Fanfic: * Prometida * | Tema: Vondy
As poltronas não eram tão desconfortáveis quanto Christopher imaginara. Obviamente não proporcionavam-lhe o mesmo conforto que as poltronas do Romanian Theater, mas daria para aguentar durante duas horas. Ele não queria estar ali, o que devia estar estampado em sua face com demasiada clareza. Mas sua noiva Karine queria, e aquilo era mais do que suficiente. Não porque morria de amores pela moça, mas porque evitar conflitos era sua maior meta naquele momento. Karine, com todo aquele seu jeito arrogante, não concordava em nada com o futuro marido, principalmente quando se tratava de qualquer assunto ligado à arte.
Christopher já sabia que discutir com a noiva era como esperar por chuva em uma seca: uma grande perda de tempo.
Naquela mesma tarde, o casal estava na casa dos pais da garota, os milionários Sherman, cuja apenas uma pequena parte da fortuna poderia ser capaz de alimentar todos os necessitados da região por um bom tempo. Não que a família se importasse em ajudar os outros, mesquinhos do jeito que eram.
- Karine, estão representando Shakespeare no Romanian, esta semana. – ele tentava insistir, mesmo sabendo da inutilidade de seu esforço.
- No Imperial também, Christopher. – a moça respondeu com a mesma arrogância de sempre, sem ao menos olhar para o noivo. Ela estava em pé, no meio da sala, enquanto três criadas ajustavam a barra de seu novo vestido cor-de-vinho.
- Sim, mas no Romanian é Hamlet! Sua peça preferida, não é mesmo? – ele tentava soar educado.
- Sim, e por esse motivo já assisti cinco vezes, todas elas no Romanian. Quero ver Romeu e Julieta. – ela suspirou, irritada.
- Mas, querida...
- Não me chame assim. Sabe que não gosto. Ainda não somos casados. – o tom de desgosto ao pronunciar a última palavra era evidente. Christopher claramente não era o único infeliz com o casamento arranjado.
- Tudo bem, me desculpe. – ele fez uma pausa e passou a mão nos cabelos, já exausto com a discussão. - Karine, não acha que seria mais apropriado estrear seu novo vestido em algum lugar que faça jus à sua grandiosidade? O Imperial é um dos piores teatros da cidade, nunca sequer fomos lá. Não é um local adequado para pessoas de nossa classe. – Argumentou, sem ao menos se importar com a presença das criadas que, evidentemente, não pertenciam à sua classe.
- Mas nem por isso deve ser desmerecido. Por isso mesmo quero ir, porque nunca fomos.
- Tudo bem, não insistirei. Mas pense em como os atores serão ruins, a estrutra será desqualificada, os cenários serão...
- Já chega, Christopher. – ela o interrompeu, virando-se para o noivo. As criadas acompanharam o giro, ainda agachadas. – Já pensei sobre tudo isso e, a menos que tenha algum argumento melhor, é para lá que iremos hoje à noite.
Como não conseguira mesmo encontrar argumento melhor, lá estava ele, Christopher Uckermann, sentado numa poltrona de terceira classe, em um teatro de terceira classe, rodeado por pessoas da terceira classe. No meio de toda aquela gente menos afortunada, o contraste das vestimentas na décima quinta fileira da plateia em relação às outras chegava a ser ridículo. Estavam sentadas somente cinco pessoas ao centro daquela fileira: Christopher, Karine e a família da moça: sua irmã mais nova Celine e seus pais, Angelina e Marco. Ninguém mais se atreveu a ocupar qualquer uma das dez poltronas restantes, nem mesmo nas extremidades.
Crianças admiravam, impressionadas, todo o explendor e superioridade presentes naquelas vestimentas tão honrosas. Adultos cochichavam entre si, alguns mais indiscretos até mesmo apontavam, mas nada incomodava aquelas cinco pessoas tão dissemelhantes ao restante. Estavam acostumados a serem notados ao irem a lugares com maior presença das classes sociais mais baixas.
- Karine, meu bem, você não poderia ter escolhido um teatro mais apropriado para pessoas como nós? – a senhora Sherman perguntou, sem a menor intenção de ser discreta. Se antes as pessoas observavam o grupo com certa curiosidade, agora lançavam-lhe olhares furiosos. Não que fossem tentar qualquer gesto de revolta maior do que aquele porque, afinal, eram inferiores e tinham noção disso.
- Eu sei que estamos em um lugar inferior, mamãe, mas só quero assistir à peça. Pouco me importam as pessoas que frequentam este teatro. – ela respondeu, sem olhar para a mãe. Angelina sentiu-se derrotada e apenas tornou a olhar para frente, suspirando.
Chris apenas observou a cena, calado. O silêncio se estabeleceu novamente, o que para ele era como uma bênção. Detestava aquela família, e detestava ainda mais o fato de que, em breve, faria parte dela. Maldita necessidade de manter a riqueza, ele pensava. Seu casamento com Karine fora planejado antes mesmo de seu nascimento. As duas famílias, Uckermann e Sherman, eram sócias em um negócio petrolífero há muito tempo e a única maneira de assegurar a permanência do capital nas mãos certas seria casando os futuros herdeiros. Portanto, esperando que nascessem bebês de sexos opostos, colocaram o sucesso do plano nas mãos de Deus.
Dito e feito. As senhoras Uckermann e Sherman engravidaram praticamente na mesma época, alguns meses depois do trato. Entretanto, a primeira gravidez de Angelina não ocorreu conforme era esperado e a pobre mulher sofreu um aborto espontâneo em seu terceiro mês de gestação. Por outro lado, a gravidez da senhora Uckermann não poderia ter sido mais satisfatória. Nove meses mais tarde, veio ao mundo o que todos esperavam: um garoto perfeitamente saudável, ao qual dariam o nome de Christopher.
Traumatizada com a infelicidade do aborto, Angelina só engravidou novamente quatro anos depois. A pressão para o nascimento de uma menina era tanta que tornou a gravidez cada vez mais tensa e difícil, e a chegada do oitavo mês fora o maior alívio na vida dos Sherman até aquele momento. Três semanas mais tarde, para a alegria de todos, nascera Karine, e desde então o casamento vinha sendo planejado.
Christopher amaldiçoava cada célula do corpo de Angelina por ter gerado aquela mulher. Não se importaria se Karine tivesse a mesma personalidade de sua irmã Celine. Mesmo tendo apenas dez anos, a menina já mostrava que seria diferente do restante da família. Ao contrário deles, não tinha a típica arrogância presente em seu tom de voz e não era uma pessoa amarga, sinais que estiveram presentes em Karine desde a infância. E, claro, características que não mudaram na jovem com o passar dos anos.
- Chris?
A voz feminina e aguda retirou Christopher de seus devaneios. Era Celine. A garota tinha uma grande afeição pelo futuro cunhado e decidiu sentar ao seu lado, longe dos pais.
- Sim, Celi? – ele virou seu rosto em direção à menina e deu-lhe um leve sorriso.
- Vai demorar muito para começar?
Christopher retirou o relógio do bolso e checou a hora. Eram 19h55.
- Faltam apenas cinco minutos, querida.
- Adoro quando você me chama assim, sabia? Ao contrário de Karine, eu não me importaria se precisasse me casar com alguém como você.
Celine corou e Chris abriu ainda mais seu sorriso. Tinha pena pela menina, pois ela já era ciente de que teria o mesmo destino de um casamento arranjado.
- Você terá um noivo muito bom, Celine, assim como você merece.
- Talvez não. Karine não te merece.
Christopher não encontrava palavras. Queria concordar com Celine, mas quem era ele para dizer? Sabia que, no fundo, era como aquela família. Não tinha culpa da maneira como fora criado.
Atenção: Romeu e Julieta irá começar. Retornem aos seus lugares e tenham uma boa noite.
Christopher agradeceu mentalmente àquela voz vinda de trás do palco. Ainda não tinha uma resposta decente para Celine. Talvez nunca tivesse.
Os dois viraram-se para frente enquanto as cortinas vermelhas, já comidas pelas traças e desgastadas pelo tempo, se abriam.
O cenário, como Christopher já havia imaginado, era precário. Comparado às produções do Romanian, era como lixo. Uma torre ao canto esquerdo e uma pintura já desgastada de uma praça ao fundo era o que compunha o palco. Chris soltou um longo suspiro, acomodando-se um pouco mais na cadeira, que rangeu ao receber um pouco mais de seu peso no encosto. Recebeu um olhar repreensivo de Karine por causa do barulho inoportuno, mas fingiu não ter percebido.
Um homem vestindo um terno barato e já um pouco velho adentrou o palco. Era possível ouvir o rangido que a madeira fazia conforme o sujeito caminhava.
- Esta é a história de um romance impossível. Impossível, mas não menos belo. Estamos em Verona, por volta do ano de 1500. Duas famílias, os Montecchio e os Capuleto, possuem a maior rivalidade já vista nesta terra. Certa noite, quando o velho Capuleto resolve dar uma festa, Romeu, filho do velho Montecchio, resolve disfarçar-se e adentrar a festa para poder ver Rosaline, uma garota por quem estava interessado. Entretanto, meus caros amigos, sua atenção é tomada por outra bela moça e daí começa uma trágica, mas muito bonita história.
O homem saiu do palco e então muitas pessoas entraram, todas mascaradas e agindo naturalmente, como se já estivessem lá durante a introdução. Uma música de baile começou a tocar ao fundo, dando um tom realmente festivo à cena. Os figurinos não combinavam com a verdadeira classe retratada por Shakespeare em sua peça, mas Christopher já esperava por aquilo. O que ele não esperava era por uma pequena e delicada figura posicionada ao centro do palco. Usava um vestido rosa claro, comprido, praticamente digno de uma princesa, e uma máscara prata, cheia de adornos. Não só o vestido destacava a moça dos demais atores, mas também sua graciosidade e o sorriso sincero que não saía de seu rosto. Ela dançava junto a um ator mais velho, que deveria estar representando seu pai, o velho Capuleto. Ela com certeza era a Julieta da peça.
Christopher não entendia o porquê, mas a necessidade de retirar aquela máscara e ver por completo o rosto da donzela dominou todo seu ser. Conseguia ver vagamente os olhos da atriz, e só aquele pequeno deslumbre de seu olhar já o encantava. Mesmo sem ver por completo os delicados traços da moça, já sabia que era uma das mulheres mais lindas que já havia visto em toda sua vida.
Como já havia assistido àquela peça incontáveis vezes, concentrou toda sua atenção na mulher, mesmo que involuntariamente. A cena da festa parecia interminável. Christopher agora estava sentado desencostado da poltrona, com uma mão fechada sobre a outra e os braços apoiados sobre os joelhos, sua típica posição de interesse. Karine assustou-se ao vê-lo tão compenetrado na peça, mas achou melhor falar sobre aquilo após o teatro.
A cena finalmente foi encerrada. As cortinas foram fechadas novamente e Christopher decidiu aproveitar a oportunidade para sair um pouco do salão. Precisava de ar puro.
- Se me derem licença, vou ao toilet. – ele disse alto suficiente para que todos na fileira ouvissem.
- Claro. – foi Karine que se pronunciou, com o mesmo desinteresse de sempre, sem ao menos ohar para o noivo.
Chris subiu as escadas o mais rápido que conseguiu. Não queria perder a próxima cena e sabia bem o porquê. Ainda não entendia como aquela atriz tinha conseguido chamar tanto sua atenção mesmo estando ainda mascarada. Talvez fosse seus movimentos perfeitos e graciosos, ou até mesmo sua confiança ao atuar. Ela era realmente boa. E se Christopher Uckermann assumia que algo era bom, ninguém duvidava de que era mesmo.
Rapidamente encontrou o toilet, que ficava somente alguns metros à frente do corredor de entrada do teatro. Quando estava abrindo a porta, ouviu um burburinho e parou instantaneamente. Era a voz que ele ouvira há alguns minutos, a voz da tão misteriosa Julieta. Virou para trás e viu que um pouco mais a frente, do lado oposto do corredor, havia uma porta entreabertaque dava para um pequeno salão com pessoas se maquiando e se trocando rapidamente. Devia ser o camarim dos atores.
Sem pensar duas vezes, o rapaz deu alguns passos e parou em frente à porta. Sentada em frente a um espelho, de costas para a porta, estava a mulher que tanto chamou sua atenção. Ainda usava a máscara mas vestia outro vestido, lilás, mais simples do que o anterior. Christopher podia ver o reflexo de seu rosto no espelho.
- Tire a máscara, querida, preciso fazer a trança em seu cabelo! – uma muher mais velha chegou ao seu lado, segurando uma escova de cabelo nas mãos.
nstatação.
Autor(a): Anna Uckermann
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A jovem puxou com uma das mãos a ponta do laço que prendia a máscara ao rosto e levou a outra mão até a parte da frente do adereço. Puxou para cima, depositou a máscara sobre a penteadeira e mirou sua imagem no espelho. Christopher mirou aquele reflexo ao mesmo tempo e suas teorias foram confirmadas. Nunca havia v ...
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