Fanfics Brasil - Defini-lo é como definir a mim mesma: o que faço, o que sou e o que sinto O safado do 105 (ADAPTADA)

Fanfic: O safado do 105 (ADAPTADA) | Tema: Rebelde


Capítulo: Defini-lo é como definir a mim mesma: o que faço, o que sou e o que sinto

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Dirigi sem rumo durante muito tempo. Peguei uma BR só para me distrair (e para poder pisar
fundo sem pena; quanto mais rápido, melhor). Fiquei me sentindo naquela música do Roberto Carlos, em que ele provavelmente leva chifres, pega seu carro, segue em alta velocidade e vai se lamentando, gemendo aos quatro cantos, exaltando o quanto está perdido e infeliz. Deprimente, eu sei. Seria engraçado se a perdida não fosse eu.



Segui rumo ao interior do estado durante quase quarenta minutos. Meu coração se acalmava aos poucos, enquanto eu me concentrava no asfalto e nas placas de sinalização. Tentava compreender o que havia acontecido. Cada detalhe foi selecionado e minuciosamente estudado pela minha cabeça parcialmente calculista. Foi muita reflexão... Muitas lágrimas, muita tortura mental.



Decidi pegar um retorno para voltar à cidade (quando não se tem para onde ir, a gente sempre se lembra de voltar), pois já estava me sentindo uma louca perturbada. Parei em um posto de gasolina, aqueles de beira de estrada, só para abastecer. Acabei comprando chocolates na loja de conveniência; e, claro, o meu fim de noite se tornou um pouco melhor, embora não menos dramático (sério, mais dramático do que lágrimas e estradas desertas, só lágrimas, estradas desertas e chocolate).



Coloquei todas as vantagens e desvantagens da situação na balança. Por incrível que pareça,
depois que medi tudo, as coisas pareceram vantajosas até demais para mim. Pensa direitinho: Karen havia me procurado de propósito, então certamente ela se sentiu ameaçada com a minha presença na festa. Se fui capaz de ameaçá-la, foi porque também percebeu a mudança que eu podia perceber no Calvin.



Eu o atingia. Ela sabia. Eu sei. Só ele que não sabe ainda.



Karen era sua melhor amiga (se bem que, depois daquela, ficou muito claro que a relação deles nunca foi de amizade), não podia ter feito aquela cena toda de graça, sem mais nem menos. A única coisa que prezava era a troca de favores sexuais, e espero que o Calvin tenha aprendido o que eu já lhe disse há algum tempo: aquela mulher nunca foi sua amiga de verdade.



A intenção da nojenta era mesmo me atingir, e pior, me separar dele; fazê-lo ficar contra mim
ou o contrário, o que acabou acontecendo, visto que fui embora morrendo de raiva. Mas, poxa... O safado mereceu. Seus planos mirabolantes para foder as mulheres da festa (menos eu!) eram nojentos e ridículos.



Confesso que passei a maior parte do tempo imaginando como o Calvin faria aquela proeza.
Certamente não daria conta de todas, então elas começariam a se tocar também. Credo. Sem contar que ficariam se revezando para receber a atenção dele; haveria mais de uma mulher para cuidar de cada parte de seu corpo. Uma confusão sem igual. Uma tosquice aguda. Será que aquelas vadias estavam cientes do que aconteceria? Pelo visto, sim. E aceitavam de bom grado.



Karen-quenga devia ter planejado aquilo junto com o Calvin. Arranjar vinte e cinco mulheres
dispostas a entrarem em um harém não podia ser uma tarefa fácil (eu ainda acredito na humanidade ou sou inocente demais?). Pensei nos homens da festa. Eram poucos, mas existiam. Será que participariam também? E o Carlos, participaria? Minha nossa... As dúvidas acabavam comigo, mas as certezas me deixavam ainda mais morta e enterrada.



Meu celular tocou algumas vezes. Em uma delas foi a Lilian, mas eu não estava a fim de atendêla.



Não queria falar com ninguém. Logo em seguida, um número desconhecido começou a insistir
muito. Acabei atendendo na quinta chamada, pois estava ficando temerosa, com medo de que alguma coisa grave tivesse acontecido.
Entretanto, para minha surpresa, era o Calvin.



– Alô?



– Ah, Dulce... Graças a Deus!



Merda! A voz dele estava desesperada.



– Como conseguiu meu telefone?



– Peguei com a sua prima... – Ah, é, Lilian devia ter amado receber a ligação dele.



– Espero que você não tenha preocupado a minha família.



– Não, não falei nada. Só pedi seu telefone, juro. Dulce... Volta pra casa. Por favor.



Olhei ao redor. Já estava na cidade de novo, e as ruas estavam mais desertas do que quando as deixei. Devia ser perto das três da manhã, na melhor das hipóteses.
Achei legal o Calvin não perguntar onde eu estava (não saberia responder direito mesmo). Só
pediu para que eu voltasse.



– Volto quando eu quiser. Sou livre.



Ele arquejou, acho que decepcionado. Tanto faz, também estava muito decepcionada.



– Por favor, Dulce. Estou preocupado. Volta... Por favor. Não vou me perdoar se alguma coisa
acontecer contigo.



Engoli em seco. Meu Deus... O que pensar? Como pensar? Desaprendi.



– Vá comer suas vadias. Preocupe-se com elas.



– Eu te avisei... Avisei mais de mil vezes... Falei que te machucaria. É a única coisa que eu sei
fazer.



– Não estou machucada. Ganhei aquela briga com a sua melhor amiga, ela que quebrou a cara!



Calvin riu, mas foi só um pouquinho. Não sei por que, mas acabei o acompanhando.



– Todos já foram embora – comentou. – Volta, Dulce.



– Todas? – enalteci o feminino.



– Sim. Eu... Planejei esta festa há muito tempo, mas nada faz sentido agora. Me perdoa, Dulce...



Devia ter percebido antes.



Um lado meu teve pena, mas mandei que ficasse quietinho, reduzido à sua insignificância, mais
calado que mineiro na hora do almoço.



– Percebido o quê? – quase gritei. Estava ficando mais nervosa ainda.



– Que não faria sentido.



– O quê não faria sentido, Calvin?



Parei em um sinal vermelho. Podia avançar por causa da hora elevada, mas estava quase
explodindo de ansiedade.



– Ficar sem você. Volta, Dulce... – Permaneci muda, estarrecida. Fechei os olhos, afundando no banco do carro, e lágrimas escorreram. Depois, como uma bobona, sorri. – Por favor, eu... eu... – Parou.


Ai, meu Deus! Você o quê, Calvin? O maldito parou de vez. Pensei em lhe perguntar (será que
ele diria a frase mágica? Minha nossa senhora dos perdidos na estrada... Tende piedade de mim!), mas o sinal ficou verde e me concentrei em dar partida. Estava muito deserto, e um assalto era a última coisa de que eu precisava.



– Estou voltando... – sussurrei.



– Obrigado.



– Não estou voltando por você, muito menos para você – menti feio. Nem sei como consegui
fazer charminho diante de seu desespero.



– Não importa, desde que volte. Agora, vou desligar para que dirija com atenção. Por favor,
venha devagar.



Calvin desligou mesmo, e nem me deu tchau. Argh. Não pude questionar nada. Só me restou
obedecê-lo.



Sentindo-me bem mais calma, mesmo que um turbilhão acontecesse nas minhas ideias, voltei
para casa sem maiores problemas. Estacionei em frente ao nosso jardim, como sempre. Calvin estava me esperando, sentado na escadinha de sua varanda. Soltou o ar dos pulmões quando me viu, e se levantou depressa.



– Desculpa... – adiantei, aproximando-me dele. – Estraguei a sua festa.



– Não me importo.



Calvin ainda vestia a mesma roupa, só que parecia meio surrada, como se tivesse bebido demais ou sofrido demais. Tentei acreditar na segunda opção.



– Menos mal. – Parei na sua frente.



– Onde esteve? – Que olhar esquisito era aquele?



– Por aí. Precisava pensar.



– Conseguiu? Eu não consegui.



– Não sei direito. É complicado.



Aquiesceu.



– Me perdoa... – murmurou. Parecia altamente envergonhado. Contudo, eu queria muito mais
que um pedido de perdão. Queria a redenção total daquele safado. Só assim, quem sabe, eu realmente o perdoasse. Porque, vou te dizer, a raiva que já senti daquele homem ultrapassou qualquer limite do possível.



Eu não sabia que podia sentir extremos tão intensos pela mesma pessoa.



– Perdoar pelo quê?



Calvin desviou os olhos. Pensou um pouco mais.



– Por não ter te dito antes o que estava planejando.



Sério, brochei. Se eu tivesse um pau duro, ele teria ficado mole no mesmo instante.



– Que diferença faria? – Foi uma pergunta retórica, pois eu sabia que não faria diferença alguma para mim. O meu ódio seria exatamente o mesmo.



Calvin cerrou os olhos com força. Evitou me encarar. Os lábios estalaram com irritação.



– Eu não sei. Só sei que você sempre tem razão. Karen não podia ter feito o que fez. Não me
conformo... Ela mentiu feio, mentiu pra mim, pra você... Dulce, eu juro que o que aquela louca te falou é mentira. Acredite em mim, por favor. Eu me arrependo até hoje de ter proposto dividir você com ela. Se eu pudesse voltar no tempo, eu... eu...



Fiz uma careta de sofrimento. Ele estava usando a mesma, eu acho.



– Da próxima vez, escolha melhor as suas amizades.



E, de preferência, mude de atitude.



– Não, já chega. Não quero amigos... Não quero troca de favores, não quero relações
pretensiosas. Serei como você, uma pessoa que prefere a solidão a companhias inúteis.



Eita... O coitadinho se revoltou.



– Eu não estou certa com relação a isso. Todo mundo precisa de amigos, Calvin.



– Já tenho uma amiga. – Finalmente me olhou. – Bom, se ela puder me perdoar.


Isso... Faz isso, Calvin. Maltrata a garota e depois joga ela na friend zone de novo. Muito típico
de você! Mas se lembre de que onde joga um, jogam dois.



– Não vou te perdoar por ser quem é.



Calvin arquejou ruidosamente.



– Tudo bem, Dulce, não sei mais o que fazer contigo. Acho melhor irmos dormir. Desisto.
Ele desistia? Alguém pode me dizer o que ele tinha para desistir? Em que momento o Calvin
havia tentado alguma coisa? Pelo amor de Deus, eu havia feito todo o trabalho, e mesmo assim ainda estava ali.



– Beleza. Tchau.



Entrei na minha casa sem olhar para trás, morrendo de raiva pela milésima vez naquele dia.
Tomei um banho, retirando de mim todo o serviço que foi feito no salão (em vão).
Joguei-me na cama, ignorando a camisa branca do Calvin, que já fazia parte fundamental da
minha roupa de cama. Não tinha mais o cheiro dele, pois eu a tinha lavado, mas era reconfortante mesmo assim.



Olhei a minha parede da Clarice. Desisti, como o Calvin. Não queria consolo. Queria uma boa
solução, ou outra direção a ser seguida. A ideia de aparecer com outro cara ainda martelava o meu juízo. O que me impedia era a maturidade. Eu não me perdoaria por uma atitude tão infantil, tão sem sentido. Não sou uma qualquer, nunca fui e jamais pretendo ser. Não preciso mostrar a ninguém que posso sair com quem eu quiser. Detesto esse tipo de jogo. Usar outra pessoa para os meus planos era uma atitude cruel, típica de vilã de novela, o que me faria exatamente igual à Karen.



Estava pensando novamente em desistir quando comecei a ouvir sons no quarto ao lado. Calvin tinha ligado o videogame. Fiquei em silêncio, acompanhando os ruídos, esperando o sono chegar. Nem o dele e nem o meu deu as caras.



Acabei indo dormir com o cantar de um galo, porém com uma nova ideia na mente. Sabia com o quê presentearia o Calvin. Ele não estava merecendo, mas, como amigo, estava sendo ótimo para mim. Eu só fiquei chateada com tudo porque nutria outras intenções. A culpa só podia ser minha mesmo. Dei um tiro no meu próprio pé.



Precisei sair cedo para visitar os meus pais, por isso quase não dormi. Era sábado, felizmente e infelizmente. A primeira coisa que perguntaram não teve nada a ver com o meu estado físico ou emocional; minha família veio logo questionando sobre o paradeiro do meu vizinho. Um saco ter que responder o que não tem resposta.


De um modo geral, o sábado até que foi tranquilo. Não fui a única preguiçosa, meus irmãos mal
saíram do canto. Dormi durante os filmes da tarde e jantei só por jantar. Conversei pouco, só o
bastante para ninguém perceber que eu não estava cem por cento. Sentia-me exausta, de verdade.



Cansada até para comer (raridade completa), o que me fez perceber que eu estava ficando doente por dentro.
Fui ao shopping assim que saí da casa dos meus pais. Demorei um pouco, mas encontrei o que eu queria. Tinha dúvidas e mais dúvidas sobre o quê exatamente comprar (morria de medo de errar e acabar presenteando o Calvin com uma coisa que não ia servir), mas o vendedor me ajudou bastante, e acabei realizando uma boa compra.



Quero dizer, eu achei que sim. Só saberia quando visse os olhos do Calvin ao abrir a embalagem. Esperava lhe causar fortes emoções, pois o presente era significativo. Havia um conjunto de ideias por trás daquele objeto, e o vizinho com certeza entenderia o que quis dizer.



Pensei em escrever outro bilhete, mas desisti. Não havia nada mais a ser dito. Também estava
cansada de dizer, de espernear, de tentar fazê-lo entender o que ele já tinha entendido (safadeza não é demência, certo?) e lutava contra.



Cheguei em casa perto das dez horas. Tomei um banho, vesti algo confortável e apenas esperei por ele, morrendo de medo de vê-lo com alguma vadia naquela noite. Já que o maldito tinha se dado mal na noite anterior, talvez estivesse pensando em descontar nesta. Porcaria.


Pedi aos céus para que chegasse sozinho e me desse a oportunidade de lhe entregar o presente. Deitada na minha cama, olhando e relendo a minha parede – encontrando consolo, conforto e força dentro de mim mesma –, ouvi-o chegar. Calvin só abriu a porta do quarto e se jogou com tudo na cama, o que me fez pensar que estava com alguém.



Fechei os olhos e esperei os ruídos. Aquela era a sua última chance. De verdade. Se estivesse
com alguém, jurei por Deus, desistiria de tudo ali mesmo e jamais entregaria o presente. Nunca mais pensaria em conquistá-lo.
Posso ser teimosa tanto para seguir quanto para desistir.



– Dulce? – sua voz soou cansada, meio rouca. Meu coração parou no tempo. Suspirei aliviada,
porque àquela altura desistir seria mais difícil do que continuar. E olha que continuar não era nada
fácil.



– Calvin – murmurei de volta, quase chorando. Eu estava vivendo no limite. Meus nervos não
aguentavam mais nada.



– Queria tanto que você falasse o meu nome.



Oh, céus... Alguém me ajude!



Cerrei o punho, tentando não ter um troço. Meu cérebro conseguiu captar uma voz estranha
demais vinda do outro lado da parece. Percebi que o Calvin não estava bem.



– Eu queria muito saber o nome do homem que... – Merda completa. – Mas eu queria ainda mais saber se ele está bem.



Calvin demorou a responder. Ouvi alguns suspiros.



– Não sei... Acho que estou. Acabei de chegar do hospital.



Sentei-me na cama tão rápido que fiquei tonta. Minha vista embaçou por alguns segundos.



– O que você tem? – Pareci uma maníaca desesperada. Lembrei-me logo da minha avó. Se
alguma coisa acontecesse com o Calvin... Não queria nem pensar nisso.



– Acho que é só uma gripe mesmo.



– Tem certeza? – A gente também pensava que a minha avó estava com gripe! Ai, Senhor! – O
que está sentindo?



– Dor de cabeça, febre... Mas passou, estou medicado. Só me restou a moleza mesmo. Fui ao
médico só para pegar atestado...



– Não foi trabalhar hoje? – Levantei-me da cama e troquei de blusa. Coloquei uma mais casta,
sem decotes e de manga comprida. Decidi trocar o short também, pus um bem menos apertado.



A última coisa que eu queria era ser chamada de provocadora de novo.



– Não... Mal consegui sair da cama hoje.



O coitado passou o dia inteiro sozinho? Puta merda...



– Por que não me ligou?



– Você estava com seus pais... Não queria inco...



– Estou indo aí – interrompi-o. – Agora.



Esperei que respondesse alguma coisa, mas Calvin ficou calado em condescendência. Peguei o presente e fui. A porta de sua casa estava aberta, por isso entrei e caminhei diretamente até o quarto dele.



As luzes estavam apagadas, mas havia um abajur fornecendo ao ambiente uma meia-luz
agradável. Bati na porta aberta do quarto só por educação. Sorri quando ele sorriu ao me ver. Estava deitado, vestindo só uma cueca preta (eu não posso provocar, mas ele pode, né?), porém havia muitos travesseiros debaixo de sua cabeça, de forma que ficava quase sentado.



Aproximei-me devagar, mostrando-lhe o presente. Ele sorriu ainda mais. Parecia um pouco
abatido, tinha olheiras ao redor de seus olhos, mas estava bem. Pelo menos, ia ficar. Não parecia que ia morrer. Amém.



– Demorou, mas aqui está o seu presente!



Sentei ao seu lado e lhe entreguei a embalagem. Calvin a segurou, porém ficou me observando com aquele sorriso lindo estampado em seus lábios. Passou muito tempo apenas me olhando. Acho que nunca me senti tão apaixonada por alguém.



Ele foi retirando a fita vermelha devagar, sem deixar o sorriso morrer. Quando livrou a
embalagem, em vez de abri-la, veio com a fita na minha direção. Ergueu os meus cabelos e a passou pela minha nuca. Depois, fez um laço em cima, criando uma espécie de tiara.



Ficou me olhando. Ainda sorria. Os olhos brilhavam. Tive vontade de morrer, mas não ousaria.
Não naquele instante. Precisava viver para conferir aqueles olhos apaixonados apontados para mim. É isso mesmo. Apaixonado. Este era o estado daquele homem lindo.
Eu venci. Consegui. Só me restava dar o golpe de misericórdia.



– Obrigado pelo presente... – sussurrou, desfazendo o laço no topo da minha cabeça. Deixou a
fita escorrer. Meus olhos se encheram de lágrimas. – Você é o maior presente que a vida me deu, Dulce.



Soltei um soluço-risada. Tentei fazer as lágrimas não caírem. Fiz o mais esforço que foi
possível. Calvin deixou seus dedos brincarem com o meu rosto. Sentou-se de vez na cama,
aproximando-se mais. Sei que ele ia me beijar, mas alguma coisa estava faltando. Não ia me deixar levar até estar realmente segura e completa.



– Vamos... Abre o presente... – falei baixinho.



Calvin aproximou nossos lábios.



– Estou abrindo.



Comecei a rir, afastando-me um pouco. Deixei suas mãos e lábios no ar. Precisei de uma força
de vontade enorme para isso. Eu estava provocando, e nem precisava de roupa curta para tal.



– Bobinho... Abre logo! – Peguei a embalagem em cima da cama e entreguei a ele. Calvin
desistiu de “me abrir”. Sem demorar, retirou o objeto de dentro.
Ficou olhando com uma expressão confusa. Era um joystick de videogame, igual ao que ele já
tinha. Continuou bastante confuso, e achei que valia uma explicação.



– Será que você aceita um segundo player?



Olhou para mim, estupefato. Sorriu.



– Vou acabar contigo no Mortal Kombat!



Calvin praticamente voou da cama. Sua disposição retornou de um segundo para o outro. As
luzes foram acesas, a TV e o videogame foram ligados. Achei lindo observar seu lado adolescente enquanto deixava tudo pronto para que jogássemos.
Sentou-se ao meu lado, entregando-me o comando novo. Nossas pernas se encostaram uma na outra.



– Não, este é seu. Posso ficar com o antigo...



Peguei o outro, e iniciamos o jogo. Sempre fui boa em jogos de luta no videogame, mas o Calvin é um verdadeiro apelão. Sabia todos os comandos de cor e salteado, e é claro que realmente acabou com a minha raça.



Foi um momento superdivertido. Ri horrores com ele. O doido joga fazendo palhaçadas e
falando com os personagens. Quero dizer, acho que só jogou assim porque tinha companhia. Acabei entrando na onda dele também; se é para zoar, a gente zoa.



Depois dos jogos de luta, ainda jogamos um de matar zumbis (Calvin repetiu o nome do jogo
dez vezes, mas não consegui pronunciar em nenhuma delas), e depois futebol. O tempo passou que eu nem senti, admito. Tudo estava tão bom que eu não queria que a noite acabasse nunca; dava de mil a zero na noite anterior.



Nossos conflitos nem sonharam em surgir, e as palavras de ordem foram diversão e amizade
(nem tanto, pois ele tentou me beijar algumas vezes, eu que não quis). Varamos a madrugada, que foi regada a chocolate quente (eu que fiz) e biscoitinhos caseiros de leite (Calvin tinha feito e guardado no armário).



Quando nos cansamos de videogame, deitamos na cama. Já era muito tarde, porém o sono não queria nos atingir. Mantive certa distância do meu querido vizinho safado. Ainda faltava o algo mais. Não me contentaria com pouco. Lutei bastante para ter exatamente o que mereço, sei que qualquer passo em falso colocaria tudo a perder.



Calvin percebeu a minha distância e não insistiu, mas percebi resquícios de decepção pairando sobre ele. De repente, colocou-se de pé. Andou até a estante e retirou de lá um dos livros da Sra. Klein.
Tornou a se deitar ao meu lado.



– Quer ler um pouco?



– Leia para mim – pedi.



Peguei o livro em suas mãos. Chamava-se “A paixão segundo G.H.”, da Clarice Lispector. Já
tinha ouvido falar nele, embora não soubesse do que se tratava, e fiquei logo interessada.
Calvin pegou seus óculos na primeira gaveta da mesinha de cabeceira, a mesma que tinha a
minha foto logo em cima. Que, por sinal, ainda estava lá. Ainda era estranho vê-lo usando aqueles óculos, mas eu podia me acostumar facinho.



Ele foi se deitando e me levando junto, obrigando-me a terminar com a cabeça apoiada em seu
peito. Relaxei completamente. Entreguei-me ao momento singular; deu para sentir um calor delicioso tomando o meu corpo, intensificando a sensação de proteção que só ele podia me fornecer.



– “A paixão segundo G.H.”... – leu o título bem devagarzinho, em voz alta. – Já leu?



– Ainda não... E você?



Riu.



– Umas trezentas vezes.



– Gosta dele tanto assim?



– Uhum... – Balançou a cabeça, vislumbrando a capa. Demorou demais para começar a leitura.
Fiquei sem entender seus motivos. – Tem certeza de que quer fazer isso, Dulce?



– Claro. Por favor, leia para mim...



Um suspiro fez o topo da minha cabeça eriçar. Apenas esperei. Não sabia o que se passava
naquela cabecinha oca, e nem fiz comentário algum.
Ele começou a ler devagar. Já no início, percebi que seria uma leitura densa, repleta de
significado. Confesso que foi difícil entender o primeiro parágrafo, e por isso comecei a rir.



– Ela é meio louca mesmo... – Calvin comentou, rindo junto.



– Sensacional! Adoro gente louca...



– Eu também!



– Vamos, repete este começo.



– “... estou procurando, estou procurando. Estou tentando entender. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi. Não sei o que fazer do que vivi, eu tenho medo dessa desorganização profunda.” – Calvin lia muito bem. Sua entonação era bastante interessante, e me perguntei se ele já havia feito leitura em voz alta para outra pessoa, ou para si mesmo. Contudo, não ousei interrompê-lo. Tentei me aprofundar, participar da mente louca e inteligente da Clarice.



Calvin estava muito empolgado, mais do que com o videogame. A cada palavra que saía de sua boca, mais encantada e perdida eu ficava. Sentia-me enriquecida tanto pelas reflexivas palavras da tia Lispector quanto por aquele sentimento profundo que eu carregava no peito.
Deu para sentir a magia de cada instante. Às vezes, achava que estava sonhando, vivendo uma irrealidade bem distante de mim. Em outros segundos, achava que aquilo era a coisa mais lógica que tinha para acontecer na minha vida. Os opostos dos meus pensamentos se mesclaram com as ideias da Clarice, e me vi entrando em um labirinto de reflexões e sensações. Foi perfeito.



Depois de mais de meia hora de leitura, ele se cansou. Pediu para que eu lesse, mas me recusei. Aleguei que leríamos um pouco a cada noite, e assim manteríamos um ritmo frequente. Calvin concordou, meio que sem acreditar na minha proposta. Percebi a sua total confusão, o coitado estava mesmo perdido. Sua ficha ainda não tinha caído. Ou será que eu estava imaginando coisas demais?



O receio e a dúvida se fizeram presentes de novo. Eu queria tanto que tudo desse certo, e que por um milagre estava dando, que a única coisa que me sobrou foi o medo de dar errado.
Calvin colocou o livro e os óculos de volta na mesa de cabeceira. Eu ainda estava deitada sobre seu peito, e ele não havia me tocado até então; abraçou-me com suavidade e começou a brincar com os meus cabelos. O clima, instantaneamente, esquentou muito. Percebi o meu corpo se excitando, desejando seu toque, seus beijos, sua total entrega.



Resfoleguei.



– Meus pais perguntaram por você.



Ouvi seu risinho. Não podia vê-lo naquela posição, por isso meu olhar se fez fixo na TV
desligada.



– Eles são ótimos. Você tem muita sorte.



– Sim. – Era a mais pura verdade.



Achei o Calvin meio tristinho depois que disse aquilo. Não foi a minha intenção, só comentei
sobre os meus pais para que ele se sentisse bem-vindo. Jamais queria vê-lo desamparado de novo.



– Meu pai teve câncer na próstata. Foi difícil – comentou, do nada.



Fechei os olhos. Merda. Eu não sabia aquela informação porque não tive chance (e nem coragem) de perguntar sobre como havia sido a morte de seu pai.


– Ele sofreu muito? – murmurei.



– Sim... Mas acho que sofri mais. Ver alguém morrendo aos poucos deve ser pior do que morrer aos poucos. Preferia ter ido no lugar dele.



– Não fale assim.



– É a verdade. Bom, era a verdade... Agora, não é mais.


– Por quê?



– Você me fez mudar de ideia.



Engoli em seco. Levantei o meu rosto para encará-lo de perto. Calvin estava muito perturbado.



– Calvin... Por que está me falando isso agora? Não quero que esta noite acabe triste. Não quero te deixar mal.



Ele alisou o meu lábio inferior.



– Você me faz muito bem. – Ai, meu Deus. Meu cérebro derreteu todo, deve ter ficado igual a
uma amoeba. Olhos escuros me atingiram em cheio. – É só que... Era o que faltava.



– Faltava? Para o quê?



– Para você saber tudo o que é relevante sobre mim. – Seus dedos saíram dos meus lábios e
foram para os meus cabelos de novo. Fiquei mais parada que estátua. – Agora, você é a única pessoa no mundo que realmente me conhece.



Não soube o que dizer, por isso apenas sorri, emocionada. Orgulho e honra me definiram. Olhei o relógio na cabeceira. Eram cinco da manhã. Minha nossa, já havia amanhecido!
Suspirei.



– Está tarde... Ou cedo, sei lá. Você precisa descansar. – Conferi a temperatura dele. Toquei-lhe a testa e o pescoço, constatando que estavam um pouco quentes. – Está febril, Calvin. Vou buscar água para que tome seu remédio.



Levantei-me, e por um segundo achei que o Calvin não permitiria a nossa distância. Quase não
me largou, mas acabou fazendo. Fui à cozinha e peguei o copo com água. Ele apareceu com o remédio em mãos quando eu já ia voltar para o quarto. Tomou-o na minha frente, e sorri mais uma vez, satisfeita com sua obediência.



– Boa noite, Calvin. Ou melhor, bom dia.



Largou o copo em cima da pia e me olhou de um jeito estranho.



– Bom dia. Me perdoa, Dulce... Me perdoa por tudo e... – Meu Deus, ele estava desesperado. – Obrigado... Por tudo.



– Amigos são para isso. – Pisquei um olho.



Tuchê. O golpe de misericórdia foi muito bem dado. Soou como um fatality no Mortal Kombat.
Dei as costas e fui saindo de sua casa sem mais demoras. Fui embora antes que a prudência me deixasse e eu me atirasse de vez nos braços dele. Estava vivendo por um triz.



Atravessei nossas varandas, percebendo que, sim, havia amanhecido. O clima estava friozinho,meio escuro por causa do sol fraco. O jardim umidificava o ar consideravelmente. Inspirei com vontade, renovando o meu fôlego.



Entrei na minha casa, fechei a porta e estaquei. Soltei todo o ar que havia inspirado, como se
tivesse ficado sem respirar não durante aqueles segundos, mas sim durante todo o tempo em que estive com o Calvin.



Só Deus sabe como consegui resistir. E o porquê de eu ter insistido em resistir. Nem eu mesma me compreendi. De qualquer forma, sentia-me vitoriosa. Se tivéssemos transado não teríamos passado momentos tão agradáveis.



Ouvi batidas na minha porta, e logo fiquei alarmada. Na verdade, tomei uma espécie de susto.
Sequer pensei em conferir pela janela, fui logo escancarando tudo.
Era o Calvin. Olhava-me seriamente.



- Christopher



Franzi o cenho e olhei para baixo. Juro que não entendi. Quero dizer, cheguei a achar que alguma coisa havia “caído” no chão (demência tem limite). Depois de um segundo foi que percebi o que tinha de fato caído: a máscara dele e o meu coração, que devia estar fazendo a dança da minhoca na cerâmica.



– Hã? – Dã.



– Meu nome é Christopher,Dulce.



Levei uma mão à boca para conter um soluço. Meus olhos se encheram de lágrimas, e comecei a derrubá-las no instante seguinte.



– Eu... Eu... – gaguejei feio.



– Sei muito bem como eu quero que este dia termine... Ou comece.



Sua seriedade quase não entrou de acordo com o que fez logo em seguida; tomou-me em seus
braços e me deu um longo beijo de novela, com direito a lábios frenéticos, línguas saudosas e rostos que não se decidiam em qual lado iriam ficar.


Pulei em cima dele sem pensar duas vezes, e o Christopher  (ai, meu Deus, eu sei o nome dele!) segurou meus cabelos ondulados, longos e castanhos. Praticamente correu até o meu quarto, levando-me junto de uma forma quase emergente.


 Não consegui respirar ou parar de beijá-lo.


Fomos atirados na cama. Suas mãos percorreram a minha pele branca por debaixo da blusa, e em questão de segundos ele já fazia questão de me despir dela. Gemi quando sua boca encontrou o meu pescoço.


 – Que saudade... Que saudade, Dulce...


 Gemi ainda mais. Ele parou só para me ver. O castanho-escuro de seus olhos fitou o castanho médio dos meus.


 -Christopher... – falei o seu nome pela primeira vez na vida. Ele sorriu, nitidamente emocionado. Eu também estava muito, muito emocionada mesmo.


 Havia parado de chorar só para beijá-lo, mas a vontade ainda permanecia.


 Por menos importante que seja um nome, sabê-lo tardiamente me fez criar um valor incrível com relação a ele. Um nome é só um nome, e continuará sendo, mas poder definir o dono dos meus desejos, pensamentos e coração foi imprescindível.


 – Dulce, eu... Eu... – Esperei com ansiedade, mas o maldito parou.


De novo (oh, minha nossa senhora, faça este homem desembuchar logo!). Seus olhos confusos até demais foram dando lugar à firmeza, e só tive a certeza de que ele não ia falar o que falou em seguida:


 – Eu vou te f/oder até você gritar o meu nome por tantas vezes quanto deixou de gritar até agora.


 Afundou a sua boca na minha, impedindo-me de reduzir a pena que me impôs com tanto desejo enraizado. Mas tudo bem, porque eu teria tempo de sobra. Era domingo, e os meus domingos sempre serão dele.


 É isso aí, Clarice. Liberdade é pouco. O que eu desejo tem nome, e se chama Christopher.


_________________________________________________-


 


Chegueeeeeei com esse capítulo maraaaaaa <3


Finalmente o safado se rendeu a nossa Dul e falou o seu nome *------*


 


Amo,amo e amo {#emotions_dlg.kiss}



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Autor(a): luvondul

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 41



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  • aucker Postado em 17/12/2020 - 23:29:30

    Como essa fic pode ter poucos comentários gente? Sério msm amei a história

  • dudinhah Postado em 16/11/2018 - 01:59:46

    Essa é a única web ,que eu li que não tem os outros rbds

  • manu_morais Postado em 28/12/2016 - 20:27:20

    https://m.fanfics.com.br/fanfic/55689/never-gonna-be-alone-vondy estou começando a escrever essa fanfic passem-lá

  • manu_morais Postado em 28/12/2016 - 20:25:24

    Simplesmente perfeita essa fanfic, amei d+ a história

  • stellabarcelos Postado em 06/04/2016 - 14:13:33

    Amei amei amei amei! Uma das histórias Hot mais incríveis que eu já li! Nunca ia esperar por isso

  • luvondul Postado em 24/03/2016 - 21:42:19

    Christopher Uckermann é um renomado advogado criminalista apaixonado pelo que faz. Além do sucesso inquestionável na carreira jurídica, também usufrui do impacto devastador que provoca nas mulheres a sua volta. E com a sua nova estagiária Dulce Maria não seria diferente. Recém-chegada de uma temporada fora do país, quando acompanhou o então namorado e cantor pop Dereck Mayer em turnê pelo mundo, a estudante de Direito está determinada a cumprir as horas de estágio para finalmente ganhar o diploma, nem que para isso tenha de resistir aos hipnotizantes olhos azuis do dr. Uckermann. Assim como o seu chefe, a jovem leva uma vida descompromissada, curtindo o sexo oposto sem romantismo ou grandes demonstrações de afeto. Passem lá na minha nova fic meninas ;) http://fanfics.com.br/?q=capitulo&fanfic=53091&capitulo=1

  • hanna_ Postado em 22/03/2016 - 15:46:44

    Foi tudo muito lindo ao modo safado dele mas foi hahahah...fiquei muito feluz de acompanhar essa fic. Cada frase da Clarice q tbm falou com nós leitoras. Ansiosa para sua próxima adaptação. Obrigada vc, bjôooo ;)

  • danihponnyvondyrbd Postado em 20/03/2016 - 21:13:55

    O comentário abaixo e meu

  • Postado em 20/03/2016 - 21:11:41

    N acredito q é o ultimo (to chorando um balde de água) n pode acaber é muito boa por favor não faça isso comigo o meu coração não aguenta. Postao próximo capítulo :-):-):-)

  • hanna_ Postado em 20/03/2016 - 01:06:00

    Q lindos! Ah eu amei a Clarice e o Ck tbm <3 ...Tá acabando :(


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