Fanfic: * Prometida * | Tema: Vondy
A jovem puxou com uma das mãos a ponta do laço que prendia a máscara ao rosto e levou a outra mão até a parte da frente do adereço. Puxou para cima, depositou a máscara sobre a penteadeira e mirou sua imagem no espelho. Christopher mirou aquele reflexo ao mesmo tempo e suas teorias foram confirmadas. Nunca havia visto mulher mais bela. Os traços angelicais e delicados, o olhar profundo, as maçãs coradas, os lábios rosados... Não sabia dizer o que era mais belo. Todas aquelas partes juntas formavam o rosto mais impressionante que Christopher já observara.
- Pronto, Dulce! Está maravilhosa, como sempre.
Dulce... Então aquele era o nome que fazia honra a tal beleza. Dulce sorriu, passou a mão por cima da longa trança e anunciou que estava pronta para voltar ao palco.
Christopher pôs-se a andar o mais rápido possivel para voltar ao teatro. Não queria perder um momento sequer que envolvesse Dulce. As pessoas olhavam sem entender quando ele passava quase correndo pelo corredor.
Finalmente chegou à décima quinta fileira novamente, sentou-se em sua poltrona e recebeu um olhar indagador de Karine.
- Demorou para voltar.
- Eu tive dificuldades para... – ele hesitou - encontrar o toilet.
- Eu deveria ter imaginado. – ela tornou a olhar para frente.
Chris tentava recuperar o fôlego que lhe fora tomado durante a corrida para o teatro. Quando a mesma voz que anunciara o início da peça anunciou o segundo ato,assumiu sua postura concentrada novamente e esperou as cortinas se abrirem. Quando o palco pôde ser visto novamente, lá estava ela, Dulce, na janela da torre. Sua expressão era serena, e sua atuação, impecável.
- Romeu, Romeu! Ah! Por que és tu Romeu? Renega o pai, despoja-te do nome; ou então, se não quiseres, jura ao menos que amor me tens, porque uma Capuleto deixarei de ser logo.
Christopher podia sentir a intensidade daquelas palavras tocando-lhe fundo. Dulce as dizia de maneira tão natural que seria possível esquecer de que aquilo era uma encenação. As palavras pronunciadas eram quase tangíveis, tamanha era sua dedicação e paixão ao que fazia. Chris se perguntava o que uma atriz com tanto potencial fazia em um teatro tão abaixo de seu nível artístico. Ela merecia muito mais.
Uckermann passou o restante da peça admirando cada gesto e palavra vindos daquela moça tão intrigante. Observou cada detalhe possível e chegou à conclusão de que não deveria ter mais de vinte anos. A atuação então não era proveniente de experiência, mas sim de um dom.
Quando a encenação chegou ao fim todos aplaudiram em pé, exceto por uma única fileira, é claro. Os Sherman aplaudiam com pouco entusiasmo, enquanto Chris controlava-se para não levantar também e aplaudir com mais força do que já estava fazendo. O olhar curioso de Karine era insistente, mas Christopher não deu importância. Só continuava mirando Dulce e toda sua aura angelical.
Foram os primeiros a se levantar e sair do teatro. A carruagem entretanto ainda não estava na porta do Imperial, então foram obrigados a esperar pelo cocheiro.
- Por Deus, está frio! – Karine reclamou.
- Pegue o meu terno. – Chris retirou a peça de roupa e foi para trás da noiva. Quando estava colocando-a sobre os ombros de Karine, algo chamou-lhe a atenção. Uma carruagem muito sofisticada, até mesmo mais elegante que a dos Sherman, parou em frente ao teatro. Quem estaria esperando? A resposta veio após alguns segundos e foi ainda mais chocante do que ver um veículo tão imponente naquele local.
Dulce descia as escadas correndo, puxando para cima a barra do mesmo vestido que usara no primeiro ato, na cena da festa. Acenava para algumas pessoas que encontrava ao longo do caminho e, para a surpresa de Chris, adentrou a carruagem sozinha, sem ajuda. Ele nunca havia visto uma mulher subir em uma carruagem sem o auxílio de um homem.
- Precisamos ser rápidos hoje, Peter! – Ele ouviu a moça gritar para o cocheiro. Ele saiu com a carruagem o mais depressa possível, desaparecendo na esquina do quarteirão em poucos segundos. Chris ainda olhava paralisado para onde o veículo estivera parado. Por que uma moça de aparência tão nobre e talentos tão notáveis estaria atuando em um teatro como aquele?
- O frio te congelou, Christopher? – a voz arrogante de Karine trouxe-o de volta a realidade.
- Ah, me... Me desculpe. Me distraí por um minuto.
A moça sequer respondeu. Após mais alguns minutos de espera, a carruagem finalmente chegou e Marco não poupou repreensões ao cocheiro, que explicou o atraso devido ao cansaço de um dos dois cavalos. Acomodaram-se rapidamente e logo o veículo já estava em movimento.
- O que te causou tanto interesse pela peça, Christopher? Percebi que estava bastante entretido.
A pergunta de Karine pegou o rapaz desprevenido. Não sabia o que responder, afinal, não havia nada interessante naquela apresentação exceto a performance da tão impressionante Dulce.
- Ah, simplesmente achei interessante o fato de que... De... De estarmos em um local diferente. Era tão diferente do que estamos ambientados que acabei me entretendo. Uma ótima escolha a sua, Karine. – ele tentou mentir da maneira mais eficiente possível, torcendo mentalmente para que a invenção passasse despercebida.
- Acredite mais em mim da próxima vez, Christopher.
Ele apenas assentiu. O silêncio prevaleceu durante todo o trajeto. Como a casa dos Sherman era a mais próxima, foi a primeira parada do cocheiro.
- Tem certeza de que não deseja dormir aqui, Christopher? Você sabe que temos muitos quartos de hóspedes. – a senhora Sherman insistiu, como fazia toda vez.Chris, entretanto, queria distância daquela casa enquanto ainda fosse possível. Oumelhor dizendo, queria distância de Karine enquanto ainda fosse possível, afinal, em alguns meses estariam dividindo o mesmo quarto, a mesma cama.
- Não se incomode, senhora Sherman. Amanhã precisarei tratar de alguns negócios pela manhã mas estarei aqui antes do meio-dia.
- Tudo bem, querido. Tenha uma boa noite! – ela sorriu e acenou. Karine, por outro lado, sequer o encarou. Não que um aceno de Angelina fizesse muita diferença. Christopher sabia que não passava da mais pura falsidade.
O senhor Sherman deu-lhe um aperto de mão e em seguida também desceu da carruagem. Celine foi a última a se despedir, dando um abraço apertado em Chris e passando logo em seguida pela porta com o auxílio do pai. James, o cocheiro, fechou a passagem e voltou ao seu lugar.
- Irá direto para casa, senhor Uckermann? – ele perguntou.
- Sim, James.
Logo a carruagem estava em movimento novamente, assim como os pensamentos de Christopher. Sua mente era diretamente atraída para Dulce e seus olhos tão expressivos, tão profundos que seria possível se perder neles. Seus gestos, sua determinação, sua beleza... Suas curvas... Era tudo tão convidativo! Cada detalhe daquela atriz despertava seu lado mais insano. O lado que queria poder conhecer melhor aquela mulher, poder tocá-la, poder senti-la... Como havia se encantado tanto com uma mulher com quem ao menos havia trocado uma palavra? Nem o rapaz mesmo sabia. Mas de uma coisa Christopher tinha certeza: Ele descobriria.
A mesa do café da manhã na casa dos Saviñón estava, como sempre, muito farta. Geleias, queijos e pães diversos, café e várias outras coisas saborosas. Dulce olhava o jardim através da grande janela enquanto misturava, sentada à ponta da mesa, um pouco de café em uma xícara de leite quente. Via os jardineiros trabalharem de maneira incessável nos arbustos floridos que insistiam em criar galhos desalinhados aos outros já podados e moldados. A grama nunca deixava de ser tão verde quanto a mais bela esmeralda, mesmo em épocas de seca. O senhor Saviñón jamais deixaria que os vizinhos vissem em sua casa qualquer sinal de desordem.
Enquanto ainda observava o minucioso trabalho dos jardineiros, Dulce pensava no quanto sua peça havia obtido êxito na noite anterior. Até mesmo outros nobres tinham comparecido! Ela só esperava que não fossem conhecidos de seus pais...
- Acordou cedo hoje, filha. Algum motivo especial? – a mãe perguntou ao adentrar a sala de estar e, em seguida, sentar-se à mesma junto a filha.
- Apenas falta de sono. Não consegui continuar na cama. - ela respondeu, mirando o copo em sua mão e fingindo estar concentrada em deixar a bebida bem misturada.
- Entendo. Desse jeito ficará indisposta durante o dia, Dulce. Há semanas você não dorme direito. Não é bom para uma moça da sua idade.
- Posso ter apenas dezenove anos, mamãe, mas isso não me impede de ter insônia. Aliás, é impossível não ter insônia quando minha sentença de morte está cada vez mais próxima. – ela deu um longo suspiro.
- Sentença de morte? Por Deus, você poderia ser menos exagerada? Plablo é um bom homem!
- Pode até ser que sim, mas isso não significa que quero ser sua esposa. Não significa que o amo.
- Dulce, já conversamos sobre isso tantas vezes...
- Mas isso não quer dizer que eu tenha mudado minha opinião, mamãe. Enquanto puder, insistirei em lutar por meus direitos.
- E não obterá êxito, Dulce. – a voz do pai soou autoritária. Ele estava na porta, entrando no cômodo. Logo juntou-se à família na mesa, sentando-se ao lado da esposa.
- Bom dia para o senhor também, papai.
- De novo falando sobre este assunto? Você não entende que nada mudará o fato de que você e Plablo estarão casados em menos de dois meses? – ralhou o homem, enquanto enchia um prato de porcelana com biscoitos amanteigados.
- Eu não quero, papai! Por que tenho que ser obrigada a isso? Eu não o amo! Quero casar-me quando tiver vontade e me sentir preparada, quando encontrar alguém que eu realmente ame e...
- Basta! – o pai bateu na mesa com o punho fechado. Dulce e sua mãe se encolheram de susto e medo. Os olhos da jovem já começavam a marejar. – Cansei dessa sua mania de querer se desvirtuar dos valores! Até quando irá manchar a honra de sua família, Dulce? Mulheres não foram feitas para escolher ou questionar. Foram feitas para aceitar. Não quero ouvir mais nenhuma contestação sobre este assunto a partir de agora, ou você se arrependerá. Fui claro?
A pobre moça apenas assentiu, de maneira quase imperceptível, enquanto as lágrimas desciam descontroladas por seu rosto. O senhor Saviñón estava vermelho e com uma expressão nada amigável quando levantou-se rumo ao seu escritório, levando consigo seu prato de biscoitos e uma xícara de café. Bateu a porta com força ao chegar no aposento e então a casa foi preenchida pelo mais pesado silêncio.
Dulce chorava sem fazer qualquer ruído, ainda sentada na mesma posição. Não conseguia mover um músculo sequer, tamanha era sua perplexidade e medo. Dolores, sua mãe, apenas a encarava com pena, tentando não chorar junto com a filha.
Era aquilo que Dulce mais temia desde muito nova: que fosse obrigada a se casar com um homem tão inescrupuloso quanto aquele para quem sua mãe fora arranjada vinte anos atrás. E quem poderia garantir que o tal Plablo não era como seu pai, ou até mesmo pior? Dulce nem o conhecia! Não tinha ideia ao menos de como seria, por exemplo, sua fisionomia. Ele sempre mandava-lhe cartas e presentes, na maioria das vezes vestidos luxuosos ou joias realmente valiosas, mas ela sabia que seu carinho poderia não passar de uma mentira. Ele poderia esconder uma terrível fera por trás do semblante de bom moço. Quem garantiria que não? Sem falar que Dulce não se deixava enganar por presentes caros. Tudo o que ela desejava era apenas poder estar ao lado de alguém de quem realmente gostasse.
Passaram-se longos minutos de silêncio até que sua mãe se manifestasse.
- Querida, eu sinto muito...
- Eu sei, mamãe. E, perdoe-me dizer, mas também sinto pela senhora, por ter que se redimir a um homem como esse.
Sem dizer mais nada ou olhar para trás, Dulce levantou-se da mesa e subiu as longas escadas que levavam até seu quarto, no terceiro andar da casa. Jogou-se na cama e deixou que as lágrimas descessem sem pudor. Não conseguia pensar em mais nada além de como odiava sua vida e do quanto desejava poder fugir daquela casa. Só não realizava tal ato de rebeldia pois sabia que, se o fizesse, o pai iria até os confins da Terra para procurá-la e, quando a encontrasse – e ele com certeza encontraria -, faria com que se arrependesse até mesmo de ter nascido. Dulce não duvidava de que ele seria até mesmo capaz de matá-la. Não se essa fosse a única forma de manter sua tão sagrada honra.
Foi pensando na tão desejada fuga que Dulce adormeceu. Teve um sonho tenebroso no qual seu pai matava sua mãe, sufocando-a na frente da filha, e Dulce sabia que seria a próxima. Acordou suando, quase sem fôlego, e então começou a chorar ainda mais do que já chorava antes de dormir. Decidiu então levantar pedir às criadas para que lhe preparassem um banho. Meia hora depois, ela estava em seu banheiro, sua banheira cheia de água morna. Enquanto despia-se, dizia para si mesma que aquilo tinha sido apenas um terrível pesadelo que nunca se concretizaria.
Infelizmente, ela não tinha tanta certeza quanto à última parte de sua constatação.
È Tudo por Hj Beijos
Autor(a): Anna Uckermann
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