Fanfic: Coração de Ágata | Tema: Segredos
Renato estava ali, sempre aos pés de Camila, para o que ela precisasse. E foi a ele, amigo tão fiel, que ela recorreu naquele momento. Chamou-o para uma conversa particular e sigilosa. Ele foi, todo contente, pensando se tratar de algo relacionado ao antigo namoro dos dois. Mas quando descobriu que havia um bastardo de Zé Finório, fez cara muito séria e se comprometeu a ajudar a amiga no que fosse preciso.
Seria tudo muito fácil. Ele era filho do prefeito, Juca Pereira, e podia muito bem procurar nos arquivos da prefeitura a identidade da mulher que constava na certidão de nascimento como mãe do adulterino. Sim, pois, de acordo com a data no documento, a criança nasceu quando Finório já era casado.
Encontrada a ficha da mulher, Laurinda, os dois foram ter com ela no endereço que lhe correspondia. Bateram á porta. Uma senhora, já bem envelhecida e caquética, com a marca dos anos exposta no rosto, abriu a porta. Vinha num vestido azul, coberto por um avental limpo, apoiada numa bengalinha. Não reconhecendo as pessoas, perguntou:
- O que desejam?
- A senhora não sabe quem somos nós, mas nós sabemos muito bem quem é a senhora, e o que fez. - Camila se adiantou.
A pobre arregalou os olhos, que ficaram do tamanho de uma pitanga graúda.
- É isso mesmo. - a moça continuou, irredutível. - Adultério!
Ela, que com essas palavras esperava receber algum desaforo em troca, com muito espanto viu que a velha disse apenas um pacato "entrem". Lá dentro, explicou tudo:
- Eu sei quem você deve ser... A filha de José Lourenço, não é? Ou José Finório, como todo mundo chama, isso não importa. Agora o moço, eu não sei quem é. Bom... Quando eu me envolvi com seu pai, menina, você ainda não tinha nascido. Na verdade, eu nem sabia que ele era casado!
- Mas, então... Como?
- Eu vim morar com a minha madrinha, que na época estava adoentada, e acabei me apaixonando. Claro que ele não me contou que tinha família. Me enganou, mesmo. Depois de um certo tempo, engravidei, e fui dar a notícia para á, cheia de alegria. O que o homem fez? Nem me deixou pôr os pés dentro da casa. Chamou a mulher e disse: "Veio uma mendiga pedir esmolas!".
- Meu pai fez isso mesmo?
- Se não fez! Quando eu vi a mulher que vinha lá da cozinha me por umas moedas na mão, pensei que seria melhor estar morta do que passar por aquele momento.
- Por que a senhora não fez nada, nunca?
- Eu sempre quis, mas ele ameaçou me matar caso contasse algo. E faria mesmo, não tenha dúvidas. A última vez que me visitou, foi quando veio pegar a criança, que tinha acabado a desmama, e cruzou a porta com ela para nunca mais voltar.
- Para onde ele a levou?
- Na época eu não sabia. Só depois de muito tempo descobri tudo. Começou a correr a história de um aleijado que apareceu no cemitério. Eu logo matei a charada: era o meu menino, só podia ser. Ele tinha um defeito na coluna. Na certa, José o soltou lá para que moresse, mas de alguma forma ele sobreviveu, e sobrevive até hoje.
Aquilo foi, para Camila, como mil baldes de água fria atirados de uma só vez. Um baque. Talvez o maior de toda a sua vida. O sangue estagnou nas veias. O rosto logo empalideceu, ficando como o de um fantasma.
- Eu vi Zé pela última vez no próprio cemitério. Era o enterro da minha madrinha, que não tinha resistido. Saí para refrescar um pouco as ideias, e acabei encontrando o meu DorsoTorto (que era como todos tinham chamado). Ia conversar com ele, mas o Padre Haniel foi mais rápido. Fiquei atrás de uma árvore, só espiando. O homem o benzeu, começou a fazer algumas orações... De repente, Finório pareceu por trás dele e o enforcou com as próprias mãos, até cair duro no chão. Dali saiu gritando que a culpa toda era do coitado do meu filho.
Camila tentou falar, mas a voz não chegou.
- Era o que ele queria. Culpar DorsoTorto, fazendo com que ninguém se compadecesse de ajudá-lo, para que não descobrirem nada. E conseguiu.
- Meu pai... Meu pai foi capaz de tudo isso?
- Adultério, ameaça de morte, assassinato á sangue frio, abandono de menor... - Renato começou a enumerar, mas a moça fez gesto para que ele se calasse.
- O que eu faço agora da minha vida, Deus do céu?
A velha tentou consolá-la:
- Sempre há um caminho, minha querida, sempre. O que eu encontrei foi o seguinte: destruí a certidão de nascimento, e solicitei o pedido de uma nova cópia. Assim, quando imprimissem pelo fax da prefeitura, iriam descobrir o segredo do Lourenço, mas não sei o que deu errado.
O jovem bateu na testa:
- Mas é claro! Um dia meu pai reclamou que o fax estava quebrado! Só pode te sido isso. Finório deu jeito de fazer a máquina dar um prego, para que todos os documentos daquele dia fossem passados nos correios. Depois se ofereceu para ir lá buscá-los. Quando a cópia da certidão foi imprimida, ele guardou para si!
Estava tudo batendo perfeitamente. Finório era o manda-chuva de Tambirema. Se havia o requerimento de uma cópia de documento com seu nome, obviamente ele ficaria sabendo com antecedência, por algum informante do cartório.
- Mas, dona Laurinda, para fazer uma certidão, é necessário um papel que prove o casamento dos pais do neném. Como a senhora conseguiu uma coisa dessas? Não tem cabimento.
A velha, com a cara mais deslavada de todas, deu uma resposta que bateu o último pino daquela história.
- Eu forjei. Queria que meu filho tivesse um nome. E escolhi bem, não foi? Olhem aí, "Ambrosildo". - disse, enchendo a boca de orgulho.
Autor(a): jorge_terrano
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
A casa de Laurinda tinha a faixada num cor-de-rosa desbotado, de paredes muito limpas e cômodos bem cuidados. Na sala, um antigo conjunto de sofás, de madeira tão velha quanto a dona, mas resistentes e lustrosos. Ao lado, encostada num canto, ficava uma pequena mesinha, coberta por uma toalha grossa, de renda, onde descansavam alguns porta-retratos ...
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