesmo magoada e se sentindo traída, Esther desculpou a amiga. Afinal, por mais que fosse loucamente apaixonada por Ethan, eles não tinham e nunca tiveram nada. Ela não podia culpar Brittany por ficar com um cara solteiro.


Ethan ter escolhido Brittany ao invés dela, que fazia de tudo para chamar-lhe a atenção, levantou uma questão: o quão grande era o abismo da diferença entre ela e Brittany? Será que era o mesmo que separava uma vespa de uma borboleta?


— Não tem nada de errado comigo, Britty.


— Não minta para mim, eu sei quando você está nervosa. Por Deus, Tesy! Por que você não me conta?


Quando Brittany Stella Barnes cismava com algo, ninguém conseguia fazer sua cabeça.


— A Juliet saiu com o Nate sexta-feira à noite. — Esther contou amarga.


— O quê?!— A voz de Brittany saiu alta e aguda, atraindo o olhar de uma morena que também estava no banheiro da universidade. — Como assim?!


Esther crispou os lábios e voltou a passar o lápis enquanto falava:


— Não precisa se exaltar, não foi nada de mais. Nate me contou que eles apenas viram um filme, comeram besteira em uma lanchonete qualquer e depois voltaram para casa. — Guardou o lápis em seu nécessaire azul com bolinhas brancas que também estava em cima da pia.


Brittany cerrou os olhos.


— Você tem certeza de que não foi nada de mais?


— Eu confio no Nate. — Enfiou o nécessaire dentro mochila.


— Se confia tanto assim nele por que está tão incomodada?


— Eu confio no Nate. — repetiu. — Mas não na Juliet.


(...)


— Shae, eu sei que você se preocupa com o Nate, mas isso já passa dos limites.


— Eu não confio nela, Ethan.


— Eu também não, mas nem por isso eu quero espionar o encontro deles!


— Será que dá pra falar mais baixo? Já me chamam de vadia, não quero pegar fama de stalker também.


Ethan e Sheila discutiam no movimentado corredor principal do departamento de Ciências Sociais, onde ocorriam as aulas de Ethan. Por mais que tentassem disfarçar e manter a voz baixa, em alguns momentos ficava claro que estavam brigando e isso atraia atenção indesejada.


— Você esta agindo como uma stalker! Me diz, qual a finalidade de segui-los no Locke Bar?


— Eu tenho vários motivos, o principal deles é saber se ela vai falar alguma coisa sobre você!


Ethan demorou um pouco para entender que ela estava se referindo ao que aconteceu na festa de Aaron.


— Por que ela contaria? É um tiro no pé.


— Pense comigo, amorzinho... Também seria um tiro no pé se você falasse a verdade para o Nate, mas isso não te impediu de querer contar. E se ela tiver a mesma mentalidade?


Ethan piscou duas vezes, não tinha pensado naquilo.


— Eu vou falar com ela.


— Vai mesmo? — perguntou desconfiada.


— Vou. — respondeu com firmeza e desgosto. A ideia de ir atrás de Esther não lhe era nem um pouco agradável. — Isso significa que você não precisa ir ao Locke Bar.


Um homem de cabeça raspada, suado e corpulento, vestindo o uniforme roxo do Dullahans esbarrou de forma proposital e agressiva em Sheila enquanto passava. Ela só não caiu no chão porque Ethan a segurou.


— Vê por onde anda, animal! — Ethan berrou furioso, ainda com Sheila em seus braços.


Todos que passavam por lá escutaram, incluindo o homem.


Ele se virou, cerrou os punhos e fez menção de ir até Ethan, mas foi impedido por um cara de cabelos castanhos, também com o uniforme, tão alto e musculoso quanto ele. Os dois trocaram algumas palavras, não tirando os olhos fuzilantes de Ethan, e continuaram seu caminho.


Em alguns segundos o clima tenso se esvaiu e tudo voltou ao normal. Os estudantes que tinham parado tudo para ver o quase conflito voltaram aos seus afazeres.Comentários, bons e ruins, sobre a ousadia de Ethan eram proferidos, mas não se conseguia identificar os autores, graças ao número de pessoas no corredor.


Ethan e Sheila desfizeram o abraço.


— Você tá bem? — Ela assentiu.


— Ele podia ter te machucado. — Sheila disse com a voz vacilando. Ela ficou tão preocupada que até parou de respirar quando o homem se virou com a intenção de ir para cima de Ethan.


— Num corredor lotado? — Riu. — Acho que não.


Ethan era superprotetor em relação à Sheila, se alguém quisesse deixa-lo puto de verdade era apenas mexer com ela. O ex-namorado de Sheila, Kevin Sheedy, por exemplo, provara de sua ira no baile de formatura do colegial. Quando Sheila apareceu chorando por causa do namorado traíra, Ethan não hesitou em largar Brittany para ir atrás de Kevin.Encher sua cara de socos foi tão gratificante que Ethan sequer sentiu suas mãos doerem, ele poderia ter continuado a noite toda se não tivesse sido tirado de cima dele. Transar com a rainha do baile no estacionamento custara a Kevin seu nariz,maxilar,três dentes da frente e o ego.


— Aposto que foi por causa da mão do Logan. — Sheila comentou desanimada, mas logo um sorriso maldoso apareceu em sua face. — Fico feliz de você ter comido a namorada daquele babaca mais vezes do que ele possa contar.


O brutamontes de uniforme roxo e cabeça raspado que esbarrara em Sheila não era ninguém mais, ninguém menos que Darragh O’Hale.


— Eu também. — O sorriso malicioso também se manifestava em Ethan. — Estou pensando em ligar para ela hoje à noite.


(...)


Lá estava ela, correndo de um lado para o outro para conseguir dar conta dos pedidos. Ora com um bloquinho de papel e caneta em mãos, ora com uma bandeja. Parecia não ter tempo nem para respirar. Vestia o uniforme do Reagan’s e seus cabelos estavam presos em uma trança lateral. Não havia nada em seu rosto além de lápis de olho preto delineando seus olhos castanho-alaranjados e uma expressão de pura impaciência. Ela provavelmente não via a hora de seu turno acabar.


— Ela é gostosinha, mas ainda prefiro a Eileen. — A figura de cabelos negros no estilo topete e camisa polo vermelha pareceu ter brotado do nada.


Ray fingiu não ouvir o comentário idiota de Connor. Quem sabe se ele ficasse quieto e sem fazer movimentos bruscos o parasita iria embora?


— Por falar em gostosa, o que acha de contratar stripers pra despedida de solteiro do Scott? Eu sei combinamos de fazer uma madrugada de pôquer com os amigos e tal... Mas não custa nada deixar isso mais interessante não? Convenhamos, meu primo merece se divertir com mais algumas mulheres antes de se algemar para sempre com aquela...


Não. Ele definitivamente não era obrigado a ficar escutando aquilo.


Sheila tinha acabado de servir uma mesa e estava fazendo seu caminho para a cozinha com a bandeja debaixo do braço. Ray aproveitou a deixa para ir atrás dela e deixar Connor falando sozinho.


— Sheila! — chamou.


Ela parou de andar e ficou olhando ao redor, a procura de quem tinha a chamado. Quando pôs os olhos em Ray, ela sorriu e foi até ele.


— Oi! — saudou animada, completamente diferente de quando estava trabalhando. — Foi você quem me chamou? — Ray assentiu.


— Tem um minuto? Preciso falar com você.


— Meu turno acaba em quinze minutos, se importa de esperar? Estou meio ocupada agora.


— É claro que não. Te espero lá fora, ok? — Ela assentiu com um sorriso.


E assim ele fez. Ficou de pé do lado de fora do restaurante, para não correr o risco de encontrar Connor de novo e ouvir suas reclamações sobre ter sido deixado no vácuo, não por quinze minutos, mas por meia hora.


O que ele não fazia por Mia?


— Desculpe a demora. — Ray deu de ombros. — Sobre o quê queria falar?


O uniforme do Reagan’s fora substituído por calça jeans, all star cinza e um casaco azul com bolsos por cima de uma blusa cinza. Com uma das mãos segurava a única alça da mochila roxa que estava em seu ombro.


— Preciso de um favor seu... — Ele contou sobre situação do vestido e a promessa que vez a Mia. — Eu sei que nem podia estar pedindo isso a você, já que mal nos conhecemos, mas você pode ir à loja com Mia?


Sheila ponderou por tempo antes de dar sua resposta:


— Eu vou, mas com uma condição...



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Autor(a): Lilie

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Capítulo 9- Ajuda. Sexta-feira, 8 de Agosto de 1997. Só se dá real valor às pessoas depois de perdê—las. Era irônico pensar que aquela frase tão clichê e que Skylar julgava típica de adolescente com dor de cotovelo realmente fizesse sentido. Skylar levou o cantil de ferro à boca e sen ...


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