Fanfic: Coração de Ágata | Tema: Segredos

  Estava Camila, um dia, dobrando a esquina para voltar á sua casa. Vinha da feira, e trazia nos braços uma cesta repleta de frutas e legumes. De repente, talvez por descuido, ou por mero destino, esbarrou em Renato, seu antigo namorado. Ele a reconheceu imediatamente, ela demorou mais.

  - Camila? - e, como para que concordar consigo mesmo. - Camila! É você sim!

  Ela entortou as sobrancelhas com cara de dúvida, mas logo abriu-a numa feição iluminada.

  - Renato!

  Seria demasiado longo contar como foi todo o reencontro. O rapaz nunca a esqueceu. Sabia que, um dia, ela voltaria para o seio da família. Só estava esperando esse momento para conquistá-la novamente.

  Renato foi seu primeiro namorado. Uma relação sólida e recíproca. Mas tudo isso acabou pouco antes da partida dela para Recife. Ela contou-lhe que era melhor acabar tudo logo, pois iria demorar na capital, e não podia jurar que lhe seria fiel, tentada pelos homens que encontrasse lá. Foi, para o pobre, o último dia de sol. Dali por diante, ele viveu sempre com o coração partido, numa eterna escuridão.

  Agora, tudo era recobrado ali: a vida, a alegria, a motivação. É claro que a moça desconversou, deixando bem claro que o tempo que passara fora não ajudou a nutrir o amor. Pelo contrário, agora havia DorsoTorto em seu lugar. Mas, só de saber que ela voltara, que estava ali, por perto, ele já se sentia outro. Sabia que podia tentar ficar com ela, e essa mottivação era o que lhe movia.

  Certa vez, como de tempos em tempos acontecia, dois violeiros corajosos toparam uma disputa musical no palanque da pracnha. O povo entrava em delírio. Era sempre de noite, todos reunidos em volta, que eles começavam a batalha de versos, para ver quem se saía melhor.

  Naquelas ocasiões, os homens costumavam assistir á peleja do bar, entornando copos de cerveja, numa agitação festiva. Daquela vez, não foi diferente. Zé Finório saiu para a rua muito cedo, a fim de pegar tudo desde o início.

  As cordas das violas, quando muitos já estavam lá, começaram a soar. Aplausos. Assobios. Quase á meia noite, ambos empatados, Finório caiu da cadeira, completamente bêbado. Nunca mais tinha se embriagado tanto. Foi preciso que Renato mais outros dois homens o levassem "rebocado" para sua cama.

  Camila, corada de vergonha, despiu o pai da cintura para cima e o lavou com um pano úmido. Ainda tirou-lhe os sapatos e deixou-o refrescado com o ventilador, para que, no dia seguinte, não acordasse com tanta ressaca.

  Ela levou o casaco para o tanque, na intenção de deixá-lo de molho, tamanha sua imundície. Mas uma coisa a fez parar. No bolso interno, bem dobrado, estava o papel que caíra na carteira, no dia em que ela voltou, e que ele não a deixou ler.

  A curiosidade é mesmo um diabo. Não deixa ninguém sossegado até ser saciada. E assim aconteceu com a moça. Abriu o documento ás pressas, o coração pulando dentro do peito. Ao ler, fez expressão de quem preferia ter não lido.

  Caiu ali mesmo, aos pés do tanque, a vista escurecida, as pernas bambas. E num sussuro, disse para si mesma:

  - Papai tem outro filho?! Um bastardo!

  Tratava-se disso mesmo. Aquela famigerada folha era uma certidão de nascimento.