Ignorando a pergunta óbvia – por que alguém teria de acreditar naquilo? –, Alfonso fez outra mais
interessante:
– Por que não?
Franzindo a testa, Anahí gesticulou para ele – o rosto, os ombros, o smoking –, e então olhou
para si.
– Nós não somos o que eu chamaria de almas gêmeas.
– Somos um casal formado durante um leilão, Anahí . E isso é tudo o que importa.
– Não, não é – resmungou ela, aqueles olhos tão expressivos se desviando outra vez, como se
houvesse algo que ainda não estivesse disposta a contar.
– O que exatamente a está preocupando?
– Qualquer um que nos conhecesse pensaria que sou sua secretária.
Ele bufou diante da ideia de ter uma secretária. O quê? Para cuidar das suas… consultas às
clientes?
Anahí o ignorou.
– Ou sua dentista. Não sua namorada.
Namorada? Ele nunca tivera uma. Nunca.
Aquele leilão fora tão só para um encontro de uma noite; apenas isso. O que era o máximo
para Alfonso no que dizia respeito à sua vida pessoal, de qualquer modo. Ou, pelo menos, fora assim
nos últimos anos, desde que ele dera as costas para o pai, suas propriedades e seus planos para o
futuro do filho – incluindo um casamento adequado –, e pegou a estrada, determinado a
encontrar a mãe e a outra versão da própria história.
No entanto, Alfonso não discutiu, ainda desejando compreender o que Anahí estava tentando
dizer.
– Ou pode achar que sou seu mecânico. Que não dá a mínima para o que as pessoas pensam.
Com isso, ela deu uma risada suave, soando genuinamente alegre, e Alfonso não conseguiu evitar
ecoar aquele riso.
– É, isso mesmo. Remington Steele vindo arrumar minha minivan. É isso, sem dúvida, o que as
pessoas vão enxergar.
Uma minivan… horrenda.
– Quem é Remington Steele?
– Um personagem de uma série de TV antiga, Jogo duplo. Era o programa favorito da minha
mãe quando eu era criança. – Anahí franziu a testa em concentração. – Espere, Pierce Brosnan é
irlandês, certo?
– Ah, esse programa – respondeu ele. – Sim, é.
Soando triunfante, ela disse:
– E ele já foi James Bond no cinema também! Então não passei tão longe.
Alfonso assentiu.
– Mas Connery ainda é o melhor.
Ela revirou os olhos.
– Seria fácil conquistar minha mãe – sussurrou Anahí para si mesma. – Ela não iria questionar
os detalhes uma vez que visse seu rosto ou ouvisse essa voz.
– Estamos nos aproximando do assunto em questão agora?
Anahí balançou a cabeça, percebendo que falara alto o suficiente para ser ouvida.
– Não. Na verdade não. Ainda é uma ideia louca, e nunca iria funcionar. Ninguém que nos
visse juntos acreditaria no que eu gostaria de passar, considerando o modo como estou
conversando com você.
– Comigo?
– Com ele – disse ela, o rosto corando outra vez. – Desculpe. Céus, não consigo acreditar que
gastei todo aquele dinheiro. Pelo menos posso deduzi-lo no imposto de renda. – Mordendo o lábio,
completou: – Pelo menos espero que sim.
– Eu bem que gostaria de saber sobre o que diabos você está falando.
– Ora, você não apenas nunca se encaixaria no meu universo como qualquer um que olhasse
para nós perceberia que não temos absolutamente nada a ver. Não temos interesses em comum,
nenhuma conexão emocional. – Anahí engoliu em seco, isso foi visível. – Zero química.
Nesse ponto ela estava enganada. Muito enganada. Alfonso sabia, por instinto, que ficaria
repassando mentalmente a conversa casual dos dois até muito tempo depois que se separassem.
E que ele se lembraria do eco daquela risada alegre e desinibida enquanto estivesse tentando
dormir.
Eles tinham química, sim. Tanta que Alfonso era capaz de senti-la pulsando entre os corpos, como
fogos de artifício coloridíssimos, reluzindo em explosões vermelhas e douradas de luz e calor.
Quando ele não estava tentando fazer o máximo esforço para compreender o que ela dizia, viase
se obrigando a não agarrá-la e beijá-la para lhe arrancar a tagarelice afetada dos lábios.
– Anahí – murmurou ele erguendo uma das mãos, de modo que pudesse tocar uma mecha
daquele cabelo dourado –, nós definitivamente temos química. Desconfio que seríamos capazes
de causar uma explosão sem nem mesmo nos aproximarmos de um laboratório químico.
Alfonso não experimentou muitas explosões na vida. Satisfação física? Ah, de vez em quando,
lógico. Mas fazia anos que não conhecia uma mulher que desejava ter por perto por um motivo
diferente que fosse o de obter o prazer que ambos obteriam da conexão física. E muito menos
uma que não fazia ideia de com quem estava lidando.
E Anahí , sem dúvida, não fazia a menor ideia. Alfonso sabia disso com a mesma segurança com
que conhecia a própria história recente.
– Você ainda está provocando…
– Não, não estou, Anahí . Você sente também. Admita.
O atrito que saía e reverberava de volta ao corpo dela ressaltava a alegação dele e não lhe
dava chance de negar aquilo. Os dois se achavam próximos o suficiente para compartilhar o
mesmo ar que respiravam, para sentir o leve roçar das roupas enquanto os corpos se
encostavam, enviando tensão e consciência à estratosfera.
Pela primeira vez desde que chegara ali essa noite, Alfonso começava a se perguntar se iria
continuar dentro daquele prédio até o nascer do sol. Eles estavam em um belo hotel. Nos andares
de cima havia centenas de quartos aguardando para serem ocupados por amantes famintos por
uma noite quente de verão em um abraço tépido e carnal.
O que Anahí diria se ele fizesse tal sugestão? Será que Alfonso a assustaria, ou finalmente
trespassaria aquela muralha de conversa autodepreciativa que ela ostentaria para mantê-lo
afastado?
– Eu sinto – admitiu Anahí , por fim, abandonando todo o fingimento.
E não falou mais nada; simplesmente ficou observando-o, atenta, para descobrir o que estava
acontecendo ali.
Sim, porque alguma coisa acontecia ali, isso com certeza.
Os lábios de Anahí estremeceram, e a pulsação dela vibrava rápido na garganta. Ávido para
sentir o sabor dela, por uma provinha daquela pele macia, Alfonso deu um beijo, apenas um
beijinho breve, naqueles lábios rosados.
– Doce Anahí … – murmurou Alfonso antes de eliminar a distância entre os dois e cobrir os lábios
dela com os seus.
Ele não a pressionou por mais, não exigiu adentrar a boca delicada. Em vez disso, apenas a
provou, compartilhou um pouco do hálito, inalou a fragrância que flutuava do cabelo dela…
pêssego, com o perfume suave da pele macia como toque final. Então obrigou-se a interromper
o beijo e se afastou, dando um único passo para trás.