Fanfic: ** Ao avesso(Vondy)

Christopher

Eu já havia passado um tempo infinito nesse hospital, ou ao menos os poucos dias me pareciam ter se arrastado em milênios, e os minutos nunca pareciam correr mais rápido – Exceto quando Dulce inventava algum jogo idiota de dez ou vinte perguntas, ou simplesmente quando estava na presença irritante dela, o que era um mistério pra mim – mas dessa vez os segundos pareciam estar tirando uma com a minha cara.

Porque nós estávamos há uma eternidade nesse quarto, olhando um cara idiota com cabelo arrepiado e olhos claros  que continuava segurando a mão do corpo verdadeiro de Dulce, sem tirar os enormes olhos azuis dela. Não. Ele estava acariciando a mão dela com o polegar. Juro. E apesar de todo esse tempo aqui observando essa cena eu ainda estava tentando absorver o que acontecia.

Não estava nem aí se as amigas de Dulce apareciam e se jogavam em cima dela, abraçando-a, beijando-a, ou tanto faz. Não me importaria nem se o cachorro imaginário dela lambesse seu rosto e não desgrudasse dela por meses. Certo, vou rever esse conceito. Mas até hoje nenhum homem, de carne e osso, havia se aproximado desse quarto, que não fossem médicos ou enfermeiros, e eles não ficavam acariciando a mão dela. Como esse cara se atrevia a fazer isso? E ele não era nada dela, senão um amigo – conhecido! – morrendo de amores por ela, e isso foi bem fácil de extrair das palavras baixas que ele murmurava de vez em quando. Que diabos...

Dane-se, essa mulher irritante não me interessava. O único interesse que eu tinha nela era fazê-la calar a boca quando parecia engolir um maldito livro para expelir todas as suas palavras. Não era como se esse cara fosse uma ameaça. Eu não tinha motivos para me sentir ameaçado, em primeiro lugar, porque Dulce não significava nada pra mim. Essa era a verdade.

Mas admito que seria bem melhor se ela franzisse o cenho como o meu diante da cena, ao invés de estar apenas observando, quieta. Eu já a vi quieta assim muitas vezes, principalmente quando estávamos sozinhos. Era um silêncio confortável, onde não precisávamos de palavra alguma para tornar o ambiente melhor. Era o meu silêncio. Quando ela fazia essa expressão serena, os olhos amáveis desse jeito. Droga, não, esse era o nosso silêncio. Por que ela estava dirigindo-o a esse idiota que acariciava a mão dela?

Percebi apenas agora que eu estava mesmo irritado.

- Sério, você ainda não vomitou? – Resmunguei para ela, com cenho franzido.

- Por quê? – Avistei a sobrancelha arqueada dela.

- Esse cara não larga você faz décadas.

- Christopher, ele está aqui faz só alguns minutos. – Olhei-a de forma cética e ela finalmente franziu o cenho. Só que pra mim. – Ta, horas. E ele se chama Eddy.

-Eddy, dane-se. Ele podia ser o imperador e eu apenas continuaria a querer arrancar o braço dele.

- Pelo menos alguém se importa comigo, Sr. Eu Não Tenho Ninguém Ao Meu Lado Agora.

- Hm. – Eu queria completar com alguns palavrões ou a tentativa inútil de socar o idiota do carinha de cabelo arrepiado, mas me contive. Ainda tinha autocontrole, que estava sendo testado ao máximo. A imagem daquela mão segurando a delicada de Dulce não me agradava nenhum pouco, principalmente quando me lembrava do dia anterior.

Aquela mão deveria estar sendo segurada pela minha. Ela não se encaixava em mais nenhuma e era um fato óbvio, por que então Dulce não começava a xingá-lo e a tentar afastá-lo dali?! Seria uma tentativa inútil, mas ao menos seria uma tentativa! Eu ainda não podia acreditar que ela de fato estava gostando daquilo!

Eu ia vomitar se aquilo continuasse.

- Ele não acha que você está sentindo a mão dele, não é? – Resmunguei, revirando os olhos, impaciente. Dulce franziu o cenho de novo, mas eu já estava no limite. Virei-me para atravessar a porta a alguns metros. – Isso é ridículo.

- Não o culpe por você não saber o significado de ‘Afeto’. – Dulce parecia impaciente também. – É claro que eu sinto.

- Não. Você não sente. – Olhei-a, estreitando os olhos. A sensação da mão dela contra a minha formigava em meus dedos, minha palma. Droga. – Os únicos que pode sentir são eu, o Christian e o Gastão, admita.

E eu não queria que mais ninguém a tocasse, eu não queria que ela desejasse outra pessoa para sentir sua pele que não fosse eu. Merda. Mil vezes merda.

Saí do quarto sem me demorar nos olhos castanhos e no cenho franzido que me desafiava, porque eu já sabia o que estava acontecendo. Eu estava perdido.

Por Dulce.