Fanfics Brasil - 3 Capitulo ❤ Um Porto Seguro ❤

Fanfic: ❤ Um Porto Seguro ❤ | Tema: Ponny ❤


Capítulo: 3 Capitulo

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O CABELO DELE havia ficado grisalho poucos anos depois do seu vigésimo aniversário, o que provocou alguns comentários e piadinhas de seus amigos. Além disso, a mudança não foi gradual, com alguns fios aqui e ali adquirindo tons prateados. Em vez disso, em janeiro ele tinha a cabeça coberta por cabelos negros, e, em janeiro do ano seguinte, apenas uns poucos fios negros ainda resistiam. Seus dois irmãos mais velhos não tiveram o mesmo destino, embora ambos houvessem ganhado alguns fios brancos nas costeletas nos últimos anos. Nem sua mãe nem seu pai foram capazes de explicar aquilo; até onde eles sabiam, Alfonso Herrera era uma anomalia para os dois lados da família.


 


Estranhamente, aquilo não o incomodava nem um pouco. No ex- ército, ele chegou a suspeitar de que os fios grisalhos o haviam ajudado na carreira. Ele trabalhava na Divisão de Investigação Criminal, ou DIC, que tinha bases na Alemanha e na Geórgia e passara dez anos investigando crimes militares, desde soldados que simplesmente desapareciam dos quartéis até casos de invasão de domicílios, maus-tratos domésticos, estupros e até mesmo assassinatos. Ele fora promovido várias vezes, até se aposentar, aos 32 anos, com uma patente de major. Depois de completar seus afazeres e concluir sua carreira no ex- ército, ele se mudou para Southport, a cidade natal de sua esposa. Eles eram recém-casados e o primeiro filho estava a caminho.


 


Embora sua primeira ideia fosse a de procurar um emprego na polícia ou em alguma outra organização que promovesse o cumprimento das leis, seu sogro havia feito uma oferta para que ele comprasse o negó- cio da família. Era uma loja construída em estilo antigo que vendia artigos rurais, frutas, verduras, geleias e outras conservas. O imóvel havia sido feito com tábuas brancas, com venezianas azuis e alguns bancos do lado de fora; era o tipo de estabelecimento que já tivera seus dias de glória há vários anos, mas que, praticamente, não existia mais. Os quartos para a família ficavam no segundo andar.


 


Uma imensa árvore de magnólias trazia sombra para um dos lados da casa, e um carvalho ficava logo em frente. Apenas metade do estacionamento era feita de asfalto, enquanto a outra metade era coberta por cascalhos — e, mesmo assim, o lugar quase nunca ficava vazio. Seu sogro havia inaugurado a loja antes que Carly nascesse, quando não havia muita coisa além de fazendas e pastos ao seu redor. Mesmo assim, o homem se orgulhava de entender as pessoas e queria manter em estoque qualquer coisa de que eles precisassem — o que resultava em um lugar que chegava a ficar desorganizado com o excesso de produtos. Poncho tinha a mesma opinião e mantinha a loja quase do mesmo jeito.


 


Cinco ou seis corredores ofereciam frutas, verduras e produtos de higiene pessoal; refrigeradores ao fundo da loja transbordavam com todo o tipo de bebida, desde refrigerantes e água até cerveja e vinho, e, assim como em qualquer outra loja de conveniência, tinha várias prateleiras de salgadinhos, doces e muitos tipos de alimentos industrializados que as pessoas compram quando estão perto da caixa registradora. Mas era ali que as similaridades terminavam. Também havia inúmeros tipos de equipamentos para pesca nas prateleiras, iscas vivas e um outro balcão com uma churrasqueira e uma chapa quente operados por Roger Thompson, que já havia trabalhado em Wall Street e que se mudara para Southport em busca de uma vida mais tranquila.


 


Ao lado da churrasqueira, onde se podia comprar hambúrgueres, sanduíches, cachorrosquentes e outras delícias, havia algumas mesas e outros lugares para sentar. Havia também DVDs para alugar, vários tipos de munição, capas impermeáveis e guarda-chuvas, além de uma pequena seleção de best-sellers e clássicos da literatura. Além disso, a loja vendia velas automotivas, correias para motor e latas de gasolina, e Poncho fazia cópias de chaves com uma máquina nos fundos. Ele tinha três bombas de gasolina para os carros e outra no ancoradouro, caso algum barco precisasse encher o tanque — o único lugar onde era possível fazer aquilo fora da marina. Vários potes de picles, sacos de amendoim cozido e cestas de legumes frescos cobriam o balcão. Surpreendentemente, não era difícil controlar o estoque da loja. Algumas mercadorias saíam regularmente, outras não.


 


Como seu sogro, Poncho notava aquilo de que as pessoas precisavam assim que elas entravam em sua loja. Ele sempre percebia e se lembrava de coisas que outras pessoas não conseguiam, uma característica que o havia auxiliado imensamente nos anos em que tinha trabalhado para o DIC. Hoje em dia, ele passava um bom tempo examinando ou testando as mercadorias do seu estoque, tentando acompanhar as mudanças de preferências dos seus clientes. Poncho nunca imaginou que um dia faria algo assim, mas a decisão que tomara não lhe desagradava. Pelo menos ele podia ficar de olho nas crianças. JP estava na escola, mas Sophi só começaria suas aulas quando o outono chegasse.


 


E, assim, ela passava os dias com ele na loja. Ele montou uma pequena área para brincadeiras atrás da caixa registradora, em que sua filha, inteligente e comunicativa, parecia estar mais feliz. Embora tivesse apenas 5 anos, ela sabia como usar a caixa e calcular o troco, subindo em um banquinho para alcançar os botões. Poncho sempre se entretinha com as expressões no rosto dos estranhos quando ela começava a calcular o valor das mercadorias para eles. Mesmo assim, não era uma infância ideal para a menina, ainda que ela não tivesse condições de perceber. Sendo honesto consigo mesmo, Poncho tinha que admitir que cuidar das crianças e da loja demandava toda a energia que ele tinha.


 


Às vezes, sentia que mal conseguia dar conta de tudo — fazer o lanche de JP e deixá-lo na escola, preencher os formulários de pedidos para os fornecedores, reunir-se com os representantes de vendas e atender aos clientes, tudo enquanto se ocupava em manter Sophi entretida. E aquilo era apenas o começo. Ele se esforçava bastante para fazer coisas de que seus filhos gostavam, como andar de bicicleta, soltar pipas e pescar com JP, mas Sophi gostava mesmo era de brincar com bonecas, desenhar e fazer artesanato. E nem mesmo quando ele finalmente conseguia colocar as crianças na cama era possível relaxar, porque sempre havia algo mais a fazer.


 


A verdade era que Poncho nem sabia mais o significado da palavra “relaxar”. Depois que as crianças estavam na cama, ele passava o resto de suas noites sozinho. Embora parecesse conhecer quase todas as pessoas na cidade, ele não tinha realmente muitos amigos. Os casais que ele e Carly às vezes visitavam para jantar ou quando eram convidados para churrascos haviam se afastado de maneira lenta e inexorável. Uma parte era por sua culpa — trabalhar na loja e criar seus filhos ocupava a maior parte do seu tempo —, mas, às vezes, ele tinha a sensação de que sua presença deixava os outros casais desconfortá- veis, como se os lembrasse de que a vida era imprevisível e assustadora e que as coisas precisam de um único instante para dar errado.


 


Era uma vida cansativa e, às vezes, isolada, mas ele mantinha o foco em JP e Sophi. Embora com menos frequência do que antigamente, ambos continuavam tendo pesadelos depois que Carly se fora. Quando eles acordavam no meio da noite, chorando de maneira inconsolável, ele os segurava nos braços e sussurrava em seus ouvidos que tudo ficaria bem. Até que os pequenos conseguiam finalmente adormecer. No começo, todos haviam passado por uma psicó- loga. As crianças faziam desenhos e falavam sobre o que sentiam. Não pareceu ajudar tanto quanto ele esperava. Os pesadelos continuaram por quase um ano. De vez em quando, ao pintar figuras com Sophi ou ao pescar com JP, seus filhos ficavam quietos e ele sabia que eles sentiam saudades da mãe. Sophi chegava a mencionar isso numa voz parecida com a de um bebê, trêmula e incerta, enquanto as lágrimas lhe escorriam pelo rosto.


 


Quando isso acontecia, Poncho tinha certeza de que conseguia ouvir seu coração se estilhaçar, porque ele sabia que não havia nada que pudesse fazer ou dizer para melhorar as coisas. A psicóloga havia lhe garantido que as crianças eram fortes e que, desde que soubessem que eram amadas, os pesadelos iriam se tornar cada vez menos frequentes. O tempo provou que a psicóloga tinha razão, mas agora Poncho tinha que enfrentar um outro tipo de perda — algo que feria seu coração da mesma maneira. Ele sabia que as crianças estavam melhorando porque as lembranças que tinham da mãe estavam lentamente desaparecendo.


 


Eles eram muito novos quando a perderam — tinham 4 e 3 anos, respectivamente — e significava que, algum dia, sua mãe se tornaria mais um conceito do que uma pessoa para eles. Era inevitável, claro, mas não parecia certo para Alex o fato de que nunca se lembrariam do riso de Carly, ou do carinho com o qual ela os segurava nos braços quando eram bebês, ou que nunca soubessem o quanto ela os amara. Ele nunca foi muito adepto da fotografia. Era sempre Carly que pegava a câmera, e, consequentemente, havia dúzias de fotografias com Poncho e as crianças. Apenas algumas incluíam Carly.


 


Embora ele fizesse questão de folhear o álbum com JP e Sophi enquanto falava da mãe deles, Poncho começava a suspeitar de que as histórias estavam se tornando exatamente isso: histórias. As emoções que acompanhavam aquelas imagens eram como castelos de areia em meio à maré, lentamente se dissolvendo na água do mar. A mesma coisa estava acontecendo com o retrato de Carly que estava pendurado em seu quarto. Em seu primeiro aniversário de casamento, ele contratou um profissional para fotografá-la, apesar dos protestos. Ele ficou feliz por ter feito aquilo. Na foto, ela parecia linda e independente, a mulher forte que havia conquistado seu coração.


 


À noite, depois que seus filhos estavam na cama, ele ocasionalmente passava longos momentos olhando para a imagem de sua esposa, com suas emoções em um turbilhão. Mas JP e Sophi mal percebiam que aquele retrato existia. Ele pensava nela com frequência e sentia saudade do companheirismo que tinham entre si e da amizade que havia sido o alicerce sobre o qual o casamento fora construído. E quando se atrevia a ser honesto consigo mesmo, ele sabia que queria ter aquilo tudo novamente.


 

 Poncho se sentia muito sozinho, embora se incomodasse em ter que admitir aquilo. Durante vários meses depois de tê-la perdido, simplesmente não conseguia imaginar que viesse a se relacionar com outra pessoa, nem mesmo via a possibilidade de voltar a amar alguém. Mesmo depois de um ano, aquele era o tipo de pensamento que ele se forçava a afastar da mente. A dor ainda era muito recente, e as lembranças dos dias vividos com Carly eram fortes demais.  Passados alguns meses, levou as crianças ao aquário municipal e, quando estavam em frente ao tanque com os tubarões, ele começou a conversar com uma mulher jovem e atraente que estava ao seu lado. Como ele, a mulher também havia trazido seus filhos e, como ele, também não usava aliança no dedo.

 

Os filhos dela tinham a mesma idade de JP e Sophi, e, enquanto os quatro pequenos estavam distraídos apontando para os peixes, ela riu de alguma coisa que ele disse, o que fez Poncho sentir uma fagulha de atração — algo que o fez lembrar daquilo que um dia sentiu. Depois de algum tempo, a conversa chegou ao fim e os dois se afastaram em direções opostas. Mesmo assim, quando estavam saindo do aquário, ele a viu mais uma vez. Ela acenou para ele e, durante um instante, ele considerou correr até ela para pedir o número do seu telefone. Mas não chegou a fazer isso e, um momento depois, ela entrou no carro e saiu do estacionamento. Poncho nunca mais voltou a vê-la. Naquela noite ele esperou que uma onda de remorso e arrependimento viesse tomar conta dos seus pensamentos, mas, estranhamente, isso não aconteceu.


 

E o que fez no aquário também não lhe pareceu errado. Em vez disso, pareceu-lhe algo... normal. Uma coisa que não era excitante, ou alarmante, mas normal e, de algum modo, ele percebeu que estava começando a superar o que havia acontecido. É claro, aquilo não significava que ele estava pronto para mergulhar de cabeça na vida de solteiro. Se acontecesse, tudo bem. E se não acontecesse? Ele imaginava que só pensaria em atravessar aquela ponte quando chegasse até ela. Estava disposto a esperar até encontrar a pessoa certa, alguém que não somente trouxesse a alegria de volta à sua vida, mas que amasse seus filhos tanto quanto ele os amava.

 

Entretanto, ele sabia que, nesta cidade, as chances de encontrar uma pessoa assim eram ínfimas. Southport era pequena demais. Quase todas as pessoas que ele conhecia estavam casadas, aposentadas ou frequentando alguma das escolas locais. Não havia muitas mulheres solteiras na cidade, especialmente mulheres que aceitassem os filhos que ele já tinha. E, com certeza, esse era o detalhe que dificultava tudo. Ele poderia se sentir sozinho, poderia estar carente e querendo companhia, mas não estava disposto a sacrificar o bem-estar de seus filhos para conseguir isso. Eles já haviam passado por muitas dificuldades e sempre seriam a prioridade na vida de Poncho. Mesmo assim... havia uma possibilidade, ele imaginava.

 

Outra mulher despertava seu interesse, embora ele não soubesse quase nada a seu respeito, exceto que era solteira. Ela vinha à sua loja uma ou duas vezes por semana, desde o começo de março. Na primeira vez que a viu, ela estava muito magra e pálida, quase raquítica e digna de pena. Normalmente, ele não olharia duas vezes para ela. As pessoas que passavam pela cidade frequentemente iam à loja para comprar refrigerantes, gasolina ou salgadinhos; ele raramente voltava a ver aquelas pessoas. Mas aquela mulher não queria nada disso. Em vez disso, ela mantinha a cabeça baixa enquanto andava pelos corredores de verduras e legumes, como se tentasse passar despercebida, como um fantasma em forma humana. 
 

Infelizmente, para ela, aquilo não funcionava. Ela era atraente demais para não ser notada. Ainda não devia ter feito 30 anos, ele imaginou, e seu cabelo castanho tinha um corte irregular na altura dos ombros. Ela não usava maquiagem, tinha as maçãs do rosto proeminentes e seus olhos grandes e arredondados lhe davam uma aparência elegante, embora um pouco frágil. Quando ela veio até a caixa registradora, ele percebeu que, de perto, ela era ainda mais bonita do que ele havia notado enquanto andava entre os corredores. Tinha olhos de um castanho-esverdeado salpicado com tons dourados, e seu sorriso breve e distraído desapareceu tão rapidamente quanto surgiu. Sobre o balcão, ela não colocou nada além do estritamente necessário: café, arroz, aveia em flocos, macarrão, pasta de amendoim e alguns artigos de higiene pessoal. Ele pressentiu que, se iniciasse uma conversa, iria deixá-la desconfortável, e preferiu somar o preço dos produtos em silêncio. Enquanto se ocupava com os preços, ele ouviu-a falar pela primeira vez.

 

— Você tem feijões? Que não sejam daqueles enlatados? 
 

— Lamento. Não costumo ter esse tipo em estoque — respondeu ele. 

 

Enquanto guardava as compras dela em uma sacola, percebeu que ela olhava pela janela, distraidamente, mordendo seu lábio inferior. Por algum motivo, teve a estranha impressão de que ela estava a ponto de chorar. Ele limpou a garganta. 

 

— Se é algo que você vai precisar regularmente, eu posso falar com meus fornecedores e trazer alguns pacotes aqui para a loja. Preciso apenas saber de que tipo você gosta. 

 

— Não quero incomodar — disse ela.

 

 Quando ela respondeu, sua voz não era mais alta do que um murmúrio.

 

Ela pagou a conta com notas de baixo valor e, depois de pegar a sacola plástica, saiu da loja. Para sua surpresa, ela continuou andando depois de sair do estacionamento, e foi naquele momento que ele percebeu que ela não havia chegado ali de carro. Aquilo só fez aumentar sua curiosidade.
 

 Na semana seguinte havia feijões na loja. Poncho havia encomendado três tipos: feijão carioca, feijão-cavalo e favas, embora apenas um pacote de cada. Quando ela voltou, ele fez questão de mencionar que os feijões estavam na prateleira inferior no canto, ao lado do arroz. Trazendo os três pacotes até a caixa registradora, ela perguntou se ele teria uma cebola. Poncho apontou para um pequeno saco de cebolas que estava em uma cesta ao lado da porta, mas ela balançou a cabeça.

 

— Só preciso de uma — murmurou ela, quase como se pedisse desculpas, com um sorriso hesitante. Suas mãos tremiam enquanto ela contava as notas e, novamente, foi embora a pé.

 

Desde então, sempre havia feijões em estoque, sempre havia a possibilidade de comprar uma cebola que não estivesse dentro de um pacote com outras e, nas semanas que se seguiram àquelas duas primeiras visitas, ela acabou se tornando uma cliente regular. Embora ainda não falasse muito, ela parecia menos frágil e menos nervosa conforme o tempo passava. As olheiras dela estavam gradualmente desaparecendo e ela chegara a ganhar um pouco de cor durante os meses recentes, em que houve vários dias de tempo bom. Até um pouco de peso ganhara — não muito, mas o bastante para suavizar suas feições delicadas. Sua voz também estava mais forte e, embora esse fato não demonstrasse qualquer sinal de que estivesse interessada nele, aquela garota já conseguia olhá-lo nos olhos por mais alguns momentos antes de finalmente virar o rosto. Eles não haviam avançado muito além de frases como “Encontrou tudo o que estava procurando?” e “Sim, obrigada”, mas, em vez de fugir da loja como um cervo perseguido por caçadores, ela às vezes circulava mais tempo por entre os corredores e havia até mesmo começado a conversar com Sophi quando as duas estavam sozinhas. Foi a primeira vez que ele a viu baixar a guarda. Sua atitude tranquila e expressão aberta demonstravam que ela tinha afeto por crianças, o que o fez pensar que ele vira a mulher que outrora ela fora e que poderia voltar a ser, dependendo das circunstâncias. Da mesma forma, Sophi parecia ter visto algo diferente naquela mulher. Depois que ela saiu, sua filha disse que havia feito uma nova amiga e que ela se chamava senhorita Annie. Mesmo assim, isso não significava que ela se sentia confortável na presença de Poncho. Na semana passada, depois de ter conversado despreocupadamente com Sophi, ele a vira lendo as contracapas dos livros em estoque na loja. Ela não comprou nenhum e, quando lhe perguntou casualmente se estava procurando por algum autor em particular, Poncho notou um lampejo do velho nervosismo. Percebeu que não devia ter mencionado que a observara.

 

— Deixe para lá — disse ele, acrescentando rapidamente: — Não é importante.

 

Quando ela saiu pela porta, entretanto, parou por um momento, com a sacola de compras junto ao corpo. Virou-se levemente na direção dele e murmurou: — Eu gosto de Dickens. Ao dizer aquilo, ela abriu a porta e se foi, caminhando pela rua. Ele vinha pensando nela cada vez mais frequentemente desde então, mas eram pensamentos vagos, cercados por mistério e tingidos pelo desejo de conhecê-la melhor. Não que ele soubesse como fazer aquilo. Além do ano em que cortejou Carly, ele nunca fora muito bom no jogo do romance. Durante a faculdade, entre o tempo que dedicava à prática da natação e as aulas, tinha poucas oportunidades para sair com garotas. Enquanto esteve no exército, ele se dedicou totalmente à sua carreira, trabalhando bastante e sendo transferido de uma base para outra com cada promoção que recebia. Embora tivesse saído com algumas mulheres, em sua maioria eram romances efêmeros, que começavam e terminavam no quarto. Às vezes, fazendo um retrospecto de sua vida, ele mal reconhecia o homem que costumava ser — e ele sabia que Carly fora a responsável por aquelas mudanças. Sim, às vezes era difícil reconhecer-se, e, sim, ele se sentia sozinho. Poncho sentia saudades de sua esposa e, embora nunca tivesse contado a ninguém, ainda havia momentos em que podia jurar que sentia a presença dela por perto, cuidando dele e fazendo de tudo para que ele ficasse bem.

 

DEVIDO AO TEMPO EXCELENTE QUE FAZIA, a loja estava mais movimentada do que o habitual naquele domingo. Quando Poncho destrancou a porta, às 7 da manhã, já havia três barcos amarrados no ancoradouro esperando para que a bomba de gasolina fosse ligada. Como já era típico, enquanto pagavam pela gasolina, os donos dos barcos aproveitavam para comprar petiscos, bebidas e sacos de gelo para levar nos barcos. Roger — que estava trabalhando na churrasqueira, como sempre — não teve um minuto de folga desde que colocou seu avental, e as mesas estavam cheias de gente comendo salsichas empanadas, cheesebúrgueres e pedindo alguma dica sobre o mercado de ações. 
 

Geralmente, Poncho ficava no comando da caixa registradora até o meio-dia, quando passaria as rédeas a Joyce. Assim como Roger, Joyce era uma funcionária que facilitava muito o trabalho de cuidar da loja. Joyce, que havia trabalhado no tribunal até o dia de sua aposentadoria, veio “de presente” com a loja, por assim dizer. O sogro de Poncho a contratara havia dez anos e agora, mesmo contando 70 anos de idade, ela não dava qualquer sinal de que quisesse levar uma vida mais tranquila. Seu marido morrera alguns anos antes, seus filhos haviam se mudado para outras cidades e ela tratava os clientes como se fossem sua verdadeira família. Joyce era tão caracter- ística da loja como os produtos nas prateleiras. 

 

Além disso, ela entendia que Poncho precisava passar o tempo com seus filhos, longe da loja, e não se incomodava de ter que trabalhar aos domingos. Assim que chegava, ia direto para trás do balcão onde estava a caixa registradora e dizia a Poncho que ele podia ir para casa, parecia ser realmente a chefe do lugar em vez de uma das funcionárias. Joyce também era a babá, a única pessoa em quem ele confiava para ficar com as crianças se ele tivesse que sair da cidade. Aquilo não era comum — acontecera apenas duas vezes nos últimos dois ou três anos, quando ele se encontrara com um velho amigo dos tempos do exército em Raleigh — mas Poncho reconhecia que Joyce fora uma das melhores coisas que já acontecera em sua vida. Quando ele precisava dela, Joyce sempre estava pronta para ajudar. 

 

Enquanto esperava pela chegada de Joyce, Poncho andou pela loja, verificando as prateleiras. O sistema informatizado era ótimo para gerenciar o inventário, mas ele sabia que fileiras de números nem sempre contavam toda a história. Às vezes, achava que tinha uma noção melhor do que precisava ser reposto se realmente olhasse as prateleiras para verificar o que havia sido vendido no dia anterior. O sucesso de uma loja exigia que as mercadorias fossem repostas o mais rapidamente possível, e aquilo significava que, vez por outra, tinha que oferecer produtos que nenhuma outra loja oferecia. Ele tinha compotas e geleias caseiras, temperos em pó feitos com base em “receitas secretas” e que davam mais sabor às carnes e aos cortes de porco e uma boa variedade de frutas e vegetais enlatados produzidos nas redondezas. Até mesmo pessoas que faziam compras regularmente em supermercados como o Food Lion ou o Piggly Wiggly vinham frequentemente dar uma olhada na loja de Alex para comprar os produtos especiais que ele fazia questão de manter em estoque. 

 

Ainda mais importante do que o volume de vendas de um produto, ele gostava de saber sobre quando certos produtos eram vendidos, algo que não aparecia necessariamente nas suas planilhas. Poncho havia percebido, por exemplo, que o pão para cachorro-quente vendia muito bem aos fins de semana, mas raramente saía das prateleiras durante a semana; com pães tradicionais, era o oposto. Percebendo isso, aproveitou para manter mais unidades de cada um deles em estoque quando a demanda aumentava, e as vendas cresceram. Não era muito, mas o dinheiro extra o ajudava a manter sua pequena loja lucrando enquanto as grandes cadeias de lojas e supermercados tiravam a maioria das pequenas empresas locais do mercado.

 

Enquanto examinava as prateleiras, ele começou a imaginar o que iria fazer com as crianças naquela tarde, e decidiu levá-las para um passeio de bicicleta. Carly sempre gostou de colocar as crianças em um carrinho de bebê especialmente feito para ser conectado à sua bicicleta e de pedalar em direção à cidade. Mas um passeio daqueles não era o bastante para ocupar a tarde toda. Talvez eles pudessem ir de bicicleta até o parque... talvez fosse algo que eles quisessem fazer. Com uma rápida olhada em direção à porta da frente para ter certeza de que ninguém estava prestes a entrar na loja, ele correu até o cô- modo que servia como depósito na parte de trás da loja e colocou a cabeça para fora de uma janela. JP estava pescando no ancoradouro, a coisa que ele mais gostava de fazer na vida. Poncho não gostava de deixá-lo sozinho ali fora — ele não tinha dúvidas de que algumas pessoas o considerariam um péssimo pai por permitir que aquilo acontecesse —, mas Poncho sempre ficava no campo de visão das câmeras de segurança e Poncho podia vê-lo no monitor que ficava ao lado da caixa registradora. Era uma das regras da família e JP sempre a respeitara. Sophi, como de costume, estava sentada em sua mesinha atrás do balcão da registradora. Ela havia separado as roupinhas da boneca em diferentes pilhas e parecia alegre em trocar as roupas da boneca de um modelo para o outro. A cada vez que finalizava, ela olhava para Poncho com uma expressão alegre e inocente, e perguntava ao papai se ele achava que a boneca continuava bonita. Como se fosse possível para Poncho dizer que não achava.

 

 

Menininhas. Elas conseguiam amaciar os corações mais embrutecidos. Poncho estava organizando alguns dos frascos de condimentos quando ouviu soar a campainha que tocava quando um cliente abria a porta da loja. Levantando a cabeça por cima da gôndola, ele viu Annie entrar na loja. 

 

— Oi, senhorita Annie — disse Sophi aparecendo por trás da caixa registradora.

 

 — Você gosta das roupas que eu coloquei na minha boneca? Do lugar onde estava, ele mal conseguia ver a cabeça de Sophi por cima do balcão, mas ela trazia nas mãos... Vanessa? Rebeca? Qualquer que fosse o nome da boneca de cabelos castanhos. E a segurava para o alto para que Annie pudesse vê-la. 

 

— Ela está linda, Sophi — respondeu Annie.

 

 — Esse vestido é novo? 

 

— Não, eu o ganhei faz algum tempo. Mas ela não o usou nos últimos dias. 

 

— Qual é o nome dela? 

 

— Vanessa — disse ela.

 

 

“Vanessa”, pensou Poncho. Quando ele elogiasse Vanessa mais tarde, pareceria um pai bem mais atencioso. 

 

— Foi você que deu esse nome a ela? 

 

— Não, ela já veio com esse nome. Pode me ajudar a calçar as botas nela? Eu não consigo puxá-las até os joelhos. 

 

Poncho observava quando Sophi entregou a boneca para Annie e quando a cliente começou a calçar a boneca com as botas de plástico flexível. Por experiência própria, Poncho sabia que era mais difícil do que parecia. Uma garotinha não teria condições de puxar as botas para que se encaixassem. Ele teve dificuldades para fazer aquilo, mas, de algum modo, Annie fez com que tudo parecesse bem fácil.

 

 Ela devolveu a boneca e perguntou: 

 

— O que acha? 

 

— Está linda. Você acha que seria bom colocar um casaco nela? 

 

— Não está tão frio lá fora. 

 

— Eu sei, mas Vanessa é meio friorenta às vezes. Eu acho que ela vai precisar de um. 

 

A cabeça de Sophi sumiu por trás do balcão e logo voltou a aparecer.

 

 — Qual ficaria melhor nela? Um azul ou um roxo? Annie colocou um dedo na boca, analisando os casacos com uma expressão séria. Ela nunca conseguiu responder. Em vez disso, quando Poncho olhou para cima, percebeu que os olhos dela haviam se arregalado pelo medo. Virando-se para trás, ele percebeu o que ela havia visto no monitor que estava atrás dele: JP havia caído na água, ainda vestindo suas roupas, e se debatia, agitando os braços em pânico. Poncho sentiu sua garganta se fechando repentinamente e começou a se mover por instinto. Ele saiu correndo de trás do balcão, passando em disparada pela loja e pelo depósito. Ao abrir a porta, esbaforido, esbarrou em um caixote de toalhas de papel, derrubando-o no chão, mas não diminuiu o passo. 
 

— Acho que o roxo vai ficar mais bonito. Sophi assentiu. 

 

— É o que eu estava pensando também. Obrigada. 

 

Annie sorriu antes de desviar o olhar, e Poncho concentrou sua atenção nas mercadorias antes que ela percebesse que ele a observava. Com o canto dos olhos, ele viu Annie pegar uma pequena cesta de compras antes de ir para um outro corredor.

 

 

Poncho voltou para o balcão da caixa registradora. Quando ela o viu, ele acenou amigavelmente. 

 

— Bom dia.

 

 — Oi — ela tentou colocar uma mecha de cabelo por trás da orelha, mas era curta demais para ficar no lugar.

 

 — Só preciso pegar algumas coisas. 

 

— Me avise se não conseguir encontrar algo de que precisa. Às vezes os produtos são remanejados. 

 

Ela fez que sim com a cabeça antes de continuar a andar pelo corredor. Quando Poncho assumiu seu posto atrás da caixa registradora, ele deu uma rápida olhada na tela do monitor. JP estava pescando no mesmo lugar enquanto um barco se aproximava lentamente do ancoradouro. 

 

— O que você acha, papai? — perguntou Sophi enquanto puxava a barra das calças dele com uma mão e segurava a boneca com a outra.

 

 — Oh, ela está linda — disse Poncho, agachando-se ao lado dela.

 

 — E gostei bastante do casaco também. Vanessa é meio friorenta, não é?

 

 — É, sim. Mas ela me disse que quer brincar no balanço, então provavelmente vai ter que se trocar.

 

 — É uma ótima ideia. Talvez possamos ir ao parque depois do almoço. Se você quiser brincar no balanço também — propôs Poncho. 

 

— Não quero brincar no balanço. É a Vanessa que quer. E é só no faz de conta, papai. 

 

— Ah, tudo bem 

 

— disse ele, levantando-se. “Lá se vai o passeio no parque”, pensou ele.

 

Perdida em seu próprio mundo, Sophi começou a despir a boneca novamente. Poncho deu uma olhada no monitor para ver onde JP estava, bem no momento em que um adolescente entrou na loja, trajando apenas uma bermuda. Ele lhe entregou um maço de notas

 

 

— Para a bomba de gasolina no ancoradouro — disse ele, antes de correr para fora. Poncho registrou a compra da gasolina e acionou a bomba enquanto Annie vinha até a caixa registradora. Quando ela olhou por cima do balcão para ver onde Sophi estava, Poncho percebeu a mudança da cor dos olhos dela.

 

— Encontrou tudo o que precisava?

 

 — Sim, obrigada.

 

Ele começou a guardar as compras que ela fez em uma sacola plástica. 

 

— Meu livro favorito de Dickens é Grandes esperanças — disse ele, tentando parecer amistoso enquanto colocava os produtos na sacola. 

 

— Qual é o seu? Em vez de responder imediatamente, ela pareceu se assustar por ele ter lembrado que ela havia dito que gostava de Dickens

 

 

— Um conto de duas cidades — respondeu ela, com a voz suave. 

 

— Gostei desse também. Mas é uma história triste. 

 

— Sim. É por isso que eu gosto dela.

 

Como ele sabia que ela voltaria para casa a pé, ele colocou mais uma sacola ao redor da primeira. 

 

— Eu imagino que, como você já conhece a minha filha, é hora de eu me apresentar. Meu nome é Poncho. Alfonso Herrera. 

 

— O nome dela é senhorita Annie — disse Sophi por trás dele.

 

 — Mas eu já lhe falei isso, não lembra? Poncho olhou para Sophi por cima do seu ombro. Quando se voltou para Annie, ela estava sorrindo enquanto lhe entregava o dinheiro.

 

 — Apenas Annie — disse ela.

 

 — Prazer em conhecê-la, Annie. Ele tocou nas teclas e a gaveta da registradora se abriu com o som de uma sineta. 

 


Ele tocou nas teclas e a gaveta da registradora se abriu com o som

de uma sineta. — Imagino que você more aqui perto. 

 

Ela nunca conseguiu responder. Em vez disso, quando Poncho olhou para cima, percebeu que os olhos dela haviam se arregalado pelo medo. Virando-se para trás, ele percebeu o que ela havia visto no monitor que estava atrás dele: JP havia caído na água, ainda vestindo suas roupas, e se debatia, agitando os braços em pânico. Poncho sentiu sua garganta se fechando repentinamente e começou a se mover por instinto. Ele saiu correndo de trás do balcão, passando em disparada pela loja e pelo depósito. Ao abrir a porta, esbaforido, esbarrou em um caixote de toalhas de papel, derrubando-o no chão, mas não diminuiu o passo.


 

 

 Poncho abriu a porta dos fundos com toda a força, sentindo a adrenalina lhe correr pelo corpo enquanto saltava por sobre alguns arbustos, encurtando o caminho até o ancoradouro. Chegou sobre a estrutura de madeira correndo a toda velocidade. Quando tomou impulso e saltou, Poncho conseguiu ver JP na água, agitando os braços. 

 

Com o coração batendo forte contra as costelas, Poncho voou pelo ar e atingiu a água bem perto de onde JP estava. A profundidade não era grande — menos de dois metros, ele imaginava — e, ao sentir os pés encostarem no fundo lamacento, afundou até os tornozelos. Ele lutou para voltar à superfície e sentiu a pressão nos seus braços quando os estendeu para pegar JP.

 

 — Pronto, peguei você! — gritou ele.

 

 — Peguei você! Mas JP estava se debatendo e tossindo, sem conseguir recobrar o fôlego. 

 

 

Poncho teve que se esforçar para contê-lo enquanto o trazia de volta para a parte mais rasa da água. Depois, com um esforço imenso, levou JP para a margem coberta pela grama, com as alternativas lhe correndo pela mente: massagem cardíaca, respiração boca a boca, ou tentar forçar JP a expelir a água que havia engolido. Alex tentou fazer com que o filho deitasse de costas, mas o menino resistia. Ele se debatia e tossia, e embora ambos ainda estivessem dominados pelo pânico, aquela reação significava que JP ficaria bem. 

 

Poncho não sabia quanto tempo levara — talvez apenas alguns segundos, mas parecia ter demorado bem mais —, até que JP finalmente, ao tossir, cuspisse um jato d’água e pela primeira vez conseguiu recobrar o fôlego. Ele respirou fundo e voltou a tossir; inalou mais uma vez e tossiu novamente, embora, desta vez parecesse mais como se ele estivesse limpando a garganta. Ele puxou o ar mais algumas vezes, ainda afetado pelo pânico, e foi somente então que o garoto pareceu perceber o que havia acontecido.

 

Ele se aproximou de seu pai e Poncho o abraçou com força. JP começou a chorar, com os ombros tremendo. Poncho sentiu seu estômago embrulhar ao pensar no que poderia ter acontecido. E se ele não tivesse percebido que Annie estava olhando para o monitor? E se mais um minuto tivesse se passado? As respostas para aquelas perguntas faziam com que ele tremesse tanto quanto JP. Depois de alguns minutos, o choro de JP começou a diminuir e ele disse suas primeiras palavras desde que Poncho o tirou da água.

 

— Me desculpe, papai — disse ele, entre soluços.

 

 — Me desculpe também — sussurrou Poncho. Ele continuou abraçando seu filho, temendo que, se ele o soltasse, de algum modo o tempo começasse a retroceder e que, se aquilo acontecesse de novo, o resultado pudesse ser diferente. 

 

Quando finalmente conseguiu afrouxar os braços ao redor de JP, Poncho viu que havia um grupo de pessoas olhando para eles atrás da loja. Roger estava lá, assim como os clientes que estavam comendo perto da churrasqueira. Outros dois clientes esticavam os pescoços, provavelmente recém-chegados. E, é claro, Sophi estava lá também. Ele repentinamente voltou a se sentir um pai terrível, porque ele viu que sua garotinha estava chorando, com medo, e precisando dele, mesmo que estivesse aninhada nos braços de Annie.

 

 

PONCHO SÓ CONSEGUIU ENTENDER o que havia acontecido depois que ele e JP se trocaram e vestiram roupas secas. Roger havia preparado hambúrgueres e batatas fritas para as crianças e todos estavam sentados em uma mesa na área ao redor da churrasqueira, embora nenhum deles estivesse com o menor apetite.

 

 

— A linha do meu anzol se enroscou no barco quando ele estava saindo do ancoradouro e eu não queria perder minha varinha de pesca. Eu achei que a linha fosse arrebentar, mas ela me puxou para o rio e eu engoli muita água. Não consegui respirar e parecia que tinha alguma coisa me puxando para baixo — disse JP, hesitando por um momento. — Acho que deixei a vara cair no rio. 

 

Sophi estava sentada ao lado dele, com os olhos ainda vermelhos e inchados. Ela havia pedido que Annie ficasse um pouco com ela, e Annie continuava ao seu lado, ainda segurando sua mão. 

 

— Está tudo bem. Eu vou até lá daqui a pouco e, se não conseguir encontrá-la, pegamos outra para você. Mas se isso acontecer de novo, deixe a vara ir embora, certo? Josh respirou fundo e assentiu.

 

 — Me desculpe. 

 

— Foi um acidente — disse Poncho, para tranquilizá-lo. 

 

— Mas você não vai mais me deixar pescar.

 

 “E me arriscar novamente a perdê-lo?”, pensou Poncho. “De jeito nenhum”.

 

 Em vez disso, ele preferiu dizer: 

 

— Vamos conversar sobre isso mais tarde.

 

 — E se eu prometer que vou soltar a vara da próxima vez? 

 

— Como eu disse, vamos conversar sobre isso mais tarde. Agora, por que não come alguma coisa? 

 

— Não estou com fome. 

 

— Eu sei. Mas estamos na hora do almoço e você precisa comer. 

 

 

 

 

JP pegou uma das batatas fritas e mordeu um pequeno pedaço, mastigando-a mecanicamente. Sophi fez o mesmo. Na mesa, ela quase sempre imitava os movimentos de JP. Aquilo era o bastante para irritar JP, mas ele não parecia ter qualquer energia sobrando para protestar.

 

 Poncho se virou para Annie. Ele engoliu em seco, sentindo-se repentinamente nervoso. — Posso conversar com você por um minuto? 

 

Ela se levantou da mesa e ele a levou para longe das crianças. Quando estavam longe o bastante para que os meninos não pudessem ouvi-lo, ele limpou a garganta. — Quero agradecê-la pelo que fez.

 

 — Eu não fiz nada — protestou ela. 

 

— Fez, sim. Se você não estivesse olhando para o monitor, eu nunca iria saber o que estava acontecendo. Talvez eu não o tivesse alcançado a tempo — disse Poncho. Ele parou por um momento. 

 

— E obrigado por cuidar de Sophi. Ela é a coisa mais doce e carinhosa no mundo, mas é bastante sensível. Fico feliz por você não ter deixado que ela ficasse sozinha. Mesmo quando tivemos que subir e trocar de roupa. 

 

— Eu fiz o que qualquer pessoa faria — insistiu Annie. 

 

No silêncio que se seguiu, ela repentinamente percebeu o quanto estava próxima de Ponho e deu um pequeno passo para trás. 

 

— Olhe, acho que é hora de eu ir.

 

 — Espere — disse Poncho. Ele foi até os refrigeradores no fundo da loja. — Você gosta de vinho? Ela balançou a cabeça.

 

— Às vezes, mas... 

 

 Antes que ela pudesse concluir a frase, ele se virou e abriu a porta, retirando uma garrafa de chardonnay

 

— Por favor, eu gostaria que você aceitasse. Este é um ótimo vinho. Eu sei que você não imaginaria encontrar uma boa garrafa de vinho aqui, mas, quando estava no exército, eu fiz um amigo que me ensinou a apreciar. Apesar de ser amador, o considero um especialista, e é ele quem escolhe os vinhos que eu vendo. Tenho certeza de que você vai gostar. 

 

— Você não precisa fazer isso. 

 

— É o mínimo que eu posso fazer — disse ele, abrindo um sorriso.

 

 — É uma forma de dizer obrigado. Pela primeira vez desde que se conheceram, ela olhou nos olhos dele e não desviou o olhar.

 

 — Tudo bem — disse ela, finalmente. 

 

 

Depois de pegar suas compras, ela saiu da loja. Poncho voltou para a mesa. Depois de um pouco mais de persuasão, JP e Sophi terminaram de almoçar, enquanto Poncho foi até o ancoradouro para buscar a vara de pescar. Quando ele voltou, Joyce já estava amarrando seu avental e Poncho pôde levar as crianças para um passeio de bicicleta. Depois, todos entraram no carro e foram para Wilmington, onde viram um filme e comeram pizza, as atividades antigas e infalíveis quando é necessário passar o tempo com crianças. O Sol já havia se posto e eles estavam cansados quando voltaram para casa. Assim, depois de um banho e de vestirem seus pijamas, Poncho se deitou entre os dois na cama durante uma hora, lendo-lhes histórias, até finalmente apagar as luzes.

 

Na sala de estar, ele ligou a televisão e correu pelos canais por algum tempo, mas não estava muito disposto a assistir o que quer que fosse. Em vez disso, voltou a pensar em JP. Embora soubesse que seu filho estava em segurança no quarto, ele sentiu um arrepio, o mesmo medo que sentira antes.

 

 

 A mesma sensação de haver fracassado. Ele estava fazendo o melhor que podia e ninguém era capaz de amar seus filhos mais do que ele. Mesmo assim, não conseguia evitar sentir que, de algum modo, aquilo não era o bastante. Mais tarde, um bom tempo depois que JP e Sophi estavam dormindo, Poncho foi até a cozinha e pegou uma cerveja na geladeira. 

 

Ele a bebeu lentamente no sofá. As lembranças do dia estavam vivas na sua mente, mas, desta vez, ele pensava em sua filha e na maneira como ela se agarrava a Annie, seu pequeno rosto enterrado no pescoço dela. A última vez que ele vira aquilo fora quando Carly ainda estava viva. 


 

                     

  

 

                                               

 

 







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Autor(a): Elly_Belly

Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).

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Comentários do Capítulo:

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  • izabelaSpaniColungaPortillaHer Postado em 26/02/2016 - 19:03:25

    oi, postaaaaaaaaa mais!

  • francielle_oliveira Postado em 22/02/2016 - 15:35:33

    olá posta mais!


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