Fanfic: Gelo Negro- Adaptação vondy | Tema: Vondy
CAPÍTULO TRINTA E DOIS
Acordei com uma rajada de vento frio. Eu tinha me esquecido de fechar as cortinas antes de cair no sono. Fui até a janela e soltei a fita que as prendia. Fiquei parada ali por um tempo, observando atentamente a floresta. Queria achar Christopher na vasta escuridão. Ele estava lá fora em algum lugar, indo atrás de mim, eu tinha certeza disso. Uma passagem em arco levava a um banheiro com duas portas que ligava o meu quarto ao de Korbie. Fui até a pia e joguei um pouco de água no rosto. Meus músculos estavam doloridos da caminhada longa e árdua até Idlewilde, e, quando olhei para meu reflexo, me assustei ao ver como minha aparência estava péssima. Minha pele estava descorada como um galho levado pela água, e tão acinzentada quanto. Meus olhos estavam com olheiras enormes, e meu cabelo, opaco e emaranhado, não era lavado fazia dias. Incomodada com a visão, dei as costas para o espelho. Fiquei de pé no piso frio de cerâmica, pensando. Então abri a porta que dava para o quarto de Korbie. Deixei as luzes apagadas e caminhei silenciosamente até sua cama. Ela dormia de bruços, o ronco profundo e rítmico parcialmente abafado pelo travesseiro. Senti uma vontade imensa de passar a mão pelo cabelo dela, mas sabia que Calvin nunca me perdoaria se eu a acordasse. Em vez disso, deitei na cama e chorei baixinho. “Sinto muito”, disse a ela em pensamento. Foi minha ideia vir para as montanhas. Nunca quis magoar você. Não agora, e nem quando namorei Calvin. Eu queria ter lhe contado sobre nós. Foi errado esconder isso de você.” Calvin e eu tínhamos namorado por menos de seis meses. Como eu o conhecia desde criança e tinha sido apaixonada por ele a maior parte desse tempo, acho que pareceu mais do que isso. Ele sempre fora uma parte de minha vida, mesmo quando não éramos oficialmente um casal. Eu queria fazê-lo feliz, e por isso concordara em manter nossa relação em segredo. Mas, lá no fundo, doía saber que ele não estava pronto para me assumir publicamente como namorada. Também doía ter que mentir para meus amigos, principalmente para Korbie, ainda mais porque Calvin era seu irmão. Para me sentir melhor, disse a mim mesma que os relacionamentos eram baseados em concessões. Eu não podia ter tudo o que queria. Isso fazia parte de crescer e aceitar que o mundo não girava ao meu redor. Então Korbie descobriu. Aconteceu na festa na piscina que ela organizou, no verão anterior. A mesma festa na piscina em que Calvin beijou Rachel. Calvin e eu tínhamos combinado que trataríamos a festa como qualquer outra ocasião. Ele ficaria com seus amigos, e eu, com os meus. Se nossos caminhos se cruzassem, falaríamos um com o outro da mesma maneira que fazíamos havia anos, mas qualquer tipo de flerte estava fora de cogitação.
Comprei um maiô preto com recortes laterais. As outras garotas estariam usando biquínis, e eu queria me destacar. Sabia que Calvin estaria de olho. Antes da festa, vesti o maiô no quarto de Korbie, e, no momento em que ela me viu, eu soube que tinha feito a escolha certa. — Uau, sexy — disse ela, com aquela mistura agradável de admiração e inveja. Korbie tinha me pedido para chegar uma hora mais cedo para ajudá-la a arrumar o que faltava, então colocamos nossas saídas de praia e seguimos para a cozinha. Eu disse a ela que precisava ir ao banheiro, mas continuei pelo corredor e entrei disfarçadamente no quarto do Calvin. Peguei um papel na sua impressora e escrevi um bilhete rápido, que vinha editando na minha cabeça por horas. Eu ainda não tinha chegado ao texto perfeito, mas estava sem tempo.
Hoje à noite, quando me vir acariciar meu braço, saiba que estou pensando em você. E, quando eu mergulhar os dedos dos pés na piscina, estou pensando que somos só nos dois na piscina e estou no seu colo enquanto você me beija. Beijinhos, Dulce
Antes que eu perdesse a coragem, dobrei o bilhete e o enfiei embaixo do travesseiro de Calvin, deixando só um pedacinho para fora. Depois corri para me encontrar com Korbie na cozinha. Um pouco antes de os convidados começarem a chegar, eu estava abrindo os guardasóis da mesa quando Korbie veio andando na minha direção e acenou o bilhete com raiva na minha cara. — O que é isso? — Eu… é só… — gaguejei. — Onde você pegou isso? — No travesseiro do Calvin, onde você acha? — Não era para você ter visto isso. Eu temia aquele momento fazia meses. Tivera bastante tempo para preparar um pedido de desculpas, mas, na hora, não conseguia pensar em nada para dizer. Korbie começou a chorar. Ela me arrastou pelo quintal, para trás da cerca viva de lilases. Eu nunca a vira tão chateada. — Por que você não me contou nada? — Korbie, me desculpe. — Eu realmente não sabia o que dizer. Me sentia péssima. — Há quanto tempo vocês estão juntos? — Desde abril. Ela enxugou as lágrimas. — Você devia ter me contado. — Eu sei. Você tem razão. O que fiz foi errado, e me sinto péssima. Korbie fungou. — Você guardou segredo porque achou que eu fosse ficar com raiva?
— Não — respondi, com sinceridade. — Calvin não estava pronto para contar às pessoas. — Acha que ele está usando você? Senti meu rosto ficar vermelho. Por que ela precisava me perguntar aquilo? Em uma noite em que eu já estava me sentindo insegura com relação a mim e a Calvin? — Acho que não. Não sei — falei, arrasada. — Se você tivesse que escolher entre nós dois, você me escolheria, não é? — É claro — respondi, rapidamente. — Você é minha melhor amiga. Korbie baixou os olhos e pegou minha mão. — Não quero dividir você com ele. Mal sabia Korbie que ela não teria que me dividir com ele por muito mais tempo. Quando Calvin foi para Stanford, foi o começo do nosso fim. Procurei afastar aquela lembrança da cabeça e voltei para o presente. Não queria sair da cama de Korbie, mas Calvin faria sua ronda logo, então puxei os cobertores até seus ombros e saí. Eu estava quase chegando a minha cama quando meu cérebro registrou algo estranho no canto ao lado do armário. A grande forma humana escondida junto à parede, como uma sombra. Antes que eu recuperasse o fôlego, ela pulou até onde eu estava, me jogando na cama e me prendendo com o corpo, abafando meu grito de susto com a mão gelada. — Não grite… sou eu, Christopher — disse ele. Me agitei ainda mais, mostrando-lhe que saber disso não me tranquilizava. Consegui levantar o joelho e mirar em sua virilha, mas errei por pouco, acertando sua coxa com força. Christopher olhou rapidamente para o alvo que eu pretendia acertar e ergueu as sobrancelhas ironicamente, enquanto voltava sua atenção para mim. — Essa passou perto — disse ele em voz baixa. Para evitar qualquer risco, ele subiu de vez em mim, me estendendo na cama com seu corpo grande, molhado e muito gelado. Embora ele tivesse conseguido entrar em Idlewilde, não estava ali dentro fazia muito tempo: havia neve em seu casaco, e sua barba curta e escura brilhava com o gelo que derretia. Protestei contra o peso esmagador de seu corpo com uma exclamação irritada, mas, com a mão de Christopher cobrindo minha boca, eu duvidava que Calvin tivesse ouvido, mesmo que estivesse no corredor com o ouvido colado à porta. O cenário mais provável era que ele estivesse lá embaixo, andando de um lado para outro, entre a porta da frente e a de trás, mal sabendo que o perigo já havia entrado. — Surpresa em me ver? — perguntou Christopher, abaixando o corpo para evitar que alguém ouvisse sua voz. Seu cheiro era o mesmo de que eu me lembrava: penas de ganso, seiva de pinheiro e fogueira. Só que, da última vez que tínhamos ficado tão perto assim um do outro, eu ainda não sabia de muita coisa e, portanto, estava mais receptiva. — Mas nem de longe tão surpresa quanto eu quando voltei para o acampamento hoje de manhã e vi que você havia desaparecido. Você devia ter me dito que ia embora, e assim me poupado o trabalho de matar um coelho para você.
Havia uma raiva controlada em seu tom de voz que fez com que eu me contorcesse por dentro. Eu não queria acreditar que Christopher me machucaria. Mas, por outro lado, ele tinha matado Anahí Uckermann. Era um especialista em esconder sua verdadeira natureza. A maioria dos psicopatas era. Isso me fazia lembrar dos vizinhos de serial killers, que sempre diziam: “Mas ele era um cara tão legal!” — Você não vai gritar, Dulce— disse Christopher, no mesmo tom baixo e letal. — Vai escutar tudo o que eu tenho para dizer. E então vai me contar onde colocou as coisas que roubou de mim. Por um momento, minha raiva se tornou maior do que meu medo e, sem pensar, arqueei as sobrancelhas, com ar de desafio. “Acha mesmo que vou obedecer a você, seu psicopata?”, pensei, furiosa. “Tire a mão e vou gritar tão alto que seus tímpanos vão arrebentar!” — Como quiser — respondeu Christopher quando me retorci, revoltada. — Eu vou falar, e você vai ouvir. E seu amigo lá embaixo pode continuar olhando pela janela da sala como um idiota. Como se eu fosse aparecer ali onde ele acendeu todas as luzes e dizer “olá”. Ao ouvi-lo insultar Calvin, me debati descontroladamente, indignada. Rezei para Calvin vir dar uma olhada em mim e abrir um buraco bem entre os olhos detestáveis de Christopher. Mas talvez fosse melhor assim. Talvez fosse bom que Christopher subestimasse Calvin. Eu mal podia esperar para ver o choque em seu rosto quando ele percebesse que nunca deveria ter tirado Calvin do sério. Se Christopher tivesse ido ali me matar porque agora eu sabia que ele tinha assassinado Anahí Uckermann, isso com certeza despertaria a ira de Calvin. Christopher não perdia por esperar. — Você disse que confiava em mim, mas mesmo assim vasculhou minhas coisas. Você deveria ter deixado que eu me explicasse antes de tirar conclusões precipitadas e fugir — disse Christopher, com a voz fria e irritada. — Mas nem ao menos sei se você alguma vez se importou. Avaliei você mal, Dulce. Parabéns por conseguir me fazer baixar a guarda… são poucos os que conseguem. Você me enganou feio. Você queria mexer nas minhas coisas esse tempo todo? Ou você bolou sua farsa de sedução para garantir que eu a ajudaria a chegar a Idlewilde? Bem, você perdeu seu tempo — disse ele, em tom crescente de raiva. — E jogou sua autoestima no lixo. Eu disse que ia trazer você aqui, e estava falando sério. Olhei diretamente nos olhos dele e levantei o queixo de um jeito arrogante. “É isso mesmo. Eu estava fingindo. O beijo foi uma farsa.” Me senti bem ao dizer aquelas coisas para ele, mesmo que em pensamento. Não queria lhe dar o prazer de achar que eu algum dia tinha me importado, principalmente se aquele era o fim da minha vida. Só que eu não contava que meus olhos se encheriam de lágrimas, e isso arruinou a insensatez do meu ataque. Tentei virar o rosto antes que ele visse, odiando a ideia de demonstrar fraqueza naquele momento. Eu não sabia se estava chorando porque estava com medo de morrer ou porque as palavras de Christopher tinham aberto uma ferida. O que havia acontecido sob a árvore na noite anterior não tinha sido uma farsa. Eu tinha me entregado a ele porque queria. Porque confiava nele. E a traição, a verdade sobre quem ele era, doía como se meu coração estivesse sendo rasgado ao meio.
— Agora vai chorar também? Você é uma atriz melhor do que eu pensava — disse Christopher, bufando amargamente. — Chore o quanto quiser… não vou soltá-la, Dulce. Não depois de ter todo esse trabalho para achar você. Não vou embora até você me devolver o que roubou. Agora, onde estão as coisas? — exigiu, me sacudindo com força. — Onde estão o pingente e o diário? Balancei a cabeça enfaticamente. Soltei o ar pelo nariz, olhando furiosa para ele para transmitir minha mensagem. Nunca antes eu havia sentido tanta vontade de xingar alguém. Uma sucessão das piores e mais sujas palavras em que eu podia pensar passaram pela minha mente, e eu só queria ter a imensa satisfação de gritá-las bem na cara dele. — Onde estão? — rosnou de novo, me comprimindo com mais força no colchão. Fechei os olhos, com a certeza de que havia chegado a hora. Ele estava com uma das mãos na minha boca e a outra por trás da minha cabeça. Bastava uma torção brusca e ele quebraria meu pescoço. Eu tentava respirar, em arfadas curtas e difíceis. Sabia que era vergonhoso esperar até aquele momento para rezar, mas eu estava desesperada. “Querido Deus, conforte meu pai e Christian depois que eu partir. E se este for o fim, por favor, que Christopher faça isso rapidamente e não prolongue minha dor.” Quando percebi que nada tinha acontecido, me arrisquei a abrir os olhos. Christopher estava curvado sobre mim, o ar sério e furioso começando a desmoronar. Ele balançou a cabeça, a decepção e o cansaço marcados em sua expressão. Então me soltou, esfregando as mãos nos olhos injetados. Seus ombros caíram, e seu corpo todo tremia quando ele desabou, chorando baixinho. Ele não tinha me matado. Eu não estava morta. Fiquei deitada na cama, incapaz de fazer qualquer coisa, a não ser chorar ao lado dele. Meus ombros subiam e desciam, em grandes e silenciosos suspiros. — Você a matou? — perguntei. — Você acha que eu a matei? — Você estava com as coisas dela. A amargura pontuava suas palavras. — Então agora eu a matei? Foi fácil chegar a essa conclusão e deduzir que eu era um assassino ou você relutou um pouco antes de acreditar nisso? Depois de ontem à noite, espero que tenha dedicado alguns minutos para avaliar meu caráter. — Eu vi o pai de Anahí Uckermann no noticiário. Ele tinha certeza de que ela estava com o pingente na noite em que desapareceu. — Ela estava. Engoli em seco. Aquilo tinha sido uma confissão? — E as algemas? Eram para quê? Christopher se encolheu, e percebi que ele achou que eu tivesse me esquecido delas. Mas como poderia? Que tipo de pessoa normal carregava algemas? — Você algemou Anahí? — continuei. — Para ela não fugir? Para deixá-la impotente? — Você acha que sou capaz de coisas terríveis, já deixou isso claro — disse Christopher, o tom denunciando o cansaço e o esgotamento que sentia. — Mas não sou o assassino que você quer que eu seja. Venho tentando fazer a coisa certa, e é por isso que estou aqui agora.
Estou tentando pegar o verdadeiro assassino. E, para fazer isso, preciso das coisas da Anahí. Mais explicações enigmáticas. Eu estava cansada delas. Não sabia em que acreditar. Só sabia que, se cometesse o erro de confiar em Christopher uma segunda vez, eu não só seria uma tola, como também provavelmente morreria. Ele podia estar me enganando… só para me matar e eliminar uma testemunha. — O que Anahí era sua? Christopher esfregou as mãos no rosto, e vi que elas estavam tremendo. Então curvou os ombros e abaixou a cabeça, quase como se estivesse sendo tomado de assalto pelas lembranças… como se elas fossem objetos invisíveis e enfeitiçados que voavam para cima dele com uma força violenta. — Eu não matei Anahí — disse ele, sem emoção na voz. Sentou-se na beirada da cama e ficou olhando a parede escura. Mesmo com a pouca luz, notei que seu olhar estava vazio. — Ela deixou uma mensagem no meu celular horas antes de desaparecer. Disse que ia sair para beber, e eu sabia que ela estava me provocando, como tinha feito uma centena de vezes. Ela queria que eu a impedisse. Meu avião tinha acabado de pousar em Jackson Hole quando recebi a mensagem, e eu queria tomar um banho e comer alguma coisa. Estava cansado de largar tudo para ir resgatá-la. Então ignorei sua ligação. Pelo menos uma vez, eu queria que ela se virasse sozinha. — Sua respiração ficou presa na garganta e ele me encarou com um olhar triste e atormentado. — Anahí era minha irmã, Dulce. Eu devia cuidar dela, e a decepcionei. Não se passa um dia sem que eu pense como as coisas teriam sido diferentes se eu não tivesse sido tão egoísta. Anahí era irmã dele? Antes que eu pudesse assimilar essa revelação, Christopher continuou: — A polícia desistiu de encontrá-la, mas eu não. Eu tinha o diário dela, e o estudei com atenção em busca de pistas. Fui a cada bar, clube e hotel em Jackson Hole a que achei que ela pudesse ter ido. Minha família estava lá de férias fazia uma semana antes de eu chegar, então eu sabia que Anahí tivera tempo de sobra para conhecer o lugar. As pessoas deviam tê-la visto. Alguém tinha visto alguma coisa. Embora eu tenha criticado a polícia por não fazer nenhum progresso, eu tinha um recurso a mais que eles… o dinheiro da minha família. Paguei as pessoas para que falassem, e uma pessoa, um barman, se lembrava de ter visto Anahí sair do bar com um caubói. O barman mais tarde vazou para o noticiário que Anahí tinha sido vista deixando o bar Silver Dollar Cowboy com um homem usando um chapéu Stetson preto, o que me deixou furioso, porque eu não queria que o cara que eu estava procurando soubesse que estavam atrás dele. Christopher respirou fundo e prosseguiu: — Com base na descrição do barman, eu sabia que estava procurando por um homem de vinte e poucos anos, magro, de estatura média, nariz quebrado, cabelo louro, olhos azuis e que, provavelmente, usava um Stetson preto. Então voltei àquele mesmo bar todas as noites durante semanas, até que finalmente Shaun apareceu. Ele batia com a descrição. Descobri o nome dele e investiguei seu passado. Fiquei sabendo, então, que ele tinha se mudado recentemente para Wyoming, vindo de Montana, onde tinha ficha por delitos
leves… pequenos roubos, agressão e perturbação da ordem. Eu tinha certeza de que havia encontrado o homem que assassinara Anahí. Larguei a faculdade, deixei meus amigos e minha família, me mudei para Wyoming, e meu trabalho de tempo integral passou ser conquistar a confiança de Shaun. Arrumei uma identidade falsa, cometi pequenos delitos e prejudiquei seus inimigos para provar meu valor. Eu teria feito o que fosse preciso para Shaun confiar em mim. Achava que ele acabaria confessando que tinha matado Anahí. E então, quando eu tivesse certeza de que ele havia feito isso, eu o mataria. Lentamente — acrescentou, em um tom frio e ameaçador, um brilho negro ardendo em seus olhos. Eu tinha me recuperado o suficiente para me afastar um pouco — silenciosamente, para Christopher não notar. Era uma história sentimental e conveniente. Talvez Christopher tivesse percebido que me ameaçar não estava adiantando e, por isso, decidira tentar outra estratégia. Seu relato também não explicava o pingente e a fotografia que parecia ter sido tirada por alguém que a espiava. Os pais de Anahí tinham certeza de que ela estava usando o pingente quando morreu. Christopher devia estar lá quando ela foi morta. E devia ter tirado o pingente de seu corpo. Com cuidado, coloquei um pé para fora da cama, mas o piso me entregou, rangendo sob meu peso. Christopher se virou, assustado. Congelei. Eu poderia gritar, mas, antes que Calvin subisse correndo, Christopher teria tempo de me atingir com um golpe mortal na cabeça e escapar pela janela. — Continue — pedi, gentilmente, tentando disfarçar o nervosismo. Para meu espanto, Christopher piscou e, quase em transe, me atendeu. — Matar Shaun, se ele tivesse assassinado Anahí, era minha jogada final. Ele tinha começado a se vangloriar de alguns dos seus crimes, como chantagear mulheres ricas e casadas com fotos que ele tirava delas quando estavam bêbadas. Mais um pouco e eu tinha certeza de que ele me falaria sobre Anahí. Christopher me encarou com seu olhar triste e continuou: — Então ele assaltou o Subway e atirou em um policial. Shaun pirou… eu nunca o tinha visto tão assustado. Ele sabia que estávamos em apuros. Quando saiu com o carro em disparada, estava tão desesperado que atingiu uma garota que atravessava a rua. Acho que ele nem chegou a vê-la. Aquela reação dele deveria ter servido de alerta para mim, eu deveria ter repensado a probabilidade de ele já ter matado, mas eu não queria estar errado sobre ele. —Christopher franziu a testa, o rosto tenso de dor. — Eu vinha caçando o assassino de Anahí fazia muito tempo para voltar à estaca zero. Depois que Shaun atirou no policial, fomos forçados a fugir. Para piorar a situação, você e Korbie apareceram na cabana em que estávamos escondidos. Em vez de tornar a segurança de vocês minha prioridade, fiquei transtornado por terem estragado meus planos. Era como se eu não fosse nem mais humano. Eu estava tomado por uma fúria sanguinária, só o que me importava era a confissão do Shaun. Tudo se resumia a isso. Se ele a tivesse matado, eu faria o mesmo com ele, e se houvesse consequências para mim, tudo bem. Eu sabia que seria preso, mas era a coisa certa a fazer. Eu queria morrer. Tinha deixado Anahí na mão quando ela mais precisou de mim, e não merecia outro destino.
Christopher apoiou os cotovelos nos joelhos e abaixou a cabeça, entrelaçando os dedos na nuca. Ele estava mais perto da porta do que eu, mas se eu continuasse me movendo até lá a passos curtos e silenciosos… — Quando você e eu nos unimos para sairmos vivos da montanha, algo aconteceu comigo. Deixei a raiva de lado. Pela primeira vez em meses, eu tinha alguém além do fantasma da Anahí em quem me apoiar. Eu queria ajudar você, Dulce. Disse a mim mesmo que eu valia mais vivo do que morto. Tinha que continuar lutando, porque você precisava de mim. E quando nos beijamos… — Ele passou as costas das mãos nos olhos. Fiquei atônita. Não esperava que ele falasse de mim com tanta emoção. De repente, senti um aperto no peito. Engoli em seco, lutando contra a doce e perigosa lembrança da noite anterior. Eu não podia me transportar de volta para aquele momento. Sabia disso, mas não era forte o suficiente para combater a recordação. Fechei os olhos por um instante, sentindo a crescente onda de saudade. Me lembrei com uma nitidez ávida da maciez de sua pele nua, do brilho da luz do fogo em seu rosto no escuro. Eu ainda sentia suas carícias lentas e deliberadas. Ele sabia como me tocar. Suas mãos estavam gravadas para sempre na minha pele. — Então isso significou algo para você também — disse Christopher, baixinho me observando com olhos que agora estavam totalmente presentes. Eu não sabia o que aquele beijo havia significado para mim. E eu não podia descobrir agora. Eu não sabia se acreditava na história dele. Que tipo de pessoa larga a faculdade para terminar um trabalho que deveria ter sido feito pela polícia? Mesmo que Anahí fosse sua irmã, eu não tinha certeza de que isso justificava medidas tão extremas. E os crimes que ele cometera para ganhar a confiança de Shaun? Por acaso eram justificáveis? Se ele quisesse mesmo justiça, teria entregado o diário e o pingente de Anahí para a polícia e confiado no trabalho deles. — Como você conseguiu o pingente da Anahí? — perguntei. — Encontrei na picape de Shaun logo depois que fizemos vocês reféns. Fui buscar seu equipamento no jipe, mas antes abri a picape de Shaun e peguei o que encontrei por lá. Eu sabia que aquela talvez fosse minha única chance de ver o que ele guardava ali dentro. Encontrei o pingente de Anahí em uma caixa de metal embaixo do banco. Também achei a foto dela. Havia fotos de outras mulheres, mas só o que me importava era que eu finalmente achara o que andava procurando. Provas de que ele conhecia Anahí. Provas de que ela era seu alvo, e que ele a observara e fotografara por dias antes de tramar sua emboscada. Costurei uma sacola de lona para esconder de Shaun o pingente e a foto, além do diário e das algemas que eu já tinha. Isso tomou tempo, daí eu ter me atrasado quando fui buscar o equipamento. Eu ainda não sabia se acreditava nele. Christopher já tinha provado que era muito inteligente e esperto. E se estivesse me enganando? — Se eu lhe disser onde o diário e o pingente estão, você jura que vai entregá-los à polícia? — perguntei. — É claro — disse ele, impaciente. — Onde estão?
Observei-o atentamente, tentando adivinhar os pensamentos que passavam pela sua cabeça. Ele parecia ansioso demais, e isso me deixou inquieta. — Eu não estou com as coisas da Anahí— falei, finalmente. — Dei tudo para Calvin. Você não vai precisar me prometer nada, porque ele vai entregá-los à polícia por você. O rosto de Christopher ficou branco de medo. No momento insano que se seguiu, meu coração começou a bater forte. Sua reação só podia significar uma coisa. Culpa. É claro que ele tinha ido ali para me enganar e pegar as coisas de Anahí de volta. Ele era um gênio do crime. Tinha inventado uma história elaborada que o fazia parecer tragicamente heroico para eu colocar as prova no seu colo, como uma recompensa para uma criança obediente. Me afastei de Christopher. Ele balançou a cabeça, desnorteado, como se não pudesse acreditar que suas histórias estavam desmoronando e eu tinha percebido isso. — Você não devia ter entregado as coisas de Anahí para Cal… — começou ele. Uma batida na porta fez com que nos virássemos e a encarássemos. A expressão perplexa de Christopher se desfez. Ele saltou da cama, agachando-se silenciosamente na escuridão ao lado da porta, as mãos prontas para o combate. Ele não tinha uma arma; ia lutar com os punhos se Calvin entrasse no quarto. — Dulce? Só queria saber se você está bem — disse Calvin, gentilmente. Os olhos escuros de Christopher correram para os meus, e ele balançou a cabeça uma vez. Queria que eu mandasse Calvin embora. Não havia tempo para pensar. Eu mal conhecia Christopher. Confiar nele era como andar em areia movediça. Calvin era firme; ele sempre tinha cuidado de mim. Dividida, eu olhava desesperadamente da porta para a figura parada ao lado dela, pronta para atacar. Minha cabeça me dizia para confiar em Calvin, mas meu coração queria que eu acreditasse em Christopher. Uma palavra minha e Calvin ou iria embora ou entraria sem pedir licença. No fim, foi minha hesitação, meu silêncio, que entregou minha incerteza. E fez Calvin entrar.
Autor(a): Mill
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
CAPÍTULO TRINTA E TRÊS Calvin ergueu o braço em um reflexo para desviar do golpe que Christopher desferiu nele quando ele passou pela porta. Ainda assim, o impacto fez com que Cal cambaleasse um passo para trás, quase perdendo o equilíbrio. Christopher não perdeu tempo; partiu para cima, os pun ...
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 43
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Mill Postado em 29/10/2015 - 16:18:04
É pena que acabou, também irei sentir saudades. Podem deixar assim que eu fizer outra fanfic eu posto aqui pra vocês ler #gelonegro! Lovei!
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juhcunha Postado em 28/10/2015 - 20:43:23
Maravilhosa pena que acabou deixar aqui sua nova web quero ler
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Polivondy16 Postado em 28/10/2015 - 19:19:39
Foi perfeita! Ficaram juntos <3 Ameeei! Obrigada você por compartilhar essa história com a gente, e espero que compartilhe muitas mais! Amei #gelonegro! Lovei! Lovei! Lovei! E infelismente.... num tem como escrever o posta mais...né! Vou sentir saudades *-*
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Mill Postado em 28/10/2015 - 16:48:18
Tá acabando :"(
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juhcunha Postado em 28/10/2015 - 00:12:54
Tadinha da dul ele não pode fazer isso com ela
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juhcunha Postado em 28/10/2015 - 00:09:14
Calvin se lasco mane
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juhcunha Postado em 28/10/2015 - 00:07:32
Essa merda d Calvin não pode morre ele tem que pagar pelo que ele fez
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Polivondy16 Postado em 27/10/2015 - 21:56:53
Acabando? Mas já? Logo agora que o pesadelo acabou... Essa Becca é cruel! Não, Christopher! Você não pode ir embora! Quero muito vê-los juntos! Posta mais *-*
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Mill Postado em 27/10/2015 - 16:44:52
kKKK Calma Korbie não matou ninguém
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juhcunha Postado em 26/10/2015 - 23:07:04
Korbie matou quem? Mdsss posta mais