Fanfic: Tentadora Paixão | Tema: Adaptada Vondy

— Oh! Não. — A voz profunda e rude não podia ser senão do próprio Christopher Uckermann— Não estou interessado. Mande-a embora.
Em pé no hall do lado de fora da biblioteca, Dulce Maria respirou fundo e tentou manter sua decisão. Não seria fácil, mas nada sobre o caso de Christopher Uckermann tinha sido fácil. Nem o acidente, nem a reabilitação, nem a locali­zação de sua propriedade.
Levara dois dias para chegar de Londres até ali. Um voo de Londres a Atenas, uma interminável corrida de carro de Atenas a Esparta e, finalmente, uma viagem numa charrete puxada por um burro, que chocalhara seus ossos, até a pro­priedade, situada na metade da íngreme subida da monta­nha.
Por que alguém, em especial um homem que não podia andar nem ver, iria querer viver num antigo monastério cons­truído no declive rochoso de Taygetos, a montanha mais alta do Peloponeso, era incompreensível para ela. Mas, agora que estava ali, não desistiria.       — Ucker. — Outra voz soou dentro da biblioteca e Dulce reconheceu-a como a do empregado grego que a rece­bera à porta. — Ela fez uma longa viagem...
— Já tive o bastante da ajuda infernal da First Class Rehab. Primeira Classe é pura enganação. Dulce fechou os olhos e soltou o ar lentamente, con­tando até dez enquanto isso.
Sua equipe em Atenas a advertira que seria uma longa viagem até o antigo monastério. Comentaram que chegar à acidentada Taygetos, com sua paisagem severa e seus extra­ordinários panoramas, era tão cansativo como cuidar do Sr.Uckermann. Informaram que subir a montanha espetacu­lar, com suas antigas ruínas bizantinas, pareceria tão mí­tico quanto impossível, mas Dulce, ocupando um lugar na charrete, pensou que havia se preparado. Acreditara que sabia em que estava se envolvendo.
Assim como acreditara que sabia em que estava se meten­do quando concordara em fornecer atendimento domiciliar de saúde ao Sr. Uckermann quando ele tivera alta do hos­pital francês.
Errara, em ambos os casos.
A dolorosa e acidentada viagem deixara Dulce tonta, com o estômago embrulhado e uma terrível dor de cabeça.
A tentativa de reabilitação do Sr. Uckermann fizera-a sofrer muito mais. Para falar a verdade, quase provocara a falência de sua empresa.
Dulce ficou tensa quando o som de vidro quebrado foi seguido por uma longa sequência de palavrões em grego, bem escolhidos e excepcionalmente pitorescos.
— Ucker, é só um copo, pode ser substituído.
— Odeio isso, Pano. Odeio tudo relacionado a isso...
— Eu sei, Ucker. — A voz de Pano ficou muito baixa e Dulce não conseguiu ouvir muito do que foi dito, mas, aparentemente, teve o efeito de acalmar o Sr. Uckermann, mas não Dulce.
Christopher Uckermann podia ser fabulosamente rico e capaz de sustentar um tipo de vida excêntrico e recluso no Peloponeso, mas isso não justificava seu comportamento autodestrutivo e autocentrado.
Ela estava lá porque ele não conseguia manter uma enfermeira em casa, não conseguia dominar seu terrível mau humor.
As vozes na biblioteca aumentaram de volume novamente e Dulce, fluente em grego, ouviu o que falavam sobre ela.
O Sr. Uckermann não a queria ali.
Pano, o velho mordomo, tentava convencer o Sr. Uckermann que não seria educado mandar a enfermeira embora sem vê-la.
O Sr. Christopher disse que não se incomodava de não ser educado.
A boca de Dulce se curvou num sorriso cauteloso quando o mordomo sugeriu que o Sr. Uckermann pelo me­nos oferecesse um lanche à enfermeira.
O sorriso desapareceu quando ouviu o Sr. Christopher responder que, como as enfermeiras de First Class Rehab eram quase todas gordas, provavelmente seria bom para a Srta. Saviñón ficar sem seu lanche da tarde.
— Ucker — insistiu Pano —, ela trouxe mala. Bagagem. A Srta. Saviñón pretende ficar.
— Ficar? — Uckermann rugiu.
— Sim, Ucker. — Suas palavras tiveram o efeito de fazer Christopher praguejar de novo.
— Pelo amor de Deus, Pano, deixe esse copo e mande-a embora. Jogue um osso para ela. Arranje-lhe um burro. Eu não quero saber. Apenas faça isso. Agora.
— Mas ela veio de Londres...
— Não quero saber de onde veio, se foi da lua. Não tinha nada que vir. Avisei à empresa, duas semanas atrás. Essa mu­lher sabe muito bem que dispensei seus serviços. Não pedi que viesse. E, se perdeu tempo, não tenho nada com isso.
Por falar nisso, pensou Dulce, massageando a nuca para diminuir a dor, estava perdendo tempo. Chegara o mo­mento de se apresentar.
Com os ombros para trás, ela respirou fundo, abriu a alta porta e entrou. Seus saltos baixos fizeram um ligeiro ruído no assoalho de madeira.
— Boa tarde, Sr. Uckermann — disse.
Seus olhos percorreram a sala, observando as janelas fe­chadas, a mesa de café desarrumada, a pilha de jornais ve­lhos na escrivaninha do canto.
— Você está invadindo e bisbilhotando.
Christopher ergueu o corpo na cadeira de rodas, sua voz pro­funda vibrando de fúria.
Ela mal o olhou, dirigindo-se para a pequena mesa cheia de vidros de remédios controlados.
— Estava gritando, Sr. Uckermann. Não precisei bisbilhotar. E estaria invadindo se os cuidados com sua saúde não fossem minha responsabilidade. Mas são, portanto, o senhor terá que me aguentar.
Dulce pegou um dos vidros de remédio para ler a eti­queta e depois os outros. Era um velho e automático há­bito. A primeira coisa que um profissional da área médica precisava saber era quais os remédios o paciente estava to­mando.
Christopher estremeceu, tentando seguir o som de seus mo­vimentos, os olhos protegidos por uma atadura branca em torno da cabeça, contrastando com os cabelos negros.
— Seus serviços já foram dispensados — disse brusca­mente.
— Suas ordens foram alteradas — respondeu Dulce, voltando-se para olhá-lo.
As ataduras deixavam à vista os duros contornos de seu rosto. Tinha a face esculpida, um queixo firme e um maxilar forte coberto por uma barba maltratada. Parecia que não se barbeara desde que mandara embora a última enfer­meira.
— Por quem? — exigiu saber.
— Seus médicos.
— Meus médicos?
— Sim. Temos contato diário com eles, Sr. Uckermann, e nesses últimos meses levantaram dúvidas sobre sua saúde mental.
— Você só pode estar brincando.
— De modo algum. Estão pensando que talvez o senhor deva ser cuidado numa instituição...
— Vá embora! — ordenou, apontando a porta. — Vá em­bora agora.
Dulce não se moveu, apenas curvou a cabeça para o lado e examinou-o com frieza. Estava desarrumado, nem um pouco parecido com o sofisticado e poderoso magnata que fora, com castelos e propriedades espalhados por todo o mundo e uma bela amante em cada local.