Fanfic: Memories - Um Conto de Daryl Dixon e Beth Greene | Tema: The Walking Dead
Daryl Dixon não sabia mais por onde procurar, não era a toa que estavam tão perdidos. Ele conhecia bem as trilhas, seguia as pistas com destreza, mas sua habilidade já parecia não servir de nada com poucas pistas. Acho que se perderam, sei lá. Não sei por que me importo. Beth o seguia aonde quer que fosse e ainda sim tentava não se importar, afinal, a garota parecia mais um fardo às vezes, por horas adorava sua companhia, mas tentava não demonstrar. Sua vida lhe ensinara que demonstrar demais trazia consequências toscas, futuramente. Não a deixe perceber que se interessa pelo que ela sente. Se conseguir, Dixon.
“Você ficou fraco, irmão”. Ouvia a voz do Merle sempre que se sentia assim, confuso e indeciso. Aprendera com os anos que ser “forte” era simplesmente ser ignorante, ser fechado para o mundo como uma rocha e nada poderia atingi-lo. Mas quem Daryl Dixon realmente queria enganar se não a si mesmo? Não conseguia mais tapear Beth Greene. Ela via a sua alma toda vez que o olhava nos olhos, talvez fosse por este motivo que a temia tanto.
- Poderia guardar seu fôlego, garota? Talvez fizesse um favor para si mesmo. – cuspiu Daryl enquanto observava Beth tentando subir em uma árvore a fim de conseguir alguns frutos.
- Qual o seu problema? Não mamou no peito?
Daryl limitou-se a fungar e coçou o nariz. Mamei, eu acho. Pensou. Balançou a cabeça negativamente e respirou fundo, deixou-a em seus afazeres enquanto continuava sentado eviscerando um coelho que conseguira caçar. Olhou Beth Greene de soslaio e não conseguiu evitar o turbilhão de pensamentos dentro de sua cabeça. Suspirou e tentou esvaziar a cabeça com uma sacudida, pelo menos algo que fosse forte o suficiente para devolvê-lo a realidade.
Deixou o coelho de lado e caminhou na direção da garota que lutava para conseguir subir na árvore. “Era isso que você queria irmãozinho? Uma vadia para lidar?” A voz de Merle ressoava em sua mente, mas Daryl já a ignorava há muito tempo. Ajudou-a descer com cuidado e esfregou as mãos antes de retornar ao coelho, que logo estaria suculento.
- Você acha que um dia o mundo vai voltar a ser o que era?
- indagou Beth.
Não gostava de pensar muito a respeito, mas ela queria forçá-lo a isso.
- Ele pode mudar, esses monstros podem acabar, mas jamais será o mesmo. – respondeu enquanto rasgava a carne do coelho e retirava sua pele. – Algumas coisas não foram feitas para dar para trás.
Ela parecia cabisbaixa, talvez não estivesse completamente satisfeita com a resposta. Mas aquela era a total verdade a respeito de tudo. Nada será como antes. Daryl permaneceu em silêncio enquanto Beth se deitava próxima da árvore e olhava para o céu. Seus olhos se fechavam como se orasse, pensando que talvez uma prece trouxesse tudo de volta. Seu pai, seu irmão, mãe e tudo o que perdera. Além do grupo, precisavam encontrá-los. Deus estaria observando por nós? Pensou. Não sabia dizer. A verdade era que nunca acreditara em uma divindade, porém Beth sempre rezava e pedia a ele que trouxesse paz ao mundo.
Terminou de retirar a pele do coelho, a vista não era tão agradável agora, mas pensou que se pudesse assá-lo, então o sabor seria um diferencial naquele seu dia desprezível. Enfiou a animal no espeto e esperou a fogueira fazer o seu trabalho, pacientemente.
- Vai demorar?
Beth não tinha o estilo de quem gostava de esperar.
- Depende. Você tem algum compromisso mais tarde?
- Nenhum que eu saiba, somente não sou do tipo que espera com paciência. – rebateu Beth. Ela fechou a cara e virou-se.
Ótimo. Agora deveria cuidar dela e de si mesmo, além de torcer para que nenhuma daquelas coisas chegasse e os pegasse de surpresa. Tinha muito tempo para se desfazer da pele, dos órgãos e de todas as vísceras do animal antes de assá-lo e comê-lo, mas tinha a intenção de fazê-lo antes do anoitecer. Queria encontrar uma casa em algum lugar seguro, talvez uma fazenda onde pudessem passar algumas horas descansando antes de retornar em sua jornada a fim de reencontrar os outros membros do grupo. Daryl já estava de saco cheio de tanto perambular, precisava de um lugar quente e tranquilo para descansar, onde pudesse relaxar e respirar um pouco antes de voltar a fazer merda (como de costume).
Beth se mexia de um lado para o outro enquanto dormia, sem dar qualquer sossego. Uma hora sua mão acertava o braço de Daryl, atrapalhando-o na hora de cortar o coelho e em outro momento sua cabeça atingiu a mão dele, fazendo com que arrancasse um pedaço da cabeça de seu dedo. Mulher inquieta... Estava dormindo ali do outro lado e já está aqui me enchendo. Pensou completamente indignado. Voltou a se concentrar em seus afazeres, afinal era ele quem estava tentando alimentá-la. Ao menos a garota não “roncava” igual a um porco desmamado, pelo menos, o qual Daryl poderia agradecer com um estonteante sorriso. Roncos atraem zumbis. Seria melhor cortar as cordas vocais fora do que ter um porco roncando aqui. Pensou. Por um momento viu Merle Dixon diante dele, observando-o terminar o serviço com o coelho.
- Nada mal, vejo que não perdeu o jeito.
- Cala a boca, você está morto. – rebateu Daryl. – E você foi burro, além de ter morrido, então não conversarei nem mesmo com seu... – apontou a faca na direção de Merle. – Fantasma...? Ou é só a minha cabeça? Oras. Estou pensando bobagem demais, você nem existe e fica aí falando merda, como: “Eu avisei, irmãozinho, você foi descuidado”. “Essa garota é um peso e vai te atrapalhar”. Eu tenho mais o que fazer, então não incomode.
- Se estou aqui é porque você está incomodado.
- Estou incomodado com a sua presença. Você fede.
- Esse cheiro não é meu, afinal, estou morto. – brincou Merle. – É você quem fede, irmãozinho. Não toma um bom banho há... Meses, pelo menos desde quando esta merda começou. Enquanto se refugiava com um grupo de lesados eu vivia em uma boa cidade fortificada que seu grupinho fodeu, juntamente com aquele monte de merda do Rick Grimes.
Daryl riu.
- Sou eu quem está pensando isso e não você. Além de burro, está morto, e suas opiniões não me são tão “valiosas”, afinal, devem ser as minhas e ultimamente tenho feito muita merda.
Merle sorriu e aparentemente o ponto que desejava tinha chegado, bastava trabalhá-lo.
- Aí está o ponto, Darylzinho, aí está o ponto... – murmurou Merle. – É você quem pensa isso de si mesmo, não eu. Na verdade eu também pensava o mesmo, correto? – Merle abriu os braços com um sorriso chato no rosto. – A verdade é que este é o mundo que pediu pra Deus, não é? Destruído, cheio de monstros e todos os tipos de merda possíveis. Isso é o tipo de mundo onde você não se sente mais diferente dos outros. Está em casa, Darylzinho?
- Darylzinho? – ele se levantou e apontou a faca na direção de Merle. – Vou enfiar essa merda na sua bunda se repetir isso novamente.
- Faça o que quiser. Se eu sou obra da sua cabeça, provavelmente uma tentativa desta resultaria um auto-flagelamento desnecessário. – Merle deu de ombros e caminhou para longe. – Deixarei que fique sozinho e pensativo. Até logo.
Sozinho... Droga! É só a minha mente me perturbando. Perdi um tempo precioso discutindo comigo mesmo. Pensou. Daryl voltou a dar atenção somente ao coelho e empalou-o com um espeto de metal que conseguira encontrar em um dos armazéns que visitara dias atrás. Depois de um longo tempo de atenção sem igual ao coelho, Daryl voltou seu olhar para a jovem Beth que estava deitada próxima a ele. Seu rosto delicado enquanto viajava em sonhos distantes aparentava a visão de um anjo. Seus cabelos dourados bagunçados que cascateavam de forma irregular pelo seu rosto e ombros eram tão reluzentes que Dixon podia ver a luz que emanava deles. Seus lábios delicados e finos de uma menina faziam-no pensar em como seria agradável poder senti-los.
Ela sorriu rapidamente enquanto dormia, foi o que aumentou a sua curiosidade. A garota deveria ter vivido anos de ouro quando jovem. Tinha uma família, uma vida. Ele jamais tivera a oportunidade de conhecer a mesma vida que ela, porém se sentia feliz por estar ao lado de alguém que podia ensiná-lo um pouco mais sobre a ternura, o respeito, o amor. “Estou pensando nisso mesmo”? Daryl pegou-se pensando em coisas que não costumava a pensar. Voltou-se para o coelho, mas novamente seus olhos se desviaram para Beth como em um impulso monstruoso, algo que não conseguia mais conter. Sentiu algo estranho em seus olhos, como se pequenas gotas surgissem, pareciam lágrimas, mas não queria chorar. Ou queria?
Respirou fundo e perguntou-se em que mundo a vida teria trazido uma garota como essa para perto dele, que dividira segredos, angústias, felicidade e tristeza. Sorriu para si mesmo em um pequeno momento de ternura em sua vida, pois não tinha tido muitos durante ela. Perguntou-se de onde vinha tudo aquilo na qual pensava e sonhava e indignou-se. O mundo precisou acabar para que ele realmente encontrasse o caminho. Se não fosse isso, estaria em um bar bebendo e fodendo com a própria vida. Um inútil, como sempre.
“Eu perdi quem eu sou. Já não posso entender, por que meu coração está tão quebrado? Rejeitando seu amor. Sem amor, deu errado. Palavras sem vida continuaram”. Pensou nas palavras que ouvira há muito tempo. Cá estava novamente pensando coisas belas e fofinhas. Apenas faltavam os unicórnios e as fadas.
- Por que está olhando?
Beth despertou e pegou Daryl de surpresa, que desviou rapidamente os olhos.
- Estava vendo se você não engoliria alguma mosca enquanto roncava. – murmurou. – Você parece um carro velho rosnando, Deus me livre.
- Melhor do que parecer um gorila raivoso!
Ele compreendeu a comparação depreciativa aos seus cabelos, barba e cara achatada. Sem contar a sujeira. Mas onde, naquele mundo, pensaria em se lavar? “O normal exigia o mínimo. Mas este mundo apenas pede que eu sobreviva, como for”. Já se cansara de terminar o dia sujo até os ossos com sangue de zumbi. Mas não se importava mais, afinal, não havia muita gente para enchê-lo naqueles tempos.
- Isso foi cruel, garota. – devolveu Daryl. – Mas ainda sim é melhor do que parecer um urso gritando enquanto dorme. – ele se levantou e afastou-se devagar.
Ele se afastou um pouco mais, mas as palavras de Beth pegaram-no de surpresa.
- Sei que você não quer ser assim... – disse quase como um sussurro. – Você tem raiva, mas isso é algo que trouxe do mundo onde não te aceitavam. Neste mundo somos todos iguais.
Daryl não se virou, mas respondeu.
- Então você quer dizer que esta catástrofe trouxe algo de bom?
Beth baixou a cabeça e levantou os ombros.
- Acho que sim. É útil tirar algo de bom de tudo o que acontece, apenas para não se esquecer...
- Esquecer o que? – cortou Daryl.
- Que vale a pena viver.
Ele tentou ignorar o que ela disse como se tivesse uma maneira mais fácil de fingir que nada havia sido dito. Respirou fundo novamente e pensou se realmente valia tanto a pena viver em um mundo feito de ruínas, mortos vivos e toda a sorte de porcaria. Daryl Dixon desejava ter esperanças, uma vida diferente da que tinha naquele momento. “Desejo mesmo isso?”. Virou-se para encará-la, às vezes tentar ser durão era desgastante e ainda pior frente a alguém que o tocava tanto. Precisava sentir o calor dela, ver seu sorriso sob o sol, ouvir suas doces palavras que vinham dos seus meigos lábios, antes que fosse tarde demais.
- Você pensa demais em viver garota! Essa vida que estamos não é nada! Vivemos no meio da merda, com mortos atrás de nós e uma esperança de merda. Isso não vai acabar tão cedo e estamos presos nisso! Aceite, é melhor.
- Então pelo que você vive? Se não é nada. Por quê?
De fato Dixon não tinha ideia do motivo de viver tanto.
- Estou cansado deste papo de merda. – resmungou Daryl dando as costas para ela. – Vou assar o coelho que ganho mais.
- Ganharia demais se dissesse o que sente. – disse Beth. – Ao menos eu digo. Pare de se esconder, Daryl. Pode se arrepender depois.
“Já me arrependi há muito tempo. Garota”.
Autor(a): henriquevietri
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- Estou cansada de ficar andando para lugar nenhum. – murmurou Beth. Daryl torceu o nariz quando olhou para trás e a viu sentando no meio da estrada. Seu cansaço estava desgastando-lhe até os ossos, mas não podia parar. Muito menos no meio da estrada correndo risco de ser encontrado por algum zumbi maluco. Adorava e odiava a menina ao mesmo ...
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