Fanfic: As Crônicas da Cidade Maldita | Tema: Vampiros, Terror, Suspense,
Casa 23, Centro da Cidade — 1996
Elizabeth Silver
O apartamento estava completamente vazio. O som dos meus passos ecoava por toda a extensão do local, fazendo a noite ficar ainda mais sinistra. Eu estava ali há mais de meia hora e ninguém havia aparecido ainda. A carta rabiscada que eu havia recebido no cemitério ainda estava em minhas mãos, amassadas e manchadas com as lágrimas que eu chorei durante toda a tarde. Eu sentia falta de Jonathan. Queria meu marido de volta. Quando o enterrei, acreditando que ele estava morto, eu senti uma dor muito forte, mas saber que tudo fora uma mentira, que ele estava vivo em algum lugar, mas não saber se ele estava bem era ainda pior. Eu senti muita dor, mas nas condições em que as coisas aconteceram eu preferia que ele estivesse morto. Era um sentimento egoísta e isso me fez lembrar de Francis, e me odiei por isso, mas era melhor do que morrer sofrendo.
A noite caiu lentamente em Raven Hill. O apartamento desocupado onde eu e Jonathan compartilhamos tantas lembranças de nosso namoro e noivado, aos poucos era possuído pela escuridão da noite que avançava de forma ameaçadora e sorrateira. Eu estava prestes a desistir, acreditando que tudo não passara de uma piada de mal gosto de algum sociopata doentio, quando ouvi a porta da sala se abrir.
Eu estava no corredor que dava para o meu antigo quarto. Eu podia visualizar bem a porta de entrada e a escuridão me escondia. Entrou por ela um homem alto, magro e de meia idade. Sua pele seca e flácida caia enrugada por sobre o corpo quase esquelético. Usava um óculos de aro fino pendurado na ponta do nariz e tinha cabelos ralos e grisalhos onde a calvície não havia atingido. Ele vestia uma camisa social xadrez por baixo de uma jaqueta de couro marrom velha, uma calça jeans surrada e um sapato da mesma cor da jaqueta e quase tão velho e surrado quanto. Na mão havia um pequeno envelope. Ele trancou a porta atrás dele e andou lenta e calmamente até o meio da sala. Parou com os braços cruzados na frente do corpo, ainda segurando o envelope. Olhou em minha direção e sorriu.
— Espero que não esteja esperando por muito tempo.
Como ele havia conseguido me ver? Eu estava completamente oculta pela escuridão do corredor do apartamento vazio. Saí do corredor e fui até a sala. O medo estava esculpido em meu rosto.
— Quem é você? — Perguntei, a voz trêmula e os olhos marejados de lágrimas de medo — Onde está Jonathan?
— Quem eu sou não interessa. Não sou ninguém importante. — Respondeu o homem — Seu marido está vivo. Isso é tudo o que você precisa saber por enquanto. — Ele estendeu o envelope em minha direção — Se ele vai continuar vivo, isso depende de você.
— O que quer dizer com isso?
— Digamos que você tem um novo patrão agora.
Estendi a mão e peguei o envelope. Era igual o que eu havia recebido mais cedo, no cemitério. Havia apenas uma foto dentro dele, a foto de um homem em seus quarenta e poucos anos. Usava terno e gravata e carregava uma pasta na mão. A foto fora tirada quando ele estava saindo de algum prédio no centro da cidade. Não consegui reconhecer o local. Olhei para o homem na sala e perguntei:
— Quem é ele?
— Seu nome é Peter Maxwell. Ele é o diretor de uma empresa de pesquisas médicas aqui em Raven Hill. Meu patrão precisa de uma informação que apenas ele contém.
— E porque seu patrão precisa de mim?
O homem começou a rir.
— Meu patrão não precisa de você. É você quem precisa do meu patrão — Olhei para ele, confusa e irritada com tudo aquilo. O que aquilo tinha haver com Jonathan? O que ele esperava de mim? — Você tem um encontro marcado com Peter amanhã. Irá ganhar a confiança dele e fará o que for necessário para conseguir a informação.
— E que informação é essa?
Ele me olhou surpreso.
— Seu eu soubesse, eu não precisaria de você, não acha? — Ele me encarou e deu um sorriso debochado.
— E como vou saber onde procurar?
— Quando encontrar, você saberá que é o que precisamos. — Ele disse, pacientemente — Irá até o Boulevard Building amanhã ao meio dia. Peter tem uma reunião marcada ás doze e trinta de amanhã. Irá falar com ele, conseguir a confiança dele e descobrir o que ele está escondendo.
— E quando eu conseguir a tal informação, como encontrarei você?
— Não irá. — Respondeu, em tom misterioso — Nós te encontraremos.
— E como saberá que consegui a informação.
Sem responder, e com um estranho sorriso no rosto, o homem virou-se e andou em direção á porta da sala. Antes que pudesse sair, porém, eu perguntei:
— Quando eu conseguir a informação, terei meu marido de volta?
O homem respondeu sem me olhar:
— Tenha paciência, querida. Peter é apenas o começo. Estamos começando uma longa amizade... — E saiu pela porta, dando gargalhadas.
O Boulevard Building era uma enorme estrutura de quarenta e três andares no centro da cidade, não muito longe de meu antigo apartamento, onde estivera na noite anterior. Apesar de a noite anterior ter sido estranha e assustadora, e de eu ter arriscado minha vida completamente em ter ido encontrar aquele estranho, eu resolvi fazer o que ele mandou. Se isso era necessário para reencontrar o meu marido, então eu iria até o fim com isso, custasse o que fosse.
O hall de entrada do prédio era um enorme salão de mármore bege, extremamente luxuoso. Sobre a cabeça do recepcionista havia um relógio enorme que indicava ser meio dia e três. Ainda havia muito tempo até que a reunião começasse e provavelmente o homem chamado Peter não havia chegado. Fui até o centro do hall, onde havia dois sofás e me sentei em um deles. Ao meu lado havia um homem de óculos escuros lendo um jornal. O envelope estava em minhas mãos. Abri-o e puxei a foto para olhar bem para o rosto do alvo. Era um homem bonito apesar de ter alguns anos a mais em relação à minha idade. Olhei bem para aquele rosto e imaginei quem seria aquele homem.
Enquanto encarava a foto, milhares de perguntas não respondidas surgiam na minha cabeça. Coisas que me deixavam confusa e assustada. Eu não sabia no que estava me metendo, mas eu precisava fazer. Mas quem era esse Peter? Que informação é essa que ele continha e que o homem do apartamento queria tanto? Seria sobre o ataque que acontecera há duas noites? Eram tantas perguntas... Mas uma delas me deixou um pouco nervosa e preocupada: na noite anterior, no apartamento, o homem havia me dito que Peter era apenas o começo. Será que haveriam outras missões para eu cumprir até que eu visse Jonathan novamente? E como eu iria ganhar a confiança de uma pessoa que nunca me viu antes? As perguntas não paravam de brotar e eu ainda estava encarando a foto. Olhei para o relógio sobre a cabeça do recepcionista mais uma vez. Meio dia e quatorze. Olhei ao redor e...
Peter Maxwell entrara pela porta principal com mais um homem ao seu lado. Um segurança provavelmente. Estava na porta do elevador, esperando que ele chegasse. Rapidamente me levantei, e me dirigi para a fila que se formava atrás dele, guardando a foto dentro do envelope novamente, e em seguida na bolsa que carregava, enquanto me aproximava. Peter era o segundo da fila, o segurança ao seu lado, ambos usando terno preto e mocassim.
Quando o elevador chegou, Peter e o segurança entraram e eu fui logo atrás. Peter carregava uma mala nas mãos e ficou no fundo do elevador. O segurança apertou o botão do trigésimo sétimo andar. Rapidamente apertei um número acima. Precisava pensar em algo antes que ele saísse. O elevador fechou as portas e começou a subir. Era um elevador moderno e rápido. Em menos de um minuto ele chegou ao décimo nono andar, onde parou para um rapaz, que havia entrado conosco, poder sair. O rapaz estava um pouco atrás de mim e me empurrou para poder abrir espaço, sem pedir licença. Mal educado, pensei, mas então uma ideia me surgiu na cabeça. Eu só precisava que Peter também fosse mal educado.
Puxei uma caneta e um bloco de dentro de minha bolsa e comecei a escrever coisas sem sentido, apenas para escrever algo. Olhei de relance para o indicador do andar e vi que ele havia parado no vigésimo sétimo andar. Uma mulher alta de cabelos loiros saiu e a porta tornou a se fechar. Olhei para os botões do elevador e vi os números acesos: trinta e sete, trinta e oito e quarenta e dois. Peter seria o próximo a sair.
Sem deixar muito claro, me pus diante da porta, ainda na frente dos outros três passageiros. Meu corpo ficou de frente pra porta, impedindo um pouco da passagem de quem quisesse sair. Quando o elevador parou no trigésimo sétimo andar, quarenta segundos depois, Peter e o segurança avançaram para sair. O segurança saiu primeiro e assim que passou por mim, fingi tentar dar passagem e esbarrei de propósito em Peter, me desequilibrando e caindo no chão. Fiz questão de bater com o joelho no chão, que arranhou e começou a sangrar um pouco. Peter parou no caminho e se abaixou para me ajudar:
— Está tudo bem, senhorita?
O segurança olhou para trás e segurou a porta do elevador para que ela não fechasse.
— Meu joelho... está sangrando.
— Me desculpe. — Ele estendeu a mão — Consegue se levantar?
— Sim, foi apenas um arranhão.
Segurei a mão de Peter e me levantei. Olhei para ele sorrindo simpaticamente.
— Está tudo bem mesmo? — Perguntou novamente.
— Sim, estou bem.
— Me perdoe, esbarrei em você quando fui sair.
— Está tudo bem, de verdade...
— Como posso me redimir?
Bingo!
— Starbucks da esquina, daqui a há uma hora. Você paga!
A porta do elevador se fechou, deixando um Peter sorridente do lado de fora. Do lado de dentro eu estava me sentindo completamente diferente. Aquela pequena atitude havia me mudado instantaneamente, e, naquele momento, eu sabia que seria capaz de qualquer coisa para encontrar Jonathan novamente. Qualquer coisa.
Autor(a): raphaelaguiar91
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