Fanfic: Segredo.

Na volta para casa eu percebi que eu pegava o mesmo ônibus escolar que o garoto do molho de queijo.Passei por ele que sentava sozinho no segundo banco e fui me senter no fundo.Por sorte ele estava distraido, lendo um livro, se eu não me engano, era "Sonetos" de William Shakespeare.
Ele era realmente cativante, mas para a minha sorte é um nerd.Ou seja, sem chances de me relacionar com alguém assim.Me lembro que quando eu estava no primeiro ano do colegial fiz uma aposta com a minha melhor amiga, meu dever era paquerar um nerd durante a hora do lanche.Não aguentei cinco minutos, parecia que o garoto estava falando alemão ou coisa assim.Sorri com a lembrança, mas logo fechei a cara, a minha conciência me acusando do meu irrevogavel erro.É totalmente a minha culpa eu não ter mais momentos como esses.
O garoto do molho desceu dois quarteirões antes do meu ponto.Como era mesmo o nome dele?
Bom, melhor que eu não lembre mesmo, eu não quero me enturmar, mesmo que seja num grupo de nerds que só se juntariam para fazer programas do tipo feira de ciências ou revisões da matéria da ultima aula de quimica.
Cheguei em casa e tudo estava  silêncioso, provavelmente, Eric, meu irmão de 16 anos-que pensa ter 21-ainda não chegara.Ele passou o verão todo num acampamento de férias em algum lugar de Atlanta.Não vi nem sinal dele no colégio, então suponho que chegara tarde.
Minha mãe ainda estava no trabalho, ela é arquiteta e trabalha numa grande empresa, com filiais nos quatro cantos do mundo.Era uma mulher bem sucedida.Quem derá eu possa ser como ela daqui á alguns anos.Mas acho meio improvavel.Eu sou um fracasso.
Subi para o meu quarto.Tirei meu All Star encardido e chutei pra debaixo da cama, depois larguei a bolsa no chão, perto da poltrona no canto do quarto e me joguei na cama.
Coloquei meus fones nos ouvidos e liguei o meu ipod.Apaguei a luz e fechei os olhos, começando a minha terapia.
Tentei me perder no meio das batidas da musica e dos gritos, era um heavy metal dos anos 80.Não que eu fosse muito fã desse gênero, mas ele me ajudava a não pensar em nada e a passar o tempo.
Sem perceber, cai no sono e só acordei quando senti algo esmagando o meu estômago e puxando os fones do meu ouvido, arrancando eles bruscamente.
-Olá dorminhoca!-o alivio tomou conta de mim quando reconheci o rosto familiar.Meu irmão tinha a mesma cor de cabelos que eu, mas os olhos dele eram mais esverdeados.
-Eric seu fedelho!Porque demorou tanto pra chegar em casa?Como você está?E o verão?Muitas gatinhas?- me ajeitei, sentando-me.
-Foi bem legal até.Nós bebemos todos os dias até desmaiar!-ele sentou ao meu lado.
-Eu espero que você esteje brincando mocinho!-dei um beliscão na bochecha dele.
-Tá bom, eu tô exagerando.-ele sorrio-Mas eu curti muito esse verão.E você?Como foi o ultimo verão em California?Cara você é meio debil, trocar california por isso?
-Ha-ha-ha, não me insulte dessa maneira!Perdeu o amor a vida?-eu fingi uma ameaça.Eric, assim como mamãe, não sabiam do verdadeiro motivo.Eles até que souberam dos acontecimentos, mas não sabiam o quanto eu estava envolvida, e o quanto a culpa por tudo caia em mim.
-Mas falando sério agora, você tá bem?Eu quero dizer, pelo que aconteceu com a sua...
-Eu estou bem!-o interrompi.Eu realmente não queria falar sobre isso.Doia muito.-Mamãe estava preocupada com você!
-Ah, mamãe se preocupa demais, você sabe...-ele me olha por um instante-Eu fico feliz por você ter voltado, senti sua falta.
Eu sorri e o abracei.Meu pequeno irmãozinho-tecnicamente ele não é tão pequeno assim, na verdade está maior que eu.
-Vamos pra cozinha, eu vou preparar o jantar!-ele levantou me puxando pelo braço.
Eric fazia com que eu me senti-se melhor,ele é uma pessoa totalmente contagiante.Nunca o vi de mau humor, até mesmo quando discute com a minha mãe, ele faz questão de manter o sarcasmo.Ele era um garoto comum, que saia pra beber escondido com os amigos, mas sempre com conciência e limites.Me peguei sorrindo enquanto o ajudava com o jantar-era muito bom saber que ele estava se tornando um homem bom e responsavel- eu descascava as batatas para o purê, enquanto ele colocava os bifes para grelhar.
-Anahi...-ele hesitou.
Eu olhei pra ele, na frente do fogão.
-Que é?-perguntei curiosa.
-Eu sei que tem algo de errado com você, embora você negue.Eu não vou te forçar a me contar nada, mas se você precisar de alguém pra te ouvir, eu estou no quarto ao lado, você sabe.-ele falou sem tirar os olhos dos bifes.
-Tá.-foi tudo o que eu consegui dizer.Claro que meu irmão não era burro.Ele me pega no meu quarto, com a luz apagada, jogada na cama, ouvindo musicas que eu nem sequer gosto, é obvio que ele iria presumir alguma coisa.
Eu costumava ser como ele, á alguns meses atrás.Chuva ou sol, eu estava feliz comigo mesma.
Mas agora, é impossivel eu voltar a ser essa pessoa, quando a culpa de uma grande perda é totalmente minha.Eu mal consigo me olhar no espelho, e acho que eu jamais serei capaz de me perdoar.
Algum tempo depois mamãe chega, o jantar estava pronto e eu fui por a mesa, enquanto ela passava um sermão para Eric.
Quando terminei de arrumar a mesa, chamei-os para comer.
-Hum, que cheiro maravilhoso!Como foi seu dia querida?-ela se senta e começa a se servir.
-Ahn...Foi...Ótimo mamãe!-menti discaradamente.
-Fez muitos amigos já?Seu pai dizia que você era popular em california.-agora ela colocava o meu prato.
Não sabia o que disser.Olhei o meu irmão sentado do outro lado da mesa, ele me encarava curioso, enquanto minha  mãe ainda esperava pela minha resposta.
-Bom...lá foi muito fácil me enturmar, e hoje foi o meu primeiro dia mãe...-comecei a comer assim que ela me deu o meu prato afim de manter a boca ocupada.
-Espero que não esteje sendo dificil pra você, mas foi muito gentil de sua parte deixar o seu pai viver a vida dele.Ou melhor, recomeçar a vida dele com outra pessoa.-era notavel a presença de ciumes em sua voz.
Eu só acenti com a cabeça.Então quando o silencio na mesa começou a ficar tenso, Eric começou um assunto sobre o times de futebol, assunto o qual minha mãe - inacreditavelmente- estava sempre por dentro.
Fiquei mais um tempo com eles acentindo e dando risadinhas as vezes, mas sem ter noção do que eles falavam.Depois dei boa noite, alegando estar cansada e ao mesmo tempo ansiosa para o próximo dia, tinha que repor as minhas energias.
Tomei um banho rápido, vesti meu pijama dos Bob Esponja e me enfiei no meio das cobertas.Fechei bem os olhos, e me cobri até a cabeça, mas o sono não veio-era muito cedo ainda- então peguei o meu celular que estava em cima do criado mudo, e liguei.
-Alô, pai.
-Oi minha menininha, como você está?
Havia muito barulho no fundo, então presumi que ele não estava em casa.
-Eu estou bem.-respondi automaticamente- Sobrevivi ao primeiro dia de aula na nova escola.
-Isso é muito bom querida!-ele deu uma risadinha com a minha piada-Como estão todos ai?
-Estão todos bem...
-Ahn, mande um abraço pra eles, diga pro Eric me ligar de vez enquando.
-Direi.
-Filha, porque me ligou?Não que eu não goste de duas ligações, mas achei que você queria um tempo de tudo ligado a esse lugar.
Eu fiquei quieta, e desabafei.
-Ah..É que na verdade, eu não estou tão bem assim.-segurei o choro.
-Oh, querida, não fique assim.Se dê uma chance, você sabe que não é responsavel por nada disso, eu já lhe disse, todos lhe disseram.
-Não quem eu queria que disse-se.
-Eles continuam isolados querida.Não respondem as ligações de ninguem, eles precisam de um tempo, mas eu sei que não estão lhe culpando.
-Então porque pai?Porque me sinto uma criminosa, uma as...
-NÃO!Shiuu, calma querida.-ele me interrompeu-Calma, tente seguir sua vida, o que se foi, não volta e agora não podemos fazer mais nada, eu sei que você fez o que pode, então por favor Anahi, por favor, pare de se culpar.Eu tenho que desligar meu anjo, vou sair com Rachel, tudo bem?Se cuide e se comporte!Não dê dor de cabeça pra sua mãe porque se não ela vai disser que eu estraguei você, essa sua mãe loca e paranoica.
Eu ri com o tom indignado dele.
-Isso minha filha!Quero você assim , rindo!Agora tenho que desligar mesmo, ok?Qualquer coisa não resite em me ligar, e quando quiser voltar, eu estarei te esperando.
-Obrigada pai.Te amo.
-Também te amo, beijo.
Ele desligou e eu joguei o celular na poltrona.Respirei fundo.Sequei meus olhos molhados e me levantei.
Peguei cinco comprimidos na minha necessaire, desci até a cozinha pra pegar um copo d`água, e tomei.Eram alguns calmantes que um doutor me deu, quando eu ainda estava histerica e em choque.
Eu não estava histerica, nem em choque.Mas sabia que dois desses comprimidos me deixavam mole.Então cinco, concerteza me nocauteariam.
Voltei pro meu quarto, chequei o meu despertador e mergulhei minha cabeça em meu travesseiro.Não demorou muito e eu me afundei num mundo de rios escuros e fundos.Num mundo onde eu me sentia em paz.