Fanfic: Aconteceu Você - Adaptada (Vondy) | Tema: Vondy

CHRISTOPHER

     Eu tentei não assustar a Dulce, queria pegar leve e ir reconquistando-a aos poucos, mas não queria que ela pensasse que eu iria desistir, apenas porque as coisas estavam indo mais lentas do que o esperado.

     Claro que eu entendi a questão dos bebês, do seu luto pelo desgraçado...quer dizer, pelo meu primo, e estava tentando arduamente relevar sua teimosia. Dulce franzia o cenho quando eu a tocava, ou então se afastava tão bruscamente como se eu fosse um mostro prestes a machucá-la. E, porra, isso me deixava louco, eu não precisava ser lembrado a cada segundo de toda a dor que causei, mas ele fazia isso mesmo sem perceber.

      Seu medo era um incômodo que me impedia de derrubar sua atitude defensiva.

      Quando finalmente chegamos à casa dos meus pais, eu fui recebido por um olhar de desgosto do meu pai e um irritado da minha mãe. Alexandra não fez nenhum comentário, mas meu pai não fazia a menor questão de esconder seu desagrado quanto a minha recente proteção à Dulce.

      Enquanto as duas conversavam e sorriam, contando histórias sobre bebês, eu a observava a distância. Seu cabelo estava preso, ela usava um vestido azul que não escondia nem um pouco o tamanho assustador da sua barriga. Tudo isso, aliás, era assustador. Dulce não passava de uma garota, afinal de contas.

      - Ela é encantadora, não é? - Meu pai insinuou logo atrás de mim. O almoço nem tinha sido servido ainda e ele já estava com um copo de uísque na mão " Assim como eu", pensei. E ignorei seu comentário deixando que ele pensasse o que quisesse. - Eu não sou idiota, Cristopher, não teria chegado onde estou se fosse cego.

      - Não faço a menor ideia do que está dizendo - blefei.

      - Há quanto tempo isso vem acontecendo?

      - Não há absolutamente nada acontecendo, pai.

    - Não se deixe levar, meu filho, algumas mulheres são capazes de nos fazer abandonar tudo. O problema é que, na maioria das vezes, elas não valem a pena. - Eu sabia a que mulher ele estava se referindo e isso me irritou.

       - Dulce não é assim. - A defendi no mesmo instante, me perguntando o que ele e minha mãe diriam se soubessem a verdade sobre o passado dela. Que a mulher grávida e sorridente no meio da nossa sala tinha sido uma prostituta...

        - Eu só estou dizendo isso porque não quero que cometa o mesmo erro que cometi, Cristopher. Pense muito bem antes de tomar qualquer decisão. Nós não sabemos nada sobre essa garota.

       - Dulce não é assim e pouco me importa o que sabemos ou não sobre ela. Erro vai ser se eu não lutar pelo que quero. Já avisei a Bianca que quero o divórcio, agora é só questão de tempo.

       - Eu espero que você saiba o que está fazendo...- ele cuspiu e se retirou, saindo do meu lado e me deixando em paz. Nem adiantava ele perder seu tempo tentando me convercer do contrário, eu já tinha tomado minha decisão. Só faltava agora convencer Dulce esquecer todas as merdas que fiz.

               ***

       - Para onde estamos indo? - Dulce perguntou já no meio do caminho. Nós tínhamos saído da casa da minha mãe há mais de uma hora e eu só pedi que ela confiasse em mim e me deixasse levá-la para algum lugar legal. Não queria terminar o dia tão cedo e precisava dela da mesma forma como precisava do ar para respirar.

       - É surpresa, Dulce. - Quando eu era adolescente, Brighton meio que tinha se tornado o meu lugar preferido no mundo. Eu gostava de pegar a estrada, quase sempre com alguma garota ao meu lado, e passar um tempo por lá para fugir da realidade esmagadora que era a minha vida.

       - Certo, acho bom você me surpreender mesmo, Cristopher, porque mulheres grávidas são muito difíceis de agradar. - E eu não sabia? Dulce me fazia pisar em ovos a todo momento com medo de cometer ou dizer alguma bobagem que poderia afastá-la ainda mais.

         - Não se preocupe, eu tenho tudo sob controle.

         - Quando que você não tem, não é? - ela disse e eu imediatamente percebi que estava sendo irônica.

         - Quando eu estou perto de você....eu não tenho controle sobre nada - admiti e ela se calou, voltando sua atenão para a paisagem.

             ***

         - Cristopher.... - ela sussurrou meu nome me deixando ainda mais ansioso. Confesso que estava preocupado se ela gostaria de vir no meu esconderijo. Esse lugar já tinha sido o meu refúgio, onde podia agir e ser quem eu quisesse sem a pressão da merda que meu pai colocava sobre meus ombros quando eu era mais jovem.

           As casas simplistas, a praia, o píer sempre lotado de crianças e famílias normais...parecia tão distante da frieza de Londres.

          - Você gostou?

          - Claro que gostei, a última vez que estive aqui, eu era criança, acredita? Foi um pouco antes dos meus pais... foi antes deles sofrerem o acidente - ela falou com a voz embargada e eu me xinguei mentalmente. Será que eu nunca acertaria quando se tratava dela? Minha intenção era vê-la feliz e não triste, merda!

          - Quantos anos você tinha quando os perdeu?

         - Dez. - Eu não gostava da ideia de Dulce sozinha, ou sofrendo por essa merda.

          - Seus tios cuidaram de você depois disso, não é? - Eu sabia disso, porque todas essas informações estavam no primeiro relatório que consegui sobre ela.

           - Eu não quero falar sobre isso, Cristopher. - Ela desviou seu olhar do meu e se inclinou para observar o mar. O tempo não estava tão fechado quanto em Londres, mas era o suficiente para deixar o mar agitado e a praia deserta.

          - Você ainda tem contato com eles?

         - Não, e pode apostar que estou muito melhor assim. Se por acaso eu tiver sorte, nunca mais vou precisar vê-los. - Esse comentário amargo me preocupou. Será que Dulce nunca foi feliz? Sua vida sempre foi conturbada?

            - Por quê?

          - História londa demais e não é algo que eu goste de lembrar. Além disso, eu adorei vir aqui. É estranho, eu sei, mas em alguns momentos, eu sinto como se os últimos anos não tivessem acontecido de verdade, sabe? Que tudo não passou de um terrível pesadelo....- ela falou e me deu um sorriso sincero. - Esse é um desses momentos. - O vento ficou mais forte, fazendo alguns fios do seu cabelo cobrirem seu rosto, me dando a oportunidade perfeita para tocá-la.

           Afastei as mechas e olhei atentamente cada traço do seu rosto, sua boca carnuda, o nariz perfeito, a pele macia... mas foram os seus olhos que fizeram meu estômago revirar. Por mais bonitos que fossem, ele pareciam ter sido sugados. O brilho que eles costumavam ter, não estava mais ali.

        - Não faça isso - ela murmurou. - Cristopher...não faça. - Minha mão estava prestes a puxá-la, e eu queria tanto cobrir sua boca com a minha e provar a ela que nada tinha mudado. Que ela era minha...e sempre seria.

         - Que tal se dermos uma caminhada pelo calçadão? - sugeri, era isso ou eu a beijaria nesse instante sem me importar com sua relutância. - Isto é, se você não estiver cansada.

          - Eu não estou cansada, e não comece a me tratar como a sua mãe e a Ângela. Elas me deixam doente.

        - Minha mãe se preocupa e diz que precisa ficar em cima de você, e eu concordo.

        - É mesmo?

        -  Sim, por mais que você não acredite. Mas eu não quero que nada te aconteça. Eu não sei o que faria se perdesse você... - Ela balançou a cabela e olhou para o outro lado e eu decidi que era hora de para de pressioná-lá. Pelo menos, por hoje.

        Passamos mais algumas horas juntos, caminhando pelo calçadão, conversando e eu adorei a sensação de poder fazê-la sorrir. Era diferente de tudo que já senti.

         Na volta para casa, Dulce acabou adormecendo ao meu lado e tive tempo suficiente para repassar toda a tarde. Ignorei a chamada que recebi enquanto dirigia, sabendo que só podia ser da Bianca. Eu estava tendo problemas em fazer com que ela assinasse a porcaria dos papéis do divórcio, adiando uma decisão que já era para estar resolvida há muito tempo.

          - Hum, não me acorda não - Dulce resmungou quanto tentei pegá-la no colo para levar até seu apartamento.

          - Eu estou tentando ... - murmurei de volta.

         - Eu estou pesada. - "Não tão pesada assim", eu pensei. E pelo que Alexandra me contava, ela estava até abaixo do peso esperado. Minha maior preocupação agora era machucá-la.

          Ângela abriu a porta e quando viu Dulce adormecida em meu colo fechou a cara e apontou para o quarto no segundo andar. Eu pensei que ela me seguiria, mas quando cheguei lá em cima estava sozinho.

           - Pede para eles pararem de me chutar, Cristopher... - A coloquei na cama e quando ia me afastar, ela segurou a minha mão e colocou em sua barriga. - Está sentindo? - Minha primeira reação era tirar minha mão dali, porque me assustou a maneira como eles a chutavam....

           - Tem certeza de que isso não te incomoda?

          - Como poderia? É a maneira que eles têm de se comunicar comigo e eu adoro. - O quarto ficou em silêncio por alguns instantes, a respiração da Dulce foi ficando constante e eu mantive minha mão em sua barriga sentindo a agitação que os bebês estavam.

           - Eu já estou indo, vou deixar vocês dormirem, tudo bem? - murmurei, me inclinando para beijar seu rosto. Por um momento, pensei que ela fosse recuar, mas não foi isso que aconteceu e eu beijei sua bochecha corada. Dulce apenas assentiu e se aconchegou um pouco mais na cama. - Durma bem, anjo.