O almoço se estendeu por toda tarde e já estava anoitecendo quando o casal se despediu dos anfitriões. Como na maioria das vezes em que eles iam para algum evento festivo, Fátima voltou dirigindo, pois William havia bebido um pouco. Durante o percurso eles ouviram um cd Roupa Nova e quase não conversaram. Quando já estavam chegando em casa William resolveu quebrar o silêncio, que para ele, incomodava mais que qualquer barulho.
-Fá, eu não quero discutir nem nada disso, mas a gente tem que conversar sobre o que aconteceu ontem à noite.
-Uhum. -respondeu ela num murmúrio.
-"Uhum" significa: sim, temos que conversar e iremos. Ou temos que conversar, mas eu não quero?
-Combinamos de não ficarmos guardando mágoas e problemas. Eu concordo que temos que conversar. -diz enquanto estacionava o carro na garagem de casa.
-Eu não quero brigar.
-Eu também não, William. A última coisa que eu quero hoje é ter uma discussão com você.
-Eu pensei no que aconteceu ontem à noite e você tem razão. Eu agi como um adolescente birrento. Mas é que eu não consegui te ver toda sorridente para o Nascimento.
-Toda sorri...
-Calma, deixa eu terminar, por favor. - interrompe ela. - Eu sei que você estava conversando normalmente com um amigo, mas naquele momento, eu não sei o que me deu.
-E o que vamos fazer? Sim, porque eu não posso, toda vez que estiver conversando com um amigo, ficar preocupada se você vai ter ou não um ataque de ciúmes. William, você sabe que nem de longe eu acho esse ciúme bobo saudável para uma relação. Eu não sou daquelas mulheres que adoram quando o homem demonstra ter ciúme porque assim se sentem amadas.
-Eu sei, Fátima. E eu não posso te prometer que isso nunca mais vai acontecer porque sou humano e eu erro. Mas eu posso te pedir para ter paciência e dizer que eu vou dar o meu melhor para corrigir isso. Não quero te decepcionar mais. - diz olhando nos olhos dela.
-Acho que isso já é um avanço. Mas, sinceramente, não entendo o porque dessa sua insegurança. Meu bem, eu te amo. Você é o meu homem! O homem que eu escolhi para estar ao meu lado, o homem que eu escolhi para ser o pai dos meus filhos, aquele em quem eu vou dormir e acordo pensando, o homem que ao mesmo tempo é meu porto seguro mas sabe me tirar o fôlego...Sabe, eu acho que eu não mereço passar por essas situações. Nosso casamento não merece...
-Nossa, você me faz me sentir a pior pessoa do mundo falando assim. E eu sei que eu mereço ouvir isso...
-Não é que você merece ouvir isso, William. A questão é que se a gente não deixar isso bem claro agora, talvez lá na frente tenhamos problemas.
-Você tem razão. Me desculpa.
-Eu já te desculpei. Só pensa nisso, ok?
-Tudo bem.
-Então tá... - diz ela abrindo a porta.
-Fá, posso te fazer uma última pergunta?
-Diz.
-Numa escala de 1 à 10, o quanto você ainda está chateada comigo?
-Huuum...Digamos que...4?
-4? Hum, é...Eu mereço um 4.
Os dois saíram do carro e entraram em casa. A noite prosseguiu normalmente e antes das 22h eles já estavam na cama. Fátima estava deitada de lado e com as costas viradas para William que fitava o teto. Ele sentia uma vontade enorme de a abraçar e sentir o calor do corpo dela e por isso resolveu colocar a mão em seu quadril. Com movimentos leves ele fazia carinho na perna dela que logo retirou a mão dele. William sabia o que aquilo significava: 4!
Mas não demorou muito Fátima procurou a mão de William e colocou novamente em sua perna. Ele sentiu uma alegria enorme o invadir e aproveitou para aninha-la junto ao seu peito. Se ela, que não gostava de dormir de conchinha, estava "propondo" aquilo...Já estava tudo bem!
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-E então, lembrou? - disse Fátima.
-Vagamente. - responde William rindo.
-Sei...
-Mas a senhora fala assim...Até parece que nunca fez cara feia com ciúmes de mim.
-Eu? Nunca!
-Nunca? Que abusada! E a Lívia?
-O quê...Ela não conta. -diz Fátima rindo.
-Por que? - provoca ele.
-Você sabe o porque! - diz jogando uma almofada nele.
-Só porque a gente tem muito assunto do passado? -finge se proteger de mais um travesseiro.
-Muito assunto do passado? Você fica insuportável quando a encontra. Parece que não existe ninguém mais no mundo. É Livinha pra lá, Livinha pra cá. Livinha, você lembra de quando aconteceu isso? William, você lembra quando nós aquilo? -diz fazendo uma voz enjoada.
-Engraçado, eu conhecia isso como ciúmes. - diz William rindo.
-Sem contar que eu tenho certeza que ela guarda um amor reprimido por você.
-Ah, isso quer dizer que não pode existir uma amizade entre homem e mulher? -provoca ele.
-Claro que pode.
-Você está se contradizendo, Fátima Bernardes? -diz ele chegando mais perto dela na cama.
-Não é isso. Eu só quero dizer que acho estranho o jeito que ela te trata. Até imagino o quarto dela cheio de fotos suas.
-Olha, eu já entrei no quarto dela e posso dizer que não vi nenhuma foto minha.
-Ah, já entrou no quarto dela...-diz fitando William.
-Fá, que cheiro é esse? - diz cheirando o pescoço dela.
-Cheiro? Deve ser do creme porque eu nem passei perfume.
-Não, eu acho que é...Huum...É cheiro de ciúmes. - diz caindo na risada.
-Bobo!
-Sou mesmo, bobo por você! -diz fazendo carinho no rosto dela enquanto a olhava no fundo dos olhos.
-Incrível como amadurecemos com nosso casamento, não é? Como hoje podemos rir dessas situações que nem de longe ameaçam nossa felicidade, nosso amor, nossa família. - diz correspondendo ao carinho.
-É verdade. Até porque a Livinha agora mora em Portugal...-diz pirraçando.
-William...- diz dando um tapinha leve no braço dele.
-Eu estou brincando. -diz derrubando-a na cama. Quem poderia pensar em qualquer outra mulher do mundo quando se tem a mais bela, a mais gentil, a mais graciosa, a mais carinhosa...
-Mas já acabaram minhas qualidades?
-Meu amor, eu poderia passar a noite toda falando sobre como você é maravilhosa. Mas é que eu acho...- diz dando um selinho nela. -...Que a gente pode aproveitar melhor esse tempo, não é?
-Claro...
-Que bom que concordamos. - diz ele rindo.
-Dormindo, por exemplo? - diz ela brincando.
-Não era bem nisso que eu estava pensando.
-E no que o senhor estava pensando?
-Bom, envolvia duas pessoas, duas bocas...Está me entendendo?
-Acho que sim. -diz ela entrelaçando os dedos no cabelo dele.
William a beijou e os dois curtiram aquele momento como dois namorados. Antes de dormir conversaram sobre várias coisas que tinham acontecido no dia e foram dormir com a certeza de que mesmo com os problemas, que todo casal enfrenta, o amor que os unia era verdadeiro e iria sempre prosperar.